Em entrevista à televisão americana CNN, o ex-primeiro-ministro britânico Tony Blair admitiu erros de planejamento na invasão do Iraque de 2003 e na administração do país depois da queda de Saddam Hussein, assumindo responsabilidade parcial pelo surgimento da organização terrorista Estado Islâmico do Iraque e do Levante. Mas defendeu a derrubada do ditador iraquiano.
Blair não reconheceu que a invasão do Iraque foi baseada numa manipulação de informes de inteligência por ele e pelo então presidente dos Estados Unidos, George W. Bush. Alegou que ambos receberam relatórios errados dos serviços secretos ampliando a dimensão dos supostos programas de armas de destruição em massa do Iraque.
O ex-primeiro-ministro lembrou que Saddam atacou seu próprio povo e também o Irã com armas químicas e usou a Primavera Árabe, uma revolta contra ditadores do Norte da África e do Oriente Médio em 2011, como exemplo para argumentar em texto para a CNN que as ditaduras não tinham mais condições de controlar "populações jovens alienadas desprovidas de direitos".
Se Saddam ainda estivesse no poder, raciocinou Blair, diante da Primavera Árabe, provavelmente teria reagido como o ditador da Síria, Bachar Assad, que atacou seu próprio povo, iniciando uma guerra civil responsável por 250 mil mortes.
A alienação da minoria árabe sunita, que estava no poder com Saddam, está na origem do Estado Islâmico. Seu precursor foi o grupo jihadista Jamaat al-Tawhid wa al-Jihad, que já estava lá antes da invasão americana de março de 2003. Foi a milícia responsável pelo ataque contra o escritório das Nações Unidas em que morreu o diplomata brasileiro Sérgio Vieira de Mello, em agosto de 2003.
Depois de oito meses de negociações com Ossama ben Laden, em setembro de 2004, o grupo passou a se chamar Al Caeda no Iraque. Dois anos depois, se transformaria no Estado Islâmico do Iraque.
Em seu texto, Blair afirma que, "em 2009, Al Caeda e outros grupos jihadistas estavam amplamente batidos no Iraque e foi na Síria, depois de 2011, que o EI ganhou proeminência e se tornou a ameaça que é hoje."
Mais bem-sucedido líder do Partido Trabalhista britânico, Blair ganhou três eleições e governou o Reino Unido de 1997 a 2007. Caiu por participar da guerra de Bush contra Saddam em que ambos são acusados de crimes de guerra.
Este é o blog do jornalista Nelson Franco Jobim, Mestre em Relações Internacionais pela London School of Economics, ex-correspondente do Jornal do Brasil em Londres, ex-editor internacional do Jornal da Globo e da TV Brasil, ex-professor de jornalismo e de relações internacionais na UniverCidade, no Rio de Janeiro. Todos os comentários, críticas e sugestões são bem-vindos, mas não serão publicadas mensagens discriminatórias, racistas, sexistas ou com ofensas pessoais.
Assinar:
Postar comentários (Atom)
2 comentários:
Apesar de tudo eu gosto do Tony Blair. Tem pelo menos a dignidade de assumir a responsabilidade por seus atos.
É inteligente e articulado, mas a invasão do Iraque foi um erro e suas desculpas são inaceitáveis. Houve uma evidente manipulação dos relatórios dos serviços secretos sobre as armas de destruição em massa de Saddam, que haviam sido eliminadas pelo regime de inspeções da ONU depois da Guerra do Golfo de 1991. Sabíamos que Saddam teve armas de destruição em massa, mas nada além do que havia sido revelado.
O grande erro foi no planejamento do pós-guerra. É muito mais caro construir um país do que destruir. No caso do Iraque, os EUA desmobilizaram as forças de segurança, jogando no desemprego e na clandestinidade centenas de milhares de pessoas com treinamento militar. Vários oficiais de Saddam lutam hoje pelo Estado Islâmico.
Conquistar a paz é muito mais difícil do que ganhar a guerra. Exige algo como um Plano Marshall para reconstruir o Estado e a nação. Custa muito dinheiro que as grandes potências não costumam gastar com países da periferia.
Postar um comentário