O ultranacionalismo de caráter neofascista que assombra a Europa chegou à Espanha. Pela primeira vez desde a morte do ditador Francisco Franco, em 1975, e da redemocratização do país, um partido de extrema direita entra numa assembleia regional. Com 11% dos votos, o partido Vox elegeu 12 deputados na região da Andaluzia.
Vox será o quinto partido na assembleia regional, de 109 cadeiras, atrás do Partido Socialista Operário Espanhol (PSOE), do primeiro-ministro Pedro Sánchez, de centro-esquerda, que elegeu 33 deputados; do conservador Partido Popular (PP), de direita, com 26 cadeiras; do liberal de centro-direita Cidadãos, com 21 deputados; e da aliança esquerdista Avante Andaluzia, formada pelo Podemos e a Esquerda Unida, com 17.
Apesar da derrota, a governadora socialista Susana Díaz pretende formar o novo governo. Para isso, terá de formar uma ampla aliança com o AA e os Cidadãos. Mas o PP e os Cidadãos, que apoiavam o governo nacional do ex-primeiro-ministro Mariano Rajoy, estão dispostos a se aliar ao Vox para derrubar o PSOE, noticiou o jornal El País.
Juan Manuel Moreno, do PP, e Juan Marín, dos Cidadãos, precisam formar uma aliança para afastar Susana Díaz. Até agora, nenhum dos dois quer abrir mão da chefia do governo.
Os Cidadãos não pretendem apoiar o PSOE. Seu líder nacional, Albert Rivera, não repudiou a entrada no parlamento regional do Vox, liderado por Santiago Abascal, mas na política europeia seu partido faz parte da Aliança Liberal. Tem como sócio o presidente da França, Emmanuel Macron, e sua República em Marcha, que com certeza deve rejeitar uma aliança com a extrema direita.
Susana Díaz se aproveitou da situação para se apresentar como um freio à ascensão ao poder dos ultranacionalistas: "Não imagino Macron aceitando a extrema direita." Em seu raciocínio oportunista, "se eliminamos os 12 deputados de Vox, a esquerda teria ganho. Está em suas mãos parar a direita, mas se o que lhes importa é o poder a qualquer custo, ao custo de apoiar a extrema direita, vão em frente."
Se apoiarem o PSOE, os Cidadãos correm o risco de perder os eleitores que deixaram o PP nas últimas eleições nacionais. O PSOE e do PP se alternam no poder desde 1982, mas desde 2015 não conseguem maioria absoluta.
A ascensão da ultradireita é um reflexo da fragmentação da política espanhola depois da grave crise econômica de 2011 e uma reação ao movimento da independência da Catalunha e ao aumento do fluxo de refugiados.
Para conter o separatismo basco e catalão, Vox defende um regime centralizado, em que o governo nacional de Madri assuma o controle da educação, da saúde e da segurança pública. Quer reduzir a entrada de imigrantes, deportar os ilegais e combater as organizações não governamentais a favor da acolher refugiados que chegam da África e do Oriente Médio pelo Mar Mediterrâneo.
É contra a proposta de transformar a União Europeia numa federação. Defende a Europa das Nações. É contra o Acordo de Schengen, que aboliu o controle nas fronteiras internas da UE. Mas, ao contrário dos partidos de extrema direita da França, Reunião Nacional (antiga Frente Nacional), e da Holanda, Partido da Liberdade, abandonar o euro e a UE não estão entre suas prioridades. Seu foco é na política interna espanhola.
A Andaluzia é a região mais populosa e mais pobre da Espanha e uma das mais pobres da Europa. Suas eleições são uma prévia das próximas eleições gerais no país. Como o governo socialista de Pedro Sánchez não tem minoria no Parlamento, as eleições nacionais podem ser realizadas antes do fim do mandato do atual Congresso de Deputados, em 2020.
O próximo teste serão as eleições europeias maio de 2019, quando Vox poderá conquistar suas primeiras cadeiras no Parlamento Europeu, consolidando a posição da extrema direita na quarta maior economia da Zona do Euro e fortalecendo o bloco antifederalista, contrário a uma integração maior do continente.
Este é o blog do jornalista Nelson Franco Jobim, Mestre em Relações Internacionais pela London School of Economics, ex-correspondente do Jornal do Brasil em Londres, ex-editor internacional do Jornal da Globo e da TV Brasil, ex-professor de jornalismo e de relações internacionais na UniverCidade, no Rio de Janeiro. Todos os comentários, críticas e sugestões são bem-vindos, mas não serão publicadas mensagens discriminatórias, racistas, sexistas ou com ofensas pessoais.
segunda-feira, 3 de dezembro de 2018
Extrema direita ressurge na política da Espanha
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