O presidente Goodluck Jonathan telefonou há pouco para o candidato oposicionista Muhamadu Buhari e o cumprimentou pela vitória na eleição presidencial do último fim de semana na Nigéria, informa a televisão americana CNN. É a primeira transferência de poder democrática à oposição na história do mais rico e mais populoso país da África. O Partido Democrático Popular, de Jonathan, estava no poder desde a primeira eleição democrática depois da última ditadura, em 1999.
A Nigéria votou para presidente num momento de prosperidade econômica, com crescimento de 6% a 8% nos últimos anos, o que a levou a ultrapassar a África do Sul como maior economia da África. Mas o país, dividido entre uma maioria muçulmana predominante no Norte e uma minoria cristã no Sul, enfrenta uma violenta rebelião da milícia terrorista Boko Haram no Nordeste.
Ontem à noite, os resultados davam uma vantagem de mais de 2 milhões de votos a favor do ex-ditador Buhari, um muçulmano nortista do povo hauçá-fulane de 72 anos. No fim, ele ganhou em 20 estados e na capital, e o presidente, em 16. O oposicionista teve 54% dos votos contra 45% para o presidente.
Buhari governou o país como ditador de 1983 a 1985 e deixou o poder extremamente impopular por causa de uma campanha para impor disciplina e boas maneiras aos nigerianos. Depois da democratização, disputou e perdeu as eleições de 2003, 2007 e 2011 - e aceitou o resultado.
Jonathan, um cristão iorubá sulista de 57 anos, chegou ao poder como vice do presidente Umaru Yar'Adua, que morreu do coração em 2010. Foi reeleito em 2011. Como só tinha concorrido a presidente uma vez, pôde se candidatar a uma segunda reeleição.
General da reserva, Buhari deve agir com dureza contra os grupos rebeldes. Além do Boko Haram, que luta para impor a lei islâmica na África Ocidental e age principalmente no Nordeste da Nigéria, há no Sul o Movimento pela Emancipação do Delta do Níger, a principal região produtora de petróleo e uma das bases eleitorais de Jonathan.
Como a trégua e a anistia negociada pelo governo Jonathan estão se esgotando, o movimento ameaça retomar a luta armada. Mas o simples fato de Jonathan ligar para Buhari reconhecendo a derrota é um avanço significativo para a democracia na África. Nas eleições anteriores, mais de 1,1 mil pessoas morreram em conflitos causados pela rejeição ao resultado oficial.
Uma ampla vitória de Buhari talvez tenha sido o melhor para a estabilidade da Nigéria. Jonathan seria mais do mesmo, um governo manchado pelo compadrismo, a corrupção e a fraqueza no combate ao Boko Haram. Com a arrecadação reduzida pela queda nos preços do petróleo, Buhari assume em 29 de maio de 2015 para um mandato de quatro anos com uma longa lista de problemas a resolver.
Para evitar o recrudescimento da guerrilha no Delta do Níger, terá de manter os programas e benefícios sociais do governo Jonathan. Ao mesmo tempo, o novo presidente planeja investir maciçamente em educação na sua região, o Norte, para dar aos jovens uma alternativa além da violência.
O Brasil tem uma relação histórica e cultural com a Nigéria. Seus maiores povos, hauçás e iorubás, inimigos mortais na África, o que só agora a democracia começa a superar, se aliaram no Brasil para lutar contra a escravidão. Da Nigéria, veio o candomblé, a religião dos orixás, herança cultural do povo iorubá.
Este é o blog do jornalista Nelson Franco Jobim, Mestre em Relações Internacionais pela London School of Economics, ex-correspondente do Jornal do Brasil em Londres, ex-editor internacional do Jornal da Globo e da TV Brasil, ex-professor de jornalismo e de relações internacionais na UniverCidade, no Rio de Janeiro. Todos os comentários, críticas e sugestões são bem-vindos, mas não serão publicadas mensagens discriminatórias, racistas, sexistas ou com ofensas pessoais.
terça-feira, 31 de março de 2015
Oposição vence pela primeira vez eleição presidencial na Nigéria
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