terça-feira, 3 de outubro de 2017

Assembleia Nacional da França aprova lei antiterrorismo

Por 415 a 127 votos, a Assembleia Nacional da França aprovou em primeira votação o projeto de lei antiterrorismo, criticado pela oposição de esquerda sob o argumento de que incorpora à legislação ordinária os dispositivos do estado de emergência decretado depois dos atentados de 13 de novembro de 2015 em Paris, quando 130 pessoas foram mortas.

Ao encaminhar a votação, o primeiro-ministro Edouard Philippe afirmou que "a lei não é o único instrumento para lutar contra a ameaça terrorista". É necessário "um combate em todas as frentes, um combate cultural, um combate social e um combate de ordem pública".

A votação aconteceu sob o impacto dos atentados terroristas em Marselha, na França, e Las Vegas, nos Estados Unidos. Foi precedida por um minuto de silêncio. Foram a favor os partidos República em Marcha (ReM), do presidente Emmanuel Macron, Movimento Democrático (MoDem) e, com reservas, pela Nova Esquerda saída do Partido Socialista (PS).

O projeto foi rejeitado pela maioria do partido de centro-direita Os Republicanos e pela Frente Nacional, de extrema direita, que o consideraram "insuficiente", e pelos grupos de esquerda França Insubmissa, Esquerda Democrática e Republicana e o Partido Comunista Francês, que acusaram o texto de "ineficaz" e "liberticida".

Parte da direita alega que "a interferência de um juiz vai complicar o procedimento e impedir uma ação rápida". A esquerda exige a participação de um juiz de instrução e não apenas de um juiz de plantão para confirmar a legalidade de prisões e apreensões de documentos.

Sob o estado de emergência, até 1º de novembro, a polícia pode realizar batidas sem autorização judicial. Com a nova lei, essas operações de busca e apreensão foram rebatizadas como "visitas domiciliares" à procura de "documentos, objetos e dados" com o "fim exclusivo de prevenir o cometimento de atos de terrorismo e quando houver razões sérias para pensar que o lugar é frequentado por uma pessoa cujo comportamento constitua uma ameaça particularmente grave para a segurança e a ordem pública."

A diferença para o estado de emergência é que estas "visitas domiciliares" precisam ser autorizadas por um juiz depois de informada a Procuradoria-Geral da República. Estas autorizações podem ser objeto de recurso.

As operações de busca não poderão começar antes das 6h nem depois das 21h, a não ser com autorização expressa do juiz. Terão de ser feitas na presença do ocupante do imóvel ou, se nenhum responsável estiver lá, de duas testemunhas. Os suspeitos poderão ser detidos por até quatro horas no local, desde que avisado o juiz.

Para o Sindicato da Magistratura, o juiz não terá condições de exercer "um verdadeiro controle sobre a base das informações fornecidas pela polícia e os serviços secretos".

Já a União Sindical dos Magistrados entende que o projeto "parece conciliar os imperativos da segurança pública e do respeito aos direitos e liberdades", desde que "o juiz disponha dos meios necessários para exercer um controle efetivo de todas as etapas do procedimento".

Na opinião da professora de direito Vanessa Codaccioni, autora do livro Justiça de Exceção: o Estado face aos crimes políticos e terroristas, "esta nova lei antiterrorismo se inscreve em duas lógicas. Uma lógica própria do antiterrorismo francês que é empilhar e multiplicar as legislações de exceção. Deste ponto de vista, esta lei se inscreve num processo histórico de reforço contínuo do aparelho antiterrorista. Por outro lado, esta lei é inédita no sentido de que visa a sair de um regime de exceção preservando suas características graves e repressivas."

A lógica central é que "uma violência excepcional exige uma Justiça excepcional", acrescentou a professora em entrevista ao jornal francês Le Monde. Ela lembra que a França tem leis para tomar medidas preventivas contra o terrorismo desde os anos 1990s. O argumento para mudar é que o terrorismo islâmico é muito mais mortífero.

Isso não é novidade na 5ª República, comentou Vanessa Codaccioni, lembrando que medidas de exceção foram adotadas durante a Guerra de Independência da Argélia (1954-62). O risco é de uma Justiça de exceção, dominada pela polícia e os serviços secretos.

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