domingo, 30 de dezembro de 2018

Competição EUA-China cria mundo mais conflituoso em 2019


Com a crescente competição estratégica entre os Estados Unidos e a China, mesmo que a guerra comercial entre as duas superpotências seja resolvida, o mundo entra em 2019 numa era mais conflituosa.

“Estamos entrando num período mais turbulento e conflituoso. O que caracteriza as relações internacionais do início do século 21 é a ascensão da China. Marcou profundamente a ordem internacional”, observou o professor Paulo Wrobel, do Instituto de Relações Internacionais da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (IRI-PUC).

O sonho do fim da Guerra Fria de uma era de paz e cooperação internacional começou a ser destruído com os atentados de 11 de setembro de 2001 nos EUA. A história não acabou, como previra o pensador americano Francis Fukuyama ao acreditar que a democracia liberal e a economia de mercado seriam dominantes.

“Ficou para trás aquela noção do fim da história, de uma ordem internacional mais cooperativa, uma ONU mais ativa, uma era de cooperação pacífica. Alguns analistas falam em volta ao mundo pré-1914, mas a natureza da guerra mudou. O mundo está mais perto de 1914 do que de 1989”, comentou Wrobel, fazendo um paralelo entre a Era dos Impérios, anterior à Primeira Guerra Mundial, e o ano da queda do Muro e das revoluções democráticas nos países do Bloco Soviético na Euro pa Oriental.

Do ponto de vista das relações internacionais, há uma volta do multipolarismo e do nacionalismo: “São quase 200 países defendendo seus interesses. É o realismo clássico.”

Diante da ascensão da China, “o governo americano não aceita mais o déficit comercial”, que em 2017 ficou em US$ 375 bilhões. “Há uma competição tecnológica e militar. Enquanto a industrialização da China era mais voltada para produtos de baixo ou médio conteúdo tecnológico, não era problema para os EUA.”

Nos últimos dez anos, o desenvolvimento da China atingiu um nível de sofisticação tecnológica, com exploração do espaço, carro elétrico, microchips, inteligência artificial, computação quântica... A China passou a competir no lado mais sofisticado. O conflito é muito mais do simplesmente comercial, é econômico tecnológico e militar.

“A China tem um projeto claro, consistente, assumiu o papel de grande potência para se tornar a grande potência do mundo até 2050. Com ou sem Donald Trump, o desafio chinês está aí. Qualquer que fosse a liderança americana teria de dar uma resposta”, analisou o professor.

“No 19º Congresso do PC, Xi Jinping se firma como ditador. Se isso vai gerar um conflito bélico, a história dirá. Não existe mais a possibilidade de um jogo cooperativo. Temos uma ordem internacional mais conflituosa. Na nova doutrina de segurança nacional dos EUA do governo Donald Trump, o inimigo não é mais terrorismo, mas a China e a Rússia”, destacou Wrobel.

A competição estratégica está lançada: “O gasto militar americano ainda é três vezes maior, mas o aumento do orçamento militar chinês é maior do que o crescimento do produto interno bruto”, ponderou o professor da PUC-RJ.

O antigo inimigo da Guerra Fria também desafia os EUA e o Ocidente em todas as frentes: “A Rússia é cada vez mais agressiva, especialmente contra a Ucrânia”: anexou a Crimeia, erguei uma cerca, gerou um conflito no Mar de Azov, anunciou um novo míssil nuclear hipersônico.

Moscou fustiga cada vez mais o Ocidente, notou Wrobel: “A Suécia cogita entrar para a OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte). A Polônia morre de medo da Rússia. [O ditador Vladimir] Putin mandou bombardeiros para a Venezuela, um país vizinho. A Ucrânia voltou a manifestar interesse em entrar para a União Europeia e a OTAN.”

Com a retirada dos 2 mil soldados americanos que estavam combatendo a organização terrorista Estado Islâmico do Iraque e do Levante, “a Rússia é o principal ator na Síria. Consolida-se como grande potência no Oriente Médio, o que complica a vida de Israel. A Rússia é uma potência militar que provoca o tempo inteiro a OTAN e os vizinhos. Há uma certa aproximação militar entre Rússia e China. Dois a três mil soldados chineses participaram de manobra militar russa na Ásia.” É pouco, mas é significativo, entende o professor.

Na Europa, o ano será marcado pela saída do Reino Unido da UE. “Em 19 de janeiro, a Câmara dos Comuns vota o acordo. O problema foi o primeiro-ministro David Cameron ter convocado o plebiscito de 23 de junho de 2016. O eleitorado se manifestou livremente. Um novo plebiscito seria um tremendo desprestígio.”

Desde o Tratado de Roma, de 1957 a Comunidade Econômica Europeia passou de 6 para 28 países e virou UE. “Pela primeira vez, um país sai. O modelo entrou em crise. Hungria, Polônia, República Tcheca e Itália contestam a integração europeia. Há um renascimento do nacionalismo europeu, uma reação contra a federalização da Europa.”

O eixo central, franco-alemão, está enfraquecido pela saída da primeira-ministra Angela Merkel e a crise do governo Emmanuel Macron, acrescentou: “A saída do Reino Unido é a saída de um peso-pesado, mais de 10% da população. A tradição francesa é fazer revolução. A mobilização, inicialmente da população branca do interior, da zona rural, levou a um desprestígio muito grande do presidente Macron”, reduzindo a chance de reforma da Europa.

“A imigração é uma questão fundamental. A Europa não pode aceitar um número muito grande de migrantes da África e do Oriente Médio. Todo ano 7 a 8 milhões entram no mercado de trabalho e a África gera 1 milhão de empregos por ano. Onde este pessoal vai trabalhar?”, perguntou Wrobel.

“A África é o último continente onde o crescimento demográfico ainda é grande. Os países só crescem muito com uma população jovem. É grande celeiro de recursos naturais. Mas, em curto prazo, a tendência é de saída de jovens da África”, assinalou o professor.

Da mesma forma, a imigração da América Central e do México virou um tema central da política nos EUA: “A população de latinos chega a 50 milhões. Trump quer um fechamento, mas não é novidade. A primeira restrição à imigração nos EUA foi com a China ainda no século 19, com a corrida do ouro na Califórnia e a construção de estradas de ferro no Oeste, Depois, houve restrições à imigração de judeus do Império Russo.”

Com a maioria da oposição democrata na Câmara dos Representes, “o clima vai esquentar em Washington. Há uma tradição de vitória da oposição nas eleições intermediárias. Aumenta a turbulência no processo legislativo americano. Agora, há um fechamento do governo. A polarização vem desde o governo Bill Clinton (1993-2001). O fim da Guerra Fria acabou com o consenso político americano”, sublinhou Wrobel.

“O Partido Democrata foi para a esquerda com o governo Barack Obama (2009-17) e o Partido Republicano foi para a direita com Trump”, aprofundando a divisão.

No Brasil, não é muito diferente, diagnosticou o professor do IRI-PUC: “Também temos um sistema político muito polarizado. Houve uma alteração profunda na correlação de forças, com uma derrota fragorosa da esquerda.”

A direita já havia chegado ao poder pelo voto com Fernando Collor de Mello, na primeira eleição presidencial depois da ditadura militar, em 1989: “Collor, um conservador, promoveu uma abertura comercial, mas teve erros crassos de política econômica como o confisco da poupança e a política anti-inflação”, avaliou.

“Agora, há um projeto liberal clássico de política econômica, uma tentativa de tirar o peso do Estado da vida econômica e uma inserção competitiva da economia brasileira. Reduzir o papel do Estado. De outro lado, tentar reinserir o Brasil. Do Grupo dos 20, das maiores economias do mundo, é o país mais fechado. Nossa economia é altamente protegida.

Wrobel espera “uma grande reação dos grandes cartéis representados nas federações das indústrias. Precisamos de um choque de capitalismo, de um capitalismo popular, menos corporativo”, defendeu. “O número de funcionários públicos dobrou sob o PT, de 6 para 12 milhões. Uma revolução macroeconômica e uma revolução microeconômica podem alavancar o crescimento nacional.”

O professor minimiza o peso do discurso marcado pelo cristianismo do futuro ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo: “A retórica de política externa é uma coisa. Eu meço pelo resultado. O resultado da política externa do PT foi pífio. Apostamos na Rodada de Doha, não fizemos nenhum acordo comercial relevante.”

A hostilidade ao regime comunista chinês pode ver vencida pelo pragmatismo; “Ernesto Araújo criou uma divisão do agronegócio. Não vejo racionalidade em combater a China, mas a exportação concentrada em commodities não basta. Podemos ficar 5 mil anos exportando soja, minério de ferro e petróleo para a China que não vamos enriquecer.”

“Aliança cristã é exercício de retórica. O que vimos no encontro do presidente eleito, Jair Bolsonaro, com o primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, tem a ver com uma aliança com os EUA e também como uma forma de se diferenciar dos governos petistas”, de marcar posição.

“A China critica Israel, mas tem uma forte aliança”, na opinião de Wrobel. Quanto às relações Brasil-Israel, “vejo a cooperação agrícola e dessalinização para combater a seca no Nordeste. A retórica é livre. Tem de ver os resultados práticos. Há ainda a crítica ao Mercosul, a proposta de aliança com o Chile e um endurecimento com Cuba, Venezuela e Nicarágua.”

No próximo ano, haverá eleições em países importantes com grandes populações, a Índia, a maior democracia do mundo, a Indonésia, que tem a quarta maior população mundial e a Nigéria, que tem a maior população da África, devendo chegar a 200 milhões de habitantes.

Existe, de acordo com o professor, “uma Inevitável frustração com a democracia em países como a Índia diante das expectativas. A democracia funciona na Índia desde a independência do Império Britânico, em 1947. O crescimento de 7% a 8% ao ano ainda é insuficiente para superar o atraso. A grande crise da democracia está na incapacidade de prover serviços de qualidade para levar os pobres à classe média. Nunca, na história da humanidade, tantos viveram tão bem.”

Em parte, isso se deve ao desenvolvimento da ciência e da medicina: “A expectativa de vida em 1900 era de 40, 50 anos. Hoje, está chegando em 75 anos. A expectativa de vida continua crescendo todo ano. Mesmo na África, já passou de 70 anos.”

Na América Latina, houve eleições em 2018 nos dois maiores países em economia e população, Brasil e México, além da Colômbia.

“O México é um país fundamental na América Latina. Tem um tremendo desafio que é a questão da violência. Os cartéis do tráfico de drogas muito mais ricos e poderoso do que no Brasil. Há o risco de virar um narcoestado como na Colômbia. O novo presidente, Andrés Manuel López Obrador prometeu grande mudança”, continuou o professor. Terá de equilibrar esquerdismo e pragmatismo.

A Colômbia elegeu um presidente jovem, Iván Duque, ligado ao ex-presidente Álvaro Uribe. Apesar do acordo de paz com as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC), o tráfico de drogas não diminuiu: “A Colômbia supre 90% do mercado de cocaína dos EUA, maior consumidor mundial. O Brasil é o segundo maior consumidor.”

Em 2019, haverá eleições na Argentina, no Uruguai e na Bolívia.

“A Argentina é um caso talvez único de um país que tenta, mas não consegue deslanchar. Precisa de uma moeda. Qualquer bico que façam, imediatamente, os argentinos compram dólares. Talvez a saída seja dolarizar, como fizeram Panamá, Equador e El Salvador. Bem ou mal, o Brasil encontrou um certo rumo”, observou o entrevistado.

Eleito em 2013 com uma plataforma reformista, o presidente Mauricio Macri enfrenta uma crise cambial, com desvalorização de 50% do peso, inflação e recessão. Terá dificuldade para se reeleger: “Enquanto não resolver a questão monetária, é difícil. Enquanto não superar o fantasma do peronismo, não avança.”

A Bolívia cresceu muito sob Evo Morales, que atropelou a Constituição com o aval do Poder Judiciário e busca um quarto mandato. “É um indígena. Representa a maior parte da população e tem uma certa legitimidade vinda do crescimento econômico.”

Outra marca de 2018 foi a perda de prestígio e até um certo repúdio às grandes empresas da Internet, que se tornaram superpoderosas: “Qualquer setor que cresce muito e se transforma nas maiores empresas do mundo acaba sendo objeto de regulamentação. Foi assim com o petróleo. John Davidson Rockefeller fez fortuna com o monopólio. Com a Lei Sherman, da Standard Oil, foram criadas 32 empresas.”

O choque do futuro hoje é o impacto da revolução tecnológica sobre o mercado de trabalho, conclui Paulo Wrobel. “O grande dilema da humanidade é o emprego. A inteligência artificial vai reduzir o emprego. Todos querem uma vida de classe média. Para isso, precisam de emprego. Os países ricos podem se dar ao luxo de ter políticas de renda mínima”, o chamado imposto de renda negativo.

É característica do futuro ser incerto e perigoso.

sábado, 29 de dezembro de 2018

Rebeldes hutis entregam porto do Iêmen sob supervisão da ONU

Sob a supervisão das Nações Unidas, os rebeldes hutis, xiitas zaiditas apoiados pelo Irã, cederam hoje o controle de Hodeida, o principal porto do Iêmen no Mar Vermelho, à Marinha e à Guarda Costeira do país, informou a agência Associated Press (AP).

A entrega é um passo importante do acordo feito durante negociações de paz na Suécia para acabar com a guerra civil iemenita, que já dura mais de cinco anos e é considerada a pior tragédia humanitária hoje no mundo.

Há mais de uma semana, os hutis e o governo do Iêmen reconhecido internacionalmente, apoiado pela Arábia Saudita e outras monarquias petroleiras do Golfo Pérsico, respeitam uma trégua em Hodeida.

Cerca de 70% das importações do Iêmen entram por Hodeida. O bloqueio do porto pela aliança sunita liderada pela Arábia Saudita provocou uma tragédia humanitária no Iêmen, com fome em massa. Por isso, o desbloqueio de Hodeida era uma das prioridades das negociações realizadas na Suécia.

sexta-feira, 28 de dezembro de 2018

Rússia proíbe participação de menores em manifestações de protesto

Em mais uma medida autoritária, o ditador Vladimir Putin sancionou lei que proíbe a presença de menores de idade em manifestações de protesto não autorizadas na Rússia, noticiou hoje o jornal The Moscow Times. Os responsáveis pelos protestos que envolvam menores podem ser punidos.

O principal alvo da lei é o principal líder da oposição na Rússia, o advogado, blogueiro e militante anticorrupção Alexei Navalny. A maioria de seus seguidores é de jovens, inclusive menores, atraídos por sua pregação nas redes sociais.

Mais de 1,6 mil pessoas, entre elas adolescentes, foram detidas numa manifestação convocada por Navalny para protestar contra a posse de Putin para um quarto mandato presidencial. A reação dos deputados subservientes ao ditador foi proibir a participação da juventude em protestos.

quinta-feira, 27 de dezembro de 2018

Coreias do Norte e do Sul planejam construir ferrovia entre os dois países

Em uma cerimônia de grande significado simbólico as Coreias do Norte e do Sul anunciaram ontem a construção de uma nova ferrovia ligando os dois países, noticiou a agência Associated Press (AP).

O anúncio tem caráter simbólico porque qualquer investimento ou projeto de infraestrutura na Coreia do Norte depende de um relaxamento ou suspensão das sanções internacionais aprovadas pelo Conselho de Segurança das Nações Unidas para pressionar a ditadura comunista de Pyongyang a entregar suas armas nucleares.

Num de seus três encontros de cúpula neste ano, o presidente sul-coreano, Moon Jae In, e o ditador norte-coreano, Kim Jong Un, concordaram em modernizar a reconstruir estradas de ferro e de rodagem ligando os dois países.

Tudo depende de um avanço nas negociações entre os Estados Unidos e a Coreia do Norte para desnuclearizar a Península Coreana. Depois do encontro de cúpula histórico de Kim com o presidente Donald Trump, em 12 de junho, em Cingapura, as negociações praticamente não evoluíram. Há poucos dias, Trump falou na expectativa de realizar um segundo encontro de cúpula em breve.

quarta-feira, 26 de dezembro de 2018

Bolsa de Nova York sobe mais de mil pontos

Depois de quatro dias de baixa, o Índice Dow Jones, da Bolsa de Valores de Nova York, subiu hoje 1.086 pontos (4,98%), sua maior alta diária em pontos e a maior percentualmente desde 2009. Todas as 30 ações do índice operaram em alta, assim como os 11 setores do índice amplo S&P 500 (+4,96%).

Empresas de alta tecnologia como Amazon, Facebook e Netflix ganharam mais de 8%. A bolsa Nasdaq, de empresas de alta tecnologia, avançou ,5,8%.

O barril de petróleo West Texas Intermediate, padrão do mercado americano, subiu 8,7% na Bolsa Mercantil de Nova York. Foi o maior aumento desde 30 de novembro de 2016, para US$ 46,56, depois da atingir na segunda-feira o menor preço em um ano e meio por medo da fraqueza da economia.

Nas quatro sessões anteriores, o Índice Dow Jones havia perdido 1.800 pontos, quase 8%, por temor do mercado de que a maior economia do mundo esteja entrando num período difícil por causa de problemas políticos.

A guerra comercial com a China, a paralisação das atividades não essenciais do governo federal dos EUA, as críticas do presidente Donald Trump ao Conselho da Reserva Federal (Fed), o banco central americano, e a mudança de controle para a oposição na Câmara dos Representantes a partir de 3 de janeiro de 2019 enervaram o mercado.

Para acalmar os investidores, o presidente do Conselho de Conselheiros Econômicos da Casa Branca, Kevin Hassett, declarou que o presidente do Fed, Jerome Powell, está 100% seguro no cargo, apesar dos ataques de Trump. O presidente foi advertido de que seus comentários não ajudam.

Quando a bolsa estava em alta, Trump reivindicava o sucesso para si. Com as baixas frequentes, passou a culpar o Fed.

O Índice Dow Jones caíra 18,8% do pico de outubro até a véspera do Natal. A recuperação de hoje foi feita com volume de negócios menor, por causa das festas de fim de ano. "O rali tirou algum sal das feridas dos investidores, mas amanhã será o dia-chave para sabermos se é sustentável", comentou Stephen Guilfoyle, da empresa Sarge986 LLC.

Apesar da recuperação parcial, os três índices caíram mais de 10% em dezembro e 5% no ano como um todo. O Dow Jones e o S&P 500 começaram o dia à beira do chamado mercado do urso, definido como uma baixa de 20% em relação ao pico mais recente. Com a alta, as perdas são de 14,7% e 15,8%.

Na semana passada, a bolsa Nasdaq foi a primeira dos principais índices a entrar no mercado do urso desde o fim da Grande Recessão (2008-9). Hoje, a queda ficou em 19,2%.

A maioria dos economistas não espera uma recessão em 2019, mas acredita que o ritmo forte deste ano não será repetido. A última estimativa do produto interno bruto do terceiro trimestre indicou um aumento em ritmo anual de 3,4%.

O mercado está de olho no consumo pessoal. De 1º de novembro a 24 de dezembro, as vendas no varejo, excluídos os automóveis, cresceram 5,1% em comparação com o mesmo período no ano passado. Foi o melhor resultado em seis anos.

China anuncia redução da tarifas de importação de mais de 700 produtos

Sob pressão da guerra comercial do presidente Donald Trump, a China vai diminuir a partir de 1º de janeiro de 2019 os impostos de importação sobre mais de 700 produtos, inclusive agrícolas, farmacêuticos e manufaturados, noticiou ontem a agência Bloomberg.

A China tenta se adaptar às exigências feitas pelos Estados Unidos dentro de prazo de 90 dias dado por Trump em 30 de novembro para renegociar as divergências no comércio bilateral. Durante jantar em Buenos Aires, no fim da reunião de cúpula do Grupo dos 20, o ditador Xi Jinping prometeu maior abertura comercial para aumentar o consumo doméstico e reduzir o saldo comercial.

Apesar da medida, a maioria das exportações dos EUA devem continuar submetidas às sobretaxas impostas pelo governo chinês em retaliação ao tarifaço americano até que os dois países cheguem a um acordo global sobre comércio.

O regime ditatorial chinês tinha anunciado cortes nas tarifas de importação. Os países que têm acordos comerciais com a China devem ser beneficiados antes.

terça-feira, 25 de dezembro de 2018

Justiça dos EUA mandar Coreia do Norte indenizar família de americano torturado

Um tribunal dos Estados Unidos mandou a ditadura comunista da Coreia do Norte pagar US$ 501 milhões de indenização à família do estudante universitário Otto Warmbier, torturado na prisão, que morreu pouco depois de ser solto, noticiou ontem a agência Reuters.

Warmbier tinha 22 anos quando foi libertado em estado de coma, voltou para os EUA e morreu dias depois. Os médicos-legistas atestaram que a causa da morte foi falta de sangue e oxigênio no cérebro.

"A Coreia do Norte é culpada de tortura, sequestro e morte extrajudicial de Otto Warmbier e de danos psicológicos a seu pai e sua mãe, Fred e Cindy Warmbier", decidiu a juíza Beryl Howell, do tribunal federal da primeira instância do Distrito de Colúmbia.

O regime stalinista de Pyongyang rejeitou as acusações de tortura e culpou o botulismo e a ingestão de soníferos pela morte de Wambier.

"Estamos gratos aos EUA por ter um sistema judicial justo e aberto para que o mundo possa ver que o regime de Kim [Jong Un] é legal e moralmente responsável pela morte de Otto", declarou a família Warmbier.

A condenação foi à revelia, quando o réu não aparece para se defender. "Pusemos a família em grande provação de uma ação judicial e um julgamento público porque prometemos a Otto que não descansaríamos enquanto não houvesse justiça para ele. Hoje a opinião circunstanciada da juíza Howell foi um passo significativo."

O julgamento acontece num momento de impasse nas negociações entre os EUA e a Coreia do Norte para pacificar e desnuclearizar a Península Coreana. Na segunda-feira, o presidente Donald Trump escreveu no Twitter: "Relatório da minha equipe de trabalho sobre a Coreia do Norte. Progresso em andamento. Aguardo meu próximo encontro de cúpula com o dirigente Kim."

Warmbier era estudante da Universidade da Virgínia quando foi preso na Coreia do Norte, em janeiro de 2016, com visto de turista, por tentar roubar um cartaz de propaganda do regime num corredor do hotel. Foi condenado a 15 anos de trabalhos forçados e autorizado a voltar para os EUA um ano e cinco meses depois, em estado comatoso.

segunda-feira, 24 de dezembro de 2018

Bolsa de Nova York cai mais 2,91% no pior dezembro desde a crise de 2008

O Índice Dow Jones, da Bolsa de Valores de Nova York, caiu mais de 653 pontos hoje depois de uma tentativa desastrada do secretário do Tesouro dos Estados Unidos, Steven Mnuchin, de acalmar o mercado pedindo a seis grandes bancos que ampliem as linhas de crédito para empresas e pessoas. Foi a pior véspera de Natal da história em Wall Street.

Ao atacar mais uma vez o Conselho da Reserva Federal (Fed), o banco central americano, dizendo que "o Fed é o único problema da nossa economia", o presidente Donald Trump agravou ainda mais hoje a situação pela qual é o principal responsável, com a guerra comercial contra a China e o aumento do déficit público federal para US$ 890 bilhões por causa de seus cortes de impostos.

Na Bolsa Mercantil de Nova York, o preço do petróleo tipo West Texas Intermediate, padrão do mercado americano, caiu 6,38% para US$ 42,68 por barril, a menor cotação em um ano e meio, por causa de expectativa de enfraquecimento da economia.

A iniciativa do secretário do Tesouro passou uma mensagem aos investidores de que o governo está preocupado. Eles sempre desconfiam que o governo tenha mais informações não repassadas ao público e que a situação real seja pior.

Antes disso, Trump consultou assessores para saber se poderia demitir o presidente do Fed, Jay Powell, que ele próprio indicou. No Twitter, o presidente acusou o banco central de "não sentir o mercado", "não entender as guerras comerciais necessárias ou mesmo o fechamento do governo pelos democratas por causa da fronteira. O Fed é como um golfista poderoso que não consegue marcar pontos porque não tem sutileza. Não consegue dar uma tacada suave."

Desde sábado, as atividades não essenciais do governo federal dos EUA estão paralisadas porque a oposição democrata se recusa a dar US$ 5 bilhões para a construção de um muro na fronteira com o México, uma promessa eleitoral de Trump. Durante a campanha, ele afirmou que o México iria pagar pelo muro.

domingo, 23 de dezembro de 2018

Fechamento do governo dos EUA pode durar até o próximo ano

Sem acordo para alocar US$ 5 bilhões para a construção do muro desejado pelo presidente Donald Trump na fronteira com o México, o governo federal dos Estados Unidos está paralisado parcialmente desde sábado por falta de orçamento para atividades não essenciais. O impasse deve continuar até o próximo ano, quando a oposição democrata terá maioria na Câmara de Representantes.

O fechamento para o trabalho de nove departamentos (ministérios) e várias agências governamentais, inclusive as responsáveis por museus e parques nacionais. Cerca de 380 mil funcionários de atividades não essenciais não trabalham e ficam sem salários e outros 420 mil, de setores como portos e aeroportos, trabalham mas não recebem enquanto durar o impasse.

Em encontro com os líderes democratas na Câmara, deputada Nancy Pelosi, e no Senado, Charles Schumer, Trump deixou claro estar disposto a paralisar parcialmente o governo para barganhar verba para o muero. Durante a campanha prometeu que o México pagaria pelo muro.

Até mesmo comentaristas ultraconservadores como Ann Coulter e Rush Limbaugh criticaram a decisão do presidente pelo fechamento neste fim de ano caótico na Casa Branca, com as demissões do chefe da Casa Civil, general John Kelly, e do secretário da Defesa, general James Mattis, considerados os últimos adultos do governo, com autoridade e responsabilidade para conter os desatinos de um presidente sem limites.

Acuado pelos escândalos de corrupção, acusações de crimes como pagar pelo silêncio de duas ex-amantes e possíveis denúncias criminais contra um filho e o genro, Trump tenta mobilizar os elementos mais radicais de suas bases eleitorais para se apresentar como vítima quando a nova maioria democrata na Câmara começar a investigar as inúmeras suspeitas.

sexta-feira, 21 de dezembro de 2018

Exército da Turquia adia operação militar no Leste da Síria

Diante do anúncio da retirada das tropas dos Estados Unidos da Síria, o presidente Recep Tayyip Erdogan adiou uma operação militar do Exército da Turquia no vale do Rio Eufrates contra a mílicia árabe-curda Forças Democráticas Sírias (FDS), noticiou hoje o jornal governista turco Daily Sabah.

Erdogan tomou a decisão depois de falar pelo telefone com o presidente Donald Trump, que anunciou a retirada, apesar das críticas dos Departamentos da Defesa e de Estado e de aliados dos EUA. Com o adiamento da operação militar turca, diminui o risco de um conflito acidental com forças americanas.

Já as FDS ficam sob pressão do Exército da Turquia, do Exército da Síria e seus aliados iranianos e da organização terrorista Estado Islâmico do Iraque e do Levante. A milícia árabe-curda foi criada pelos EUA para servir como força terrestre na campanha contra o Estado Islâmico.

Erdogan teme que os curdos da Síria se aliem ao governo autônomo do Curdistão iraquiano e proclamem a independência do Curdistão. Como a maioria dos curdos vive na Turquia, o novo país poderia reivindicar a soberania sobre uma área do Sudeste da Turquia.

Para surpresa de seus próprios generais e de países aliados, Trump anunciou nesta semana a retirada total dos 2 mil soldados americanos que estão na Síria, alegando que o Estado Islâmico está derrotado. O ditador da Rússia, Vladimir Putin, festejou. Não é um amigo dos EUA.

A retirada intempestiva de Trump provocou a demissão do secretário da Defesa, general James Mattis, considerado o último dos adultos capazes de controlar o presidente sem limites dos EUA.

quinta-feira, 20 de dezembro de 2018

Putin elogia Trump por retirar tropas dos EUA da Síria

Os aliados e os departamentos de seu próprio governo deploram. O secretário da Defesa , James Mattis, pede demissão por discordar da retirada da Síria. Mas o ditador da Rússia, Vladimir Putin, suspeitíssimo de ter ajudado a eleger o presidente Donald Trump, gostou. A saída faz parte do recuo estratégico dos Estados Unidos, que diminui sua presença no Oriente Médio e abre espaço para inimigos como a Rússia e o Irã.

Putin é o inimigo que Trump trata como aliado. A Rússia não perde oportunidade para fustigar e diminuir os EUA. O elogio do ditador russo é um sinal inequívoco que o presidente americano tomou mais uma vez a decisão errada.

"Não acredito que sejam necessárias. Não devemos esquecer que a presença das tropas dos EUA é ilegítima. Os EUA estão lá sem autorização das Nações Unidas nem convite do governo da Síria. A Rússia está lá porque foi convidada pelo governo sírio. Se os EUA decidiram se retirar, isso é bom", declarou Putin com o cinismo habitual.

A Rússia interveio militarmente na guerra civil da Síria em apoio ao ditador Bachar Assad em 30 de setembro de 2015. Em aliança com o Irã, garantiram a vitória do aliado e agora dominam as negociações de paz, de que os EUA não participam.

Os EUA iniciaram sua intervenção no governo Barack Obama, em agosto de 2014, para evitar o genocídio do povo yazidi e em seguida para combater a organização terrorista Estado Islâmico do Iraque e do Levante depois que o grupo passou a sequestrar e matar americanos.

Ao anunciar a retirada, Trump declarou que o Estado Islâmico está derrotado. Por isso, a presença militar americana não seria mais necessária. Mas o líder do grupo, Abu Baker al-Baghdadi, está foragido e os serviços secretos ocidentais estimam que ainda haja cerca de 35 mil milicianos do Estado Islâmico na Síria e no Iraque.

No fim do dia, Trump anunciou a retirada da metade dos soldados americanos do Afeganistão, cerca de 7 mil tropas. A medida por marcar o início do fim da guerra mais longa da história dos EUA, mas deve provocar caos no país.

Os EUA atacaram o Afeganistão em 7 de outubro de 2001, para derrubar o regime da milícia extremista muçulmana dos Talebã, que abrigava a rede terrorista Al Caeda, responsável pelos atentados terroristas de 11 de setembro daquele ano. Até hoje, o país não foi pacificado.

Enquanto na Síria o risco é de reagrupamento do Estado Islâmico, no Afeganistão é de um colapso total do regime instalado pela intervenção militar da Organização do Tratado do Atlântico Norte.

A retirada expõe as Forças Democráticas Sírias, uma milícia árabe-curda formada para dar combate ao Estado Islâmico em terra. Sem a presença militar americana, vão ficar sob a ameaça de duas forças hostis, o Exército da ditadura de Bachar Assad e seus aliados iranianos, de um lado, e o Exército da Turquia, que teme o separatismo curdo. Abandonar uma força que lutou pelos EUA é algo totalmente inaceitável para o secretário da Defesa.

O general James Cachorro Louco Mattis ainda tentou convencer Trump a desistir da retirada da Síria. Em sua carta de demissão, afirmou que o presidente merece ter um secretário da Defesa alinhado com suas ideias. Ele considera a China e a Rússia adversários e acredita que a segurança dos EUA depende de parcerias e alianças.

Um dos maiores danos de Trump é o ataque ao sistema multilateral criado no pós-guerra sob a inspiração do presidente Franklin Roosevelt, baseado em alianças. O recuo estratégico de Trump ameaça aliados e fortalece os inimigos dos EUA, no caso sírio, a Rússia e o Irã.

Com a saída no fim do ano do chefe da Casa Civil, general John Kelly, Mattis era o último adulto na Casa Branca, um líder com competência, força e prestígio para se opor à megalomania delirante do presidente e controlar seus arroubos. Sai em fevereiro.

Por dois anos, o general da reserva do Corpo de Fuzileiros Navais viajou pelo mundo tentando convencer os aliados dos EUA de que nada havia mudado fundamentalmente. Desistiu. Seus amigos entendem que ele deveria ter pedido demissão em outubro, quando Trump mandou 5,3 mil soldados para a fronteira com o México a pretexto de contar uma caravana de miseráveis da América Central que não representam qualquer ameaça à segurança nacional dos EUA.

O grupo de adultos da Casa Branca era formado pelo secretário de Estado, Rex Tillerson, demitido e acusado publicamente por Trump, pelo ex-assessor de Segurança Nacional Herbert McMaster, pelo general Kelly e por James Mattis.

A história política dos EUA mostra que militares não pedem demissão. Cumprem uma missão. Saem quando consideram impossível cumprir a missão que lhes foi confiada. A credibilidade de Trump sofre mais um duro golpe. A rotatividade dos altos funcionários do governo é um reflexo da instabilidade e do total despreparo do presidente para liderar o país mais rico e poderoso do mundo.

quarta-feira, 19 de dezembro de 2018

Fed ignora Trump e aumenta taxa básica de juros dos EUA

Apesar das pressões do presidente Donald Trump, o Conselho da Reserva Federal (Fed), o banco central dos Estados Unidos, aumentou hoje sua taxa básica de juros pela quarta vez no ano em 0,25 ponto percentual, para uma faixa de 2,25% a 2,5%.

Foi a nona elevação desde que o banco central americano começou a normalizar a política monetária, em dezembro de 2015, depois de manter a taxa básica praticamente zerada, em 0-0,25% ao ano, desde dezembro de 2008 para combater a Grande Recessão, deflagrada pela falência do banco Lehman Brothers, em 14 de setembro daquele ano.

Em entrevista coletiva, o presidente do Fed, Jay Powell, acenou com uma desaceleração no aumento dos juros. A expectativa era de três altas em 2019. Devem ser apenas duas, mas o Comitê de Mercado Aberto deixou claro que serão necessários mais aumentos.

A principal diferença é que, em novembro, o comitê falou que "tinha expectativa" de novos aumentos. Agora, "julga" que seria adequados. Onze dos 17 membros acreditam que duas altas serão suficientes.

Na segunda-feira, o presidente declarou no Twitter: "É incrível que o Fed esteja considerando outra alta de juros." Em entrevista à rede de televisão americana CNN, o ex-presidente do Fed, Alan Greenspan, afirmou que taparia os ouvidos para ignorar as pressões de Trump.

O mercado financeiro recebeu a notícia com medo de deterioração da economia por causa da expectativa de duas em vez de três altas no próximo ano. O Índice Dow Jones, da Bolsa de Nova York, perdeu 352 pontos (1,49%) e fechou em 23.323,66, 733 pontos abaixo do pico do dia.

A economia dos EUA deve terminar o ano com crescimento de 3%. Cresce sem parar desde o terceiro trimestre de 2009. O núcleo da inflação, expurgados os preços mais voláteis da medicamentos e alimentos, caiu de 2,1% ao ano em setembro para 1,9%. O Fed persegue uma meta informal de 2% ao ano.

EUA anunciam retirada total da Síria

Os Estados Unidos estão preparando uma retirada completa das forças enviadas à Síria para combater a organização terrorista Estado Islâmico do Iraque e do Levante, num total de 2 mil soldados, informou hoje a agência Reuters.

A saída americana abre o caminho para a Síria e a Turquia entrarem no território atualmente controlado pelas Forças Democráticas Sírias (FDS), uma milícia árabe-curda apoiada pelos EUA, que ficaria totalmente desprotegida.

Com a decisão, o governo Donald Trump reduz ainda mais a influência do país na Síria e sua participação nas negociações de paz. Ganham a Rússia, a Síria, a Turquia e o Irã.

"Derrotamos o Estado Islâmico na Síria, minha única razão para estar lá na presidência de Trump", declarou o presidente no Twitter. Ainda há bolsões de resistência na fronteira entre a Síria e o Iraque, estimada em 35 mil milicianos ligados ao Estado Islâmico.

Trump já havia tentado retirar as forças dos EUA da Síria. Recuou diante da pressão dos Departamentos da Defesa e de Estado. O anúncio de hoje veio depois de uma conversa telefônica entre Trump e o presidente da Turquia, Recep Tayyip Erdogan, que ameaçou várias vezes atacar as FDS a leste do Rio Eufrates.

Os dois departamentos protestaram, assim como deputados e senadores dos dois partidos. Depois de conquistar a área dominada pelo Estado Islâmico na Síria, os militares americanos entendem ser necessário um trabalho de estabilização de longo prazo.

terça-feira, 18 de dezembro de 2018

Fundos de investimento exigem pagamento de bônus da Venezuela

Cinco fundos de investimentos estão cobrando o pagamento do principal e dos juros de bônus de US$ 1,5 bilhão caloteados pela ditadura de Nicolás Maduro na Venezuela, noticiou ontem a agência Reuters. 

Esses fundos detêm títulos da dívida pública venezuelana no valor de US$ 380 milhões. A dívida vencida é de US$ 140 milhões.

É o primeiro esforço coordenado de credores para recuperar o valor perdido com o calote da Venezuela. O exemplo deve levar mais credores a exigirem o pagamento e a pedirem o bloqueio de ativos venezuelanos, afetando diretamente as exportações de petróleo e as finanças públicas.

As empresas e os investidores devem apelar a tribunais do exterior para arrestar carregamentos de petróleo e as atividades da companhia estatal Petróleos de Venezuela (PdVSA), reduzindo ainda mais suas exportações e o fluxo de moedas fortes para o país.

Oposições resistem a nova lei de partidos na Tanzânia

Em protesto contra o autoritarismo do presidente John Mugufuli, os partidos de oposição da Tanzânia, um país do Leste da África, resistem a uma nova lei de partidos políticos que dá imunidade ao responsável pelo registro dos partidos, nomeado pelo chefe de estado, noticiou ontem o boletim Africa News.

O projeto de lei foi apresentado pouco depois que a União Europeia decidiu rever suas relações com a Tanzânia com base numa resolução do Parlamento Europeu de 13 de dezembro de 2018 condenando violações dos direitos humanos cometidas no país.

A UE é a maior aliada da Tanzânia na promoção do desenvolvimento. Qualquer decisão de reduzir os direitos e a autonomia dos partidos políticos será repudiada pelo bloco europeu, agravando a crise nas relações com o país africano.

Desde que chegou ao poder, em 2015, o presidente Mugufuli faz uma campanha de combate à corrupção. Ao mesmo tempo, mostrou-se autoritário. Não aceita o dissenso. As liberdades sexual, de expressão e de imprensa foram reduzidas.

segunda-feira, 17 de dezembro de 2018

Ex-diretor do FBI desafia republicanos a dizer a verdade sobre Trump

O ex-diretor-geral do FBI (Federal Bureau of Investigation) James Comey, demitido 9 de maio de 2017 por se negar a acabar com a investigação sobre a influência da Rússia nas eleições de 2016 nos Estados Unidos, criticou o presidente Donald Trump por atacar a polícia federal americana e desafiou o Partido Republicano a "se erguer e falar a verdade".

"A reputação do FBI sofreu um duro golpe porque o presidente e seus seguidores mentem constantemente a respeito", declarou Comey no final do segundo depoimento a portas fechadas neste mês na Câmara dos Representantes.

O desafio foi a todos os republicanos, não apenas aos membros da Comissão de Justiça, que o entrevistaram, inclusive os senadores Bob Corker e Jeff Flake, que criticaram Trump abertamente e não disputaram a reeleição.

domingo, 16 de dezembro de 2018

Conferência de Katowice cria regras para aplicar Acordo de Paris

Apesar da resistência de países como o Brasil, que volta a ser vilão internacional em questões ambientais, o acordo final da Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima realizada em Katowice, na Polônia, formulou regras para aplicação do Acordo de Paris, especialmente métodos para medir as emissões de gases carbônicos, que causaram o aquecimento global.

"Acredito que no balanço final o resultado é fantástico", declarou a ministra do Meio Ambiente da Espanha, Theresa Ribera. "Criamos o que parecia ser muito difícil. Quase 200 países concordaram numa série de regras para governar a implementação do pacto de 2015."

O Acordo de Paris sobre Mudança do Clima prevê que cada país estabeleça suas próprias metas, as "contribuições nacionalmente determinadas". Não há imposição alguma. Mas houve problemas.

Sob pressão do Brasil, não foi criado o mercado de créditos de carbono para que os países possam negociar suas reduções de emissões. Pela fórmula apresentada pela diplomacia brasileira, poderia haver uma dupla contagem. O tema ficou para a conferência de 2019, que seria realizada no Brasil. Como o governo Jair Bolsonaro desistiu de realizá-la, o encontro deverá ser no Chile.

Outro problema é a ajuda financeira aos países em desenvolvimento para que adotem práticas ambientais mais saudáveis. Com a retirada dos Estados Unidos do Acordo de Paris pelo presidente Donald Trump, o país mais rico do mundo está fora.

Quatro grandes produtores de petróleo, EUA, Rússia, Arábia Saudita e Kuwait, rejeitaram a última avaliação do Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima (IPCC) sobre os riscos de uma elevação da temperatura de 1,5ºC e 2ºC em relação à média da era pré-industrial.

Hoje, a temperatura média está 1ºC acima da era pré-industrial e já há consequências nefastas, como os incêndios florestais na Califórnia e as ondas de calor.

sábado, 15 de dezembro de 2018

Secretário do Interior dos EUA cai sob pressão de vários inquéritos

Alvo de pelo menos 15 investigações, o secretário do Interior dos Estados Unidos, Rian Zinke, deixa o cargo no fim do ano, anunciou hoje o presidente Donald Trump. Sua conduta pessoal e decisões administrativas causaram uma série de escândalos.

O caso mais grave, encaminhado pelo inspetor-geral do Departamento do Interior ao Departamento da Justiça, examina se o secretário usou o cargo para ganho pessoal num negócio de terras em Whitefish, no estado de Montana, com o presidente da companhia Halliburton e outros investidores.

Trump elogiou o secretário: "Ryan realizou muito durante" quase dois anos "e eu gostaria de agradecê-lo pelos serviços prestados à nação." Mas a Casa Branca o pressionou a sair. No mês passado, ele foi avisado que seria demitido se não pedisse demissão até o fim do ano.

É o quarto alto funcionário do governo Trump forçado a sair por razões éticas, depois do secretário da Saúde, Tom Price; do secretário para Veteranos de Guerra, David Shulkin; e do chefe da Agência de Proteção Ambiental, Scott Pruitt. Todos tiveram de dar explicações sobre o uso de verbas públicas para benefício pessoal, por exemplo, em viagens particulares.

Entre outras medidas polêmicos, Zinke autorizou a exploração de petróleo em terras e águas protegidas por leis e regras ambientais do governo Barack Obama, a pretexto de garantir o "domínio dos EUA" no setor de energia.

A presidente da Comissão de Energia e Recursos Naturais do Senado, Lisa Murkowski, que conseguiu reabrir a Reserva Nacional de Vida Silvestre do Ártico à exploração de petróleo, ficou "desapontada".

"Ryan Zinke foi o secretário mais antipreservação ambiental da história da nação"afirmou Jenniffer Rokala, do Centro para Prioridades do Oeste. "Ao se cercar de lobistas, logo ficou claro que Ryan Zinke era um peão da indústria de petróleo e gás. Podemos esperar o mesmo do secretário interino, David Bernhardt, mas sem a ridícula comparação dom Ted Roosevelt."

Por gostar de caçar, pescar e andar a cavalo, Zinke gosta de se comparar com o presidente Theodore Roosevelt.

sexta-feira, 14 de dezembro de 2018

Parlamento do Kossovo aprova criação de Exército Nacional

O Parlamento do Kossovo aprovou uma série de leis para transformar a Força de Segurança, dotada de armamento leve, num Exército Nacional, anunciou hoje a rádio estatal Voz da Alemanha. Em protesto, os deputados de origem sérvia boicotaram a votação.

A decisão deve deteriorar ainda mais as relações com a Sérvia. O governo de Belgrado deve congelar o diálogo bilateral para reconhecer o Kossovo como um país, exigência da União Europeia para que a Sérvia possa ser aceita no bloco europeu.

Ambos faziam parte da antiga Iugoslávia. O Kossovo era uma província autônoma sérvia. Com o ressurgimento do nacionalista e as guerras que acabaram com a Iugoslávia na era pós-comunistas, o ditador Slobodan Milosevic suspendeu a autonomia do Kossovo e iniciou uma perseguição à maioria de origem albanesa.

Em 1999, sob a liderança dos Estados Unidos, a Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) travou uma guerra 78 dias com intensos bombardeios aéreos contra a Sérvia, o que levou na prática à independência do Kossovo, declarada oficialmente em 2008 e reconhecida pelos EUA e a UE, mas não pelas Nações Unidas, por causa do veto da China e da Rússia.

Em novembro, o governo kossovar impôs uma tarifa de importação de 100% sobre produtos sérvios como resposta ao bloqueio de Belgrado à participação do Kossovo independente em organizações internacionais.

quinta-feira, 13 de dezembro de 2018

China iniciava há 40 anos mais extraordinário desenvolvimento da história

Em discurso numa conferência preparatória de sessão plenária do Comitê Central do Partido Comunista da China, em 13 de dezembro de 1978, o líder Deng Xiaoping lançou a abertura econômica e o programa de reformas que transformaram um país agrário e atrasado na segunda maior economia do mundo, rumo ao primeiro lugar. 

Nos últimos 40 anos, mais de 800 milhões de chineses saíram da pobreza. Foi o mais extraordinário desenvolvimento econômico da história da humanidade. O produto interno bruto aumentou 44 vezes. Hoje apenas 1% dos chineses vive na miséria. 

Com o partido dividido a o país destroçado pela Grande Revolução Cultural Proletária (1966-76), usada por Mao Tsé-tung para manter o poder, e a morte de Mao em 1976, a China navegava sem rumo. Deng entendeu que a única ideia capaz de unir o PC era a modernização.

Era uma antiga ideia. O programa das quatro modernizações (agricultura, indústria, defesa nacional, ciência e tecnologia) foi lançado pelo primeiro-ministro Chu Enlai em 1963 e abortado pela Revolução Cultural. Em 1975, pouco antes de sua morte, em janeiro de 1976, Chu relançou a proposta no 4º Congresso Nacional do Povo.

Hua Guofeng, que não fazia parte da ala mais radical do partido, que mandava durante a Revolução Cultural, sucedeu Chu como primeiro-ministro e Mao na chefia do PC.

Com a morte de Mao, em 9 de setembro de 1976, e a prisão da Gangue dos Quatro, da qual fazia parte sua viúva, Jiang Ching, em 6 de outubro, a trágica Revolução Cultural chegava ao fim.

Sem grandes ideias próprias, Hua lançou a política dos Dois Quaisquer em editorial publicado em 7 de fevereiro de 1977 no Diário do Povo, o jornal oficial do partido: "A China deve manter quaisquer políticas que Mao tenha adotado e seguir quaisquer instruções que Mao tenha dado."

Deng havia sido ministro das Finanças (1953-54) e um dos líderes da reconstrução da economia depois do fracassado Grande Salto para a Frente (1957-60), uma tentativa de integrar indústria e agricultura com a produção de aço em zonas rurais que levara a uma grande queda na produção agrícola, à fome em massa, milhões de mortes e à fabricação de aço de péssima qualidade.

Como sua visão da economia era considerada liberal demais para o radicalismo maoísta, Deng caiu em desgraça durante a Revolução Cultural. Reabilitado por Mao em 1975, no mesmo ano foi novamente marginalizado por "desviacionismo direitista" em razão de suas críticas à Revolução Cultural.

Depois de uma grande manifestação de massa na Praça da Paz Celestial, em abril de 1976, Deng foi reabilitado de novo. Em 1977, lançou a Primavera de Beijim, uma campanha para criticar os crimes e abusos cometidos naquele período, e se insurgiu contra a política dos Dois Quaisquer, considerando-a inaceitável.

"Se este princípio estiver correto, não poderia haver justificativa para minha reabilitação", disse Deng a dois membros do Comitê Central do PC alegando que a política de Hua "não está de acordo com o marxismo".

"Não podemos aplicar mecanicamente o que o Camarada Mao disse sobre uma questão específica a outra questão, o que disse sobre um lugar específico a outro lugar, o que disse num momento específico a outro momento, o que disse em circunstâncias especiais a outras circunstâncias", escreveu Deng.

Mao falou que "ninguém pode evitar erros em seu trabalho, a não ser que não faça nada", lembrou o arquiteto das reformas. "Também disse que Marx, Engels, Lenin e Stalin cometeram erros, caso contrário, não corrigiriam seus próprios manuscritos de tempos em tempos. (...) Algumas dessas visões expressas originalmente não eram inteiramente corretas, perfeitas e acuradas."

"Esta é uma questão teórica importante, se estamos ou não aderindo ao materialismo histórico", alegou Deng, se a sociedade chinesa estava evoluindo a partir da análise de seus erros.

"Nem Marx nem Engels apresentaram uma doutrina qualquer, nem Lenin ou Stalin, nem o Camarada Mao", prosseguiu. "Devemos usar o genuíno pensamento de Mao Tsé-tung tomado como um todo para guiar o partido, o Exército e o povo, de modo a avançar a causa do partido e do socialismo na China e à causa do movimento comunista internacional. (...) O pensamento de Mao é um sistema ideológico."

O Pequeno Timoneiro, como Deng passou a ser chamado, em comparação com o Grande Timoneiro Mao Tsé-tung, havia feito pronunciamentos sobre a necessidade de "consolidar" o Exército Popular de Libertação, "retificar o estilo de trabalho do partido", "pôr as coisas em ordem em todos os campos", "respeitar o conhecimento e o pessoal treinado", "a importância estratégica da educação e do treinamento" e de "aderir ao princípio de buscar a verdade através dos fatos".

CIÊNCIA E TECNOLOGIA
"A chave para atingir a modernização é o desenvolvimento da ciência e da tecnologia", prescreveu Deng. "A menos que demos atenção especial à educação, será impossível desenvolver a ciência e a tecnologia. Conversa fiada não vai levar nosso programa de modernização a lugar nenhum; precisamos de tecnologia e de pessoal qualificado."

Com o atraso, a China não conseguiria progredir, advertiu: "Temos de reconhecer nosso atraso porque só tal reconhecimento dará esperança. Hoje, parece que a China está 20 anos atrás dos países desenvolvidos em ciência, tecnologia e educação."

Era necessário "melhorar a educação em todos os níveis simultaneamente", receitou Deng. "Vamos ver os primeiros resultados em cinco anos, mais resultados em 10 anos e grandes resultados em 15 a 20 anos. (...) Precisamos melhorar os padrões de educação ao mesmo tempo em que a tornamos acessível a mais e mais pessoas."

Sua proposta era "reunir, através de exames difíceis, as pessoas destacadas" em escolas e universidades. "Devemos selecionar milhares entre nosso pessoal mais qualificado na comunidade científica e tecnológica e criar condições condições para que dediquem toda sua atenção à pesquisa.

"Alguns têm filhos e parentes idosos vivendo com eles, ganham menos de 100 iuanes por mês e precisam gastar muito tempo fazendo trabalho doméstico. Não encontram nem mesmo um lugar tranquilo para ler à noite", descreveu Deng.

Depois da perseguição a intelectuais por "desvio burguês" durante a Revolução Cultural, era preciso criar "uma atmosfera de respeito ao conhecimento e ao pessoal qualificado. A atitude errônea de não respeitar intelectuais tem de ser combatida."

O mesmo valeria para a defesa nacional: "Sem conhecimento da guerra moderna, como poderemos lutar uma guerra moderna?"

No fim do encontro de líderes do Comitê Central do PC, em 24 de maio de 1977, Deng recomendou: "Todas as atividades e profissões devem promover a ciência, a tecnologia e a educação. As grandes empresas devem ter seus próprios órgãos e pessoal de pesquisa científica e tecnológica. Todo departamento profissional deve conduzir sua própria pesquisa científica."

Em 13 de dezembro de 1978, DEng Xiaoping fez o discurso Emancipar a mente, buscar a verdade nos fatos e formar uma unidade ao olhar para o futuro, considerado o marco inicial das reformas econômicas chinesas, quando propôs "mudar o foco de todo o trabalho do partido para as quatro modernizações".

"Sob a correta liderança do Comitê Central, o partido, o Exército e o povo vão conquistar uma vitória atrás da outra na nossa nova Longa Marcha", prometeu Deng, lembrando a longa fuga de 10 mil quilômetros dos comunistas entre 1934 e 1935 para escapar da perseguição do Exército e dos nacionalistas do Kuomintang.

Era o encerramento da conferência preparatória da terceira sessão plenária do 11º Comitê Central do PC da China. Deng elogiou "o debate vivo aqui" e o ressurgimento da "tradição democrática" do partido: "Devemos espalhar este estilo de trabalho a todo o partido, ao Exército e ao povo."

"Os participantes falaram livremente e expressaram suas opiniões honestas. Colocaram seus problemas sobre a mesa e se sentiram livres para criticar inclusive o trabalho do Comitê Central. Alguns camaradas criticaram a si mesmos em vários graus", acrescentou o líder reformista.

Seu tema era "como emancipar nossas mentes, nossas cabeças, buscando a verdade dos nos fatos e formando uma união ao olhar para o futuro".

EMANCIPAR AS MENTES
"A primeira tarefa", observou Deng, "é emancipar nossas mentes. Só então poderemos, guiados como devemos pelo marxismo-leninismo e o pensamento de Mao Tsé-tung, encontrar as soluções corretas para os problemas emergentes bem como os herdados, reformar frutiferamente todos os aspectos das relações de produção e da superestrutura que não correspondam ao rápido desenvolvimento das forças produtivas, mapear os cursos específicos e formular as políticas, métodos e medidas específicas necessárias para atingir as quatro modernizações sobre nossas condições atuais.

"A emancipação das mentes não foi completamente atingida entre nossos quadros, particularmente nossos quadros de líderes. De fato, muitos companheiros não reiniciaram seus cérebros; em outras palavras, suas ideias permanecem rígidas, ao menos parcialmente. Não que eles não sejam bons companheiros. É o resultado de condições históricas específicas", diagnosticou o Pequeno Timoneiro.

"Primeiro, porque nos últimos 12 anos, Lin Piao e a Gangue dos Quatro estabeleceram tabus ideológicos e 'zonas proibidas'... A ninguém era permitido ir além dos limites que eles prescreviam; quem o fizesse era rastreado, estigmatizado e atacado politicamente. Nesta situação, algumas pessoas acharam mais seguro parar de usar suas cabeças e de pensar sobre as questões", analisou Deng, citando os líderes da Revolução Cultural.

"Segundo, porque o centralismo democrático foi minado e o partido afligido pelo burocratismo resultante, entre outras coisas, da superconcentração de poder. Este tipo de burocratismo frequentemente é mascarado como 'liderança do partido', 'diretrizes do partido', 'interesses do partido' e 'disciplina do partido', mas na realidade é criado para controlar as pessoas, reprimi-las e oprimi-las. Nesse período, muitas questões importantes eram decididas frequentemente por uma ou duas pessoas. Os outros só podiam fazer o que poucos ordenavam. Sendo assim, não havia muito sentido em pensar por si mesmo", criticou.

"Terceiro, porque não havia uma distinção clara entre certo e errado ou entre mérito e demérito, e as recompensas e punições não eram dadas por merecimento. Não havia distinção entre os que trabalhavam bem e os que não o faziam. Em alguns casos, quem trabalhava bem era atacado, enquanto quem não fazia nada ou evitava riscos resistia a toda tempestade. Sob essas leis não escritas, as pessoas eram naturalmente relutantes em usar seus cérebros", prosseguiu, em sua crítica demolidora do radicalismo maoísta.

"Quatro, porque as pessoas ainda estão sujeitas à força do hábito e do pequeno produtor, que se apega às velhas convenções, está contente com o status quo e não deseja buscar o progresso nem aceitar qualquer novidade", ponderou Deng.

Esse pensamento rígido "segue o que quer que tenha o apoio das autoridades e ajusta suas palavras e ações de acordo com qualquer que seja o lado que o vento sopre. Pensa que assim vai evitar erros. De fato, no entanto, dobrar-se ao vento é em si um erro grave, uma contravenção do espírito do partido que todos os comunistas devem venerar."

Isso não significa que "as pessoas que pensam independentemente e ousam falar alto e agir não possam errar, mas seus erros são expostos e portanto são mais facilmente corrigíveis", argumentou. "Quando o pensamento se torna rígido, a adoração de livros, divorciada da realidade, vira uma grande doença. Quem sofre disso não ousa dizer uma palavra ou dar um passo que não seja mencionado em livros, documentos e discursos de líderes; tudo tem de ser copiado."

"Nosso esforço pelas quatro modernizações não vai levar a lugar algum a menos que o pensamento rígido seja rompido e que as mentes dos quadros e das massas sejam emancipadas completamente", afirmou. "Quando tudo é feito de acordo com o livro, quando o pensamento se torna rígido e a fé cega é a moda, é impossível ao partido e à nação fazer qualquer progresso. Sua vida vai cessar e o partido e a nação vão perecer."

Mao disse isso várias vezes nas campanhas de retificação, alegou Deng, usando sempre o líder histórico da revolução comunista como referência para legitimar suas ideias diante da velha guarda partido: "Só se emanciparmos nossas mentes, procurarmos a verdade dos fatos, procedermos com base na realidade em tudo e integrarmos teoria e prática, seremos capazes de implementar nosso programa de modernização socialista suavemente."

A doutrina é invocada para justificar as reformas radicais que viriam à frente: "Procurar a verdade a partir dos fatos é a base da perspectiva do mundo proletário bem como a base ideológica do marxismo. (...) Todos devem agir com base neste princípio, emancipar suas mentes e usar suas cabeças para elucidar as questões e orientar a ação."

O sucesso das reformas depende da mobilização da sociedade anestesiada pela traumática Revolução Cultural: "Para fazer uma revolução e construir o socialismo, precisamos de um grande número de desbravadores que ousem pensar, explorar novos caminhos e gerar novas ideias. De outra sorte, não seremos capazes de livrar nosso país da pobreza e do atraso ou alcançar - e muito menos ultrapassar - os países avançados."

DEMOCRACIA
Outra ideia que Deng tentou resgatar foi o "centralismo democrático", um princípio adotado por Vladimir Ilitch Ulianov, Lenin, o líder da Revolução Bolchevique e pai da União Soviética. O conceito foi lançado pelo social-democrata alemão Jean Baptista Schweitzer e adotado por Lenin a partir de 1902, no livro O Que Fazer?

Lenin definou o centralismo democrático como "liberdade de discussão e unidade de ação". O debate seria livre, mas uma vez tomada uma decisão ela seria de cumprimento obrigatório por todos os membros do partido. Todos os dirigentes do partido seriam eleitos, mas a rígida disciplina partidária imporia a subordinação das minorias à maioria.

O ditador Josef Stalin usou o centralismo democrático para suprimir o debate interno e impor seu reino de terror, acabando na prática com a Revolução Russa. Deng tentou dar outro sentido ao que chamou de "prática genuína do sistema proletário do centralismo democrático. Precisamos de uma liderança centralizada e unificada, mas o centralismo só pode ser correto quando há uma democracia plena."

Durante a Revolução Cultural, na visão de Deng, "o centralismo estava divorciado da democracia e havia muito pouca democracia. Mesmo hoje, só poucas pessoas ousam falar alto. Muita gente ainda hesita em dizer o que realmente pensa. Mesmo quando tem opiniões válidas, hesitam em expressá-las, não tem ousadia suficiente para lutar contra coisas e pessoas ruins. Se isto não mudar, como podemos persuadir todos a emancipar suas mentes e usar suas cabeças? Como vamos realizar as quatro modernizações?"

Para criar condições para a prática da democracia, Deng reafirmou "o princípio dos três nãos: não acusem os outros por suas falhas, não ponham rótulos em pessoas e não usem um grande porrete. Na vida política, devemos usar métodos democráticos e não recorrer à coerção e ao ataque. (...) Os direitos dos cidadãos devem ser defendidos resolutamente." A ditadura militar chinesa nunca atingiu este objetivo.

"As massas devem ser encorajadas a apresentar críticas. Não há nada com que se preocupar mesmo se poucos descontentes tirarem vantagem da democracia para criar problemas. Devemos lidar com tais situações de maneira apropriada, tendo que que a maioria esmagadora do povo será capaz de fazer seu próprio julgamento", vaticinou.

Na prática, a experiência democrática das reformas acabou com o Massacre na Praça da Paz Celestial, na noite de 3 para 4 de junho de 1989, que esmagou, com a autorização do Pequeno Timoneiro, uma revolta liderada por estudantes com reivindicações de liberdade e democracia.

Onze anos antes, Deng representava o idealismo de uma Nova China: "O que mais se deve temer é o silêncio." Ignorava as contradições entre centralismo e democracia, a rígida disciplina partidária e a democracia, que sempre tem um caráter um tanto anárquico.

"Acreditamos que nosso povo está atento aos interesses gerais do país e tem um bom senso de disciplina", imaginou. "É natural que algumas opiniões expressas pelas massa sejam corretas e outras não. Devemos examiná-las analiticamente."

"Ao lidar com problemas ideológicos, não devemos nunca usar a coerção, mas aplicar genuinamente a política de 'deixar cem flores florescerem, cem escolas de pensamento competirem'. (...) Precisamos firmemente parar com práticas más como atacar e tentar silenciar quem faz críticas". com uma ressalva: "Mas, é claro, não podemos baixar a guarda contra meia dúzia de contrarrevolucionários que ainda existem em nosso país."

DEMOCRACIA ECONÔMICA
O aspecto central das reformas de Deng foi tentar criar uma "democracia econômica" para liberar as forças produtivas, estimular a iniciativa individual e aumentar a produtividade do trabalho: "Sob o nosso atual sistema de gestão da economia, o power está superconcentrado, então é necessário devolvê-lo aos níveis inferiores, sem hesitar, mas de modo planejado."

"No momento, a necessidade mais urgente é aumentar o poder de decisão de minas, fábricas e outras empresas para dar plenas dimensões à iniciativa e à criativdade", prosseguiu o raciocínio do líder. "Imaginem a a riqueza adicional que pode ser criada se todo o pessoal das centenas de milhares de empresas e dos milhões de equipes de produção da China colocarem suas mentes para trabalhar. Com mais geração de riqueza para o Estado, a renda pessoal e os benefícios coletivos também devem aumentar."

Isso faria com que quem trabalhasse mais e produzisse mais ganharia mais porque "a revolução acontece pela necessidade de benefícios materiais". (...) "Também é necessário garantir os direitos democráticos de operários e camponeses, inclusive os direitos de eleição, gestão e supervisão."

A fim de garantir a democratização, acrescentou, "precisamos fortalecer nosso sistema legal". Mao dizia que "o poder vem da boca do canhão". Deng tinha outras ideias: "A democracia precisa ser institucionalizada e escrita em leis para dar certeza de que as instituições e as leis não mudem quando mudar a liderança ou quando os líderes mudarem suas visões ou o foco de atenção."

Na sua análise, "com muita frequência, o que os líderes dizem é tomado como lei e qualquer um que discorde é considerado fora da lei. Este tipo de lei muda sempre que as visões do líder mudam. (...) Estas leis devem ser discutidas e adotadas através de procedimentos democráticos. Ao mesmo tempo, os órgãos judiciais e a procuradoria devem ser fortalecidos. Tudo isso vai garantir que haverá leis para serem respeitadas e aplicadas estritamente e que os violadores serão processados."

Esse trecho parece uma crítica ao atual ditador, Xi Jinping, que está concentrando poderes numa escala não vista desde Mao. Para se firmar no poder, Xi lançou uma campanha anticorrupção, colocando as comissões de inspeção disciplinar a serviço de seu poder pessoal.

Para enterrar a Revolução Cultural, Deng considerou fundamental "corrigir os velhos problemas" para ajudar a olhar para o futuro: "Isto é essencial para emancipar as mentes e garantir a estabilidade política e a unidade. (...) Nosso princípio é que cada erro deve ser corrigido. Todos os erros do passado têm de ser corrigido. Precisamos resolver estes problemas do passado completamente."

A seleção dos dirigentes do partido era outra preocupação de Deng: "Jamais devemos dar postos importantes a pessoas envolvidas em espancamentos, destruição e saques, que sejam obcecadas por ideias sectárias e que venderam suas almas para enquadrar camaradas inocentes ou desrespeitarem os interesses vitais do partido."

Na busca da unidade partidária, Deng recorre a seu líder histórico: "As grandes contribuições do Camarada Mao no curso de longas lutas revolucionárias nunca vão esmaecer. (...) Não é exagero dizer que sem o Camarada Mao não haveria uma Nova China. (...) O pensamento de Mao Tsé-tung será para sempre o maior tesouro intelectual do partido, do Exército e do povo."

Com o mesmo objetivo de evitar novas lutas fratricidas, "a Revolução Cultural deve ser vista cientificamente e numa perspectiva histórica. (...) foi parte de uma etapa do desenvolvimento do socialismo na China, portanto precisa ser avaliada. No entanto, não precisa ser feito precipitadamente. (...) Provavelmente, só poderemos fazer uma análise mais correta depois de algum tempo."

Para olhar para o futuro, a receita é enfrentar os novos problemas: "Nossa burocracia é totalmente incompatível com a produção em larga escala. (...) É essencial enfrentar os males da burocracia. Nossa gestão econômica atual é marcada pelo excesso de pessoal, sobreposição organizacional, procedimentos complicados e eficiência extremamente baixa. Com frequência, tudo é afogado em discussões políticas. Esta não é uma falha de qualquer grupo de camaradas. (...) Não fizemos reformas em tempo."

ECONOMIA DE MERCADO
Outra lição de Deng: "Precisamos aprender a gerir nossa economia por meios econômicos. Se não conhecemos métodos avançados de gestão, precisamos aprender com aqueles que sabem, no país ou no exterior. Estes métodos devem ser aplicados não apenas na operação de empresas com novas tecnologias e equipamentos importados, mas também a transformação técnica das empresas existentes."

Era o início da introdução da economia de mercado.

Enquanto a China criava um programa nacional de gestão moderna, "podemos começar de maneira limitada, numa determinada região ou ramo de atividade, e então difundir os métodos gradualmente a outros setores e regiões", notou Deng.

Os líderes seriam avaliados "principalmente pela adoção de métodos avançados de gestão, pelo progresso da inovação tecnológica" e "pelo aumento do produtividade do trabalho, dos lucros, da renda pessoal dos trabalhadores e dos benefícios coletivos."

"A tarefa mais importante no momento é é fortalecer o sistema de responsabilidade do do trabalho." Antes das reformas, "em teoria", haveria "responsabilidade coletiva. De fato, isso significa que ninguém é responsável. (...) Para cada tarefa ou projeto de construção, é necessário especificar o trabalho a ser feito, o pessoal necessário, a divisão do trabalho, os padrões de qualidade e o tempo necessário."

Quando forem "introduzidos equipamentos e tecnologias estrangeiras, devemos especificar que itens serão importados e de onde, para onde vão e quem será encarregado do trabalho. (...) Quando os problemas surgirem, não adianta culpa as comissões de planejamento ou os comitês do partido envolvidos - os indivíduos responsáveis devem sentir o peso. (...) Devemos dizer explicitamente quem é responsável por cada etapa do trabalho."

"Primeiro, precisamos ampliar a autoridade dos gestores. Quem tiver responsabilidade deve ter autoridade."

"Segundo, precisamos selecionar pessoal inteligente e distribuir os deveres de acordo com a habilidade. Devemos procurar especialistas e treinar novos, colocá-los em posições importantes, aumentar seu status políticos e aumentar seus benefícios materiais. (...) O principal critério é se a pessoa escolhida pode trabalhar para o bem comum e contribuir para o desenvolvimento das forças produtivas".

"Terceiro, precisamos de um sistema rígido de avaliação e distinguir claramente os desempenhos que devem ser recompensados e os que devem ser penalizados. Todas as empresas, escolas, institutos de pesquisa e repartições do governo devem criar sistemas de avaliação do trabalho e conferir títulos acadêmicos, técnicos e profissionais. Recompensas e punições, promoções e demissões devem ser baseadas na perfórmance. E devem estar ligadas a aumentos e reduções nos benefícios materiais."

Dentro desta lógica, "penso que devemos permitir que algumas regiões e empresas e alguns operários e camponeses ganhem mais e tenham mais benefícios antes dos outros, de acordo com seu trabalho e suas contribuições à sociedade. Se o padrão de vida de algumas pessoas aumentar primeiro, este exemplo inevitavelmente deverá impressionar os vizinhos. Isto vai ajudar a economia nacional como um todo."

Depois de admitir que "vamos encontrar muitas situações novas e problemas inesperados", "problemas para decidir quem fica e quem deve sair", Deng pediu maior atenção à situação global. Voltando à retórica comunista, afirmou que "seremos capaz de resolver qualquer problema e superar qualquer obstáculo se tivermos fé nas massas e explicarmos a situação e os problemas a elas."

Em mais uma crítica à Revolução Cultural, enfatizou que "ao realizar nossos maiores esforços em campanhas políticas, não dominamos as habilidades essenciais para construir nosso país. (...) Experimentamos vários infortúnios políticos. Agora, nossa tarefa é a modernização."

"Precisamos aprender de diferentes maneiras, através das práticas, dos livros e das experiências, positivas e negativas", pregou o líder. "O conservadorismo e a adoração de livros têm de ser superados. As centenas de membros permanentes e temporários do Comitê Central e milhares de altos funcionários locais devem assumir a liderança no estudo do desenvolvimento econômico moderno."

No apelo final dos companheiros, insistiu em que "sob a liderança do Comitê Central e do Conselho de Estado, vamos avançar corajosamente para mudar a situação de atraso do país e torná-lo num Estado socialista moderno e poderoso", concluiu Deng Xiaoping.

Quarenta anos depois, a China chegou lá.