Um dos adultos encarregados de pôr um mínimo de ordem no caótico governo Donald Trump foi pego mentindo sobre a deputada que revelou a insensibilidade do presidente dos Estados Unidos ao dar condolências à viúva grávida de um militar morto por terroristas no Níger, na África Ocidental. O chefe da Casa Civil da Casa Branca, general John Kelly, mentiu para atacar a deputada federal Frederica Wilson.
Trump levou 12 dias para encontrar em contato com as famílias dos quatro soldados mortos kem 4 de outubro na África, numa emboscada de terroristas ligados ao grupo Estado Islâmico. Teria dito à viúva: "Seu marido sabia o que estava assinando, mas entendo que dói de qualquer maneira." O presidente nem citou o nome do sargento La David Johnson, indignou-se a mãe dele. A viúva chorou ao desligar o telefone.
A deputada federal democrata Frederica Wilson deu publicidade à indignação da família e logo se tornou alvo das retaliações da Casa Branca. O general Kelly afirmou que, ao participar da inauguração da nova sede do FBI (Federal Bureau of Investigation), a polícia federal dos EUA, em Miami, em 2015, Frederica Wilson teria alegado que ela conseguira os US$ 20 milhões para a obra.
Kelly apresentou Wilson como uma política cínica e oportunista, em busca da notoriedade fácil. Mas um vídeo divulgado pelo jornal The Sun Sentinel, da Flórida, derrubou a versão do general, dando razão à deputada.
Em seu discurso de nove minutos, ela nunca reivindicou para si a obtenção do dinheiro, admitindo ter sido aprovado antes de ser eleita para a Câmara dos Representantes.
Wilson fez, sim, com outros deputados, o projeto para dar ao edifício o nome de dois agentes do FBI, Benjamin Grogan e Jerry Dove, mortos em troca de tiros com assaltantes de bancos em 1986, reportou o jornal Miami Herald.
Hoje a deputada reagiu e levou o caso para a questão racial: "A Casa Branca está cheia de supremacistas brancos", disparou. "Tenho pena dele por achar que precisa mentir sobre mim, que não sou sua inimiga. Não posso nem imaginar por que ele inventou uma mentira dessas. É totalmente insano. Estou pasmada porque era tão fácil de descobrir."
Frederica Wilson era amiga da família. Conhecia La David Johnson desde o ensino fundamental, quando ele entrou para um programa de tutoria criado por ela. A deputada estava com a família dentro da limusine esperando o caixão com o corpo do sargento na pista do aeroporto quando o presidente ligou. Ela ouviu a conversa pelo viva-voz do rádio do carro.
Mais um bate-boca gerado pelo governo Trump suscitou dúvidas sobre o que realmente aconteceu no Níger em 4 de outubro. Aparentemente, os soldados americanos acompanhavam uma patrulha do Exército local perto da fronteira como Mali quando foram surpreendidos por 50 jihadistas. Não tinham homens nem poder de fogo para resistir.
A primeira questão é: que informações de inteligência esses militares tinham para se arriscar andar sem proteção especial numa fronteira de alto risco? O que eles estavam fazendo lá? Quem os mandou para essa missão? Houve negligência?
Os democratas comparam com o ataque terrorista ao consulado dos EUA em Bengázi, na Líbia, em 11 de setembro de 2012, quando morreram o embaixador e outros três americanos. A na época oposição republicana explorou o episódio, mais ainda porque Hillary Clinton era a secretária de Estado, no primeiro governo Barack Obama.
Pior para o governo Trump é a revelação de que o sargento Johnson foi abandonado no campo de batalha. Seu corpo foi resgatado 48 horas depois. A deputada chegou a cogitar que tenha ficado vivo agonizando durante horas. Isso quebra uma regra fundamental das Forças Armadas dos EUA: nenhum soldado pode ser deixado para trás. Johnson era o único negro do grupo.
Este é o blog do jornalista Nelson Franco Jobim, Mestre em Relações Internacionais pela London School of Economics, ex-correspondente do Jornal do Brasil em Londres, ex-editor internacional do Jornal da Globo e da TV Brasil, ex-professor de jornalismo e de relações internacionais na UniverCidade, no Rio de Janeiro. Todos os comentários, críticas e sugestões são bem-vindos, mas não serão publicadas mensagens discriminatórias, racistas, sexistas ou com ofensas pessoais.
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