quinta-feira, 9 de julho de 2015

Fortaleza, uma cidade para curtir de dia e de noite

Esta reportagem foi publicada no Correio do Povo, de Porto Alegre, em 19 de novembro de 1978, depois da primeira visita a Fortaleza. Republico na minha volta ao Ceará:

FORTALEZA - Lindas mulheres dourando seus corpos ao sol escaldante à beira de verdes mares. Velas fazendo-se ao mar de madrugada para voltar à tarde carregadas de peixes. Pessoas se embalando preguiçosamente à sombra dos coqueirais. Uma noite enfeitada por um luar de prata que se prolonga até o raiar do dia nos movimentados bares e restaurantes da beira-mar.

Você está no Ceará, terra de José de Alencar, da lagosta e de muitas lendas, de Iracema ao Padre Cícero. Lá o aguardam um sol que brilha o ano todo, ar despoluído, hotéis de boa qualidade (mas caros), uma culinária variada da carne-de-sol à lagosta ao Thermidor, um povo aberto e comunicativo.

Uma das cidades que mais cresceu no Brasil nas últimas décadas, enfrenta graves problemas de violência, saneamento, habitações, comunicações, trânsito e transportes públicos, que preocupam as autoridades, interessadas em fazer do turismo uma importante fonte de renda.

Fortaleza é uma cidade onde há o que fazer de dia e à noite. O calor equatorial permite que se vá à praia quase todo dia. Depois que cai o sol, uma brisa fresca retempera o ambiente.

Orgulhoso, o cearense diz que qualquer época do ano é boa para visitar Fortaleza - mas de julho a janeiro quase não chove, as praias enchem de dia e os bares vão pela madrugada. No interior, há as vaquejadas municipais, "pegas de boi" e nos fins de semana os forrós. O Ceará é animado.

Nesta época do ano, o céu está sempre azul e o mar sempre verde, convidando a um mergulho ou a que apenas se olhe para ele debaixo de uma tenda à beira-mar coberta com palha de coqueiro enquanto se toma cerveja ou água de coco e engana o estômago com camarões, patinhas de caranguejo e agulhas fritas.

Os aterros que foram feitos, para melhor ou para pior, numa cidade construída sem planejamento que cresce em ritmo de embolada, condenaram a praia de Iracema ao ostracismo nas narrativas dos poetas, em prateleiras empoeiradas ou em rodas de som nos botecos.

A praia do Mucuripe também não resistiu ao progresso. Sua forma é bonita. Há muitos coqueiros plantados na areia branca, bares e restaurante no outro lado da Avenida Presidente Kennedy. Mas o movimento do porto e a falta de saneamento básico (entenda-se rede de esgotos) a comprometem. Resta sentar num dos bares à tarde e observar o "arrastão" das jangadas. Ou ver os pescadores partindo às cinco da madrugada. O mar está sujo.

Os jovens preferem a praia do Futuro, principalmente a parte fronteiriça à Praça 31 de março - o ponto da moda. Durante o período escolar, é ali que os namorados marcam encontro no sábado. Também é ali que desfilam as cearenses mais bonitas. Barraquinha vendem bebidas e tira-gostos.

Mas os jornais de Fortaleza não se cansam de registrar protestos contra aqueles que praticam esportes fora dos locais determinados, desrespeitando adultos e ameaçando crianças. Isso provoca discussões e bolas furadas.

TIRA-GOSTO
Quando a barriga roncar e não se satisfizer mais com frugais tira-gostos, uma boa pedida é comer nos simpáticos restaurantes à beira-mar. Fique de olho nos preços.

Durante uma refeição à beira-mar, vão desfilar à sua frente pequenos artesãos oferecendo suas mercadorias: entalhes, rendas, bordados, quadros ou simplesmente colares de conchas. Os preços são razoáveis, melhores em geral do que em Salvador e no Recife. Quanto à qualidade, o gosto de cada um que julgue.

Fortaleza também é conhecida como a "cidade dos clubes", vários deles situados à beira-mar com restaurantes abertos ao público.

PASSEIOS
Uma boa volta pela cidade inclui o Mausoléu do Presidente Castelo Branco, o Palácio da Abolição, o Museu Histórico e Antropológico do Ceará, o Teatro José de Alencar, as praias, os novos bairros residenciais, o centro e a barra do Rio Ceará, onde começa o retorno.

O mausoléu e o palácio, sede do governo estadual, são construídos em estilo arquitetônico moderno, concebidos pelo arquiteto Sérgio Bernardes. No primeiro, além do túmulo do presidente, estão expostas cartas, fotos, documentos, medalhas e placas com os pensamentos do marechal Castelo Branco.

Do palácio, se conhece apenas o aspecto externo, onde estátuas de Zenon Barreto representam as figuras características do Ceará: o cafuné, a mulher carregando a moringa, a mulher pulando para fazer passoca, o jangadeiro, a mulher rendeira. Árvores da terra como o acácia imperial, o peão roxo e o cacto nordestino dão o acabamento paisagístico.

O Museu Histórico e Antropológico, na Avenida Barão de Studart, mostra peças e pertences das mais variadas personalidades cearenses, do presidente Castelo Branco ao Padre Cícero, de Chico Anysio a Dom Hélder Câmara.

Ali estão expostas armas usadas nas mais diferentes revoltas, das quais participaram "coronéis" até hoje muito influentes, a ponto do historiador Clóvis Silva, funcionário do museu, prevenir-se contra microfones antes de abrir a boca.

MERCADO
Depois de uma parada para um sorvete de caju, goiaba ou graviola, o passeio segue pelas praias até a Praia do Futuro. Então, por entre morros em cima dos quais se erguem luxuosas mansões, tomam-se as avenidas que levam ao centro.

No burburinho do Mercado Central, o turista encontra os diversos objetos a que a criatividade popular deu forma: vestidos rendados ou bordados, sacolas e cestas de palha, estatuetas de barro do Padim Ciço, redes para se embalar. Nas proximidades, fica o imponente Teatro José de Alencar, um dos passeios obrigatórios da cidade.

Em estilo art nouveau, foi inaugurado em 1910. Suas frisas, escadarias, camarotes e balcão nobre são de ferro fundido. Na plateia, há uma impressionante estrutura metálica importada da Escócia. À saída do teatro, todos os caminhos levam à Praça do Ferreira, onde as antigas construções revelam uma Fortaleza histórica - diferente da Fortaleza das praias, dos jangadeiros, das rendeiras e dos coqueirais.

GUARANI
Depois de uma rápida passada pelo forte que deu nome à cidade, quando o sol estiver caindo, se o passeio for à tarde, você avistará a barra do rio Ceará, onde estarão fundeados pequenos barcos. A uns 10 quilômetros do centro urbano, ela conta a história dos primeiros colonizadores nas ruínas quase encobertas do primeiro fortim, construído por Pero Coelho de Souza.

Durante a travessia, os barcos contam que por ali José de Alencar passou e se inspirou para escrever O Guarani.

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