Por 65 votos a 34, o Senado dos Estados Unidos aprovou ontem à noite mudanças no sistema de interrogar e processar suspeitos de terrorismo, preparando o julgamento em tribunais militares de 14 supostos líderes da rede terrorista Al Caeda que teriam sido transferidos para o centro de detenção instalado na base naval de Guantânamo, um enclave americano em Cuba.
O projeto apresentado pelo presidente George W. Bush depois que sua política de detenção de prisioneiros da guerra contra o terror foi declarada inconstitucional pela Suprema Corte tinha aprovado na Câmara, na noite anterior, por 232 a 191. Na opinião do jornal The Washington Post, impõe limites "extraordinários" ao direito de defesa. Também deve ser questionado na Suprema Corte.
As restrições limitam o direito dos "combatentes inimigos ilegais" de contestar sua detenção, de examinar todas as provas contra eles, e proíbe testemunhos obtidos mediante coação. O governo Bush criou esta definição de "combatentes ilegais" para negar aos presos na guerra contra o terror os direitos garantidos pelas Convenções de Genebra, alegando que eles não pertencem a um exército regular, não usam uniforme, não têm patente militar, e não obedecem a uma hierarquia e uma cadeia de comando.
Com esta lei, Bush tenta legalizar as comissões militares para julgar os suspeitos de terrorismo e as técnicas de interrogatório usadas pelos agentes da CIA (Agência Central de Inteligência): "Quando nossos soldados arriscam suas vidas combatendo o terrorismo, esta lei vai garantir que estejam preparados para enfrentar os inimigos de hoje e as ameaças de amanhã", declarou o presidente ao pedir o apoio dos senadores.
Sob pressão do senador republicano John McCain, prisioneiro de guerra no Vietnã e aspirante à Casa Branca, a lei proíbe as comissões militares de levar em consideração testemunha obtidos mediante técnicas de interrogatório que envolvam "tratamento ou punição cruel, incomum ou desumano".
O projeto correu riscos, quando o senador republicano Arlen Specter, presidente da Comissão de Justiça, declarou que votaria contra por julgá-lo "claramente inconstitucional". Já o também republicano Lindsey Graham argumentou que "permitir aos detentos entrar com pedido de habeas corpus seria dar a um juiz o que historicamente sempre foi uma função militar", "atrapalha o esforço de guerra e é irresponsável".
Na prática, a lei nega aos prisioneiros da guerra contra o terror o direito de habeas corpus, peça fundamental da Constituição dos EUA e muito anterior a ela. Foi criado em 1215 na Magna Carta, que a aristocracia inglesa obrigou o rei João Sem Terra a assinar.
João Sem Terra ficou conhecido assim por tentar usurpar o trono quando seu irmão Ricardo I, o Coração de Leão, lutava na Terceira Cruzada. A Magna Carta obrigava o rei a apresentar os presos à Justiça, a mostrar o corpo. É um instituto usado universalmente hoje, ou pelo menos nos países democráticos, para pedir a libertação de pessoas detidas ilegalmente, sem flagrante nem ordem judicial.
A ditadura militar brasileira suspendeu o direito de habeas corpus.
Este é o blog do jornalista Nelson Franco Jobim, Mestre em Relações Internacionais pela London School of Economics, ex-correspondente do Jornal do Brasil em Londres, ex-editor internacional do Jornal da Globo e da TV Brasil, ex-professor de jornalismo e de relações internacionais na UniverCidade, no Rio de Janeiro. Todos os comentários, críticas e sugestões são bem-vindos, mas não serão publicadas mensagens discriminatórias, racistas, sexistas ou com ofensas pessoais.
sábado, 30 de setembro de 2006
Produção industrial do Japão cresce 1,9% em agosto
A segunda maior economia do mundo produziu dois números positivos nesta sexta-feira. A produção industrial japonesa cresceu 1,9% em agosto em relação a julho, e o núcleo da inflação aumentou 0,3% em agosto, indicando que o Japão superou a deflação que estagnou a economia do país durante mais de uma década. Mas uma queda de 4,4% no consumo das famílias assalariadas provoca alguma preocupação. O índice de desemprego ficou estável em 4,1%.
Pela previsão do Ministério da Economia, a produção deve cair 0,1% em setembro mas subir 1,8% em outubro.
O governo do novo primeiro-ministro, Shinzo Abe, ainda reluta em declarar a vitória sobre a deflação: "Como houve um longo período de deflação, precisamos tomar com cuidado a decisão sobre sua superação", comentou o secretário de Governo (espécie de Chefe da Casa Civil), Yasuhisa Shiozaki. "Precisamos ter a certeza de que a inflação não voltará".
A taxa de desemprego, que era de menos de 3% durante a euforia do SuperJapão dos anos 80, cai consistentemente desde 2003. Em maio, chegou a 4%, nível mais baixo em oito anos, subindo para 4,2% em junho e baixando para 4,1% em agosto.
Nos últimos 12 meses, o número de desempregados caiu em 120 mil, ficando em 2,7 milhões, enquanto o total de empregados subiu 220 mil, chegando a 64,27 milhões, depois de 16 meses consecutivos de alta.
A recuperação da economia japonesa foi um resultado das reformas realizadas nos últimos cinco anos pelo agora ex-primeiro-ministro Junichiro Koizumi, que deixou o poder na última terça-feira, e também do extraordinário crescimento da China, que se tornou o maior parceiro comercial do Japão, superando os EUA.
Pela previsão do Ministério da Economia, a produção deve cair 0,1% em setembro mas subir 1,8% em outubro.
O governo do novo primeiro-ministro, Shinzo Abe, ainda reluta em declarar a vitória sobre a deflação: "Como houve um longo período de deflação, precisamos tomar com cuidado a decisão sobre sua superação", comentou o secretário de Governo (espécie de Chefe da Casa Civil), Yasuhisa Shiozaki. "Precisamos ter a certeza de que a inflação não voltará".
A taxa de desemprego, que era de menos de 3% durante a euforia do SuperJapão dos anos 80, cai consistentemente desde 2003. Em maio, chegou a 4%, nível mais baixo em oito anos, subindo para 4,2% em junho e baixando para 4,1% em agosto.
Nos últimos 12 meses, o número de desempregados caiu em 120 mil, ficando em 2,7 milhões, enquanto o total de empregados subiu 220 mil, chegando a 64,27 milhões, depois de 16 meses consecutivos de alta.
A recuperação da economia japonesa foi um resultado das reformas realizadas nos últimos cinco anos pelo agora ex-primeiro-ministro Junichiro Koizumi, que deixou o poder na última terça-feira, e também do extraordinário crescimento da China, que se tornou o maior parceiro comercial do Japão, superando os EUA.
Uribe vai se encontrar com as FARC
O presidente linha-dura da Colômbia, Álvaro Uribe, aceitou desmilitarizar duas cidades para ter um encontro com as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia, que lutam para impor um regime marxista no país há mais de 40 anos. Uribe negociaria uma troca de prisioneiros, 500 guerrilheiros por 58 reféns, na maioria políticos e militares, dois americanos e a candidata à Presidência Ingrid Betancourt, seqüestrada desde 23 de fevereiro de 2002.
Durante 45 dias, as cidades de Florida e Pradera, no vale do Rio Cauca, serão declaradas "zona de encontro".
"Existe uma vontade política de retirar as tropas e se sentar para negociar", declarou à Rádio Caracol o ex-ministro Álvaro Levya, encarregado pelo presidente para entrar com contato com o principal grupo guerrilheiro colombiano, com cerca de 17 mil rebeldes que se aproveitam do tráfico de cocaína para ter dinheiro para a guerra civil.
Ao negociar, Uribe altera sua política em relação ao primeiro mandato (2002-2006), que era de "segurança democrática", negando legitimidade aos grupos guerrilheiros diante de sua autoridade de presidente eleito.
Durante 45 dias, as cidades de Florida e Pradera, no vale do Rio Cauca, serão declaradas "zona de encontro".
"Existe uma vontade política de retirar as tropas e se sentar para negociar", declarou à Rádio Caracol o ex-ministro Álvaro Levya, encarregado pelo presidente para entrar com contato com o principal grupo guerrilheiro colombiano, com cerca de 17 mil rebeldes que se aproveitam do tráfico de cocaína para ter dinheiro para a guerra civil.
Ao negociar, Uribe altera sua política em relação ao primeiro mandato (2002-2006), que era de "segurança democrática", negando legitimidade aos grupos guerrilheiros diante de sua autoridade de presidente eleito.
sexta-feira, 29 de setembro de 2006
Jospin desiste da presidência da França
O ex-primeiro-ministro francês Lionel Jospin desistiu de disputar a candidatura socialista à eleição presidencial do ano que vem. Sua decisão abre caminho para Ségolène Royal, a favorita entre o eleitorado de esquerda. Ela pode ser a primeira mulher a presidir a França.
Agora, quatro candidatos disputarão a indicação do Partido Socialista: o ex-primeiro-ministro Laurent Fabius, o ex-ministro da Cultura Jack Lang, Ségolène Royal e o ex-ministro da Economia Dominique Strauss-Kahn. O partido dará uma previa entre seus militantes para escolher o candidato, que deve enfrentar o ministro do Interior, Nicolas Sarkozy, o favorito da direita.
Jospin perdeu a vaga no segundo turno, em 21 de abril de 2002, para Jean-Marie Le Pen, da Frente Nacional, neofascista, o que provocou um terremoto na política francesa, especialmente a esquerda, obrigada a votar no presidente conservador e corrupto Jacques Chirac para barrar a ascensão da extrema direita.
Agora, quatro candidatos disputarão a indicação do Partido Socialista: o ex-primeiro-ministro Laurent Fabius, o ex-ministro da Cultura Jack Lang, Ségolène Royal e o ex-ministro da Economia Dominique Strauss-Kahn. O partido dará uma previa entre seus militantes para escolher o candidato, que deve enfrentar o ministro do Interior, Nicolas Sarkozy, o favorito da direita.
Jospin perdeu a vaga no segundo turno, em 21 de abril de 2002, para Jean-Marie Le Pen, da Frente Nacional, neofascista, o que provocou um terremoto na política francesa, especialmente a esquerda, obrigada a votar no presidente conservador e corrupto Jacques Chirac para barrar a ascensão da extrema direita.
quinta-feira, 28 de setembro de 2006
Lula x Chávez: quem lidera a América Latina?
Às vésperas da eleição presidencial brasileira, a revista The Economist sai com matéria de capa perguntando quem lidera a América Latina: Lula ou Chávez?
Há quatro anos, quando foi eleito com uma biografia de líder sindical e retirante nordestino, sétimo filho de uma família pobre, Luiz Inácio Lula da Silva parecia ter a autoridade moral para ser o líder da América Latina, diz o Economist no seu principal editorial. Mas esta liderança vem sendo consistentemente minada pelo caudilhismo do presidente da Venezuela, Hugo Chávez, que se apresenta como líder da esquerda latino-americana e herdeiro político de Fidel Castro, ideológo de um mal definido "socialismo do século 21", que não chega a propor um modelo de desenvolvimento mas é uma série de políticas sociais financiada pela renda do petróleo venezuelano.
Lula apresenta-se como capaz de exercer um poder moderador sobre Chávez. Mas diante das recentes viagens do líder venezuelano, em busca de contato com todos os adversários dos EUA, inclusive o presidente radical do Irã, Mahmoud Ahmadinejad, e o ditador da Bielorrússia, Alexander Lukachenko, fica evidente que Chávez corre em faixa própria.
Para a revista inglesa, Lula perdeu terreno por causa da corrupção, do crescimento medíocre da economia brasileira, que impede o país de ser a locomotiva da América do Sul e para a agressividade de Chávez: "Ele não é a voz mais forte que ecoa na América Latina, nem a mais à esquerda, mas, sim, Chávez, o presidente populista da Venezuela".
Ao defender o ingresso da Venezuela como representante temporária da América Latina no Conselho de Segurança das Nações por dois anos, Lula revela "ingenuidade na condução da política externa".
Qual foi a resposta de Chávez?, pergunta The Economist. "Ajudar a humilhar o Brasil na Bolívia" e "tentar sabotar os princípios da democracia e do livre mercado que são as bases do Mercosul".
Na minha opinião, Chávez e Fidel representam o passado, o caudilhismo e o populismo. Lula, apesar de todos os seus defeitos e dos inúmeros escândalos envolvendo seu governo, que são sinais evidentes de atraso político, representa o futuro da esquerda democrática na América Latina.
Quando fala da eleição na reportagem "Uma segunda chance para Lula", a revista recomenda "concentrar esforços para livrar o Brasil da armadilha de baixo crescimento" que deixa o país "muito atrás" das outras potências emergentes: China, Índia e Rússia.
Há quatro anos, quando foi eleito com uma biografia de líder sindical e retirante nordestino, sétimo filho de uma família pobre, Luiz Inácio Lula da Silva parecia ter a autoridade moral para ser o líder da América Latina, diz o Economist no seu principal editorial. Mas esta liderança vem sendo consistentemente minada pelo caudilhismo do presidente da Venezuela, Hugo Chávez, que se apresenta como líder da esquerda latino-americana e herdeiro político de Fidel Castro, ideológo de um mal definido "socialismo do século 21", que não chega a propor um modelo de desenvolvimento mas é uma série de políticas sociais financiada pela renda do petróleo venezuelano.
Lula apresenta-se como capaz de exercer um poder moderador sobre Chávez. Mas diante das recentes viagens do líder venezuelano, em busca de contato com todos os adversários dos EUA, inclusive o presidente radical do Irã, Mahmoud Ahmadinejad, e o ditador da Bielorrússia, Alexander Lukachenko, fica evidente que Chávez corre em faixa própria.
Para a revista inglesa, Lula perdeu terreno por causa da corrupção, do crescimento medíocre da economia brasileira, que impede o país de ser a locomotiva da América do Sul e para a agressividade de Chávez: "Ele não é a voz mais forte que ecoa na América Latina, nem a mais à esquerda, mas, sim, Chávez, o presidente populista da Venezuela".
Ao defender o ingresso da Venezuela como representante temporária da América Latina no Conselho de Segurança das Nações por dois anos, Lula revela "ingenuidade na condução da política externa".
Qual foi a resposta de Chávez?, pergunta The Economist. "Ajudar a humilhar o Brasil na Bolívia" e "tentar sabotar os princípios da democracia e do livre mercado que são as bases do Mercosul".
Na minha opinião, Chávez e Fidel representam o passado, o caudilhismo e o populismo. Lula, apesar de todos os seus defeitos e dos inúmeros escândalos envolvendo seu governo, que são sinais evidentes de atraso político, representa o futuro da esquerda democrática na América Latina.
Quando fala da eleição na reportagem "Uma segunda chance para Lula", a revista recomenda "concentrar esforços para livrar o Brasil da armadilha de baixo crescimento" que deixa o país "muito atrás" das outras potências emergentes: China, Índia e Rússia.
Mais de 4 mil terroristas morreram no Iraque
A 'guerra santa' contra os Estados Unidos já matou 4 mil terroristas estrangeiros no Iraque, anunciou hoje o líder da rede Al Caeda no país. Abu Ayub al-Massári convocou seus guerrilheiros a atacar as forças de ocupação americanas com armas biológicas.
Serviço secreto do Paquistão ajuda os Talebã
A visita a Londres do ditador do Paquistão, general Pervez Musharraf, está sendo ofuscada por um documento do serviço secreto britânico acusando seu congênere paquistanês de apoiar grupos muçulmanos radicais, inclusive a Milícia dos Talebã, no Afeganistão.
Ontem, Musharraf esteve na Casa Branca com os presidentes dos Estados Unidos, George W. Bush, e do Afeganistão, Hamid Karzai. Musharraf e Karzai não se cumprimentaram publicamente.
O Paquistão é um país-chave para o combate ao terrorismo, já que a liderança d'al Caeda estaria refugiada nas montanhas da fronteiras com o Afeganistão. A recente conspiração revelada na Inglaterra para explodir aviões em pleno ar em rotas para os EUA foi organizada por muçulmanos britânicos com ligações com o Paquistão.
Este país tem armas atômicas e ajudou a disseminar a tecnologia nuclear. Para Bush, Musharraf é considerado um aliado, sobretudo por ter sido alvo de dois atentados de jihadistas que não aceitam seu apoio aos EUA.
Ontem, Musharraf esteve na Casa Branca com os presidentes dos Estados Unidos, George W. Bush, e do Afeganistão, Hamid Karzai. Musharraf e Karzai não se cumprimentaram publicamente.
O Paquistão é um país-chave para o combate ao terrorismo, já que a liderança d'al Caeda estaria refugiada nas montanhas da fronteiras com o Afeganistão. A recente conspiração revelada na Inglaterra para explodir aviões em pleno ar em rotas para os EUA foi organizada por muçulmanos britânicos com ligações com o Paquistão.
Este país tem armas atômicas e ajudou a disseminar a tecnologia nuclear. Para Bush, Musharraf é considerado um aliado, sobretudo por ter sido alvo de dois atentados de jihadistas que não aceitam seu apoio aos EUA.
Chanceler alemã critica censura a ópera
A chanceler (primeira-ministra) da Alemanha, Angela Merkel, criticou ontem a decisão da Ópera Alemã de Berlim de suspender a apresentação de Idomeneo, do compositor austríaco Wolfgang Amadeus Mozart, um dos maiores músicos de todos os tempos. Uma cena da montagem mostrava a cabeça decapitada do profeta Maomé, fundador do islamismo. A decisão foi tomada sob a pressão de ameaças anônimas e o medo de represálias.
"Pensem nas conseqüências", protestou o diretor Hans Neuenfels. Numa cena final da peça, ele colocava as cabeças decepadas de Buda, Jesus Cristo, Maomé e Netuno sobre cadeira.
O jornal conservador Frankfurter Allgemeine Zeitung viu um "sufocamento da coragem cívica" e convidou todos os teatros alemães a aproveitarem a oportunidade.
Num contraste de opiniões, enquanto o jornal Neues Deutschland denuncia a "islamofobia" ululante, o Tagespiegel, de Berlim, fez uma observação sobre o conflito: "O combate de culturas que vivemos é singular: é a luta de nossa cultura liberal com ela mesma". E concluiu: "Em outros lugares do mundo, as pessoas são decapitadas. Na ópera, só se decapitam bonecos. Isto é civilização".
"Pensem nas conseqüências", protestou o diretor Hans Neuenfels. Numa cena final da peça, ele colocava as cabeças decepadas de Buda, Jesus Cristo, Maomé e Netuno sobre cadeira.
O jornal conservador Frankfurter Allgemeine Zeitung viu um "sufocamento da coragem cívica" e convidou todos os teatros alemães a aproveitarem a oportunidade.
Num contraste de opiniões, enquanto o jornal Neues Deutschland denuncia a "islamofobia" ululante, o Tagespiegel, de Berlim, fez uma observação sobre o conflito: "O combate de culturas que vivemos é singular: é a luta de nossa cultura liberal com ela mesma". E concluiu: "Em outros lugares do mundo, as pessoas são decapitadas. Na ópera, só se decapitam bonecos. Isto é civilização".
quarta-feira, 27 de setembro de 2006
Iraquianos querem retirada americana em um ano
A grande maioria dos iraquianos (71%) quer a retirada total dentro de um ano das forças americanas que invadiram o país em março de 2003, indica uma pesquisa realizada pela Universidade de Maryland, nos Estados Unidos. Eles acreditam que a presença militar americana está fazendo mais mal do que bem ao país, exacerbando a violência política.
Diante de quatro opções, 37% querem a retirada americana em seis meses, enquanto 34% optaram por uma retirada gradual com prazo de um ano, 23% dão um prazo de dois anos e apenas 9% acham que a retirada só deve ocorrer quando melhorar a segurança no Iraque.
O país vive à beira de uma guerra civil entre sunitas e xiitas. Agora, no mês do Ramadã, sagrado para os muçulmanos, o comando militar americano espera um aumento da violência política.
A imensa maioria acredita que os americanos estão provocando mais conflitos. Por este raciocínio, que despreza a força dos jihadistas estrangeiros, a retirada americana fortaleceria o governo iraquiano.
Aos olhos do cidadão comum, aumenta a legitimidade de ações contra as forças americanas. Há uma percepção generalizada de que os EUA querem instalar bases militares permanentes no Iraque.
A pesquisa foi divulgada no momento em que os serviços secretos dos EUA concluíram que a invasão do Iraque foi um grande estímulo para o terrorismo, mobilizando novas legiões de jovens jihadistas dispostos ao suicídio para atacar cidadãos e interesses americanos e de seus aliados no mundo inteiro.
Diante de quatro opções, 37% querem a retirada americana em seis meses, enquanto 34% optaram por uma retirada gradual com prazo de um ano, 23% dão um prazo de dois anos e apenas 9% acham que a retirada só deve ocorrer quando melhorar a segurança no Iraque.
O país vive à beira de uma guerra civil entre sunitas e xiitas. Agora, no mês do Ramadã, sagrado para os muçulmanos, o comando militar americano espera um aumento da violência política.
A imensa maioria acredita que os americanos estão provocando mais conflitos. Por este raciocínio, que despreza a força dos jihadistas estrangeiros, a retirada americana fortaleceria o governo iraquiano.
Aos olhos do cidadão comum, aumenta a legitimidade de ações contra as forças americanas. Há uma percepção generalizada de que os EUA querem instalar bases militares permanentes no Iraque.
A pesquisa foi divulgada no momento em que os serviços secretos dos EUA concluíram que a invasão do Iraque foi um grande estímulo para o terrorismo, mobilizando novas legiões de jovens jihadistas dispostos ao suicídio para atacar cidadãos e interesses americanos e de seus aliados no mundo inteiro.
Arábia Saudita quer cerca contra terror do Iraque
A Arábia Saudita planeja construir uma cerca de 900 quilômetros ao longo de sua fronteira com o Iraque para impedir terrorista do caótica país vizinho de invadir o reino onde ficam as duas principais cidades sagradas do Islamismo, Meca e Medina, e que tem um sério problema interno de radicalismo muçulmano e terrorismo. Ossama ben Laden é saudita e tem muitos fãs e financiadores no reino.
A cerca, que levará cinco a seis anos para ser construída, é parte de um conjunto de medidas de US$ 12 bilhões. Inclui sensores eletrônicos, bases militares e barreiras físicas para o proteger o país com as maiores reservas de petróleo do mundo (25% do total comprovado) de ameaças externas, como explicou Nawaf Obeid, chefe do Projeto de Avaliação da Segurança Nacional Saudita, um instituto de pesquisas independente.
O projeto reflete tanto a preocupação com o terrorismo como também o medo da situação de anarquia no Iraque. Desde 2004, a Arábia Saudita já gastou US$ 1,8 bilhão para proteger sua fronteira com o Iraque.
A cerca, que levará cinco a seis anos para ser construída, é parte de um conjunto de medidas de US$ 12 bilhões. Inclui sensores eletrônicos, bases militares e barreiras físicas para o proteger o país com as maiores reservas de petróleo do mundo (25% do total comprovado) de ameaças externas, como explicou Nawaf Obeid, chefe do Projeto de Avaliação da Segurança Nacional Saudita, um instituto de pesquisas independente.
O projeto reflete tanto a preocupação com o terrorismo como também o medo da situação de anarquia no Iraque. Desde 2004, a Arábia Saudita já gastou US$ 1,8 bilhão para proteger sua fronteira com o Iraque.
"A corrupção é difícil de provar"
A corrupção é uma praga do subdesenvolvimento mas afeta também os países ricos. É de lá a maioria das empresas transnacionais que corrompem governantes sem escrúpulos nem qualificação. Dois pontos fundamentais são punir não apenas os agentes públicos mas também os agentes privados envolvidos na corrupção e recuperar o dinheiro roubado, comentou o embaixador francês Jean-Pierre Vidon, responsável no seu país pelo combate ao crime organizado, em palestra no Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri), no Rio de Janeiro, em 22 de setembro.
Vidon destacou a necessidade de maior transparência no financiamento dos partidos políticos, principal fonte da corrupção, de um rigoroso código de ética para o setor público, cujos funcionários e agentes “devem ser bem remunerados”. Mas não quis comentar a série de escândalos no Brasil: “Minha percepção do Brasil é o que vejo na imprensa. A corrupção é difícil de provar”.
Para o embaixador, o instrumento mais efetivo contra a corrupção internacional é a Convenção sobre o Combate ao Suborno de Funcionários Públicos Estrangeiros nas Transações e Negócios Internacionais, aprovada em 1997 pela Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), um clube de países desenvolvidos. Os 30 países-membros ratificaram a chamada Convenção da OCDE, além de outros seis países, inclusive o Brasil e a Argentina, já que a convenção está aberta para adesão de outros países.
“A legislação reflete uma mudança de atitude”, observa Vidon, que participou da Conferência da Interpol no Rio. “Antigamente, a lei francesa penalizava apenas a corrupção ativa e passiva de autoridades, funcionários públicos ou políticos com mandato eletivo.” Nas transações internacionais, “a França e a maioria dos países europeus tolerava a prática de suborno, oficialmente descrito como comissões ou ‘despesas excepcionais de vendas’; quando pago a um funcionário público estrangeiro, era dedutível do imposto de renda”.
Agora, qualquer pessoa que tente corromper ou obter vantagens em transações internacionais pode ser condenada a até 10 anos de prisão e multa de 150 mil euros. Além disso, as empresas podem ser responsabilizadas e punidas criminalmente.
Por causa desta convenção, o Ministério da Justiça da França criou um Departamento Central de Prevenção da Corrupção e introduziu códigos de conduta.
Há críticas, admite o embaixador Vidon. Por exemplo, é impossível apresentar uma ação de iniciativa dos cidadãos. Isto deixa a decisão de oferecer denúncia ou não somente nas mãos da Procuradoria.
O avanço na punição às empresas é modesto. “Há uma discrepância entre a obrigação dos funcionários públicos e auditores de denunciar os casos de corrupção e o pequeno número de casos revelados”, reconhece.
De acordo com o parágrafo 2 do artigo 40 do Código de Processo Penal da França, “qualquer autoridade constituída ou funcionário público que, no desempenho de suas funções, tiver conhecimento de um crime ou ofensa, é obrigado a notificar a Promotoria Pública imediatamente, transmitindo-lhe todas as informações, minutas e procedimentos relativos ao caso”.
FALTA PROTEÇÃO A TESTEMUNHAS
Da mesma forma, raramente se vêem trabalhadores de empresas privadas denunciando atos de corrupção. Falta a figura da delação premiada para isentar de processo quem apresentar provas e proteção legal suficiente para testemunhas de acusação.
Outra legislação foi introduzida pelo Conselho da Europa, que reúne todos os partidos democráticos do continente, sendo portanto maior do que a União Européia. A França aderiu à Convenção sobre Direito Penal e à Convenção sobre Direito Civil, ratificadas pelo parlamento no ano passado.
“A principal característica da Convenção sobre Direito Penal é sua amplitude”, explicou o embaixador francês. “Ela cobre os vários aspectos que a corrupção pode assumir, passiva ou ativa, nos setores público e privado. Também exige que os países signatários a penalizar o tráfico de influência, a lavagem de dinheiro e os crimes contábeis”.
As convenções discutidas até aqui são européias. A primeira tentativa de criar uma lei universal, feita pelas Nações Unidas, levou à assinatura da Convenção contra o Crime Organizado Transacional em Palermo, na Itália, em dezembro de 2000.
O debate foi quente, com os países ricos alegando que a corrupção é uma das causas do subdesenvolvimento, e os pobres que o dinheiro sai das empresas dos países ricos e geralmente volta para seus bancos.
A Convenção contra o Crime Organizado Transnacional criminalizou a corrupção ativa e passiva mas a ONU começou a discutir uma convenção específica para a corrupção, aprovada pela Assembléia Geral em outubro de 2003 e já ratificada pelo Brasil.
Esta nova convenção, a Convenção de Mérida, prevê, pela primeira vez no Direito Internacional, a recuperação dos ativos e a adoção de mecanismos de prevenção para fortalecer os Estados democráticos e criar uma cultura anticorrupção.
A transparência do financiamento dos partidos políticos é considerada essencial.
Há “uma lista de atos ilícitos de criminalização obrigatória, a corrupção passiva e ativa de funcionários públicos nacionais, estrangeiros ou internacionais para obter contratos ou vantagens indevidas em atividades associadas ao comércio internacional, malversação de dinheiro público, lavagem de dinheiro do crime organizado, obstrução de justiça, tráfico de influência, corrupção e roubo de propriedade no setor privado, enriquecimento ilícito, abuso de função ou lucrar com abuso de função”, enumera Jean-Pierre Vidon.
O embaixador citou ainda o Compacto Global, uma iniciativa das Nações Unidas para convocar as empresas a contribuir, ao lado da ONU, dos governos e da sociedade civil para uma globalização não-excludente. Um de seus 10 princípios é: “As empresas devem trabalhar contra a corrupção em todas as formas, inclusive extorsão e suborno”.
Vidon destacou a necessidade de maior transparência no financiamento dos partidos políticos, principal fonte da corrupção, de um rigoroso código de ética para o setor público, cujos funcionários e agentes “devem ser bem remunerados”. Mas não quis comentar a série de escândalos no Brasil: “Minha percepção do Brasil é o que vejo na imprensa. A corrupção é difícil de provar”.
Para o embaixador, o instrumento mais efetivo contra a corrupção internacional é a Convenção sobre o Combate ao Suborno de Funcionários Públicos Estrangeiros nas Transações e Negócios Internacionais, aprovada em 1997 pela Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), um clube de países desenvolvidos. Os 30 países-membros ratificaram a chamada Convenção da OCDE, além de outros seis países, inclusive o Brasil e a Argentina, já que a convenção está aberta para adesão de outros países.
“A legislação reflete uma mudança de atitude”, observa Vidon, que participou da Conferência da Interpol no Rio. “Antigamente, a lei francesa penalizava apenas a corrupção ativa e passiva de autoridades, funcionários públicos ou políticos com mandato eletivo.” Nas transações internacionais, “a França e a maioria dos países europeus tolerava a prática de suborno, oficialmente descrito como comissões ou ‘despesas excepcionais de vendas’; quando pago a um funcionário público estrangeiro, era dedutível do imposto de renda”.
Agora, qualquer pessoa que tente corromper ou obter vantagens em transações internacionais pode ser condenada a até 10 anos de prisão e multa de 150 mil euros. Além disso, as empresas podem ser responsabilizadas e punidas criminalmente.
Por causa desta convenção, o Ministério da Justiça da França criou um Departamento Central de Prevenção da Corrupção e introduziu códigos de conduta.
Há críticas, admite o embaixador Vidon. Por exemplo, é impossível apresentar uma ação de iniciativa dos cidadãos. Isto deixa a decisão de oferecer denúncia ou não somente nas mãos da Procuradoria.
O avanço na punição às empresas é modesto. “Há uma discrepância entre a obrigação dos funcionários públicos e auditores de denunciar os casos de corrupção e o pequeno número de casos revelados”, reconhece.
De acordo com o parágrafo 2 do artigo 40 do Código de Processo Penal da França, “qualquer autoridade constituída ou funcionário público que, no desempenho de suas funções, tiver conhecimento de um crime ou ofensa, é obrigado a notificar a Promotoria Pública imediatamente, transmitindo-lhe todas as informações, minutas e procedimentos relativos ao caso”.
FALTA PROTEÇÃO A TESTEMUNHAS
Da mesma forma, raramente se vêem trabalhadores de empresas privadas denunciando atos de corrupção. Falta a figura da delação premiada para isentar de processo quem apresentar provas e proteção legal suficiente para testemunhas de acusação.
Outra legislação foi introduzida pelo Conselho da Europa, que reúne todos os partidos democráticos do continente, sendo portanto maior do que a União Européia. A França aderiu à Convenção sobre Direito Penal e à Convenção sobre Direito Civil, ratificadas pelo parlamento no ano passado.
“A principal característica da Convenção sobre Direito Penal é sua amplitude”, explicou o embaixador francês. “Ela cobre os vários aspectos que a corrupção pode assumir, passiva ou ativa, nos setores público e privado. Também exige que os países signatários a penalizar o tráfico de influência, a lavagem de dinheiro e os crimes contábeis”.
As convenções discutidas até aqui são européias. A primeira tentativa de criar uma lei universal, feita pelas Nações Unidas, levou à assinatura da Convenção contra o Crime Organizado Transacional em Palermo, na Itália, em dezembro de 2000.
O debate foi quente, com os países ricos alegando que a corrupção é uma das causas do subdesenvolvimento, e os pobres que o dinheiro sai das empresas dos países ricos e geralmente volta para seus bancos.
A Convenção contra o Crime Organizado Transnacional criminalizou a corrupção ativa e passiva mas a ONU começou a discutir uma convenção específica para a corrupção, aprovada pela Assembléia Geral em outubro de 2003 e já ratificada pelo Brasil.
Esta nova convenção, a Convenção de Mérida, prevê, pela primeira vez no Direito Internacional, a recuperação dos ativos e a adoção de mecanismos de prevenção para fortalecer os Estados democráticos e criar uma cultura anticorrupção.
A transparência do financiamento dos partidos políticos é considerada essencial.
Há “uma lista de atos ilícitos de criminalização obrigatória, a corrupção passiva e ativa de funcionários públicos nacionais, estrangeiros ou internacionais para obter contratos ou vantagens indevidas em atividades associadas ao comércio internacional, malversação de dinheiro público, lavagem de dinheiro do crime organizado, obstrução de justiça, tráfico de influência, corrupção e roubo de propriedade no setor privado, enriquecimento ilícito, abuso de função ou lucrar com abuso de função”, enumera Jean-Pierre Vidon.
O embaixador citou ainda o Compacto Global, uma iniciativa das Nações Unidas para convocar as empresas a contribuir, ao lado da ONU, dos governos e da sociedade civil para uma globalização não-excludente. Um de seus 10 princípios é: “As empresas devem trabalhar contra a corrupção em todas as formas, inclusive extorsão e suborno”.
Bulgária e Romênia entram na UE em 2007
A União Européia deu sinal verde ontem ao ingresso da Bulgária e da Romênia, a partir de 1º de janeiro de 2007, mas com as condições mais duras já impostas até hoje e um sinal de que o processo de expansão deve parar por aí por algum tempo.
O presidente da Comissão Européia, o ex-primeiro-ministro português José Manuel Durão Barroso, disse que primeiro deve ser resolvido o problema da Constituição da Europa, rejeitada no ano passado pela França e pela Holanda. Sem uma Constituição, uma Europa de 27 países corre o risco de paralisia adminstrativa.
Diante do temor de uma invasão de trabalhadores da Europa Oriental aceitando salários baixos, aumentou a reação negativa contra a ampliação da UE nos países mais ricos da Europa Ocidental. Só no Reino Unido, há hoje 1 milhão de poloneses. Isto levou o governo britânico a anunciar que os romenos e búlgaros serão submetidos a um "período de transição", ou seja, não poderão emigrar para a Grã-Bretanha assim que se tornarem cidadãos europeus. Na prática, serão cidadãos europeus de segunda classe.
Os dois futuros membros foram duramente criticados por não combater a corrupção, a pirataria e o crime organizado, e por não se prepararem para entrar no sistema de pagamentos da UE, inclusive para receber subsídios e fundos de ajuda estrutural. A Romênia também terá de melhor o tratamento da minoria cigana.
"É um dia histórico para a Romênia", festejou o ministro do Exterior, Miahai Razvan Ungu-reanu. "Mas o objetivo não é só entrar, é se tornar um país como a França ou a Inglaterra".
Já para o primeiro-ministro búlgaro, Sergei Stanishev, "esta foi a genuína e definitiva queda do Muro de Berlim para a Bulgária".
O presidente da Comissão Européia, o ex-primeiro-ministro português José Manuel Durão Barroso, disse que primeiro deve ser resolvido o problema da Constituição da Europa, rejeitada no ano passado pela França e pela Holanda. Sem uma Constituição, uma Europa de 27 países corre o risco de paralisia adminstrativa.
Diante do temor de uma invasão de trabalhadores da Europa Oriental aceitando salários baixos, aumentou a reação negativa contra a ampliação da UE nos países mais ricos da Europa Ocidental. Só no Reino Unido, há hoje 1 milhão de poloneses. Isto levou o governo britânico a anunciar que os romenos e búlgaros serão submetidos a um "período de transição", ou seja, não poderão emigrar para a Grã-Bretanha assim que se tornarem cidadãos europeus. Na prática, serão cidadãos europeus de segunda classe.
Os dois futuros membros foram duramente criticados por não combater a corrupção, a pirataria e o crime organizado, e por não se prepararem para entrar no sistema de pagamentos da UE, inclusive para receber subsídios e fundos de ajuda estrutural. A Romênia também terá de melhor o tratamento da minoria cigana.
"É um dia histórico para a Romênia", festejou o ministro do Exterior, Miahai Razvan Ungu-reanu. "Mas o objetivo não é só entrar, é se tornar um país como a França ou a Inglaterra".
Já para o primeiro-ministro búlgaro, Sergei Stanishev, "esta foi a genuína e definitiva queda do Muro de Berlim para a Bulgária".
terça-feira, 26 de setembro de 2006
Blair se despede do partido e Brown promete continuar sua obra
Depois de 12 anos como líder e nove como primeiro-ministro, Tony Blair fez hoje seu último discurso líder numa convenção nacional do Partido Trabalhista, enquanto o ministro das Finanças e sucessor quase certo, Gordon Brown, posando como futuro primeiro-ministro, falou em tom conciliatório, elogiando "o mais bem-sucedido primeiro-ministro trabalhista britânico".
O partido terá saudade de Blair, o primeiro líder trabalhista a vencer três eleições consecutivas. Afinal, foi ele que acabou com 18 anos de governos conservadores, ocupando o centro do espectro político e empurrando os conservadores de tal modo para a direita que eles se tornaram inelegíveis, como era o Partido Trabalhista no início dos anos 80, na era Margaret Thatcher.
Em tom emocionado, Blair destacou os principais sucessos de seu governo na área social: redução na pobreza de velhos e crianças, salário mínimo, escolas e hospitais bem de finanças, perdão da dívida de países pobres, e o combate à doença e à privação na África - temas importantes para o partido, que rachou em protesto contra seu apoio incondicional às guerras do presidente dos Estados Unidos, George W. Bush, na luta contra o terrorismo. Se não foram grandes sucessos, pelo menos marcaram uma diferença em relação ao neoliberalismo radical dos conservadores, criando a chamada Terceira Via entre o neoliberalismo e a social-democracia clássica.
Foi este apoio a Bush que comprometeu Blair, obrigando-o a sair de cena antes do que gostaria, sob intensa pressão da opinião pública e especialmente da esquerda trabalhista.
Apostando na globalização, Blair e seu chanceler e provável sucessor conseguiram manter a competitividade da economia britânica, hoje a quarta maior do mundo. Sua mensagem de despedida é que o Partido Trabalhista, para se manter no poder, deve prosseguir realizando as reformas necessárias para preparar a Grã-Bretanha a enfrentar os desafios do mundo globalizado.
Depois de lutar furiosamente pelo poder e de encurralar o primeiro-ministro, o que lhe valeu uma crítica da primeira-dama, Cherie Blair, chamando-o de mentiroso, Brown trabalhou na convenção para unir o partido e evitar um desafio sério à sua liderança. Criticando o jovem líder conservador, David Cameron, Brown disse que uma pessoa reservada como ele entrou na política para fazer uma diferença: "Se a política fosse uma questão de imagem ou celebridade, não serviria ao público".
Brown prometeu maior descentralização administrativa, com mais poder para os municípios, e a criação de um fundo de US$ 20 bilhões para ajudar os países pobres a reduzir a emissão dos gases que provocam o aquecimento da Terra.
Mas a ovação a Blair foi tão grande que o primeiro-ministro estaria planejando ficar mais uns nove meses no poder. Brown terá de esperar mais um pouco.
O partido terá saudade de Blair, o primeiro líder trabalhista a vencer três eleições consecutivas. Afinal, foi ele que acabou com 18 anos de governos conservadores, ocupando o centro do espectro político e empurrando os conservadores de tal modo para a direita que eles se tornaram inelegíveis, como era o Partido Trabalhista no início dos anos 80, na era Margaret Thatcher.
Em tom emocionado, Blair destacou os principais sucessos de seu governo na área social: redução na pobreza de velhos e crianças, salário mínimo, escolas e hospitais bem de finanças, perdão da dívida de países pobres, e o combate à doença e à privação na África - temas importantes para o partido, que rachou em protesto contra seu apoio incondicional às guerras do presidente dos Estados Unidos, George W. Bush, na luta contra o terrorismo. Se não foram grandes sucessos, pelo menos marcaram uma diferença em relação ao neoliberalismo radical dos conservadores, criando a chamada Terceira Via entre o neoliberalismo e a social-democracia clássica.
Foi este apoio a Bush que comprometeu Blair, obrigando-o a sair de cena antes do que gostaria, sob intensa pressão da opinião pública e especialmente da esquerda trabalhista.
Apostando na globalização, Blair e seu chanceler e provável sucessor conseguiram manter a competitividade da economia britânica, hoje a quarta maior do mundo. Sua mensagem de despedida é que o Partido Trabalhista, para se manter no poder, deve prosseguir realizando as reformas necessárias para preparar a Grã-Bretanha a enfrentar os desafios do mundo globalizado.
Depois de lutar furiosamente pelo poder e de encurralar o primeiro-ministro, o que lhe valeu uma crítica da primeira-dama, Cherie Blair, chamando-o de mentiroso, Brown trabalhou na convenção para unir o partido e evitar um desafio sério à sua liderança. Criticando o jovem líder conservador, David Cameron, Brown disse que uma pessoa reservada como ele entrou na política para fazer uma diferença: "Se a política fosse uma questão de imagem ou celebridade, não serviria ao público".
Brown prometeu maior descentralização administrativa, com mais poder para os municípios, e a criação de um fundo de US$ 20 bilhões para ajudar os países pobres a reduzir a emissão dos gases que provocam o aquecimento da Terra.
Mas a ovação a Blair foi tão grande que o primeiro-ministro estaria planejando ficar mais uns nove meses no poder. Brown terá de esperar mais um pouco.
Era Koizumi reergueu Japão
O novo líder do Partido Liberal-Democrata, Shinzo Abe, foi eleito hoje novo primeiro-ministro do Japão. Ele substitui Junichiro Koizumi, que governou o país nos últimos cinco anos, conseguindo tirá-lo da estagdeflação que se arrastava há mais de uma década.
Koizumi enfrentou grandes resistências mas suspendeu as obras públicas em que o governo japonês investia numa tentativa de reanimar a economia, atacou o problema da montanha de dívidas pobres do sistema financeiro, conteve o endividamento púiblico e conseguiu recuperar a segunda maior economia do mundo. Contou, para isso, com o extraordinário crescimento econômico da China, vizinha e rival histórica.
Mas as visitas do ex-primeiro-ministro ao santuário de Yasukuni, onde estão enterrados os heróis de guerra japoneses, inclusive 14 notórios criminosos de guerra, prejudicou as relações com a China, invadida pelo Japão durante a Segunda Guerra Mundial. Abe quer melhorar as relações com a China mas não criticou suas visitas ao templo.
Koizumi enfrentou grandes resistências mas suspendeu as obras públicas em que o governo japonês investia numa tentativa de reanimar a economia, atacou o problema da montanha de dívidas pobres do sistema financeiro, conteve o endividamento púiblico e conseguiu recuperar a segunda maior economia do mundo. Contou, para isso, com o extraordinário crescimento econômico da China, vizinha e rival histórica.
Mas as visitas do ex-primeiro-ministro ao santuário de Yasukuni, onde estão enterrados os heróis de guerra japoneses, inclusive 14 notórios criminosos de guerra, prejudicou as relações com a China, invadida pelo Japão durante a Segunda Guerra Mundial. Abe quer melhorar as relações com a China mas não criticou suas visitas ao templo.
segunda-feira, 25 de setembro de 2006
Ben Laden estaria vivo mas doente
O terrorista mais famoso não morreu, Ossama ben Laden, como anunciou um jornal do interior da França na semana passada. Mas estaria mal de saúde, com uma doença contraída por água contaminada nas montanhas entre o Paquistão e o Afeganistão, onde acredita-se que ele esteja refugiado. Ben Laden pode ser tifo ou difteria, o que colocaria sua saúde em alto risco no rigoroso inverno das montanhas. O líder da rede terrorista Al Caeda não divulgou nenhuma mensagem gravada no aniversário dos atentados de 11 de setembro e não aparece em vídeo há dois anos.
A morte de Ben Laden foi anunciada pelo jornal L'Est Républicain, do interior da França, citando como fonte um documento do serviço secreto francês que atribuía a agentes da Arábia Saudita a informação que o líder d'al Caeda morrera em 23 de agosto, de uma febre tifóide que paralisara seus membros inferiores. Os sauditas não confirmaram esta versão mas disseram que Ben Laden está doente.
Ele sofreu ataque de gás dos soviéticos no Afeganistão e sofreria até hoje as conseqüências da arma química.
A morte de Ben Laden foi anunciada pelo jornal L'Est Républicain, do interior da França, citando como fonte um documento do serviço secreto francês que atribuía a agentes da Arábia Saudita a informação que o líder d'al Caeda morrera em 23 de agosto, de uma febre tifóide que paralisara seus membros inferiores. Os sauditas não confirmaram esta versão mas disseram que Ben Laden está doente.
Ele sofreu ataque de gás dos soviéticos no Afeganistão e sofreria até hoje as conseqüências da arma química.
Justiça dos EUA autoriza ação coletiva contra indústria do fumo
Um juiz federal dos Estados Unidos transformou hoje em ação coletiva um pedido de indenização feito em nome de milhões de fumantes que alegam ter sido enganados pela Philip Morris, Reynold American e outras fábricas de cigarros para acreditar que os chamados cigarros 'light' são menos prejudiciais à saúde do que os comuns, quando na realidade o dano é o mesmo. O total de indenizações pode chegar a centenas de bilhões de dólares. Estima-se que a indústria tenha ganho US$ 250 bilhões com os cigarros 'light'.
"Se as alegações são verdadeiras, os acusados participam há 50 anos de uma conspiração ainda em andamento para enganar o público quanto aos riscos de fumar de modo a prevenir uma regulamentação governamental restritiva e promover a venda de cigarros que teriam encalhado se os fumantes começassem a entender a variedade de doenças causadas pelo fumo", sentenciou o juiz Jack Weinstein, no processo iniciado em 2004. Os membros do júri serão selecionados a partir de 22 de janeiro.
A decisão permite que fumantes que compraram cigarros 'light' desde 1971 peçam compensação por danos à saúde.
A indústria do tabaco, que obteve vitórias importantes nos tribunais recentemente, promete recorrer. Em agosto, a juíza Gladys Kessler decidiu que os fabricantes de cigarros enganaram o público sobre os riscos associados ao fumo mas declarou sem autoridade para ordenar o pagamento de compensações financeiras. Ela mandou a indústria parar de usar as palavras 'light' e 'baixos teores'.
Antes, o Tribunal de Justiça da Flórida mantivera a decisão de um tribunal inferior de rejeitar uma indenização de US$ 145 bilhões numa ação coletiva por considerá-la "excessiva". Em dezembro, o Tribunal de Justiça do Estado de Illinois rejeitou uma ação coletiva de US$ 10,1 bilhões sobre cigarros 'light'.
"Se as alegações são verdadeiras, os acusados participam há 50 anos de uma conspiração ainda em andamento para enganar o público quanto aos riscos de fumar de modo a prevenir uma regulamentação governamental restritiva e promover a venda de cigarros que teriam encalhado se os fumantes começassem a entender a variedade de doenças causadas pelo fumo", sentenciou o juiz Jack Weinstein, no processo iniciado em 2004. Os membros do júri serão selecionados a partir de 22 de janeiro.
A decisão permite que fumantes que compraram cigarros 'light' desde 1971 peçam compensação por danos à saúde.
A indústria do tabaco, que obteve vitórias importantes nos tribunais recentemente, promete recorrer. Em agosto, a juíza Gladys Kessler decidiu que os fabricantes de cigarros enganaram o público sobre os riscos associados ao fumo mas declarou sem autoridade para ordenar o pagamento de compensações financeiras. Ela mandou a indústria parar de usar as palavras 'light' e 'baixos teores'.
Antes, o Tribunal de Justiça da Flórida mantivera a decisão de um tribunal inferior de rejeitar uma indenização de US$ 145 bilhões numa ação coletiva por considerá-la "excessiva". Em dezembro, o Tribunal de Justiça do Estado de Illinois rejeitou uma ação coletiva de US$ 10,1 bilhões sobre cigarros 'light'.
Petróleo cai a menos de US$ 60 e OPEP considera corte na produção
Os preços do barril de petróleo bruto caíram abaixo de US$ 60 pela primeira vez em seis meses nesta segunda-feira. A Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep) já estuda a possibilidade de reduzir sua produção para sustentar os preços, que no mês passado chegaram a um recorde de US$ 78,40. O tema está na pauta da próxima reunião ministerial da Opep, marcada para dezembro na Nigéria.
Durante o dia, o petróleo Brent, do Mar do Norte, padrão do mercado europeu, foi vendido a US$ 59,91 o barril na Bolsa Mercantil de Londres. Nos Estados Unidos, o petróleo do Texas caiu a US$ 59,62, subindo depois para US$ 61,45.
Para os analistas, não há mais tanto risco de uma operação militar dos EUA contra o programa nuclear iraniano. Com menor risco geopolítico, a economia americana em desaceleração e a China querendo esfriar a sua, diminui a pressão da demanda.
Além do mais, os preços elevados provocavam especulação no mercado de petróleo. Com a expectativa de queda nos preços, os hedge funds e outros grandes investidores reduziram o peso das commodities nas suas carteiras de investimento.
A demanda continuará aquecida por causa do extraordinário crescimento econômico da China e da Índia. Mas pode ser que os preços dêem uma trégua. De qualquer maneira, o mercado está aberto para fontes alternativas de energia aos combustíveis, como álcool e biodiesel, em que o Brasil tem vantagens competitivas importantes.
Durante o dia, o petróleo Brent, do Mar do Norte, padrão do mercado europeu, foi vendido a US$ 59,91 o barril na Bolsa Mercantil de Londres. Nos Estados Unidos, o petróleo do Texas caiu a US$ 59,62, subindo depois para US$ 61,45.
Para os analistas, não há mais tanto risco de uma operação militar dos EUA contra o programa nuclear iraniano. Com menor risco geopolítico, a economia americana em desaceleração e a China querendo esfriar a sua, diminui a pressão da demanda.
Além do mais, os preços elevados provocavam especulação no mercado de petróleo. Com a expectativa de queda nos preços, os hedge funds e outros grandes investidores reduziram o peso das commodities nas suas carteiras de investimento.
A demanda continuará aquecida por causa do extraordinário crescimento econômico da China e da Índia. Mas pode ser que os preços dêem uma trégua. De qualquer maneira, o mercado está aberto para fontes alternativas de energia aos combustíveis, como álcool e biodiesel, em que o Brasil tem vantagens competitivas importantes.
Invasão do Iraque aumentou ameaça terrorista
A invasão e ocupação do Iraque são o principal motivo para difusão da ideologia jihadista. Produziram uma nova geração de guerrilheiros fundamentalistas muçulmanos, afirmou neste domingo o jornal americano The New York Times, com base num relatório elaborado por 16 serviços secretos do governo dos Estados Unidos.
O documento Tendências do Terrorismo Verbal - implicações para os EUA, de 30 páginas, sugere que a guerra no Iraque provocou uma metástase e o jihadiismo espalhou-se como um câncer pelo mundo muçulmano e pela Europa. A Internet, que hoje tem mais de 5 mil sítios dedicados ao fundamentalismo muçulmano, também se tornou um instrumento importante na 'guerra santa' dos radicais islâmicos.
O documento Tendências do Terrorismo Verbal - implicações para os EUA, de 30 páginas, sugere que a guerra no Iraque provocou uma metástase e o jihadiismo espalhou-se como um câncer pelo mundo muçulmano e pela Europa. A Internet, que hoje tem mais de 5 mil sítios dedicados ao fundamentalismo muçulmano, também se tornou um instrumento importante na 'guerra santa' dos radicais islâmicos.
sábado, 23 de setembro de 2006
Bomba mata 34 em bairro xiita de Bagdá
Uma bomba que explodiu junto a um caminhão-tanque que distribuía querosene para uso doméstico matou pelo menos 34 pessoas hoje em Cidade Sader, um bairro xiita da periferia da capital do Iraque, no primeiro dia de jejum do mês de Ramadã, sagrado para os muçulmanos. O bairro, de 2 milhões de habitantes, é a principal base de poder do aiatolá rebelde Muktada al-Sader, líder de uma milícia de 10 mil homens, o Exército Mehdi.
"Esta operação é uma resposta aos crimes do Exército Mehdi contra nossos irmãos sunitas em Bagdá", declarou o grupo Jamaat Jund al-Sahaba (Soldados dos Companheiros do Profeta). "Nossas espadas podem ir fundo nas vossas áreas, então parem de matar sunitas desarmados".
Três soldados americanos foram mortos por bombas detonadas à beira da estradas, em Bagdá e na violenta cidade de Kirkuk, na região curda, disputada entre sunitas e curdos. Um civil americano que trabalhava para o Departamento de Estado e um soldados dinamarquês foram mortos no Sul, nos arredores da cidade de Bássora.
"Esta operação é uma resposta aos crimes do Exército Mehdi contra nossos irmãos sunitas em Bagdá", declarou o grupo Jamaat Jund al-Sahaba (Soldados dos Companheiros do Profeta). "Nossas espadas podem ir fundo nas vossas áreas, então parem de matar sunitas desarmados".
Três soldados americanos foram mortos por bombas detonadas à beira da estradas, em Bagdá e na violenta cidade de Kirkuk, na região curda, disputada entre sunitas e curdos. Um civil americano que trabalhava para o Departamento de Estado e um soldados dinamarquês foram mortos no Sul, nos arredores da cidade de Bássora.
Hesbolá não entrega armas e Hamas não reconhece Israel
Diante de 800 mil pessoas, durante uma grande manifestação de massa em Beirute, num desafio às potências ocidentais, o líder da milícia fundamentalista xiita Hesbolá (Partido de Deus), xeque Hassan Nasrallah, rejeitou qualquer possibilidade de desarmar o grupo: "Nenhum exército do mundo será capaz de desmantelar nossa resistência. Nenhum exército do mundo será capaz de tirar as armas de nossas mãos."
Quando a Síria retirou suas forças do Líbano, no ano passado, depois de ocupar parcialmente o país vizinho durante 29 anos, o Conselho de Segurança das Nações Unidas aprovou uma resolução exigindo o desarmamento de todas as milícias. Agora que a força de paz da ONU no Líbano foi reforçada, depois de 34 dias de guerra entre Israel e o Hesbolá, para que o Exército do Líbano assuma o controle sobre o Sul do país, seria natural que tentasse cumprir a decisão de desarmar a milícia xiita.
Este é o grande problema. O Hesbolá nasceu como reação à invasão israelense ao Líbano em 1982. Seus atentados suicidas mataram 241 fuzileiros navais americanos e 58 soldados franceses, em 1983. Outras ações levaram Israel a sair do Líbano em 1985, menos de uma zona de segurança no Sul do país.
Em 2000, o então primeiro-ministro Ehud Barak decidiu realizar uma retirada unilateral do Sul do Líbano. Como o Exército libanês não estendeu sua autoridade até a região, o Hesbolá se tornou a força dominante e usou a área como base para atacar Israel.
Por outro lado, o primeiro-ministro palestino Ismail Haniyeh negou que o Movimento de Resistência Islâmica (Hamas) vá reconhecer Israel. Haniyeh negociou com o presidente da Autoridade Nacional Palestina, Mahmoud Abbas, a formação de um governo de união nacional e quer retomar as negociações com Israel. Mas o Estado judaico exige o reconhecimento como precondição para negociar com o Hamas.
O impasse continua. Isto não impede que Abbas mantenha contatos com Israel. Mas enfraquece sua posição negociadora.
Quando a Síria retirou suas forças do Líbano, no ano passado, depois de ocupar parcialmente o país vizinho durante 29 anos, o Conselho de Segurança das Nações Unidas aprovou uma resolução exigindo o desarmamento de todas as milícias. Agora que a força de paz da ONU no Líbano foi reforçada, depois de 34 dias de guerra entre Israel e o Hesbolá, para que o Exército do Líbano assuma o controle sobre o Sul do país, seria natural que tentasse cumprir a decisão de desarmar a milícia xiita.
Este é o grande problema. O Hesbolá nasceu como reação à invasão israelense ao Líbano em 1982. Seus atentados suicidas mataram 241 fuzileiros navais americanos e 58 soldados franceses, em 1983. Outras ações levaram Israel a sair do Líbano em 1985, menos de uma zona de segurança no Sul do país.
Em 2000, o então primeiro-ministro Ehud Barak decidiu realizar uma retirada unilateral do Sul do Líbano. Como o Exército libanês não estendeu sua autoridade até a região, o Hesbolá se tornou a força dominante e usou a área como base para atacar Israel.
Por outro lado, o primeiro-ministro palestino Ismail Haniyeh negou que o Movimento de Resistência Islâmica (Hamas) vá reconhecer Israel. Haniyeh negociou com o presidente da Autoridade Nacional Palestina, Mahmoud Abbas, a formação de um governo de união nacional e quer retomar as negociações com Israel. Mas o Estado judaico exige o reconhecimento como precondição para negociar com o Hamas.
O impasse continua. Isto não impede que Abbas mantenha contatos com Israel. Mas enfraquece sua posição negociadora.
Gasto com armas supera 15 vezes ajuda internacional a países pobres
O total de gastos militares este ano no mundo deve chegar a US$ 1,07 trilhão, mais do que durante a Guerra Fria, superando em 15 vezes o total da ajuda internacional a países pobres, informa a organização não-governamental Intermón-Oxfam. De 2000 a 2004, os lucros da indústria armamentista aumentaram 70%.
A cada minuto, morre uma pessoa atingida por arma de fogo no mundo. Na maioria dos casos, "as armas estão nas mãos de forças irregulares".
Ao mesmo tempo em que estas armas alimentam conflitos ao redor do planeta, são a principal causa da fome: 35% das emergências alimentares ocorridas nos últimos anos foram provocadas por guerras.
A diretora geral da Intermón-Oxfam, Arian Arpa, responsabilizou os governos das potências ocidentais "que permitem que os fabricantes de armas aumentem constantemente suas vendas". Ela apelou para que as Nações Unidas negociem um acordo internacional para controlar o tráfico de armas: "O problema é que estas armas estão nas mãos de quem não deveriam; deveriam estar sob o controle de forças regulares de Estados democráticos".
Há poucos anos, os Estados Unidos vetaram um tratado para controlar o tráfico de armas leves alegando que poderia ser usado para negar o direito de portar armas previsto na Constituição americana.
A cada minuto, morre uma pessoa atingida por arma de fogo no mundo. Na maioria dos casos, "as armas estão nas mãos de forças irregulares".
Ao mesmo tempo em que estas armas alimentam conflitos ao redor do planeta, são a principal causa da fome: 35% das emergências alimentares ocorridas nos últimos anos foram provocadas por guerras.
A diretora geral da Intermón-Oxfam, Arian Arpa, responsabilizou os governos das potências ocidentais "que permitem que os fabricantes de armas aumentem constantemente suas vendas". Ela apelou para que as Nações Unidas negociem um acordo internacional para controlar o tráfico de armas: "O problema é que estas armas estão nas mãos de quem não deveriam; deveriam estar sob o controle de forças regulares de Estados democráticos".
Há poucos anos, os Estados Unidos vetaram um tratado para controlar o tráfico de armas leves alegando que poderia ser usado para negar o direito de portar armas previsto na Constituição americana.
Chávez promove livro de Chomsky
Em seu discurso agressivo contra o presidente George W. Bush na Assembléia Geral da ONU, o caudilho venezuelano Hugo Chávez puxou um livro do lingüista americano Noam Chomsky, professor do Instituto de Tecnologia de Massachusetts. Recomendou a todos que lessem 'Hegemonia e Sobrevivência: a luta dos EUA pela dominação global' para "entender o que está acontecendo no mundo do século 21".
Resultado: as vendas disparam. Na loja virtual Amazon.com, o livro passou do 160.722º para o sétimo lugar.
Resultado: as vendas disparam. Na loja virtual Amazon.com, o livro passou do 160.722º para o sétimo lugar.
sexta-feira, 22 de setembro de 2006
Tailândia proíbe partidos políticos
A junta militar que deu um golpe na Tailândia em 19 de setembro proibiu ontem a atividade política no país mas prometeu realizar eleições daqui a um ano. Quatro ministros do governo do primeiro-ministro deposto, Thaksin Shinawatra, foram presos. O líder do golpe, general Sonthi Boonyaratglin, comandante do Exército, prometera devolver o poder aos civis rapidamente.
O ex-primeiro-ministro, que participava da Assembléia Geral das Nações Unidas, em Nova Iorque, quando os militares tomaram o poder em Bangcoc, está em Londres, onde pediu a realização imediata de novas eleições.
"Para garantir o funcionamento da monarquia constitucional até que as reformas tenham sido completadas, o Conselho da Reforma Política ordena todos os partidos políticos a suspender todas as reuniões e atividades políticas", disse a nota oficial.
Nesta sexta-feira, o jornal tailandês The Nation informa que os militares criaram um comitê formado por dois juízes e um ex-presidente do banco central para investigar as atividades econômicas de Thaksin e outros 15 membros de seu gabinete.
O ex-primeiro-ministro, que participava da Assembléia Geral das Nações Unidas, em Nova Iorque, quando os militares tomaram o poder em Bangcoc, está em Londres, onde pediu a realização imediata de novas eleições.
"Para garantir o funcionamento da monarquia constitucional até que as reformas tenham sido completadas, o Conselho da Reforma Política ordena todos os partidos políticos a suspender todas as reuniões e atividades políticas", disse a nota oficial.
Nesta sexta-feira, o jornal tailandês The Nation informa que os militares criaram um comitê formado por dois juízes e um ex-presidente do banco central para investigar as atividades econômicas de Thaksin e outros 15 membros de seu gabinete.
quinta-feira, 21 de setembro de 2006
Califórnia processa indústria automobilística
Num processo sem precedentes, o governo do estado da Califórnia, nos Estados Unidos, está acusando as fábricas de automóveis pelo aumento da concentração de gás carbônico na atmosfera, o que provoca o efeito-estufa e o aquecimento da Terra. A ação exige bilhões de dólares em indenizações.
O secretário estadual de Justiça, Bill Lockyer, iniciou ontem a ação contra seis empresas, General Motors, Chrysler, Ford, Toyota, Honda e Nissan, denunciando-as pela "emissão maciça de gás carbônico e assim contribuir para o aumento da concentração deste gás na atmosfera. As emissões dos veículos destas companhias são responsáveis por cerca de 9% das emissões de gás carbônico do mundo e de 30% na Califórnia". O estado tem 35 milhões de habitantes e 32 milhões de carros registrados.
A poluição causada pelos automóveis, continua a denúncia, "reduz a quantidade de neve no estado, uma importante fonte de água doce, eleva o nível dos mares, agrava a poluição do ar pelo ozônio nas cidades e aumenta o risco de incêndios florestais".
O secretário estadual de Justiça, Bill Lockyer, iniciou ontem a ação contra seis empresas, General Motors, Chrysler, Ford, Toyota, Honda e Nissan, denunciando-as pela "emissão maciça de gás carbônico e assim contribuir para o aumento da concentração deste gás na atmosfera. As emissões dos veículos destas companhias são responsáveis por cerca de 9% das emissões de gás carbônico do mundo e de 30% na Califórnia". O estado tem 35 milhões de habitantes e 32 milhões de carros registrados.
A poluição causada pelos automóveis, continua a denúncia, "reduz a quantidade de neve no estado, uma importante fonte de água doce, eleva o nível dos mares, agrava a poluição do ar pelo ozônio nas cidades e aumenta o risco de incêndios florestais".
CIA forçou Bush a acabar com prisões secretas
O presidente George W. Bush foi obrigado a admitir a existência de prisões secretas para os suspeitos detidos na luta contra o terrorismo porque os interrogadores da CIA (Agência Central de Inteligência), o serviço de espionagem dos Estados Unidos, negaram-se a continuar trabalhando em prisões secretas, revela hoje o jornal inglês Financial Times.
Quando Bush fez o anúncio de que todos os prisioneiros da guerra contra o terror seriam tratados de acordo com as Convenções de Genebra, dias antes do quinto aniversário dos atentados de 11 de setembro, parecia estar tentando retomar a iniciativa política tendo em vista as eleições parlamentares de 7 de novembro e se adaptar às decisões da Suprema Corte. Mas altos funcionários da CIA disseram ao FT que o verdadeiro motivo foi a recusa dos agentes de continuar trabalhando em condições que pudessem justificar processos por tortura.
John Bellinger, assessor jurídico do Departamento de Estado, revelou que houve "muito pouca atividade operacional" desde a aprovação, em dezembro do ano passado, de um projeto do senador republicano John McCain proibindo a tortura e o tratamento desumano de presos. McCain foi prisioneiro de guerra no Vietnã e sempre insistiu que as leis de existem para proteger todos os combatentes, inclusive os soldados americanos.
Os 14 suspeitos que devem ser processados como líderes da Caeda, inclusive Khaled Cheikh Mohamed, considerado o arquiteto dos atentados de 11 de setembro, passaram até três anos e meio em prisões clandestinas até serem transferidos recentemente para o centro de detenção instalado na base naval de Guantânamo, um enclave americano em Cuba.
Quando Bush fez o anúncio de que todos os prisioneiros da guerra contra o terror seriam tratados de acordo com as Convenções de Genebra, dias antes do quinto aniversário dos atentados de 11 de setembro, parecia estar tentando retomar a iniciativa política tendo em vista as eleições parlamentares de 7 de novembro e se adaptar às decisões da Suprema Corte. Mas altos funcionários da CIA disseram ao FT que o verdadeiro motivo foi a recusa dos agentes de continuar trabalhando em condições que pudessem justificar processos por tortura.
John Bellinger, assessor jurídico do Departamento de Estado, revelou que houve "muito pouca atividade operacional" desde a aprovação, em dezembro do ano passado, de um projeto do senador republicano John McCain proibindo a tortura e o tratamento desumano de presos. McCain foi prisioneiro de guerra no Vietnã e sempre insistiu que as leis de existem para proteger todos os combatentes, inclusive os soldados americanos.
Os 14 suspeitos que devem ser processados como líderes da Caeda, inclusive Khaled Cheikh Mohamed, considerado o arquiteto dos atentados de 11 de setembro, passaram até três anos e meio em prisões clandestinas até serem transferidos recentemente para o centro de detenção instalado na base naval de Guantânamo, um enclave americano em Cuba.
Integração regional vive crise profunda
O processo de integração regional da América do Sul vive uma profunda crise. Os superávits comerciais que o Brasil tem com os países vizinhos reforçam a impressão de que o país é o grande beneficiário. Isto leva outros países da região a negociar acordos com os Estados Unidos na busca de um aumento maior do volume de comércio e de investimentos. O Mercosul fracassou, ao não mediar a ‘guerra das papeleiras’ entre Argentina e Uruguai, em parte por causa de sua baixa institucionalização. A nacionalização do petróleo e do gás na Bolívia incentivou os nacionalismos. E a entrada da Venezuela sob a presidência de Hugo Chávez não facilita esta institucionalização e ainda complica as negociações externas do bloco comercial.
Estas foram algumas das questões levantadas na mesa-redonda Desafios da Integração no Hesmifério: Mercosul, Comunidade Andina (CAN), Comunidade Sul-Americana de Nações (Casa), Nafta e ALCA, que encerrou o 3º Curso de Comércio e Negociações Internacionais para Jornalistas realizado no Rio de Janeiro pelo Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri) e o Instituto de Estudos de Comércio e Negociações Internacionais (Ícone).
Se o Uruguai fechar um acordo preferencial de comércio com os EUA, como quer o governo Tabaré Vasquez, “a primeira vitima seria a negociação União Européia-Mercosul e a segunda o próprio Mercosul”, analisou o economista Roberto Fendt, diretor de várias empresas e associações empresariais, e professor do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre-FGV).
Fendt era diretor da extinta Carteira de Comércio Exterior do Banco do Brasil (Cacex) quando Brasil e Argentina começaram o processo de integração, em 1985. Na época, havia duas preocupações:
- aumentar o volume de trocas
- e uma preocupação com segurança, que levou ao acordo nuclear.
“O Uruguai já foi parte do Brasil e o Paraguai recebeu o maior investimento do Brasil no exterior”, observou o professor. “Com o Mercosul, os países imaginavam ter acesso a mercados maiores que, crescendo, atuariam como locomotivas da integração”.
Ele constata que “o comércio cresceu mas houve problemas, como a falta de convergência macroeconômica e das políticas cambiais, que levaram a situações esdrúxulas”, com a desvalorização do real, em 1999, e o colapso da paridade dólar-peso na Argentina, em 2001.
A realidade hoje é que a África cresceu 5% ao ano nos últimos três anos, enquanto a América Latina, de modo geral, apresenta taxas de crescimento medíocres. E a percepção no subcontinente é que “o Brasil não pensa no desenvolvimento dos países vizinhos”.
Passados quinze anos da assinatura do Tratado de Assunção, que criou o Mercosul em 26 de março de 1991, “os uruguaios e também os paraguaios pensam nas vantagens de fazer acordos com os EUA.”.
Seria um duro golpe, comenta Fendt: “Não vejo como aprofundar o Mercosul, se o Uruguai fizer um acordo com os EUA”.
Por outro lado, “a consolidação da democracia no Cone Sul da América Latina torna o Mercosul [que evitou pelo menos três golpes de Estado no Paraguai] menos importante neste aspecto”, raciocina o professor.
No resto da América Latina, nota ele, “há uma profunda divisão em alguns países, como revelam os resultados das eleições na Bolívia, no Peru e no México”.
A entrada de Chávez no Mercosul “não ajuda a melhorar nossos problemas. Não estou dizendo que as coisas são piorar sistematicamente. Mas não estou dizendo que vão melhorar”, argumenta Fendt. “Não podemos fugir da realidade da formação de blocos regionais. Acredito que a razão no final prevalece. Há um grande volume de criação de comércio”.
Estas foram algumas das questões levantadas na mesa-redonda Desafios da Integração no Hesmifério: Mercosul, Comunidade Andina (CAN), Comunidade Sul-Americana de Nações (Casa), Nafta e ALCA, que encerrou o 3º Curso de Comércio e Negociações Internacionais para Jornalistas realizado no Rio de Janeiro pelo Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri) e o Instituto de Estudos de Comércio e Negociações Internacionais (Ícone).
Se o Uruguai fechar um acordo preferencial de comércio com os EUA, como quer o governo Tabaré Vasquez, “a primeira vitima seria a negociação União Européia-Mercosul e a segunda o próprio Mercosul”, analisou o economista Roberto Fendt, diretor de várias empresas e associações empresariais, e professor do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre-FGV).
Fendt era diretor da extinta Carteira de Comércio Exterior do Banco do Brasil (Cacex) quando Brasil e Argentina começaram o processo de integração, em 1985. Na época, havia duas preocupações:
- aumentar o volume de trocas
- e uma preocupação com segurança, que levou ao acordo nuclear.
“O Uruguai já foi parte do Brasil e o Paraguai recebeu o maior investimento do Brasil no exterior”, observou o professor. “Com o Mercosul, os países imaginavam ter acesso a mercados maiores que, crescendo, atuariam como locomotivas da integração”.
Ele constata que “o comércio cresceu mas houve problemas, como a falta de convergência macroeconômica e das políticas cambiais, que levaram a situações esdrúxulas”, com a desvalorização do real, em 1999, e o colapso da paridade dólar-peso na Argentina, em 2001.
A realidade hoje é que a África cresceu 5% ao ano nos últimos três anos, enquanto a América Latina, de modo geral, apresenta taxas de crescimento medíocres. E a percepção no subcontinente é que “o Brasil não pensa no desenvolvimento dos países vizinhos”.
Passados quinze anos da assinatura do Tratado de Assunção, que criou o Mercosul em 26 de março de 1991, “os uruguaios e também os paraguaios pensam nas vantagens de fazer acordos com os EUA.”.
Seria um duro golpe, comenta Fendt: “Não vejo como aprofundar o Mercosul, se o Uruguai fizer um acordo com os EUA”.
Por outro lado, “a consolidação da democracia no Cone Sul da América Latina torna o Mercosul [que evitou pelo menos três golpes de Estado no Paraguai] menos importante neste aspecto”, raciocina o professor.
No resto da América Latina, nota ele, “há uma profunda divisão em alguns países, como revelam os resultados das eleições na Bolívia, no Peru e no México”.
A entrada de Chávez no Mercosul “não ajuda a melhorar nossos problemas. Não estou dizendo que as coisas são piorar sistematicamente. Mas não estou dizendo que vão melhorar”, argumenta Fendt. “Não podemos fugir da realidade da formação de blocos regionais. Acredito que a razão no final prevalece. Há um grande volume de criação de comércio”.
Sócios acham que Mercosul só beneficia Brasil
O maior risco para a integração regional é a fragmentação da América do Sul, com um ressurgimento do nacionalismo, porque os países sul-americanos têm propostas diferentes de inserção internacional, declarou a economista Lucia Maduro, pesquisadora da Confederação Nacional da Indústria (CNI), ao falar dos desafios do Mercosulno encerramento do 3º Curso de Comércio e Negociações Internacionais para jornalistas. Ela afirmou que os sócios têm a percepção de que só o Brasil se beneficia com o bloco.
No governo Lula, Lucia diz que as ações concretas em relação ao Mercosul seguem quatro orientações:
- retomar os entendimentos na formulação e coordenação de políticas,
- administrar as demandas dos sócios,
- institucionalizar o bloco
- e o alargamento, com a entrada da Venezuela.
Com o relançamento do Mercosul em 2000, depois da crise provocada pela desvalorização do real em janeiro de 1999, surgiu a chamada Agenda de Las Leñas. Na reunião de cúpula de Florianópolis, são estabelecidos princípios e metas para a coordenação macroeconômica.
Mas o bloco tem sérios problemas, adverte Lucia Maduro: “Se estamos falando de união aduaneira, é preciso harmonizar os regimes de importação, trabalhar para acabar com a bitributação da tarifa externa comum. Um produto paga tarifa quando entra de fora do bloco e paga de novo ao cruzar fronteiras dentro do bloco. A união aduaneira e a área de livre comércio são fictícias O Merocsul vai trabalhar no livre comércio? Ou continuar a integração na união aduaneira?”
Na opinião de Lúcia, “a percepção dos sócios é a apropriação dos benefícios é brasileira. O Brasil tem superávits muito expressivos com os sócios. Mas ao mesmo tempo as exportações brasileiras cresceram tanto que o Mercosul perde peso relativo para o Brasil. Para a Argentina, sim, o Brasil é um mercado muito expressivo”.
O presidente do Cebri, embaixador José Botafogo Gonçalves, observou que “os sócios menores entendem que o Mercosul beneficiou mais ao Brasil, mas a Argentina aproveita para se reindustrializar.
Ao contrário do que aconteceu na Europa, onde por sinal a Alemanha representa 30% do produto regional bruto, “o Brasil não dispõe dos recursos de que a Alemanha dispõe. A renda per capita do Brasil ainda é inferior à do Uruguai”, compara a economista.
Sob pressão argentina, foi negociado o Mecanismo de Adaptação Competitiva: “A CNI era contra. Virou um protocolo adicional a acordos da Aladi (Associação Latino-Americana de integração). As empresas precisam comprovar dano. O MAC nunca foi utilizado”.
Lúcia destacou avanços como o Fundo de Convergência Estrutural, “ainda irrelevante em termos de recursos mas é um embrião importante”. Inicialmente os recursos serão aplicados em infra-estrutura.
Outro progresso foi a criação do Parlamento do Mercosul, aprovada em dezembro do ano passado. “Como fazer união aduaneira sem código aduaneiro comum?”, pergunta a economista da CNI. “É preciso trabalhar para melhorar as normas. O Parlamento deve ajudar.”
Quanto à Venezuela, Lucia Maduro entende que tem interesses geoestratégicos, políticos e econômicos: “A integração energética e de infra-estrutura não depende do Mercosul. Para isso, não haveria necessidade de adesão da Venezuela”.
Ela explica que o comércio de energia funciona na base da oferta e da procura, e teme pela complexidade da agenda externa do Mercosul, sobretudo nas relações com os EUA: “A indústria se preocupa mais com os EUA do que com a UE”.
No governo Lula, Lucia diz que as ações concretas em relação ao Mercosul seguem quatro orientações:
- retomar os entendimentos na formulação e coordenação de políticas,
- administrar as demandas dos sócios,
- institucionalizar o bloco
- e o alargamento, com a entrada da Venezuela.
Com o relançamento do Mercosul em 2000, depois da crise provocada pela desvalorização do real em janeiro de 1999, surgiu a chamada Agenda de Las Leñas. Na reunião de cúpula de Florianópolis, são estabelecidos princípios e metas para a coordenação macroeconômica.
Mas o bloco tem sérios problemas, adverte Lucia Maduro: “Se estamos falando de união aduaneira, é preciso harmonizar os regimes de importação, trabalhar para acabar com a bitributação da tarifa externa comum. Um produto paga tarifa quando entra de fora do bloco e paga de novo ao cruzar fronteiras dentro do bloco. A união aduaneira e a área de livre comércio são fictícias O Merocsul vai trabalhar no livre comércio? Ou continuar a integração na união aduaneira?”
Na opinião de Lúcia, “a percepção dos sócios é a apropriação dos benefícios é brasileira. O Brasil tem superávits muito expressivos com os sócios. Mas ao mesmo tempo as exportações brasileiras cresceram tanto que o Mercosul perde peso relativo para o Brasil. Para a Argentina, sim, o Brasil é um mercado muito expressivo”.
O presidente do Cebri, embaixador José Botafogo Gonçalves, observou que “os sócios menores entendem que o Mercosul beneficiou mais ao Brasil, mas a Argentina aproveita para se reindustrializar.
Ao contrário do que aconteceu na Europa, onde por sinal a Alemanha representa 30% do produto regional bruto, “o Brasil não dispõe dos recursos de que a Alemanha dispõe. A renda per capita do Brasil ainda é inferior à do Uruguai”, compara a economista.
Sob pressão argentina, foi negociado o Mecanismo de Adaptação Competitiva: “A CNI era contra. Virou um protocolo adicional a acordos da Aladi (Associação Latino-Americana de integração). As empresas precisam comprovar dano. O MAC nunca foi utilizado”.
Lúcia destacou avanços como o Fundo de Convergência Estrutural, “ainda irrelevante em termos de recursos mas é um embrião importante”. Inicialmente os recursos serão aplicados em infra-estrutura.
Outro progresso foi a criação do Parlamento do Mercosul, aprovada em dezembro do ano passado. “Como fazer união aduaneira sem código aduaneiro comum?”, pergunta a economista da CNI. “É preciso trabalhar para melhorar as normas. O Parlamento deve ajudar.”
Quanto à Venezuela, Lucia Maduro entende que tem interesses geoestratégicos, políticos e econômicos: “A integração energética e de infra-estrutura não depende do Mercosul. Para isso, não haveria necessidade de adesão da Venezuela”.
Ela explica que o comércio de energia funciona na base da oferta e da procura, e teme pela complexidade da agenda externa do Mercosul, sobretudo nas relações com os EUA: “A indústria se preocupa mais com os EUA do que com a UE”.
“O setor industrial quer um acordo com os EUA”
Os acordos de comércio internacional são políticos mas a sociedade precisa percebê-los como positivos, afirmou a economista Lia Valls Pereira, pesquisadora do Ibre-FGV e professora da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), na mesa-redonda de encerramento do 3º curso de Comércio e Negociações Internacionais, realizado no Rio pelo Centro Brasileiro de Relações internacionais (Cebri) e o Instituto de Estudos de Negociações e Comércio Internaciona.
“Qualquer acordo é uma administração de comércio”, nota, acrescentando que "o setor industrial quer um acordo com os EUA".
Às vezes, os acordos servem para consolidar reformas, como foi o caso do México ao aderir ao Acordo de Livre Comércio da América do Norte (Nafta).
“Como então avaliar os acordos?”, questiona Lia Valls. “Há criação e desvio de comércio, e os efeitos dinâmicos, como economia de escala, especialização e aumento dos fluxos de investimento”.
O Brasil é o chamado ‘global trader’, seu comércio está bem distribuído por todas as regiões do mundo, sempre uma boa garantia contra crises nacionais:
- UE: 22%
- EUA 19%
- Mercosul: 9%
- Resto da América Latina: 9%
- Ásia: 15%
- China: 6,6% (menos que a Argentina, com 8,9%).
A pauta de exportações varia muito. Para a UE, 47% são produtos primários. Para os países da Aladi, excluindo os sócios do Mercosul, 85% são manufaturados; para o Mercosul, 90%.
“O setor industrial quer um acordo com os EUA”, declara Lia Valls.
Numa breve revisão histórica das iniciativas anteriores de integração sul-americana, a economista citou a criação, em 1969, da Associação Latino-Americana de Livre Comércio (Alalc).
A inspiração vinha da Comunidade Econômica Européia e do pensamento da Comissão Econômica para a América Latina. A proposta era: vamos nos unir e erguer barreiras para o resto do mundo. “Como fazer países com idéias protecionistas negociar a integração?”
Diante do veto dos EUA, que era contra o regionalismo econômico, que implica a imposição de barreiras para produtos do país dominante, só a Comunidade Européia foi em frente na primeira onda de regionalismo. O fim do veto americano vem em 1988, quando americanos e canadenses firmam um acordo de livre comércio. Com déficits comerciais crescentes, os EUA sentiam-se pressionados pela Europa e pelo Japão e tratavam de defender o único mercado onde ainda tinham saldo positivo.
Nos anos 90, há uma nova onda de regionalismo, ou neo-regionalismo. Hoje a Organização Mundial do Comércio registra mais de 300 acordos preferências de comércio adaptados às regras do sistema multilateral de comércio.
Como os países latino-americanos na defensiva desde que o presidente George Bush, pai lançara a Iniciativa para as Américas, em 1990, o governo Itamar Franco propôs, em 1993, a criação de uma Área de Livre Comércio da América do Sul.
Em 1994, na Cúpula das Américas em Miami, foi lançada a Área de Livre Comércio das Américas (Alca). A reação contrária provoca o debate sobre a integração.
Lia considera difícil promover a integração com superávit comercial: “Vendemos produtos industrializados. Compramos produtos minerais”.
O Mercosul foi relançado em 2000 e tem sérios problemas de infra-estrutura: “O custo do transporte atrapalha ao comércio.”
Em 2004, o Mercosul acertou uma integração com a Comunidade Andina para formar a Comunidade Sul-Americana de Nações (Casa). Para Lia Valls, foi “mais uma jogada política com pouca substância”.
O Brasil perde com os acordos bilaterais firmados com os EUA por outros países da região, como Chile, Peru, Equador, Colômbia e Venezuela. “Mas a realidade é que o Brasil pode fazer acordo com a CAN sem mudar sua política comercial. Com os EUA, é diferente.”
Na condição de debatedor, o economista Túlio Duran, comentou que um dos grandes problemas da integração regional na América é a assimetria, as diferenças de poder entre os países, a começar pelos EUA. Mas é ingenuidade supor que, excluídos os EUA, os outros têm alguma simetria: “O Paraguai tem o tamanho do Japão e a população do Rio. O patrimônio da Eletropaulo é igual ao de todo o sistema elétrico do Chile”.
Sem saída para o mar, a Bolívia e o Paraguai têm custos de transporte 60% maiores.
Além disso, só Uruguai e Brasil não têm problemas de fronteira. E só o Chile merece grau de investimento das agências de classificação de risco.
“Qualquer acordo é uma administração de comércio”, nota, acrescentando que "o setor industrial quer um acordo com os EUA".
Às vezes, os acordos servem para consolidar reformas, como foi o caso do México ao aderir ao Acordo de Livre Comércio da América do Norte (Nafta).
“Como então avaliar os acordos?”, questiona Lia Valls. “Há criação e desvio de comércio, e os efeitos dinâmicos, como economia de escala, especialização e aumento dos fluxos de investimento”.
O Brasil é o chamado ‘global trader’, seu comércio está bem distribuído por todas as regiões do mundo, sempre uma boa garantia contra crises nacionais:
- UE: 22%
- EUA 19%
- Mercosul: 9%
- Resto da América Latina: 9%
- Ásia: 15%
- China: 6,6% (menos que a Argentina, com 8,9%).
A pauta de exportações varia muito. Para a UE, 47% são produtos primários. Para os países da Aladi, excluindo os sócios do Mercosul, 85% são manufaturados; para o Mercosul, 90%.
“O setor industrial quer um acordo com os EUA”, declara Lia Valls.
Numa breve revisão histórica das iniciativas anteriores de integração sul-americana, a economista citou a criação, em 1969, da Associação Latino-Americana de Livre Comércio (Alalc).
A inspiração vinha da Comunidade Econômica Européia e do pensamento da Comissão Econômica para a América Latina. A proposta era: vamos nos unir e erguer barreiras para o resto do mundo. “Como fazer países com idéias protecionistas negociar a integração?”
Diante do veto dos EUA, que era contra o regionalismo econômico, que implica a imposição de barreiras para produtos do país dominante, só a Comunidade Européia foi em frente na primeira onda de regionalismo. O fim do veto americano vem em 1988, quando americanos e canadenses firmam um acordo de livre comércio. Com déficits comerciais crescentes, os EUA sentiam-se pressionados pela Europa e pelo Japão e tratavam de defender o único mercado onde ainda tinham saldo positivo.
Nos anos 90, há uma nova onda de regionalismo, ou neo-regionalismo. Hoje a Organização Mundial do Comércio registra mais de 300 acordos preferências de comércio adaptados às regras do sistema multilateral de comércio.
Como os países latino-americanos na defensiva desde que o presidente George Bush, pai lançara a Iniciativa para as Américas, em 1990, o governo Itamar Franco propôs, em 1993, a criação de uma Área de Livre Comércio da América do Sul.
Em 1994, na Cúpula das Américas em Miami, foi lançada a Área de Livre Comércio das Américas (Alca). A reação contrária provoca o debate sobre a integração.
Lia considera difícil promover a integração com superávit comercial: “Vendemos produtos industrializados. Compramos produtos minerais”.
O Mercosul foi relançado em 2000 e tem sérios problemas de infra-estrutura: “O custo do transporte atrapalha ao comércio.”
Em 2004, o Mercosul acertou uma integração com a Comunidade Andina para formar a Comunidade Sul-Americana de Nações (Casa). Para Lia Valls, foi “mais uma jogada política com pouca substância”.
O Brasil perde com os acordos bilaterais firmados com os EUA por outros países da região, como Chile, Peru, Equador, Colômbia e Venezuela. “Mas a realidade é que o Brasil pode fazer acordo com a CAN sem mudar sua política comercial. Com os EUA, é diferente.”
Na condição de debatedor, o economista Túlio Duran, comentou que um dos grandes problemas da integração regional na América é a assimetria, as diferenças de poder entre os países, a começar pelos EUA. Mas é ingenuidade supor que, excluídos os EUA, os outros têm alguma simetria: “O Paraguai tem o tamanho do Japão e a população do Rio. O patrimônio da Eletropaulo é igual ao de todo o sistema elétrico do Chile”.
Sem saída para o mar, a Bolívia e o Paraguai têm custos de transporte 60% maiores.
Além disso, só Uruguai e Brasil não têm problemas de fronteira. E só o Chile merece grau de investimento das agências de classificação de risco.
quarta-feira, 20 de setembro de 2006
Novo líder quer fim de restrições militares ao Japão
O Partido Liberal-Democrata, que governou o Japão quase ininterruptamente desde 1955, acaba de eleger seu novo líder: com 66% dos votos, Shinzo Abe sucede ao primeiro-ministro Junichiro Koizumi. Como o PLD tem maioria no Parlamento, na próxima terça-feira, ele será escolhido novo chefe do governo japonês.
Abe, de 52 anos, será o mais jovem primeiro-ministro japonês depois da Segunda Guerra Mundial. Ele não tem grande experiência administrativa. Foi apenas chefe do Gabinete, cargo que mistura as funções de porta-voz e chefe da Casa Civil, durante menos de um ano. Tornou-se popular ao negociar a libertação de japoneses seqüestrados pela Coréia do Norte, quando conquistou a fama de grande defensor dos interesses nacionais.
Uma de suas propostas é acabar com as restrições do artigo 9 da Constituição do Japão, imposta pelos EUA, que proíbe o país de realizar operações militares ofensivas. Diante da ameaça dos mísseis e do programa nuclear da Coréia do Norte, Abe quer que o Japão tenha o direito de fazer ataques preventivos.
Na política interna, Abe deve seguir as políticas de Koizumi, que assumiu em 2001 e conseguiu tirar o Japão da crise econômica que misturava deflação e estagnação desde o estouro da bolha especulativa do SuperJapão dos anos 80, em 1991. Koizumi cortou gastos para conter o aumento da dívida pública interna. Privatizou empresas públicas, inclusive o Correio, onde os japoneses depositam uma poupança de US$ 2 trilhões, e demitiu funcionários públicos.
O novo líder promete continuar controlando os gastos públicos e tentando aumentar a arrecadação de impostos através do crescimento econômico: "Não podemos parar com as reformas. Precisamos acelerar as reformas", declarou.
Será difícil substituir Koizumi, que atacou grandes interesses como os do setor financeiro, que resistiam às reformas, prolongando a crise. Mas na política externa, Abe pretende melhorar as relações com a China com a realização de uma reunião de cúpula entre os inimigos históricos do Leste da Ásia.
Koizumi costumava visitar o santuário de Yasukuni, uma homenagem aos heróis de guerra japoneses, no Centro de Tóquio, onde estão enterrados 14 notórios criminosos de guerra da Segunda Guerra Mundial. Cada vez que isto acontecia, havia protestos dos países invadidos pelo Japão no século passado, Coréia, China, Vietnã, Camboja, Indonésia e Malásia.
Ao contrário da Alemanha, o Japão nunca reconheceu seus crimes de guerra nem pediu perdão. Agora que a China se afirma como uma superpotência, a tensão entre os dois países aumenta. Mas eles têm interesses econômicos comuns como nunca. O extraordinário crescimento econômico chinês ajudou a tirar o Japão da crise.
Shinzo Abe pretende realizar um encontro de cúpula com as autoridades chinesas: "É lamentável que não haja encontros de cúpula entre os líderes da China e do Japão".
Calmo e controlado, Abe tem a confiança dos japoneses não apenas para manter a recuperação da economia mas também para melhorar as relações com a China, já que a interação destas duas grandes potências será decisiva para o futuro da região que mais cresce no mundo.
Abe, de 52 anos, será o mais jovem primeiro-ministro japonês depois da Segunda Guerra Mundial. Ele não tem grande experiência administrativa. Foi apenas chefe do Gabinete, cargo que mistura as funções de porta-voz e chefe da Casa Civil, durante menos de um ano. Tornou-se popular ao negociar a libertação de japoneses seqüestrados pela Coréia do Norte, quando conquistou a fama de grande defensor dos interesses nacionais.
Uma de suas propostas é acabar com as restrições do artigo 9 da Constituição do Japão, imposta pelos EUA, que proíbe o país de realizar operações militares ofensivas. Diante da ameaça dos mísseis e do programa nuclear da Coréia do Norte, Abe quer que o Japão tenha o direito de fazer ataques preventivos.
Na política interna, Abe deve seguir as políticas de Koizumi, que assumiu em 2001 e conseguiu tirar o Japão da crise econômica que misturava deflação e estagnação desde o estouro da bolha especulativa do SuperJapão dos anos 80, em 1991. Koizumi cortou gastos para conter o aumento da dívida pública interna. Privatizou empresas públicas, inclusive o Correio, onde os japoneses depositam uma poupança de US$ 2 trilhões, e demitiu funcionários públicos.
O novo líder promete continuar controlando os gastos públicos e tentando aumentar a arrecadação de impostos através do crescimento econômico: "Não podemos parar com as reformas. Precisamos acelerar as reformas", declarou.
Será difícil substituir Koizumi, que atacou grandes interesses como os do setor financeiro, que resistiam às reformas, prolongando a crise. Mas na política externa, Abe pretende melhorar as relações com a China com a realização de uma reunião de cúpula entre os inimigos históricos do Leste da Ásia.
Koizumi costumava visitar o santuário de Yasukuni, uma homenagem aos heróis de guerra japoneses, no Centro de Tóquio, onde estão enterrados 14 notórios criminosos de guerra da Segunda Guerra Mundial. Cada vez que isto acontecia, havia protestos dos países invadidos pelo Japão no século passado, Coréia, China, Vietnã, Camboja, Indonésia e Malásia.
Ao contrário da Alemanha, o Japão nunca reconheceu seus crimes de guerra nem pediu perdão. Agora que a China se afirma como uma superpotência, a tensão entre os dois países aumenta. Mas eles têm interesses econômicos comuns como nunca. O extraordinário crescimento econômico chinês ajudou a tirar o Japão da crise.
Shinzo Abe pretende realizar um encontro de cúpula com as autoridades chinesas: "É lamentável que não haja encontros de cúpula entre os líderes da China e do Japão".
Calmo e controlado, Abe tem a confiança dos japoneses não apenas para manter a recuperação da economia mas também para melhorar as relações com a China, já que a interação destas duas grandes potências será decisiva para o futuro da região que mais cresce no mundo.
Banco central dos EUA mantém taxa de juros
Pela segunda reunião consecutiva depois de 17 altas, o Comitê do Mercado Aberto do Federal Reserve Board (Fed), o banco central dos Estados Unidos, decidiu hoje manter inalterada, em 5,25%, a taxa básica de juros da maior economia do mundo. Para justificar sua decisão, o Fed apontou para a desaceleração da economia americana, especialmente no setor imobiliário. Mas advertiu que o risco inflacionário continua.
"A moderação do crescimento econômico parece continuar, refletindo em parte o esfriamento do mercado imobiliário", diz a nota do Fed. "As pressões inflacionárias parecem se moderar com o tempo, refletindo o a redução do ímpeto dos preços de energia, a contenção das expectativas inflacionárias e os efeitos cumulativos das ações de política monetária e outros fatores que restringiram a demanda agregada".
O Fed acrescenta que persistem alguns riscos inflacionários. Isto levou o presidente da representação do banco central americano em Richmond, Jeffrey Lacker, a votar a favor de uma alta de 0,25 ponto percentual, o que elevaria a taxa básica de juros, aquela que o banco central cobra dos grandes bancos a que empresta dinheiro, para 5,5% ao ano.
A Bolsa de Nova Iorque, embalada pela decisão do Fed, a queda do petróleo e os bons resultados anunciados pela empresa de informática Oracle e o banco de investimentos Morgan Stanley, fechou com o índice Dow Jones em alta de 72,28 pontos (0,63%), fechando em 11.613,19, perto de seu recorde. O índice S&P 500, mais amplo, subiu 0,5%, fechando em 1.327, nível mais alto desde fevereiro de 2001.
"A moderação do crescimento econômico parece continuar, refletindo em parte o esfriamento do mercado imobiliário", diz a nota do Fed. "As pressões inflacionárias parecem se moderar com o tempo, refletindo o a redução do ímpeto dos preços de energia, a contenção das expectativas inflacionárias e os efeitos cumulativos das ações de política monetária e outros fatores que restringiram a demanda agregada".
O Fed acrescenta que persistem alguns riscos inflacionários. Isto levou o presidente da representação do banco central americano em Richmond, Jeffrey Lacker, a votar a favor de uma alta de 0,25 ponto percentual, o que elevaria a taxa básica de juros, aquela que o banco central cobra dos grandes bancos a que empresta dinheiro, para 5,5% ao ano.
A Bolsa de Nova Iorque, embalada pela decisão do Fed, a queda do petróleo e os bons resultados anunciados pela empresa de informática Oracle e o banco de investimentos Morgan Stanley, fechou com o índice Dow Jones em alta de 72,28 pontos (0,63%), fechando em 11.613,19, perto de seu recorde. O índice S&P 500, mais amplo, subiu 0,5%, fechando em 1.327, nível mais alto desde fevereiro de 2001.
Petróleo tem preço mais baixo em seis meses
O preço do barril de petróleo para entrega em outubro fechou hoje em US$ 60 na Bolsa Mercantil de Nova Iorque, o valor mais baixo em seis meses.
No início dos negócios, caíra para US$ 60,90 mas subiu para mais de US$ 61,20 depois que o Departamento de Energia dos Estados Unidos anunciou uma redução dos estoques de petróleo bruto do país pela terceira semana consecutiva mas um aumento dos estoques de combustíveis.
Para os analistas, diminuiu o risco de uma ação militar americana contra o programa nuclear do Irã, grande foco de tensão nos últimos meses. Não houve até agora furacões capazes de prejudicar a produção no Golfo do México. Também há uma desaceleração da economia dos EUA e uma tentativa das autoridades chinesas de esfriar um pouco sua economia, que cresce acima de 10% ao ano.
Até agora, a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP) não se mexeu para reduzir a demanda. Mas há uma intenção de manter o preço em US$ 60. Então, pode haver cortes na produção, se os preços continuarem caindo.
No início dos negócios, caíra para US$ 60,90 mas subiu para mais de US$ 61,20 depois que o Departamento de Energia dos Estados Unidos anunciou uma redução dos estoques de petróleo bruto do país pela terceira semana consecutiva mas um aumento dos estoques de combustíveis.
Para os analistas, diminuiu o risco de uma ação militar americana contra o programa nuclear do Irã, grande foco de tensão nos últimos meses. Não houve até agora furacões capazes de prejudicar a produção no Golfo do México. Também há uma desaceleração da economia dos EUA e uma tentativa das autoridades chinesas de esfriar um pouco sua economia, que cresce acima de 10% ao ano.
Até agora, a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP) não se mexeu para reduzir a demanda. Mas há uma intenção de manter o preço em US$ 60. Então, pode haver cortes na produção, se os preços continuarem caindo.
terça-feira, 19 de setembro de 2006
Militares dão golpe de Estado na Tailândia
Com o primeiro-ministro Thaksin Shinawatra em Nova Iorque, onde participa da Assembléia Geral das Nações Unidas, tanques cercaram a sede do governo da Tailândia, os chefes militares decretaram lei marcial e anunciaram que o autoproclamado Conselho da Reforma Administrativa assumira o poder sem resistência "para manter a paz e a ordem", e combater a corrupção. Eles pediram "a cooperação do público e perdão por eventuais transtornos".
Em discurso pela televisão, à noite, o comandante do Exército, general Sonthi Boonyaratkalin, prometeu devolver o poder aos civis "assim que seja possível".
À distância, Thaksin decretou estado de emergência. Ontem, em entrevista ao jornal The Wall St. Journal, o primeiro-ministro rejeitou a possibilidade de golpe de Estado, apesar dos rumores insistentes. Mas oficiais superiores já discutem com o rei a formação do novo governo.
Homem mais rico da Tailândia, o primeiro-ministro é acusado de abuso de poder para aumentar ainda mais sua riqueza, enquanto enfraquece a Justiça e outras instituições. Quando sua família vendeu sua participação na Shin Corporation, maior empresa de telecomunicações do país, para um grupo de Cingapura por US$ 1,9 bilhão sem pagar impostos, uma onda de manifestações de rua.
Thaksin reagiu dissolvendo o Parlamento e convocando eleições antecipadas, numa tentativa de recuperar a legitimidade. Mas a oposição boicotou a votação, em 2 de abril, que acabou sendo anulada pela Justiça por causa da elevada abstenção.
A crise política tailandesa vem no momento em que os antigos 'tigres' do Sudeste Asiático lutam para enfrentar o concorrência da China. Thaksin era elogiado pelos investidores estrangeiros por seus esforços para aumentar a competitividade da Tailândia. Mas a economia sentiu o peso da deterioração política. O crescimento caiu de uma taxa anualizada de 6,1% no primeiro trimestre para 4,9% no segundo trimestre deste ano.
Com a crise, negociações de liberalização comercial com os Estados Unidos e o Japão foram paralisadas. A tentativa de golpe abalou a moeda nacional, o baht, e a Bolsa de Bangcoc. Não se deve esquecer que a crise asiática de 1997 começou com a desvalorização do baht, em 2 de julho daquele ano. Isto não vai se repetir agora mas o mercado internacional sentiu o golpe, que gera novas incertezas.
Em discurso pela televisão, à noite, o comandante do Exército, general Sonthi Boonyaratkalin, prometeu devolver o poder aos civis "assim que seja possível".
À distância, Thaksin decretou estado de emergência. Ontem, em entrevista ao jornal The Wall St. Journal, o primeiro-ministro rejeitou a possibilidade de golpe de Estado, apesar dos rumores insistentes. Mas oficiais superiores já discutem com o rei a formação do novo governo.
Homem mais rico da Tailândia, o primeiro-ministro é acusado de abuso de poder para aumentar ainda mais sua riqueza, enquanto enfraquece a Justiça e outras instituições. Quando sua família vendeu sua participação na Shin Corporation, maior empresa de telecomunicações do país, para um grupo de Cingapura por US$ 1,9 bilhão sem pagar impostos, uma onda de manifestações de rua.
Thaksin reagiu dissolvendo o Parlamento e convocando eleições antecipadas, numa tentativa de recuperar a legitimidade. Mas a oposição boicotou a votação, em 2 de abril, que acabou sendo anulada pela Justiça por causa da elevada abstenção.
A crise política tailandesa vem no momento em que os antigos 'tigres' do Sudeste Asiático lutam para enfrentar o concorrência da China. Thaksin era elogiado pelos investidores estrangeiros por seus esforços para aumentar a competitividade da Tailândia. Mas a economia sentiu o peso da deterioração política. O crescimento caiu de uma taxa anualizada de 6,1% no primeiro trimestre para 4,9% no segundo trimestre deste ano.
Com a crise, negociações de liberalização comercial com os Estados Unidos e o Japão foram paralisadas. A tentativa de golpe abalou a moeda nacional, o baht, e a Bolsa de Bangcoc. Não se deve esquecer que a crise asiática de 1997 começou com a desvalorização do baht, em 2 de julho daquele ano. Isto não vai se repetir agora mas o mercado internacional sentiu o golpe, que gera novas incertezas.
Ségolène é favorita dos socialistas franceses
PARIS - Com 43% das preferências, Ségolène Royal é a favorita dos eleitores do Partido Socialista para ser candidata à Presidência da França no ano que vem. Em segundo, está o ex-primeiro-ministro socialista Lionel Jospin, que ficou em terceiro lugar nas últimas eleições presidenciais, em 2002, perdendo a vaga no segundo turno para o neofascista Jean-Marie Le Pen, da Frente Nacional, de extrema direita. Jospin lidera a oposição da velha guarda à ascensão de Ségolène, considerada direitista demais.
A seguir, sem grandes chances, vem o ex-ministro da Economia Dominique Strauss-Kahn, com 12%; o ex-ministro da Cultura Jack Lang, com 8%; a ex-ministra Martine Aubry, filha do ex-presidente da Comissão Européia Jacques Delors, com 4%; o líder do PS, François Hollande, marido de Ségolène; e o ex-primeiro-ministro Laurent Fabius, com 3%.
A pesquisa, divulgada pelo jornal Libération, foi realizada no sábado, depois dos discursos dos presidenciáveis na convenção do partido em Lens, no Norte da França.
O registro oficial das candidaturas à candidato oficial socialista será feito de 30 de setembro a 3 de outubro. A decisão dos militantes do PS será em 16 e 23 de novembro, se houver necessidade de um segundo turno.
A seguir, sem grandes chances, vem o ex-ministro da Economia Dominique Strauss-Kahn, com 12%; o ex-ministro da Cultura Jack Lang, com 8%; a ex-ministra Martine Aubry, filha do ex-presidente da Comissão Européia Jacques Delors, com 4%; o líder do PS, François Hollande, marido de Ségolène; e o ex-primeiro-ministro Laurent Fabius, com 3%.
A pesquisa, divulgada pelo jornal Libération, foi realizada no sábado, depois dos discursos dos presidenciáveis na convenção do partido em Lens, no Norte da França.
O registro oficial das candidaturas à candidato oficial socialista será feito de 30 de setembro a 3 de outubro. A decisão dos militantes do PS será em 16 e 23 de novembro, se houver necessidade de um segundo turno.
sábado, 16 de setembro de 2006
Bento XVI não teve sensibilidade política
PARIS - Os muçulmanos estão em polvorosa porque o papa Bento XVI descreveu o islamismo como "uma religião da espada", guerreira. Na verdade, ele falou como intelectual e acadêmico, propondo um diálogo. E tem razão: o islamismo nasceu como um religião da espada. Dominou primeiro a Arábia e depois se expandiu pelo Norte da África, chegando até a Península Ibérica.
Mas quantas guerras foram travadas em nome da fé cristã?
No momento em que fanáticos muçulmanos pregam o conflito de civilizações, tentando ressuscitar as cruzadas, as palavras do papa revelam, no mínimo, falta de sensibilidade política.
Imediatamente, Bento XVI foi acusado de ser aliado dos Estados Unidos e de caracterizar os muçulmanos como terroristas. Na prática, estimulou o radicalismo que pretendia combater.
É mais um sinal do desentendimento entre as culturas. Enquanto no Ocidente a razão pretende ser a mediadora de todos os debates, o Islã não passou pela revolução das idéias liberais do iluminismo e os fundamentalistas não admitem qualquer contestação a seus dogmas. Afinal, o Corão teria sido ditado diretamente por Deus ao profeta Maomé.
Só que a intolerância e o fundamentalismo religioso não são exclusividade dos muçulmanos. Jesus Cristo ensinou os homens a amarem uns aos outros. Mas em 1095, no seu famoso sermão em Clermont-Ferrand, aqui onde hoje é a França, o papa Urbano II mandou matar os infiéis, lançando as cruzadas, nove guerras santas em que os cristãos tentaram tomar Jerusalém.
Novecentos anos depois, Ossama ben Laden e seus asseclas usam a mesma lógica.
Como observou o embaixador Alberto Costa e Silva, num seminário realizado recentemente pelo Itamaraty, "toda religião é fundamentalista".
Ao ver a escultura a Porta do Inferno, que Auguste Rodin fez a partir da Divina Comédia, de Dante Alighieri, a obra-prima da literatura italiana, é difícil discordar do embaixador. A diferença fundamental é que no Ocidente laico e secularista a maioria das pessoas não acredita mais no inferno; os muçulmanos radicais acreditam.
Se um Exército de Deus deve combater os infiéis, é óbvio que deve matá-los para que eles se encontrem logo com o Senhor e tenham a punição merecida.
O diálogo entre as civilizações na busca da paz ficou mais difícil.
Mas quantas guerras foram travadas em nome da fé cristã?
No momento em que fanáticos muçulmanos pregam o conflito de civilizações, tentando ressuscitar as cruzadas, as palavras do papa revelam, no mínimo, falta de sensibilidade política.
Imediatamente, Bento XVI foi acusado de ser aliado dos Estados Unidos e de caracterizar os muçulmanos como terroristas. Na prática, estimulou o radicalismo que pretendia combater.
É mais um sinal do desentendimento entre as culturas. Enquanto no Ocidente a razão pretende ser a mediadora de todos os debates, o Islã não passou pela revolução das idéias liberais do iluminismo e os fundamentalistas não admitem qualquer contestação a seus dogmas. Afinal, o Corão teria sido ditado diretamente por Deus ao profeta Maomé.
Só que a intolerância e o fundamentalismo religioso não são exclusividade dos muçulmanos. Jesus Cristo ensinou os homens a amarem uns aos outros. Mas em 1095, no seu famoso sermão em Clermont-Ferrand, aqui onde hoje é a França, o papa Urbano II mandou matar os infiéis, lançando as cruzadas, nove guerras santas em que os cristãos tentaram tomar Jerusalém.
Novecentos anos depois, Ossama ben Laden e seus asseclas usam a mesma lógica.
Como observou o embaixador Alberto Costa e Silva, num seminário realizado recentemente pelo Itamaraty, "toda religião é fundamentalista".
Ao ver a escultura a Porta do Inferno, que Auguste Rodin fez a partir da Divina Comédia, de Dante Alighieri, a obra-prima da literatura italiana, é difícil discordar do embaixador. A diferença fundamental é que no Ocidente laico e secularista a maioria das pessoas não acredita mais no inferno; os muçulmanos radicais acreditam.
Se um Exército de Deus deve combater os infiéis, é óbvio que deve matá-los para que eles se encontrem logo com o Senhor e tenham a punição merecida.
O diálogo entre as civilizações na busca da paz ficou mais difícil.
sexta-feira, 15 de setembro de 2006
Ernesto Neto ocupa o Panthéon em Paris
Foto de Rebecca Lockwood |
Com ares de anjo barroco, do alto de uma série de escadas montadas sobre uma estrutura metálica, Ernesto Sabóia de Albuquerque Neto, um dos artistas plásticos brasileiros de maior sucesso no exterior, orienta alpinistas e outros trabalhadores que o ajudam a montar sua mais recente obra: "Isto aqui está errado. Tem de passar pelo outro lado", dizia ele, três dias antes do vernissage, nesta sexta-feira.
Léviathan Thot é uma instalação monumental que ocupa a necrópole republicana da França, a “homenagem da pátria agradecida a seus heróis”. A exposição será inagurada hoje, dentro do Festival de Outono de Paris, e vai até 31 de dezembro.
É uma obra ciclópica feita em tecido, areia e bolinhas de isopor, com grandes sacos que pendem da cúpula do Panthéon. Parece um grande etcoplasma, uma forma primitiva de vida como as dos filmes de ficção científica que se expande entre aquelas paredes frias. Ali estão, entre outros, os restos mortais de Jean-Paul Marat, um dos líderes que a Revolução Francesa engoliu, dos filósofos Jean-Baptiste Voltaire e Jean-Jacques Rousseau, que inspiraram a revolução, do escritor Victor Hugo, e dos químicos Pierre e Marie Curie, que descobriram a radioatividade e também foram mortos por ela.
No meio, o Pêndulo Foucault nos lembra que a Terra gira e da importância da ciência na era da modernidade, cujo marco inicial foi a Revolução Francesa de 1789.
Leviatã vem do hebraico para "animal que se enrosca". Na mitologia fenícia, é o nome de um monstro do caos e assim é tratado na Bíblia. Para o filósofo político inglês do século 17 Thomas Hobbes, um dos principais ideólogos do realismo e do conservadorismo político, autor de uma obra clássica com este nome, é o Estado todo-poderoso, na sua opinião necessário para conter a agressividade humana.
Sem um leviatã, dizia Hobbes, que escreveu sob o impacto da Guerra Civil Inglesa (1630-1688), o mundo degeneraria numa guerra de todos contra todos onde "a vida seria detestável, brutal e curta".
Para amenizar o peso do Estado-leviatã criado pela Revolução Francesa, que introduziu o conceito de terrorismo político, Neto acrescentou Thot, o deus egípcio da sabedoria, da escrita, do tempo e da magia, representado por um homem com a cabeça do pássaro Íbis. O Tarô é o livro de Thot. Para o artista, Thot dá uma sonoridade ao nome de sua obra.
De uma certa forma, Neto humanizou e pós-modernizou o Pantheón, uma estrutura neoclássica pesada, trazendo-o para o século 21. Sua obra é orgânica. Dá vontade de entrar dentro, de se aconchegar e relaxar, exatamente o contrário do que sugere a dureza do Panthéon como um grande mausoléu coletivo.
"Arrebentou", comentou Tunga, outro artista plástico brasileiro de enorme prestígio internacional, na entrada do Panthéon. "Conseguiu fazer um constraste entre a dureza da arquitetura e a leveza da peça."
Sem dúvida, é um desafio, um gesto de enorme coragem e ousadia criar uma instalação neste grande prédio monumental com uma carga histórica tão pesada, como o próprio artista reconheceu em entrevista ao jornal francês Le Monde: “É de um gigantismo, de uma brutalidade, com todas estas pinturas e toda esta História”.
Quando descobriu o Panthéon, Neto lamentou não ter feito sua instalação na Igreja Salpêtrière, onde estava previsto inicialmente. Mas houve um problema com os padres. “Adoro aquela capela. Ela é linda e feminina, e evoca o nascimento da psiquiatria”, disse Neto ao Monde.
Depois de estudar a História do Panthéon, entendeu que de certa forma ele nos ensina como o mundo chegou ao que é hoje, “um monumento à mudança política, à transição da monarquia para a república”.
Sua obra se imiscui, por exemplo, com uma estátua em homenagem à Convenção, à segunda fase da Revolução Francesa (1792-95), o período do terror e da guilhotina, do terrorismo do Estado querendo purgar os males da sociedade. Aos pés de Marianne, a mulher que simboliza a revolução, os nobres com suas perucas brancas pedem clemência à direita, enquanto os revolucionários avançam à esquerda. A inscrição diz: “Viver livre ou morrer”.
Na opinião de Neto, o mundo vive hoje um momento igualmente violento, a era da globalização, em que os representantes eleitos pelo povo, uma conquista das revoluções francesa e americana, são impotentes diante do capital que se move na velocidade da luz. Ele espera que sua obra provoque uma reflexão sobre “que mundo queremos para o futuro”.
Os fantasmas do Panthéon devem estar adorando.
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quinta-feira, 14 de setembro de 2006
França vira alvo da Caeda
PARIS - Diante da chegada hoje de 900 soldados franceses para reforçar a força de paz das Nações Unidas, o subcomandante da rede terrorista Al Caeda adverte que a França passa a ser alvo dos muçulmanos fundamentalistas.
Zawahiri anunciou que o Grupo Salafista pela Pregação e Combate aliou-se a Al Caeda e terá como objetivo principal atacar a França. Este grupo nasceu na Argélia mas já operou em outros paises norte-africanos.
Além da questão libanesa, o vice de Ben Laden acusou a França por ter proibido o uso do véu muçulmano pelas meninas em escolas públicas da França.
Um dos grandes problemas da França é o inimigo interno. Este país tem a maior população islâmica da Europa. São mais de 5 milhões de muçulmanos, na sua imensa maioria imigrantes ou filhos de imigrantes que se sentem discriminados na sociedade francesa.
No final do ano passado, houve uma revolta de jovens da periferia depois que a polícia matou dois garotos que fugiam de uma perseguição policial. O desemprego entre jovens na França supera os 20%. No caso dos imigrantes ou descendentes de imigrantes, chega a 40%. É uma grande massa de manobra facilmente manipulável por radicais.
Zawahiri anunciou que o Grupo Salafista pela Pregação e Combate aliou-se a Al Caeda e terá como objetivo principal atacar a França. Este grupo nasceu na Argélia mas já operou em outros paises norte-africanos.
Além da questão libanesa, o vice de Ben Laden acusou a França por ter proibido o uso do véu muçulmano pelas meninas em escolas públicas da França.
Um dos grandes problemas da França é o inimigo interno. Este país tem a maior população islâmica da Europa. São mais de 5 milhões de muçulmanos, na sua imensa maioria imigrantes ou filhos de imigrantes que se sentem discriminados na sociedade francesa.
No final do ano passado, houve uma revolta de jovens da periferia depois que a polícia matou dois garotos que fugiam de uma perseguição policial. O desemprego entre jovens na França supera os 20%. No caso dos imigrantes ou descendentes de imigrantes, chega a 40%. É uma grande massa de manobra facilmente manipulável por radicais.
Primeiro autor convidado
Até hoje, tinha publicado apenas textos meus neste blog. Como meu objetivo é discutir idéias, começo aqui uma nova etapa, com o texto abaixo, do prof. José Henrique de Faria, da Universidade Federal do Paranà, que critica a postura antiisraelense de parte da esquerda brasileira diante dos conflitos no Oriente Médio.
EU ACUSO
Professor Doutor JOSé HENRIQUE DE FARIA
O materialismo histórico e dialético é a base epistemológica que Marx utiliza para explicar as mudanças ocorridas na sociedade através de seus elementos contraditórios. Não obstante Marx tenha explicitado seu método, sua teoria e suas concepções com bastante clareza, apesar da complexidade de seu pensamento, cada um de seus vários seguidores postula para si a propriedade da única e verdadeira interpretação. Eis que existem, nesta cesta, os vários “marxismos verdadeiros”: stalinista, leninista, estruturalista, mecanicista, formal, fenomenológico, maoísta e, entre outros, os atuais populistas nacionalistas. Também é possível encontrar o marxismo ortodoxo dogmático, que postula que Marx explicou tudo o que pretendia explicar, explicou o que não pretendia explicar e explicou o que não podia explicar.
Este último marxismo, o da beatificação, o religioso, mais comum do que se pensa, vale-se de categorias marxistas de análise, mas o faz de forma idealista, descolada do concreto, como se este tivesse sido imobilizado desde a publicação de O Capital. Além destes, existem os falsos marxismos, que se utilizam de alguns pensamentos de Marx para parecerem marxistas; estes muitas vezes se misturam aos demais e, de forma insidiosa, se vão amalgamando até serem confundidos com os mesmos e deles não se distinguindo devido à sua condição mimética, a não ser que se preste atenção às suas características camaleônicas.
No Prefácio da "Contribuição à Crítica da Economia Política", Marx identifica os seguintes estágios de desenvolvimento das forças produtivas (modos de produção): asiático (comunismo primitivo), escravista (da Grécia e de Roma), feudal e burguês. A tese geral marxiana (para não confundir com os mencionados marxismos) é a de que o modo pelo qual a produção das condições materiais de existência de uma sociedade é realizada condiciona a organização política e as representações ou, para dizer de outro modo, a base material ou econômica condiciona diretamente a formação das instituições jurídico-políticas (as leis, o Estado) e ideológicas. No processo histórico, tais contradições são geradas pelas lutas entre as classes sociais em presença. Resumidamente, a evolução de um modo de produção para outro ocorre a partir do desenvolvimento das forças produtivas e da luta de classes, de forma que o movimento da História não somente segue um processo de transformação progressivo, como obedece a um movimento dialético.
Para o marxismo autêntico, aquele que se baseia no pensamento original de Marx e reconhece sua força e suas fragilidades, assim como o capitalismo surgiu do feudalismo desenvolvido, é do capitalismo desenvolvido, dialeticamente expresso, que surgirá um modo de produção superior. Não faz o mínimo sentido, para o marxismo autêntico, que a história possa ou deva regredir. O que há de feudal no capitalismo são resquícios de um modo de produção que ainda permanecem e que permanecerão até que o modo atual tenha se desenvolvido plenamente, quando, então, será também superado.
Nesta profusão de esquerdismos, alguns grupos de uma auto-intitulada esquerda, que por suposto deveriam ter como meta a construção do socialismo ou, então, de uma sociedade democrática, passam a manifestar publicamente apoio a práticas medievais, que escravizam mulheres e não reconhecem a elas igualdade de direitos com os homens; apoio a regimes baseados na tirania, em que os opositores podem ter a mão decepada ou sofrer humilhações e nos quais, com toda a certeza, estes mesmos grupos de esquerda não teriam liberdade para se manifestar e se o fizessem não sobreviveriam; apoio ao fanatismo religioso que a esquerda conceituaria como sendo demonstração de primitivismo; apoio aos que se recusam a possuir mercadorias do mundo capitalista ocidental, mas que paradoxalmente, utilizam sua mídia eletrônica, sua ciência e sua tecnologia ultra-moderna; apoio a um sistema educacional que se sustenta no princípio do ódio; apoio, enfim, a práticas superadas pelas lutas de resistência dos trabalhadores, nas quais muitos pagaram com a própria vida. Tudo isto baseado na lógica de que qualquer coisa que seja contra o capitalismo deve ser apoiada e incentivada, mesmo que represente o atraso. Este é o fundamento da falsa esquerda, que não trata da unidade dos contrários, do desenvolvimento das forças produtivas, da busca de uma síntese, mas que demonstra uma preferência subjetiva movida pelo sentimento objetiva e historicamente preconceituoso. Neste sentido, o materialismo aparece na forma de ideologia, o histórico na forma de dados manipulados e o dialético na forma de classificação dicotômica.
O falso marxismo aproveita-se de todas as situações para acenar suas bandeiras repletas de símbolos e para proferir discursos elegendo os sempre disponíveis demônios e também prometendo aos seus seguidores a ataraxia social. De fato, o conflito recente no Oriente Médio é uma destas situações que faz reabrir velhas e surradas análises eivadas de equívocos, parciais e maniqueístas. Certos pensadores que se pretendem dialéticos mostram-se incapazes de encontrar a unidade dos contrários, base analítica da busca da negação, e entram no fácil caminho da dicotomia entre o bem e o mal, tratando como se fossem oposições o que nem ao menos é dialética mecanicista. Outros, revelam desprezo pela história e a reduzem a um conjunto mal feito de efemérides, às vezes até ordenadas cronologicamente para dar certa impressão de capricho contextual. Para estes “analistas”, o Oriente Médio se divide em dois grupos: o do capitalismo, representado por Israel e o do anti-capitalismo, representado pelo Hamas, Hezbollah e seus financiadores. Tais analistas, em primeiro lugar, caem em um erro comum, de certa maneira promovido pelos Islamitas Integristas, que se resume em colocar todos os fatos na mesma cesta analítica. O que está se passando no Líbano não tem relação direta com a questão Palestina, mas a auto-intitulada esquerda não é capaz de ver qualquer diferença, já que seu mundo se divide em capitalismo e anti-capitalismo. O Islã tenta hoje se apropriar das crises do Mundo Árabe e propor soluções de "Volta à era gloriosa do Profeta", à época da Expansão Islâmica, ou seja, à Idade Media. E é para a Idade Média que a auto-intitulada esquerda está desejosa de ir, talvez saudosa dos bons tempos do feudalismo, das monarquias absolutas, das corporações de ofícios, das jornadas de trabalho de 14 horas para trabalhadores de até 12 anos.
Quando estes “analistas” da auto-intitulada esquerda se dispõem a explicar um fato a partir de uma história sem passado, nos deparamos inevitavelmente com análises plenas de erros, nas quais tudo se justifica para “um lado”, que é o lado do bem, descrito como tendo sua origem natural pela existência do outro, o lado do mal. Psicanaliticamente, poder-se-ia falar de um psicótico: sou o que sou por culpa do outro e não tenho responsabilidade alguma em sê-lo. Daí, proliferam as análises do tipo causa-efeito, tão ao gosto do raciocínio linear, inaugurando, quem sabe, um novo sub-marxismo: o linear-positivista. “Um lado” é apresentado como bondoso, caridoso, social, humano, assistencial e deificado. O outro, é apresentado como malévolo, demoníaco, desumano, assassino. Esta história, como se sabe, já tem milênios. E quando tudo se justifica para um e tudo se condena para outro, pratica-se um outro tipo de terrorismo: o do preconceito. Este que se esconde sob a máscara dos que não assumem suas faces.
Nada justifica, de “um lado” e de outro, a morte de inocentes. Não há bons e ruins nas guerras. Há apenas a barbárie humana. Pode-se explicar qualquer conflito que tire a vida de uma única vítima que seja, mas não há nenhum argumento, por melhor que seja, que o justifique. Porém, criminalizar um e inocentar ou sacralizar outro é tentar justificar o injustificável, é dar abrigo “ao que não tem governo nem nunca terá, ao que não tem juízo” . Por este motivo é também necessário questionar, como se deve fazer, que outros fatores se encontram impregnados neste conflito. Não para justificar, mas para entender.
Acobertar e aceitar atitudes, omitir informações, deturpar a história, não são atividades compatíveis com a tradição da esquerda, pelo menos da esquerda autêntica. Por esta razão, a humanidade orgulha-se dos seus grandes expoentes, que não caíram na armadilha do discurso fácil dos acusadores em busca de aplausos dos que nada sabem, que não se deixaram levar pelas aparências, pois eles sempre foram a garantia do registro de um passado que é necessário expor sem julgamentos pré-concebidos. Hoje, ao contrário, é fácil encontrar análises que, a pretexto de revelarem a história, primam pela quantidade de inverdades, distorções, exageros, omissões, confusões e mitos. Deste modo, convém lembrar que se alguma verdade pode ser encontrada é que a verdade é o lugar da práxis.
O que passa no Líbano atualmente é do estilo déjà vu . País criado depois da Primeira Guerra Mundial, tendo como cenário a rivalidade Franco-Britânica, o Líbano se caracterizou pela sua sociedade pluri-confessional, sendo quatro as comunidades importantes que o constituíram: Muçulmanos Sunitas, Muçulmanos Xiitas, Druzos e Cristãos Maronitas. Na época (anos 1930 e 1940), os Cristãos Maronitas eram maioria. Em 1943, no Pacto Nacional que representa um acordo constituinte de vida civil em comum, estabeleceram-se as bases políticas do País. Trata-se de um equilíbrio muito sensível que foi resultado de um acordo das duas maiores comunidades naqueles anos (Maronitas e Sunitas) que lograram manter sempre o Presidente Maronita e o Primeiro Ministro Sunita, com um sistema de proporção na representação parlamentar.
Convém salientar as ocasiões em que este equilíbrio foi abalado, para se poder perceber os traços comuns dos acontecimentos:
1. Em 1958, sob a influência Nasserista (Pan-Arabismo), há uma tentativa de tomada de poder, em que se buscou derrubar o Presidente Camille Chamoun, visto como pró-ocidente. É a época da Guerra Fria e o Líbano é invadido pelos Marines Americanos (Eisenhower);
2. No fim dos anos 1970, a Organização para a Libertação da Palestina – OLP começa seu capítulo Libanês e tenta fazer dele a base da luta Árabe contra Israel, acusado de representar o Imperialismo Americano no Oriente Médio. Inicia-se uma guerra civil que abala de novo o equilíbrio precário da Sociedade libanesa. Nesta época, se armam as milícias Confessionais: os muçulmanos apóiam a OLP; os cristãos unem-se em torno das Falanges de Pierre e Bashir Jumayel; os druzos juntam-se com a milícia de Kamal Jumbalat; os xiitas unem-se em torno do Movimento AmAl de Nabi Berri. Esta fase vai precipitar a Invasão de Israel ao Líbano em 1982;
3. Dos anos 1990 até hoje, é a vez do Integrismo Islâmico, que também clama por um estilo de "Pan-Islamismo", e que novamente desequilibra o Líbano, fazendo dele sua base revolucionária, que obviamente passa pela "Luta pela destruição do Estado Sionista". Seu protagonista, desta vez, é o Hezbollah xiita.
O que é comum nos três episódios é: penetração política em um Estado com equilíbrio precário; abalo do sistema; exportação de um sonho de unidade dos "Oprimidos" contra a civilização dominante, que é a civilização ocidental, embora certos analistas da auto-intitulada esquerda insistam que se trate apenas do capitalismo. O capitalismo é apenas parte do problema. O que está em jogo são os valores da civilização ocidental, a moral, as liberdades (especialmente as referentes à sexualidade) e tudo o que represente uma ameaça aos preceitos do islamismo. Por este motivo, no Oriente Médio, Israel é o alvo propício. Tratando-se de um corpo estranho no habitat do Oriente Médio, Israel sem dúvida é um País com características ocidentais e uma democracia, algo raro na região, e ainda por cima é desenvolvido economicamente nos moldes capitalistas. Daí à fantasia ideológica, a distância é pequena.
A questão libanesa, considerando que o Líbano é o País mais ocidental do mundo Árabe, passa por restituir o equilíbrio confessional desta Sociedade, restabelecer o papel do poder central, democraticamente eleito, desarmar todas as milícias, dar poderes ao Exército libanês, que deve receber ordens do poder legitimo e assegurar internacionalmente as fronteiras reconhecidas do Líbano. É obvio que isto implica na retirada total do Exército Israelense e de toda presença militar estrangeira no Líbano.
Resolvida a questão libanesa, Israel deve procurar por todos os meios participar do esforço para resolver a questão Nacional Palestina, que passa inevitavelmente pela sua saída dos territórios Palestinos ainda ocupados. Isto não pode acontecer sem a compreensão dos Palestinos de que a aventura "Hamassita" é o caminho mais inapropriado para qualquer solução. É preciso reconhecer o direito aos palestinos a um Estado Palestino autônomo, livre e democrático.
No entanto, não é desta forma que certo grupo de intelectuais de uma auto denominada esquerda aborda este tema. Dando vazão ao recorrente vício de analisar o que não entendem e apresentar soluções para o que desconhecem, tendo por base empírica o movimento nos corredores dos seus locais de trabalho, tais intelectuais vociferam suas posições. Felizes, por certo, com o pacto antiimperialista proposto por um populista nacionalista latino americano com um governo não democrático do Oriente, tais intelectuais decidem importar o conflito entre Israel e os grupos Hamas e Hezbollah para o interior da maior universidade pública brasileira, através de uma associação sindical de seus trabalhadores . Para tanto, promoveram um ato contra o massacre no Líbano e na Palestina. Não há barbárie maior ou menor, justificada ou injustificada, boa ou má: barbárie não tem adjetivação. Por este motivo um ato contra a barbárie é importante. Entretanto, a auto intitulada esquerda fez um grande alarde para arrombar portas abertas. Era preciso, em nome da coerência, arrombar portas fechadas. Onde estava esta auto intitulada esquerda para fazer um ato contra a barbárie durante os anos da revolução cultural chinesa? Onde estava esta mesma falsa esquerda para fazer um ato público contra as barbáries do stalinismo? E onde estava a falsa esquerda para fazer um ato público contra a maior mortandade ocorrida no Líbano, causada pela própria Guerra Civil, um conflito interno que se iniciou em abril de 1975 e com a OLP, xiitas, sunitas, drusos e a Síria de um lado, contra cristãos maronitas e setores da direita do outro, matando 150 mil pessoas?
Em relação a Sabra e Chatila, as estimativas de mortos variam de 300 a
500, segundo a polícia libanesa. De todas as aldeias libanesas que sofreram massacres, as únicas que ficaram conhecidas são as de Sabra e Chatila, em 1982.
Entretanto, em maio de 1985, houve novo massacre em Chatila e em Burj-el Baranjê quando muçulmanos atacaram os acampamentos. Segundo a ONU, houve 635 mortos e 2.500 feridos. E durante uma batalha de dois anos entre a milícia xiita Amal – respaldada pelo Governo Sírio – e a OLP, foram registrados mais de dois mil mortos, incluindo muitos civis. Onde estava a auto intitulada esquerda para organizar um ato público contra estas barbáries? Será que, neste sentido, para a falsa esquerda a moral deles é diferente da nossa, como anuncia o título de um manifesto de Trotski? Será que as “mortes deles”, dos inimigos da revolução, são melhores, mais justas e justificadas, em relação às “nossas”?
Em “A cruzada ética contra o marxismo”, Osvaldo Coggiola afirma que “o próprio objetivo de unir a classe operária internacional, para dar fim à exploração, elimina logicamente, apesar das vantagens a curto prazo que isso possa ter num ou noutro país, qualquer apelo a interesses particularistas, como o racismo ou o chauvinismo, qualquer incitamento à ação não baseado na igualdade fundamental de todos os homens, em toda parte”. Para Coggiola, a esquerda perdeu a ética de classe e, com isto, perdeu “a sua própria natureza de esquerda e, não raro, a própria vergonha”. O que não deixa alternativa que não seja “construir uma outra esquerda, baseada nos princípios classistas e na tradição histórica do marxismo revolucionário”. O diagnóstico é interessante, mas o remédio nem tanto. Não há dúvida que a esquerda deve ter um projeto político no qual não cabe o imperialismo, não cabe a exploração da força de trabalho, não cabe a exclusão social, não cabe o autoritarismo, não cabe a violência. Entretanto, é preciso acautelar-se. Primeiro, porque não há necessidade de criar nenhum novo marxismo, bastando apenas fazer o devido enfrentamento aos sub-marxismos; segundo, porque marxismo revolucionário é uma tautologia; terceiro, porque à conta de criar algo novo é que se destruiu o original e se fortaleceu a cópia mal feita.
É necessário que seja dito de forma clara e sem subterfúgios que, para a esquerda, não há e nem pode haver qualquer justificativa para uma guerra. Quando ela existe a humanidade falha. Mas, qualquer pessoa com uma capacidade mínima de reflexão sabe quantos interesses habitam os bastidores e que não se revelam. Daí que a história precisa ser escrita sobre os fatos concretos e suas relações sempre contraditórias. A prática do preconceito, este terrorismo de gabinete, em nada colabora para desvendar as contradições que se expõem neste conflito. Para a esquerda autêntica, assim como para qualquer humanista, uma única vítima já é motivo mais do que suficiente para tirar qualquer razão de quem quer que seja. Nada justifica tantas mortes. Mas, nada justifica a ignorância de que as mesmas tenham ocorrido ou, o que é pior, nada justifica que muitas delas sejam justificadas, esquecidas, omitidas, desprezadas e que não estejam estampadas em camisetas dos que realmente se interessam pela essência do mundo e não se iludem com suas aparências, como aliás ensinava Marx.
Pode-se pensar, contudo, que se trata de mera ignorância. Mas, é manifesto que se trata preconceito, deste sentimento de ódio que nasce e se desenvolve nos escritórios de “intelectuais”, espalha-se nas salas de aula, registra-se nos jornais e boletins de forma explícita ou insidiosa e, para justificar-se, precisa de um bordão legitimador comum, tal como “fim do imperialismo” ou “luta contra o capitalismo”, mas que, de fato, deseja "o fim do Estado de Israel" e “denuncia” quem lhes ousa contestar com o epíteto de “subserviência às 'poderosas' forças dos imperialistas e dos genocidas judeus". Judeus e não israelenses, o que já deixa claro que se trata de racismo. Isto em uma instituição universitária, onde alguns destes partidários da auto intitulada esquerda certamente se esmeram em apresentar o que julgam ser belas e úteis contribuições ao desenvolvimento das forças produtivas, capazes de acentuar as contradições do sistema de capital e de promover sua crise de acumulação. Eis que estes revolucionários das instituições, com seu idealismo feuerbachiano, fazem questão de ressuscitar e de convidar a entrar pela janela o morto que a realidade já havia expulsado pela porta. Marx, ao tratar da ideologia, ofereceu vários exemplos de como as “idéias fixas” podem servir para “orientar as classes” sem levar em conta seus reais interesses e seu lugar no processo de produção.
O fim do Estado de Israel pretende propor, enfim, uma solução mágica da auto intitulada esquerda criativa, que deve ter brotado dos gabinetes, dos grandes debates em salas de aula com presença maciça de dez a doze pessoas com larga experiência em política internacional, em geoestratégia, em conflitos, em unidade econômica, que é a: “criação do Estado Palestino laico, onde caibam todos, palestinos, israelenses, árabes...". Quem sabe estes intelectuais tão criativos também já não tenham pronta, tirada da manga, uma proposta de criação de uma simples associação de trabalhadores universitários onde caibam todos, esquerda, direita, centro, árabes, judeus, em que todos possam se expressar livremente, isonomicamente, com os mesmos direitos. Depois, talvez mereçam levar esta experiência a vôos mais altos, como, por exemplo, à própria universidade. Mas, para que cumprir esta trajetória se estes brilhantes intelectuais já possuem a grande solução para o Oriente Médio, uma solução que ninguém havia pensado, que é simples tal qual a simploriedade de seus proponentes?
Para abrilhantar o ato a favor da democracia uma lojinha vende camisetas e produtos do Hezbollah, para “financiar a gente aqui no Brasil”. A luta, dizem do alto de sua sabedoria de manuais, não é dos palestinos e libaneses, mas dos trabalhadores do mundo inteiro, e não se pode deixar de ocupar a trincheira de combate ao imperialismo. Aí está a capa protetora do discurso que pretende dar legitimidade ao racismo: o fim do Estado de Israel equivale ao combate ao imperialismo e ao sistema de capital no mundo. A auto intitulada esquerda, raivosa, professa, à moda dos que leram e não entenderam ou dos que entenderam e reinterpretaram à sua maneira, um outro marxismo, o da conveniência. O mundo do capitalismo repentinamente se encontra reduzido a um único Estado, com uma área territorial de cerca de vinte e dois mil quilômetros quadrados, cuja destruição representaria a destruição do imperialismo. Obviamente, é de se supor que em Israel não existam trabalhadores, apenas imperialistas; não existam partidos de esquerda, apenas de ultra direita. Em “O Dezoito Brumário”, Marx já havia denunciado esta prática ao mostrar como os jacobinos deram sentido à sua ação através da ênfase no verbo, promovendo a “ressurreição dos mortos” e ocultando aos olhos dos sujeitos seus objetivos reais, iludindo-os de modo eficaz.
Então, brotando da mais profunda cripta, um auto referenciado marxista revolucionário defende a destruição de todos os Estados, pois “enquanto houver burguesia e capitalismo, não haverá paz”. A utopia rousseauniana ilumina o palco em que estão sendo gerados os bons selvagens. O “Mal Estar na Civilização” é negado tal como Freud, seu autor, pois com o fim do Estado, os homens e mulheres deixarão de ser perversos, invejosos, cruéis, belicosos e defensores de interesses pessoais e passarão a ser cooperativos, bondosos, democráticos, pacifistas e defensores exclusivos dos interesses coletivos, tal qual se pôde observar nas experiências da União Soviética, da China, da Albânia e que ainda se observa em Cuba, na Venezuela, na Coréia do Norte, na Palestina, na Síria, no Irã, e no interior da organização Hezbollah. Mas, é preciso reconhecer que a superação do Estado é um projeto marxista em sua fase pós-socialista. É um estágio no qual a humanidade se elevaria a tal ponto em termos de vida associativa que retornaria ao modo comunista, mas não à sua forma primitiva. Se fosse esta a questão, acabar com o Estado, inclusive o de Israel, poderia ser um projeto de uma esquerda revolucionária. Mas, em seu lugar, a auto intitulada esquerda deseja colocar o que? Um outro Estado. Um Estado Palestino.
Então, a questão não é a destruição do Estado, mas de um Estado específico, que é, como se sabe, o Estado de Israel. De fato, para o auto referenciado marxista revolucionário, o que lhe interessa é travar “a luta nacional e internacional pela destruição do Estado de Israel e o imperialismo norte-americano”. A falsa esquerda, novamente, apropria-se de referências marxistas para usá-las de forma irresponsável, inadequada, descontextualizada.
O “profeta recém saído do forno”, para usar uma expressão de Engels a respeito do Senhor Düring, se coloca a pensar o fim do Estado assumindo um pensamento de Estado, utilizando categorias de análise produzidas e garantidas pelo Estado, o que mostra a fragilidade da sua reflexão. Sua concepção auto-referenciada de revolucionária o faz acreditar que isto o torna um sujeito independente do Estado, mas a mesma não poderia ter sido desenvolvida sem o apoio do Estado. Mais do que isto, sem ser financiada pelos recursos públicos que o Estado administra através da apropriação, via tributação, da massa de valor excedente produzida na sociedade . Ao destruir o Estado (caso isto fosse uma realidade e não uma projeção metafísica), o revolucionário deveria estar preparado para negar sua independência ou para usar contra esta nova forma de organização social a liberdade que o Estado democrático representativo lhe garantiu, ou seja, ser oposição de sua posição. Isto se ele não pretender ficar prisioneiro do pensamento de Estado, pois se for este o caso, o auto denominado revolucionário jamais teria a liberdade que postula naquele tipo de Estado que ele julga exemplar na luta contra o imperialismo. Sendo explícito, o auto denominado revolucionário poderia se organizar livremente no Estado de Israel, mas perderia sua independência nos tipos de Estado que ele toma como modelo.
As contradições seguem seu curso, inexoravelmente. A luta desta auto intitulada esquerda clerical prossegue em direção à destruição do capitalismo. Pode-se encontrá-la nos sites e blogs, estas poderosas máquinas da propaganda e da mídia informacional imperialista. Os participantes da luta são informados (e convocados) não apenas através de sites e blogs, mas diretamente via E.Mail, esta expressão do sistema capitalista de informação em tempo real, usando a rede de computadores fabricados por empresas capitalistas, disponíveis na universidade. Camisetas são produzidas usando a cadeia produtiva capitalista do setor têxtil. À mesa, garrafas de água produzidas por uma empresa capitalista e vendidas no mercado capitalista. Os organizadores deslocaram-se para a universidade em veículos produzidos pelo capitalismo, trabalham com instrumentos e equipamentos produzidos pelo capitalismo, vão ao supermercado e consomem mercadorias, submetidos à lógica do capitalismo e não conseguem enxergar um palmo na frente do nariz: o lugar da luta não é o que dizem ser. Mas não podem enxergar, pois sofrem de miopia teórica, política e prática impregnadas do inevitável racismo.
De fato, em seus discursos, eivados de equívocos teóricos, históricos, políticos e práticos, ficam evidentes não apenas a ignorância, a simplicidade da análise, a estupidez e a má fé, que já seriam suficientes para desqualificar as manifestações, mas o preconceito. Esta auto intitulada esquerda está “ombro a ombro, lado a lado” pela vitória do Hezbollah, “porque isso vai alavancar a luta contra o imperialismo. Uma derrota do imperialismo, uma derrota sobre o sionismo vai alavancar a luta do proletariado latino-americano, dos companheiros da Volks que estão sendo atacados agora, (...) vai levantar a luta contra a reforma trabalhista e sindical que Lula quer implementar em nosso País.(...) Até a vitória, até a destruição dessa máquina assassina!” O discurso inflamado tem como substrato a falta de substância e um grande excedente de estéril imaginação! Apelar para o Hezbollah para fazer frente à reestruturação produtiva do sistema de capital é o mesmo que cair no que Marx chamava, em “As lutas de Classes na França”, de “generosa embriaguez”, este ideologia fraternária que oculta a verdadeira luta de classes e promove uma “abstração negligente”.
A grandiloqüência arrogante das proclamações autovalorizantes não visa apenas desacreditar os oponentes, que, aliás, sequer podem se manifestar de forma isonômica no mesmo “espaço democrático”, mas valorizar os novos profetas, com seus exibicionismos retóricos destinados a um público ávido em ser convencido do que previamente já havia sido. Esta esquerda que Ruy Fausto (Jogo de Espelhos. Caderno Mais, Folha de São Paulo, 10.09.2006) chama de totalitária, populista, “heavy”, que acredita nas virtudes dos chefes autoritários, é uma esquerda “indulgente com os totalitarismos”. Trata-se de um grupo que ao mesmo tempo é admirado e admira a direita . Ruy Fausto argumenta que boa parte da direita “tem uma grande admiração pelos ícones da esquerda antidemocrática”. Por “realismo ou por falta de amor pela democracia, parte da direita tem uma fascinação secreta pela esquerda antidemocrática”. Ao mesmo tempo, continua Fausto, “a extrema esquerda antidemocrática, sob muitos aspectos, prefere a direita à esquerda democrática”. Aqueles, alerta Ruy Fausto com conhecimento de causa, que se permitem criticar esta esquerda são tratados com violência muito maior do que a que eventualmente usam contra a direita.
De acordo com Eric Hobsbawm (A Epidemia da Guerra. Caderno Mais, Folha de São Paulo, 14 de abril de 2002), cerca de 187 milhões de pessoas morreram em função de guerras no século passado. Na I Guerra Mundial, 5% eram civis; na II Guerra Mundial, 66% eram civis; nas “guerras modernas de alta tecnologia”, entre 80 e 90% dos afetados foram civis. Quanto mais avanços tecnológicos são incorporados pela indústria bélica, relativamente maior é o número de civis atingidos pela destruição. Mas, a barbárie faz parte do que Hanna Arendt chama de “banalidade do mal”. O que interessa é fazer com que esta indústria renove seu consumo e isto somente pode acontecer se forem utilizados seus produtos, não apenas para “repor os estoques”, como para incorporar “novas tecnologias”. A crise de acumulação de capital encontra, na “indústria da guerra”, uma forma de mobilizar o conjunto dos complexos industriais, colocando em movimento diversos elos das cadeias produtivas. Contudo, é um equívoco acreditar, dada a integração produtiva do mundo globalizado, que as beneficiárias serão apenas as indústrias sediadas na Alemanha, Inglaterra, Rússia ou Estados Unidos. Existe uma complexa rede de relações, da qual Manuel Castells, em “A Era da Informação”, analisando a “Sociedade em Rede”, esboça uma pista, muito articulada e com interesses mais profundos do que estes que aparecem na superfície.
Os avanços tecnológicos, o desenvolvimento dos aparatos normativos internacionais, a integração econômica, a evolução do processo civilizatório, contudo, não são capazes, como ainda crêem alguns, de frear a barbárie. Em “Mal Estar na Civilização”, Freud afirmava que a civilização está sempre ameaçada pela tendência humana de precisar dar vazão à sua agressividade de alguma forma . Para Freud, a cruel agressividade do homem espera alguma provocação, uma razão qualquer para exteriorizar-se. No âmbito internacional, as guerras têm sido a forma mais comum de exteriorização da violência. Assim, se uma sociedade organizada como Estado de Direito e, portanto, com controle da violência interna, pode, num determinado momento, mostrar-se sangrenta e cruel contra outro povo, é muito mais provável que uma sociedade organizada sob o signo da violência e do autoritarismo interno, baseada em um fanatismo ideológico, invista contra outro povo, que naquele momento representa a origem e a fonte de todo o mal, de todo o drama. Em ambos os casos, a consideração do homem com sua própria espécie é facilmente perdida ou ignorada. Basta transformar o outro na encarnação do mal, seja ele um estrangeiro, um integrante de alguma minoria, um estrangeiro dos estrangeiros. Seja ele um sujeito ou uma coletividade, especialmente se esta coletividade puder ser denominada, na conhecida fórmula hitlerista, atualmente tão bem assimilada por setores da auto-intitulada esquerda revolucionária. Nestes momentos, há o impedimento do uso da razão, da justiça, da liberdade, da democracia, grandes conquistas da civilização.
Em “Psicologia de Grupo e Análise do Ego”, Freud afirma que a psicologia das massas faz com que o indivíduo sinta-se pertencente a uma unidade invencível. Como estar em uma associação de irmãos é pertencer a uma horda, o sujeito necessita e deseja ser guiado por um chefe, por um líder, por um temido “pai primitivo”, um verdadeiro ente que encarna a potência dos impotentes, um “revolucionário autêntico”, detentor da palavra do grupo, do verbo, de suas representações discursivas e simbólicas. O grupo deseja ser governado por este ser extraordinário, uma vez que lhe atribui uma força irrestrita e nutre por ele extrema paixão. É nestas situações que a personalidade individual definha e o sujeito permite-se a liberação de pulsões que individualmente reprimiria. O líder bate no peito, grita palavras de ordem, pronuncia frases de efeito mesmo que não tenham conteúdo, convoca para uma luta mesmo sabendo que a mesma não se dará naqueles termos. No fenômeno de massas, o líder carismático é colocado como o ideal do grupo, ocorrendo uma sujeição total a ele. Obedientes seguidores, os membros do grupo perdem a capacidade de análise, substituem a crítica pelo dogma, a razão pela irracionalidade.
De fato, nas análises pseudomarxistas feitas por estes grupos auto-intitulados de esquerda não há relação, mas opção. Há um julgamento e não uma análise que dê conta da dinâmica do confronto entre forças políticas e o que efetivamente estas representam. Estas “análises” não estão interessadas nas contradições, na história, enfim, no materialismo histórico e dialético. Tampouco se preocupam com a precisão conceitual. Falam de genocídio e acusam os judeus de cometê-lo no recente conflito. Genocídio é a destruição intencional de um povo para eliminá-lo, como foi o caso dos armênios, como foi o caso do Holocausto, como foi o caso de Ruanda e ainda é o caso de diversas tribos indígenas. Mas, pregam a tese da destruição intencional de Israel. Seria um paradoxo? Seria uma estupidez teórica e política? Seria um descuido? Ou seria uma proposta de genocídio contra o sionismo? Esta auto intitulada esquerda esmera-se no discurso do disfarce, mas não consegue sequer esconder o rabo.
Que lamentável decadência! Com tantas contradições presentes no capitalismo contemporâneo, com a acentuada crise de acumulação capitalista que se desenrola no interior do neoliberalismo, estes “analistas” vão buscar inspiração no seu próprio preconceito! E têm certeza que o Hezbollah vai alavancar a luta a favor dos “companheiros da Volks”. Seria muito cômico se não fosse excessivamente trágico.
Mais de 60% da população israelense é a favor de um Estado Palestino independente. Porém, existem obstáculos tanto em Israel, como entre os Palestinos para que um acordo de paz se viabilize. Há forças políticas que se negam a um acordo por motivos religiosos e ainda que tais forças sejam majoritárias entre os palestinos, por mais que se considerem outras causas, incluindo erros de governos israelenses, as forças que se negam a um acordo em Israel são minoria. Na dinâmica dos conflitos existem muitas vítimas palestinas e israelenses, situação que deve terminar imediatamente, mas transformar este conflito em uma “política de destruição de um povo” ou em uma “política de destruição do Estado de Israel” só pode ser delírio ou preconceito. Ou, para ser mais preciso, somente pode ser uma solução proposta por um híbrido de uma auto intitulada esquerda revolucionária com o fundamentalismo islâmico que reclama pelo desaparecimento de Israel. As questões envolvendo Israel e a Palestina, tanto quanto os conflitos com o Hezbollah (financiado pela Síria e pelo Iran), são muito mais antigas, complexas e profundas do que o que imagina e prega em seu catecismo a vã filosofia do fim do Estado e da luta contra o imperialismo da auto intitulada esquerda.
Contudo, é esta pregação que pretende manter vivo o dito marxismo. Uma vez enterrado o marxismo como práxis política, como teoria ou mesmo como filosofia ou epistemologia, estes arautos do niilismo intelectual que trataram de desconstruí-lo, tratam de reconstruí-lo, segundo uma lógica pós-moderna, agora em seu aspecto religioso. A religião marxista, como qualquer religião, é uma ilusão, já dizia Freud. É alguma coisa que não necessita confirmação, é um dogma, uma crença, e basta que os neo-militantes acreditem no marxismo religioso e em suas promessas para que elas se tornem fatos, independentemente de que estes fatos sejam verificados. Como se sabe, religiões necessitam de sacerdotes (ou pastores) e é aí que surgem os sempre oportunistas pregadores (ditos líderes) para falar de seu marxismo irreal, ilusório, que não defende os sujeitos individuais ou coletivos (inclusive as classes sociais), mas que precisam manter viva a chama da promessa de que sua religião marxista pode e irá proteger a todos e salvar a todos, mesmo que para tanto deva associar-se aos seus piores inimigos, ao mundo atrasado do ultra-conservadorismo de direita. Este marxismo religioso é uma ilusão exatamente porque, fundamentado na crença generalizada de sua superioridade, propõe-se a responder a todas as perguntas, a encontrar todas as soluções para as angústias humanas, baseado nas interpretações que fazem dos escritos do seu mito criador e seus fiéis discípulos. O real, contrariando a tese marxista, perdeu a sua primazia para a metafísica.
André Glucksmann, filósofo francês, disse recentemente , a propósito dos protestativos profissionais, que lhe indigna a indignação de tantos indignados. Alguns mortos muçulmanos pesam menos que uma pluma, enquanto outros pesam toneladas. Os crimes terroristas de cinqüenta civis, diariamente, em Bagdá, aparecem na seção de sucessos, enquanto um bombardeio contra um grupo terrorista que mata 28 pessoas, incluindo civis, é colocado na conta de crime contra a humanidade. São dois pesos e duas medidas, afirma Glucksmann. Por que, pergunta ele, os 200.000 mortos de Darfur não despertam nem 20% das reações de horror que despertam as vítimas 200 vezes menos numerosas do Líbano? Quando os muçulmanos matam outros muçulmanos parece que isto não conta nem para as autoridades corânicas e nem para a má consciência ocidental. A explicação é necessária, posto que quando o exército russo, cristão e ungido pelo Papa, arrasa a capital dos muçulmanos chechênios (Grozny, que possui 400.000 habitantes), em uma “operação anti-terrorista”, de acordo com o Primeiro Ministro (e depois Presidente) Vladimir Putin, e mata dezenas de milhares de crianças, nada conta. O Conselho de Segurança da ONU não realiza reuniões freqüentes para discutir a situação e a Organização dos Estados Islâmicos desvia seu olhar desta realidade. Parece, diz Glucksmann, que se é obrigado a concluir que só muçulmanos mortos por israelenses provocam indignação universal.
Deve-se crer, pergunta Glucksmann, que Ahmadineyad (Presidente do Iran) disse em voz alta o que a opinião pública mundial murmura para si mesma? Nota-se que um grande número de consciências ocidentais ultrajadas pelos bombardeios no Líbano se sente indignada quando se suspeita que seja anti-semita. Pode-se acreditar nelas, não estivesse o mundo a imaginar que todos vivem a paranóia anti-semita. Porém, o mistério aumenta ainda mais. Por que semelhante paralisia? Por que uma indignação mundial sobreexagerada quando se trata de bombas israelenses? Se as imagens das destruições no Líbano causam impacto incomparavelmente muito maior do que os famintos de Darfur e as ruínas da Chechênia, é porque levam implícitos os subtítulos de uma geopolítica surrealista. Quem contempla a atualidade de Cana ou de Gaza não conta somente os féretros dos piores dias: os desafortunados a quem enterram parece que levam a auréola de um presságio fatal, desconhecido em centenas de milhares de cadáveres africanos ou caucasianos, conclui Glucksmann.
Os criativos proponentes de um Estado Palestino laico construído sobre a destruição do Estado de Israel acreditam ter achado a solução para a definitiva paz. Com isso, seriam resolvidos todos os conflitos no Oriente Médio: o fanatismo religioso desapareceria sob o laicismo estatal; as divergências belicosas, tais como as que hoje ocorrem entre xiitas, druzos e sunitas, por exemplo, acabariam em um grande congraçamento; as revoluções sangrentas, as ditaduras sanguinárias, o terrorismo e a obsessão anti-ocidental apagar-se-iam com o sopro mágico deste outro Estado. Em resumo, o futuro de uma ilusão seria outra ilusão, baseada no fim das relações de poder. Diante deste sacrilégio teórico e prático, desfilam os faltos, com suas melopéias.
A existência do Estado de Israel nunca foi obstáculo ao anti-ocidentalismo assim como não é motivo ao anti-semitismo. É necessário muita ingenuidade ou má fé para não perceber que a destruição de Israel encerra, ao mesmo tempo, uma motivação relacionada à judeofobia e um pretexto para uma “guerra santa” em todas as frentes, que nada tem de conteúdo socialista ou antiimperialista, pois a pretensão é exatamente a imposição de um outro imperialismo, baseado no fanatismo religioso, o qual certamente não andará de mãos dadas com o fanatismo religioso dos neomarxistas. Uma vez destruído o Estado de Israel, somente os ignorantes ou os de má índole acreditarão que os fanáticos religiosos festejarão a vitória com o abandono das armas. É preciso dizer mais: somente o purismo relativo à parvoíce pode alimentar a crença de que a esta mesma esquerda será permitido organizar-se politicamente e atuar democrática e livremente, de maneira crítica, independente e autônoma, naqueles países. A geopolítica de má fé se converteu em ideologia religiosa. O neonazismo se reorganiza muito rapidamente no mundo, sob a complacência de uns e com a conivência e o apoio de outros, inclusive da falsa esquerda.
Como observa Roberto Romano (Correio de Campinas, 29/08/2006), “Jean-Pierre Faye fala na ‘ferradura ideológica’ pela qual circulam os discursos totalitários. Enunciações geradas no nazismo terminam em bocas da esquerda. É o que ocorre com o anti-semitismo que explode entre nós. Iniciada nas ‘fontes’ venenosas que saciaram o ódio de Hitler pelos judeus, a fala racista passa pela esquerda”. Ao “ato público” realizado em uma universidade pública, “só foram convidados os defensores de uma doutrina. E assim as mentiras fascistas se espalham: a propaganda nega o contraditório, porque lhe interessa impor sua vontade de potência. O asco é resposta aos que promovem o racismo sob a capa mentirosa das ‘lutas sociais’”. Para acompanhar este evento, diante das sempre raivosas demonstrações de irascibilidade destes auto denominados marxistas revolucionários, algumas autoridades universitárias e demais associações representativas adotam aquela clássica posição ambígua dos que se acomodam no berço da neutralidade dos coniventes.
A pretexto de propagar e defender o marxismo ou, segundo estes grupos se consideram, o único, o verdadeiro e o legítimo marxismo, os mesmos estão corroendo toda a base do marxismo, simplificando-o, reduzindo-o a mero discurso vazio e inconsistente, atacando-o com a pior das armas que é o seu uso irresponsável e oportunista, jogando pelo ralo como água suja um século e meio de construção. A judeofobia destes grupos auto intitulados de esquerda é grotesca: Marx, Trotski e Rosa Luxemburgo, por exemplo, são judeus. É vergonhoso, para um marxista ou para quem está simplesmente no campo da esquerda, ser confundido com estes grupos, como se toda a esquerda fosse uma só e, em sendo uma, fosse esta. Portanto, é imperioso indicar o que caracteriza esta auto-intitulada esquerda.
Não é uma tarefa simples ser marxista e ter, como referência epistemológica e teórica, o materialismo histórico e dialético. Principalmente nos dias atuais. Primeiro, porque a forma de se conduzir diante do real tendo por base o materialismo histórico e dialético requer muito investimento intelectual, muita dedicação e uma necessária quebra de preconceito contra outras formas de pensamento, pois não é preciso depreciar as outras teorias para valorizar a escolha, a não ser que não se acredite na força e pertinência da escolha feita. Em segundo lugar, porque o marxismo tem sido tratado com muito desdém pelos liberais e neoliberais, geralmente ignorantes do poder que o mesmo possui devido ao seu rigor teórico, metodológico e epistemológico. Há uma tentativa permanente de escarnecer o marxismo por seus supostos fracassos teóricos, pelo fato de que sua teoria não explica todos os fenômenos e pelo insucesso que representou o chamado socialismo real. Porém, nada disto tem relação com o marxismo de Marx. Marx não era profeta e não poderia explicar o que ainda não era real; Marx não era um hipercientísta, capaz de apresentar uma explicação definitiva sobre todos os ramos da ciência; Marx jamais advogou a tese de que seu socialismo científico tivesse a forma que teve o que se chamou de socialismo real. Marx era um sujeito. Brilhante, mas um sujeito. Seus textos são provas de uma das mais extraordinárias produções científicas e filosóficas da história da humanidade, mas, como todas as demais, possuem contradições, contêm equívocos, são limitadas pela realidade e pelo estágio científico e tecnológico em que foram criadas. Além disto, uma parte do que escreveu foi publicado sem sua revisão final, após sua morte, o que deixa dúvidas sobre a precisão de algumas passagens. Porém, de um autor só se pode esperar o que ele pretendeu fazer, caso contrário segue-se o caminho da mitificação.
Se, com todos estes fatores, já é uma tarefa difícil ser marxista, mais ainda se torna quando ao marxismo se agregam grupos de oportunistas, que o destroem feito vírus, com seus vícios, sua decadência, seu descompromisso. Estes formam o marxismo pérfido ou a esquerda pérfida. À diferença do marxismo e de uma esquerda genuína, grupos que formam o marxismo pérfido padecem de: (i) falta de autenticidade, pois desenterram suas “análises” de ultrapassadas realidades; (ii) atraso, pois desejam fazer regredir a história; (iii) preconceito, pois já têm o fato julgado antes de analisá-lo e mesmo diante da realidade mantém o pré-julgamento; (iv) incompetência científica, pois mesmo quando o real concreto aponta para complexas relações, satisfazem-se com análises simples e superficiais; (v) incapacidade de elaboração teórica original, pois ainda que tenham à sua disposição a mais sólida ferramenta teórico-epistemológica, insistem em fazer dela um dogma; (vi) ideologização da práxis política, pois procuram legitimar seus discursos e idéias com bordões e palavras de ordem retiradas do referencial marxista e deslocadas do lugar de sua produção original, encobrindo o real; (vii) criminalização de um Estado livre e democrático, pois ignoram convenientemente que em Israel existe oposição ao governo, liberdade de expressão e de organização; (viii) preferência pelos valores obtusos da Idade Média, pois se decidem pela defesa de um modo de vida feudal pelo simples fato do mesmo resistir ao capitalismo, como se esta resistência tivesse a mesma qualidade que uma luta contra o capitalismo no interior do mesmo; (ix) opção pela tirania, pois consideram a opressão e a crueldade como símbolos do heroísmo; (x) pacto com políticas nazistas, pois aplaudem o nacional socialismo latino americano e mundial e seus acordos com a pior tradição da direita, desprezando um fato histórico tão recente cujas conseqüências foram incomensuráveis; (xi) covardia, pois fogem dos verdadeiros debates no campo da esquerda já que seus argumentos são inconsistentes e se baseiam apenas em surrados discursos; (xii) autoritarismo, pois são incapazes de aceitar as diferenças e se comportam como raivosos componentes de uma ditadura típica do submundo do crime, a qual protege os aderentes e elimina os divergentes; (xiii) incoerência, pois afirmam que a religião é o ópio do povo, mas apóiam com raro entusiasmo o fanatismo religioso.
Por tudo isto, com a devida licença de Émile Zola que, com sua carta pública, de 13 de Janeiro de 1898, fez reabrir o caso do Capitão Alfred Dreyfus, judeu, sentenciado à Ilha do Diabo, da mesma forma Eu Acuso estes grupos da esquerda pérfida de anti-semitas. De igual modo, Eu os Acuso de anti-marxistas.
O materialismo histórico e dialético é a base epistemológica que Marx utiliza para explicar as mudanças ocorridas na sociedade através de seus elementos contraditórios. Não obstante Marx tenha explicitado seu método, sua teoria e suas concepções com bastante clareza, apesar da complexidade de seu pensamento, cada um de seus vários seguidores postula para si a propriedade da única e verdadeira interpretação. Eis que existem, nesta cesta, os vários “marxismos verdadeiros”: stalinista, leninista, estruturalista, mecanicista, formal, fenomenológico, maoísta e, entre outros, os atuais populistas nacionalistas. Também é possível encontrar o marxismo ortodoxo dogmático, que postula que Marx explicou tudo o que pretendia explicar, explicou o que não pretendia explicar e explicou o que não podia explicar.
Este último marxismo, o da beatificação, o religioso, mais comum do que se pensa, vale-se de categorias marxistas de análise, mas o faz de forma idealista, descolada do concreto, como se este tivesse sido imobilizado desde a publicação de O Capital. Além destes, existem os falsos marxismos, que se utilizam de alguns pensamentos de Marx para parecerem marxistas; estes muitas vezes se misturam aos demais e, de forma insidiosa, se vão amalgamando até serem confundidos com os mesmos e deles não se distinguindo devido à sua condição mimética, a não ser que se preste atenção às suas características camaleônicas.
No Prefácio da "Contribuição à Crítica da Economia Política", Marx identifica os seguintes estágios de desenvolvimento das forças produtivas (modos de produção): asiático (comunismo primitivo), escravista (da Grécia e de Roma), feudal e burguês. A tese geral marxiana (para não confundir com os mencionados marxismos) é a de que o modo pelo qual a produção das condições materiais de existência de uma sociedade é realizada condiciona a organização política e as representações ou, para dizer de outro modo, a base material ou econômica condiciona diretamente a formação das instituições jurídico-políticas (as leis, o Estado) e ideológicas. No processo histórico, tais contradições são geradas pelas lutas entre as classes sociais em presença. Resumidamente, a evolução de um modo de produção para outro ocorre a partir do desenvolvimento das forças produtivas e da luta de classes, de forma que o movimento da História não somente segue um processo de transformação progressivo, como obedece a um movimento dialético.
Para o marxismo autêntico, aquele que se baseia no pensamento original de Marx e reconhece sua força e suas fragilidades, assim como o capitalismo surgiu do feudalismo desenvolvido, é do capitalismo desenvolvido, dialeticamente expresso, que surgirá um modo de produção superior. Não faz o mínimo sentido, para o marxismo autêntico, que a história possa ou deva regredir. O que há de feudal no capitalismo são resquícios de um modo de produção que ainda permanecem e que permanecerão até que o modo atual tenha se desenvolvido plenamente, quando, então, será também superado.
Nesta profusão de esquerdismos, alguns grupos de uma auto-intitulada esquerda, que por suposto deveriam ter como meta a construção do socialismo ou, então, de uma sociedade democrática, passam a manifestar publicamente apoio a práticas medievais, que escravizam mulheres e não reconhecem a elas igualdade de direitos com os homens; apoio a regimes baseados na tirania, em que os opositores podem ter a mão decepada ou sofrer humilhações e nos quais, com toda a certeza, estes mesmos grupos de esquerda não teriam liberdade para se manifestar e se o fizessem não sobreviveriam; apoio ao fanatismo religioso que a esquerda conceituaria como sendo demonstração de primitivismo; apoio aos que se recusam a possuir mercadorias do mundo capitalista ocidental, mas que paradoxalmente, utilizam sua mídia eletrônica, sua ciência e sua tecnologia ultra-moderna; apoio a um sistema educacional que se sustenta no princípio do ódio; apoio, enfim, a práticas superadas pelas lutas de resistência dos trabalhadores, nas quais muitos pagaram com a própria vida. Tudo isto baseado na lógica de que qualquer coisa que seja contra o capitalismo deve ser apoiada e incentivada, mesmo que represente o atraso. Este é o fundamento da falsa esquerda, que não trata da unidade dos contrários, do desenvolvimento das forças produtivas, da busca de uma síntese, mas que demonstra uma preferência subjetiva movida pelo sentimento objetiva e historicamente preconceituoso. Neste sentido, o materialismo aparece na forma de ideologia, o histórico na forma de dados manipulados e o dialético na forma de classificação dicotômica.
O falso marxismo aproveita-se de todas as situações para acenar suas bandeiras repletas de símbolos e para proferir discursos elegendo os sempre disponíveis demônios e também prometendo aos seus seguidores a ataraxia social. De fato, o conflito recente no Oriente Médio é uma destas situações que faz reabrir velhas e surradas análises eivadas de equívocos, parciais e maniqueístas. Certos pensadores que se pretendem dialéticos mostram-se incapazes de encontrar a unidade dos contrários, base analítica da busca da negação, e entram no fácil caminho da dicotomia entre o bem e o mal, tratando como se fossem oposições o que nem ao menos é dialética mecanicista. Outros, revelam desprezo pela história e a reduzem a um conjunto mal feito de efemérides, às vezes até ordenadas cronologicamente para dar certa impressão de capricho contextual. Para estes “analistas”, o Oriente Médio se divide em dois grupos: o do capitalismo, representado por Israel e o do anti-capitalismo, representado pelo Hamas, Hezbollah e seus financiadores. Tais analistas, em primeiro lugar, caem em um erro comum, de certa maneira promovido pelos Islamitas Integristas, que se resume em colocar todos os fatos na mesma cesta analítica. O que está se passando no Líbano não tem relação direta com a questão Palestina, mas a auto-intitulada esquerda não é capaz de ver qualquer diferença, já que seu mundo se divide em capitalismo e anti-capitalismo. O Islã tenta hoje se apropriar das crises do Mundo Árabe e propor soluções de "Volta à era gloriosa do Profeta", à época da Expansão Islâmica, ou seja, à Idade Media. E é para a Idade Média que a auto-intitulada esquerda está desejosa de ir, talvez saudosa dos bons tempos do feudalismo, das monarquias absolutas, das corporações de ofícios, das jornadas de trabalho de 14 horas para trabalhadores de até 12 anos.
Quando estes “analistas” da auto-intitulada esquerda se dispõem a explicar um fato a partir de uma história sem passado, nos deparamos inevitavelmente com análises plenas de erros, nas quais tudo se justifica para “um lado”, que é o lado do bem, descrito como tendo sua origem natural pela existência do outro, o lado do mal. Psicanaliticamente, poder-se-ia falar de um psicótico: sou o que sou por culpa do outro e não tenho responsabilidade alguma em sê-lo. Daí, proliferam as análises do tipo causa-efeito, tão ao gosto do raciocínio linear, inaugurando, quem sabe, um novo sub-marxismo: o linear-positivista. “Um lado” é apresentado como bondoso, caridoso, social, humano, assistencial e deificado. O outro, é apresentado como malévolo, demoníaco, desumano, assassino. Esta história, como se sabe, já tem milênios. E quando tudo se justifica para um e tudo se condena para outro, pratica-se um outro tipo de terrorismo: o do preconceito. Este que se esconde sob a máscara dos que não assumem suas faces.
Nada justifica, de “um lado” e de outro, a morte de inocentes. Não há bons e ruins nas guerras. Há apenas a barbárie humana. Pode-se explicar qualquer conflito que tire a vida de uma única vítima que seja, mas não há nenhum argumento, por melhor que seja, que o justifique. Porém, criminalizar um e inocentar ou sacralizar outro é tentar justificar o injustificável, é dar abrigo “ao que não tem governo nem nunca terá, ao que não tem juízo” . Por este motivo é também necessário questionar, como se deve fazer, que outros fatores se encontram impregnados neste conflito. Não para justificar, mas para entender.
Acobertar e aceitar atitudes, omitir informações, deturpar a história, não são atividades compatíveis com a tradição da esquerda, pelo menos da esquerda autêntica. Por esta razão, a humanidade orgulha-se dos seus grandes expoentes, que não caíram na armadilha do discurso fácil dos acusadores em busca de aplausos dos que nada sabem, que não se deixaram levar pelas aparências, pois eles sempre foram a garantia do registro de um passado que é necessário expor sem julgamentos pré-concebidos. Hoje, ao contrário, é fácil encontrar análises que, a pretexto de revelarem a história, primam pela quantidade de inverdades, distorções, exageros, omissões, confusões e mitos. Deste modo, convém lembrar que se alguma verdade pode ser encontrada é que a verdade é o lugar da práxis.
O que passa no Líbano atualmente é do estilo déjà vu . País criado depois da Primeira Guerra Mundial, tendo como cenário a rivalidade Franco-Britânica, o Líbano se caracterizou pela sua sociedade pluri-confessional, sendo quatro as comunidades importantes que o constituíram: Muçulmanos Sunitas, Muçulmanos Xiitas, Druzos e Cristãos Maronitas. Na época (anos 1930 e 1940), os Cristãos Maronitas eram maioria. Em 1943, no Pacto Nacional que representa um acordo constituinte de vida civil em comum, estabeleceram-se as bases políticas do País. Trata-se de um equilíbrio muito sensível que foi resultado de um acordo das duas maiores comunidades naqueles anos (Maronitas e Sunitas) que lograram manter sempre o Presidente Maronita e o Primeiro Ministro Sunita, com um sistema de proporção na representação parlamentar.
Convém salientar as ocasiões em que este equilíbrio foi abalado, para se poder perceber os traços comuns dos acontecimentos:
1. Em 1958, sob a influência Nasserista (Pan-Arabismo), há uma tentativa de tomada de poder, em que se buscou derrubar o Presidente Camille Chamoun, visto como pró-ocidente. É a época da Guerra Fria e o Líbano é invadido pelos Marines Americanos (Eisenhower);
2. No fim dos anos 1970, a Organização para a Libertação da Palestina – OLP começa seu capítulo Libanês e tenta fazer dele a base da luta Árabe contra Israel, acusado de representar o Imperialismo Americano no Oriente Médio. Inicia-se uma guerra civil que abala de novo o equilíbrio precário da Sociedade libanesa. Nesta época, se armam as milícias Confessionais: os muçulmanos apóiam a OLP; os cristãos unem-se em torno das Falanges de Pierre e Bashir Jumayel; os druzos juntam-se com a milícia de Kamal Jumbalat; os xiitas unem-se em torno do Movimento AmAl de Nabi Berri. Esta fase vai precipitar a Invasão de Israel ao Líbano em 1982;
3. Dos anos 1990 até hoje, é a vez do Integrismo Islâmico, que também clama por um estilo de "Pan-Islamismo", e que novamente desequilibra o Líbano, fazendo dele sua base revolucionária, que obviamente passa pela "Luta pela destruição do Estado Sionista". Seu protagonista, desta vez, é o Hezbollah xiita.
O que é comum nos três episódios é: penetração política em um Estado com equilíbrio precário; abalo do sistema; exportação de um sonho de unidade dos "Oprimidos" contra a civilização dominante, que é a civilização ocidental, embora certos analistas da auto-intitulada esquerda insistam que se trate apenas do capitalismo. O capitalismo é apenas parte do problema. O que está em jogo são os valores da civilização ocidental, a moral, as liberdades (especialmente as referentes à sexualidade) e tudo o que represente uma ameaça aos preceitos do islamismo. Por este motivo, no Oriente Médio, Israel é o alvo propício. Tratando-se de um corpo estranho no habitat do Oriente Médio, Israel sem dúvida é um País com características ocidentais e uma democracia, algo raro na região, e ainda por cima é desenvolvido economicamente nos moldes capitalistas. Daí à fantasia ideológica, a distância é pequena.
A questão libanesa, considerando que o Líbano é o País mais ocidental do mundo Árabe, passa por restituir o equilíbrio confessional desta Sociedade, restabelecer o papel do poder central, democraticamente eleito, desarmar todas as milícias, dar poderes ao Exército libanês, que deve receber ordens do poder legitimo e assegurar internacionalmente as fronteiras reconhecidas do Líbano. É obvio que isto implica na retirada total do Exército Israelense e de toda presença militar estrangeira no Líbano.
Resolvida a questão libanesa, Israel deve procurar por todos os meios participar do esforço para resolver a questão Nacional Palestina, que passa inevitavelmente pela sua saída dos territórios Palestinos ainda ocupados. Isto não pode acontecer sem a compreensão dos Palestinos de que a aventura "Hamassita" é o caminho mais inapropriado para qualquer solução. É preciso reconhecer o direito aos palestinos a um Estado Palestino autônomo, livre e democrático.
No entanto, não é desta forma que certo grupo de intelectuais de uma auto denominada esquerda aborda este tema. Dando vazão ao recorrente vício de analisar o que não entendem e apresentar soluções para o que desconhecem, tendo por base empírica o movimento nos corredores dos seus locais de trabalho, tais intelectuais vociferam suas posições. Felizes, por certo, com o pacto antiimperialista proposto por um populista nacionalista latino americano com um governo não democrático do Oriente, tais intelectuais decidem importar o conflito entre Israel e os grupos Hamas e Hezbollah para o interior da maior universidade pública brasileira, através de uma associação sindical de seus trabalhadores . Para tanto, promoveram um ato contra o massacre no Líbano e na Palestina. Não há barbárie maior ou menor, justificada ou injustificada, boa ou má: barbárie não tem adjetivação. Por este motivo um ato contra a barbárie é importante. Entretanto, a auto intitulada esquerda fez um grande alarde para arrombar portas abertas. Era preciso, em nome da coerência, arrombar portas fechadas. Onde estava esta auto intitulada esquerda para fazer um ato contra a barbárie durante os anos da revolução cultural chinesa? Onde estava esta mesma falsa esquerda para fazer um ato público contra as barbáries do stalinismo? E onde estava a falsa esquerda para fazer um ato público contra a maior mortandade ocorrida no Líbano, causada pela própria Guerra Civil, um conflito interno que se iniciou em abril de 1975 e com a OLP, xiitas, sunitas, drusos e a Síria de um lado, contra cristãos maronitas e setores da direita do outro, matando 150 mil pessoas?
Em relação a Sabra e Chatila, as estimativas de mortos variam de 300 a
500, segundo a polícia libanesa. De todas as aldeias libanesas que sofreram massacres, as únicas que ficaram conhecidas são as de Sabra e Chatila, em 1982.
Entretanto, em maio de 1985, houve novo massacre em Chatila e em Burj-el Baranjê quando muçulmanos atacaram os acampamentos. Segundo a ONU, houve 635 mortos e 2.500 feridos. E durante uma batalha de dois anos entre a milícia xiita Amal – respaldada pelo Governo Sírio – e a OLP, foram registrados mais de dois mil mortos, incluindo muitos civis. Onde estava a auto intitulada esquerda para organizar um ato público contra estas barbáries? Será que, neste sentido, para a falsa esquerda a moral deles é diferente da nossa, como anuncia o título de um manifesto de Trotski? Será que as “mortes deles”, dos inimigos da revolução, são melhores, mais justas e justificadas, em relação às “nossas”?
Em “A cruzada ética contra o marxismo”, Osvaldo Coggiola afirma que “o próprio objetivo de unir a classe operária internacional, para dar fim à exploração, elimina logicamente, apesar das vantagens a curto prazo que isso possa ter num ou noutro país, qualquer apelo a interesses particularistas, como o racismo ou o chauvinismo, qualquer incitamento à ação não baseado na igualdade fundamental de todos os homens, em toda parte”. Para Coggiola, a esquerda perdeu a ética de classe e, com isto, perdeu “a sua própria natureza de esquerda e, não raro, a própria vergonha”. O que não deixa alternativa que não seja “construir uma outra esquerda, baseada nos princípios classistas e na tradição histórica do marxismo revolucionário”. O diagnóstico é interessante, mas o remédio nem tanto. Não há dúvida que a esquerda deve ter um projeto político no qual não cabe o imperialismo, não cabe a exploração da força de trabalho, não cabe a exclusão social, não cabe o autoritarismo, não cabe a violência. Entretanto, é preciso acautelar-se. Primeiro, porque não há necessidade de criar nenhum novo marxismo, bastando apenas fazer o devido enfrentamento aos sub-marxismos; segundo, porque marxismo revolucionário é uma tautologia; terceiro, porque à conta de criar algo novo é que se destruiu o original e se fortaleceu a cópia mal feita.
É necessário que seja dito de forma clara e sem subterfúgios que, para a esquerda, não há e nem pode haver qualquer justificativa para uma guerra. Quando ela existe a humanidade falha. Mas, qualquer pessoa com uma capacidade mínima de reflexão sabe quantos interesses habitam os bastidores e que não se revelam. Daí que a história precisa ser escrita sobre os fatos concretos e suas relações sempre contraditórias. A prática do preconceito, este terrorismo de gabinete, em nada colabora para desvendar as contradições que se expõem neste conflito. Para a esquerda autêntica, assim como para qualquer humanista, uma única vítima já é motivo mais do que suficiente para tirar qualquer razão de quem quer que seja. Nada justifica tantas mortes. Mas, nada justifica a ignorância de que as mesmas tenham ocorrido ou, o que é pior, nada justifica que muitas delas sejam justificadas, esquecidas, omitidas, desprezadas e que não estejam estampadas em camisetas dos que realmente se interessam pela essência do mundo e não se iludem com suas aparências, como aliás ensinava Marx.
Pode-se pensar, contudo, que se trata de mera ignorância. Mas, é manifesto que se trata preconceito, deste sentimento de ódio que nasce e se desenvolve nos escritórios de “intelectuais”, espalha-se nas salas de aula, registra-se nos jornais e boletins de forma explícita ou insidiosa e, para justificar-se, precisa de um bordão legitimador comum, tal como “fim do imperialismo” ou “luta contra o capitalismo”, mas que, de fato, deseja "o fim do Estado de Israel" e “denuncia” quem lhes ousa contestar com o epíteto de “subserviência às 'poderosas' forças dos imperialistas e dos genocidas judeus". Judeus e não israelenses, o que já deixa claro que se trata de racismo. Isto em uma instituição universitária, onde alguns destes partidários da auto intitulada esquerda certamente se esmeram em apresentar o que julgam ser belas e úteis contribuições ao desenvolvimento das forças produtivas, capazes de acentuar as contradições do sistema de capital e de promover sua crise de acumulação. Eis que estes revolucionários das instituições, com seu idealismo feuerbachiano, fazem questão de ressuscitar e de convidar a entrar pela janela o morto que a realidade já havia expulsado pela porta. Marx, ao tratar da ideologia, ofereceu vários exemplos de como as “idéias fixas” podem servir para “orientar as classes” sem levar em conta seus reais interesses e seu lugar no processo de produção.
O fim do Estado de Israel pretende propor, enfim, uma solução mágica da auto intitulada esquerda criativa, que deve ter brotado dos gabinetes, dos grandes debates em salas de aula com presença maciça de dez a doze pessoas com larga experiência em política internacional, em geoestratégia, em conflitos, em unidade econômica, que é a: “criação do Estado Palestino laico, onde caibam todos, palestinos, israelenses, árabes...". Quem sabe estes intelectuais tão criativos também já não tenham pronta, tirada da manga, uma proposta de criação de uma simples associação de trabalhadores universitários onde caibam todos, esquerda, direita, centro, árabes, judeus, em que todos possam se expressar livremente, isonomicamente, com os mesmos direitos. Depois, talvez mereçam levar esta experiência a vôos mais altos, como, por exemplo, à própria universidade. Mas, para que cumprir esta trajetória se estes brilhantes intelectuais já possuem a grande solução para o Oriente Médio, uma solução que ninguém havia pensado, que é simples tal qual a simploriedade de seus proponentes?
Para abrilhantar o ato a favor da democracia uma lojinha vende camisetas e produtos do Hezbollah, para “financiar a gente aqui no Brasil”. A luta, dizem do alto de sua sabedoria de manuais, não é dos palestinos e libaneses, mas dos trabalhadores do mundo inteiro, e não se pode deixar de ocupar a trincheira de combate ao imperialismo. Aí está a capa protetora do discurso que pretende dar legitimidade ao racismo: o fim do Estado de Israel equivale ao combate ao imperialismo e ao sistema de capital no mundo. A auto intitulada esquerda, raivosa, professa, à moda dos que leram e não entenderam ou dos que entenderam e reinterpretaram à sua maneira, um outro marxismo, o da conveniência. O mundo do capitalismo repentinamente se encontra reduzido a um único Estado, com uma área territorial de cerca de vinte e dois mil quilômetros quadrados, cuja destruição representaria a destruição do imperialismo. Obviamente, é de se supor que em Israel não existam trabalhadores, apenas imperialistas; não existam partidos de esquerda, apenas de ultra direita. Em “O Dezoito Brumário”, Marx já havia denunciado esta prática ao mostrar como os jacobinos deram sentido à sua ação através da ênfase no verbo, promovendo a “ressurreição dos mortos” e ocultando aos olhos dos sujeitos seus objetivos reais, iludindo-os de modo eficaz.
Então, brotando da mais profunda cripta, um auto referenciado marxista revolucionário defende a destruição de todos os Estados, pois “enquanto houver burguesia e capitalismo, não haverá paz”. A utopia rousseauniana ilumina o palco em que estão sendo gerados os bons selvagens. O “Mal Estar na Civilização” é negado tal como Freud, seu autor, pois com o fim do Estado, os homens e mulheres deixarão de ser perversos, invejosos, cruéis, belicosos e defensores de interesses pessoais e passarão a ser cooperativos, bondosos, democráticos, pacifistas e defensores exclusivos dos interesses coletivos, tal qual se pôde observar nas experiências da União Soviética, da China, da Albânia e que ainda se observa em Cuba, na Venezuela, na Coréia do Norte, na Palestina, na Síria, no Irã, e no interior da organização Hezbollah. Mas, é preciso reconhecer que a superação do Estado é um projeto marxista em sua fase pós-socialista. É um estágio no qual a humanidade se elevaria a tal ponto em termos de vida associativa que retornaria ao modo comunista, mas não à sua forma primitiva. Se fosse esta a questão, acabar com o Estado, inclusive o de Israel, poderia ser um projeto de uma esquerda revolucionária. Mas, em seu lugar, a auto intitulada esquerda deseja colocar o que? Um outro Estado. Um Estado Palestino.
Então, a questão não é a destruição do Estado, mas de um Estado específico, que é, como se sabe, o Estado de Israel. De fato, para o auto referenciado marxista revolucionário, o que lhe interessa é travar “a luta nacional e internacional pela destruição do Estado de Israel e o imperialismo norte-americano”. A falsa esquerda, novamente, apropria-se de referências marxistas para usá-las de forma irresponsável, inadequada, descontextualizada.
O “profeta recém saído do forno”, para usar uma expressão de Engels a respeito do Senhor Düring, se coloca a pensar o fim do Estado assumindo um pensamento de Estado, utilizando categorias de análise produzidas e garantidas pelo Estado, o que mostra a fragilidade da sua reflexão. Sua concepção auto-referenciada de revolucionária o faz acreditar que isto o torna um sujeito independente do Estado, mas a mesma não poderia ter sido desenvolvida sem o apoio do Estado. Mais do que isto, sem ser financiada pelos recursos públicos que o Estado administra através da apropriação, via tributação, da massa de valor excedente produzida na sociedade . Ao destruir o Estado (caso isto fosse uma realidade e não uma projeção metafísica), o revolucionário deveria estar preparado para negar sua independência ou para usar contra esta nova forma de organização social a liberdade que o Estado democrático representativo lhe garantiu, ou seja, ser oposição de sua posição. Isto se ele não pretender ficar prisioneiro do pensamento de Estado, pois se for este o caso, o auto denominado revolucionário jamais teria a liberdade que postula naquele tipo de Estado que ele julga exemplar na luta contra o imperialismo. Sendo explícito, o auto denominado revolucionário poderia se organizar livremente no Estado de Israel, mas perderia sua independência nos tipos de Estado que ele toma como modelo.
As contradições seguem seu curso, inexoravelmente. A luta desta auto intitulada esquerda clerical prossegue em direção à destruição do capitalismo. Pode-se encontrá-la nos sites e blogs, estas poderosas máquinas da propaganda e da mídia informacional imperialista. Os participantes da luta são informados (e convocados) não apenas através de sites e blogs, mas diretamente via E.Mail, esta expressão do sistema capitalista de informação em tempo real, usando a rede de computadores fabricados por empresas capitalistas, disponíveis na universidade. Camisetas são produzidas usando a cadeia produtiva capitalista do setor têxtil. À mesa, garrafas de água produzidas por uma empresa capitalista e vendidas no mercado capitalista. Os organizadores deslocaram-se para a universidade em veículos produzidos pelo capitalismo, trabalham com instrumentos e equipamentos produzidos pelo capitalismo, vão ao supermercado e consomem mercadorias, submetidos à lógica do capitalismo e não conseguem enxergar um palmo na frente do nariz: o lugar da luta não é o que dizem ser. Mas não podem enxergar, pois sofrem de miopia teórica, política e prática impregnadas do inevitável racismo.
De fato, em seus discursos, eivados de equívocos teóricos, históricos, políticos e práticos, ficam evidentes não apenas a ignorância, a simplicidade da análise, a estupidez e a má fé, que já seriam suficientes para desqualificar as manifestações, mas o preconceito. Esta auto intitulada esquerda está “ombro a ombro, lado a lado” pela vitória do Hezbollah, “porque isso vai alavancar a luta contra o imperialismo. Uma derrota do imperialismo, uma derrota sobre o sionismo vai alavancar a luta do proletariado latino-americano, dos companheiros da Volks que estão sendo atacados agora, (...) vai levantar a luta contra a reforma trabalhista e sindical que Lula quer implementar em nosso País.(...) Até a vitória, até a destruição dessa máquina assassina!” O discurso inflamado tem como substrato a falta de substância e um grande excedente de estéril imaginação! Apelar para o Hezbollah para fazer frente à reestruturação produtiva do sistema de capital é o mesmo que cair no que Marx chamava, em “As lutas de Classes na França”, de “generosa embriaguez”, este ideologia fraternária que oculta a verdadeira luta de classes e promove uma “abstração negligente”.
A grandiloqüência arrogante das proclamações autovalorizantes não visa apenas desacreditar os oponentes, que, aliás, sequer podem se manifestar de forma isonômica no mesmo “espaço democrático”, mas valorizar os novos profetas, com seus exibicionismos retóricos destinados a um público ávido em ser convencido do que previamente já havia sido. Esta esquerda que Ruy Fausto (Jogo de Espelhos. Caderno Mais, Folha de São Paulo, 10.09.2006) chama de totalitária, populista, “heavy”, que acredita nas virtudes dos chefes autoritários, é uma esquerda “indulgente com os totalitarismos”. Trata-se de um grupo que ao mesmo tempo é admirado e admira a direita . Ruy Fausto argumenta que boa parte da direita “tem uma grande admiração pelos ícones da esquerda antidemocrática”. Por “realismo ou por falta de amor pela democracia, parte da direita tem uma fascinação secreta pela esquerda antidemocrática”. Ao mesmo tempo, continua Fausto, “a extrema esquerda antidemocrática, sob muitos aspectos, prefere a direita à esquerda democrática”. Aqueles, alerta Ruy Fausto com conhecimento de causa, que se permitem criticar esta esquerda são tratados com violência muito maior do que a que eventualmente usam contra a direita.
De acordo com Eric Hobsbawm (A Epidemia da Guerra. Caderno Mais, Folha de São Paulo, 14 de abril de 2002), cerca de 187 milhões de pessoas morreram em função de guerras no século passado. Na I Guerra Mundial, 5% eram civis; na II Guerra Mundial, 66% eram civis; nas “guerras modernas de alta tecnologia”, entre 80 e 90% dos afetados foram civis. Quanto mais avanços tecnológicos são incorporados pela indústria bélica, relativamente maior é o número de civis atingidos pela destruição. Mas, a barbárie faz parte do que Hanna Arendt chama de “banalidade do mal”. O que interessa é fazer com que esta indústria renove seu consumo e isto somente pode acontecer se forem utilizados seus produtos, não apenas para “repor os estoques”, como para incorporar “novas tecnologias”. A crise de acumulação de capital encontra, na “indústria da guerra”, uma forma de mobilizar o conjunto dos complexos industriais, colocando em movimento diversos elos das cadeias produtivas. Contudo, é um equívoco acreditar, dada a integração produtiva do mundo globalizado, que as beneficiárias serão apenas as indústrias sediadas na Alemanha, Inglaterra, Rússia ou Estados Unidos. Existe uma complexa rede de relações, da qual Manuel Castells, em “A Era da Informação”, analisando a “Sociedade em Rede”, esboça uma pista, muito articulada e com interesses mais profundos do que estes que aparecem na superfície.
Os avanços tecnológicos, o desenvolvimento dos aparatos normativos internacionais, a integração econômica, a evolução do processo civilizatório, contudo, não são capazes, como ainda crêem alguns, de frear a barbárie. Em “Mal Estar na Civilização”, Freud afirmava que a civilização está sempre ameaçada pela tendência humana de precisar dar vazão à sua agressividade de alguma forma . Para Freud, a cruel agressividade do homem espera alguma provocação, uma razão qualquer para exteriorizar-se. No âmbito internacional, as guerras têm sido a forma mais comum de exteriorização da violência. Assim, se uma sociedade organizada como Estado de Direito e, portanto, com controle da violência interna, pode, num determinado momento, mostrar-se sangrenta e cruel contra outro povo, é muito mais provável que uma sociedade organizada sob o signo da violência e do autoritarismo interno, baseada em um fanatismo ideológico, invista contra outro povo, que naquele momento representa a origem e a fonte de todo o mal, de todo o drama. Em ambos os casos, a consideração do homem com sua própria espécie é facilmente perdida ou ignorada. Basta transformar o outro na encarnação do mal, seja ele um estrangeiro, um integrante de alguma minoria, um estrangeiro dos estrangeiros. Seja ele um sujeito ou uma coletividade, especialmente se esta coletividade puder ser denominada, na conhecida fórmula hitlerista, atualmente tão bem assimilada por setores da auto-intitulada esquerda revolucionária. Nestes momentos, há o impedimento do uso da razão, da justiça, da liberdade, da democracia, grandes conquistas da civilização.
Em “Psicologia de Grupo e Análise do Ego”, Freud afirma que a psicologia das massas faz com que o indivíduo sinta-se pertencente a uma unidade invencível. Como estar em uma associação de irmãos é pertencer a uma horda, o sujeito necessita e deseja ser guiado por um chefe, por um líder, por um temido “pai primitivo”, um verdadeiro ente que encarna a potência dos impotentes, um “revolucionário autêntico”, detentor da palavra do grupo, do verbo, de suas representações discursivas e simbólicas. O grupo deseja ser governado por este ser extraordinário, uma vez que lhe atribui uma força irrestrita e nutre por ele extrema paixão. É nestas situações que a personalidade individual definha e o sujeito permite-se a liberação de pulsões que individualmente reprimiria. O líder bate no peito, grita palavras de ordem, pronuncia frases de efeito mesmo que não tenham conteúdo, convoca para uma luta mesmo sabendo que a mesma não se dará naqueles termos. No fenômeno de massas, o líder carismático é colocado como o ideal do grupo, ocorrendo uma sujeição total a ele. Obedientes seguidores, os membros do grupo perdem a capacidade de análise, substituem a crítica pelo dogma, a razão pela irracionalidade.
De fato, nas análises pseudomarxistas feitas por estes grupos auto-intitulados de esquerda não há relação, mas opção. Há um julgamento e não uma análise que dê conta da dinâmica do confronto entre forças políticas e o que efetivamente estas representam. Estas “análises” não estão interessadas nas contradições, na história, enfim, no materialismo histórico e dialético. Tampouco se preocupam com a precisão conceitual. Falam de genocídio e acusam os judeus de cometê-lo no recente conflito. Genocídio é a destruição intencional de um povo para eliminá-lo, como foi o caso dos armênios, como foi o caso do Holocausto, como foi o caso de Ruanda e ainda é o caso de diversas tribos indígenas. Mas, pregam a tese da destruição intencional de Israel. Seria um paradoxo? Seria uma estupidez teórica e política? Seria um descuido? Ou seria uma proposta de genocídio contra o sionismo? Esta auto intitulada esquerda esmera-se no discurso do disfarce, mas não consegue sequer esconder o rabo.
Que lamentável decadência! Com tantas contradições presentes no capitalismo contemporâneo, com a acentuada crise de acumulação capitalista que se desenrola no interior do neoliberalismo, estes “analistas” vão buscar inspiração no seu próprio preconceito! E têm certeza que o Hezbollah vai alavancar a luta a favor dos “companheiros da Volks”. Seria muito cômico se não fosse excessivamente trágico.
Mais de 60% da população israelense é a favor de um Estado Palestino independente. Porém, existem obstáculos tanto em Israel, como entre os Palestinos para que um acordo de paz se viabilize. Há forças políticas que se negam a um acordo por motivos religiosos e ainda que tais forças sejam majoritárias entre os palestinos, por mais que se considerem outras causas, incluindo erros de governos israelenses, as forças que se negam a um acordo em Israel são minoria. Na dinâmica dos conflitos existem muitas vítimas palestinas e israelenses, situação que deve terminar imediatamente, mas transformar este conflito em uma “política de destruição de um povo” ou em uma “política de destruição do Estado de Israel” só pode ser delírio ou preconceito. Ou, para ser mais preciso, somente pode ser uma solução proposta por um híbrido de uma auto intitulada esquerda revolucionária com o fundamentalismo islâmico que reclama pelo desaparecimento de Israel. As questões envolvendo Israel e a Palestina, tanto quanto os conflitos com o Hezbollah (financiado pela Síria e pelo Iran), são muito mais antigas, complexas e profundas do que o que imagina e prega em seu catecismo a vã filosofia do fim do Estado e da luta contra o imperialismo da auto intitulada esquerda.
Contudo, é esta pregação que pretende manter vivo o dito marxismo. Uma vez enterrado o marxismo como práxis política, como teoria ou mesmo como filosofia ou epistemologia, estes arautos do niilismo intelectual que trataram de desconstruí-lo, tratam de reconstruí-lo, segundo uma lógica pós-moderna, agora em seu aspecto religioso. A religião marxista, como qualquer religião, é uma ilusão, já dizia Freud. É alguma coisa que não necessita confirmação, é um dogma, uma crença, e basta que os neo-militantes acreditem no marxismo religioso e em suas promessas para que elas se tornem fatos, independentemente de que estes fatos sejam verificados. Como se sabe, religiões necessitam de sacerdotes (ou pastores) e é aí que surgem os sempre oportunistas pregadores (ditos líderes) para falar de seu marxismo irreal, ilusório, que não defende os sujeitos individuais ou coletivos (inclusive as classes sociais), mas que precisam manter viva a chama da promessa de que sua religião marxista pode e irá proteger a todos e salvar a todos, mesmo que para tanto deva associar-se aos seus piores inimigos, ao mundo atrasado do ultra-conservadorismo de direita. Este marxismo religioso é uma ilusão exatamente porque, fundamentado na crença generalizada de sua superioridade, propõe-se a responder a todas as perguntas, a encontrar todas as soluções para as angústias humanas, baseado nas interpretações que fazem dos escritos do seu mito criador e seus fiéis discípulos. O real, contrariando a tese marxista, perdeu a sua primazia para a metafísica.
André Glucksmann, filósofo francês, disse recentemente , a propósito dos protestativos profissionais, que lhe indigna a indignação de tantos indignados. Alguns mortos muçulmanos pesam menos que uma pluma, enquanto outros pesam toneladas. Os crimes terroristas de cinqüenta civis, diariamente, em Bagdá, aparecem na seção de sucessos, enquanto um bombardeio contra um grupo terrorista que mata 28 pessoas, incluindo civis, é colocado na conta de crime contra a humanidade. São dois pesos e duas medidas, afirma Glucksmann. Por que, pergunta ele, os 200.000 mortos de Darfur não despertam nem 20% das reações de horror que despertam as vítimas 200 vezes menos numerosas do Líbano? Quando os muçulmanos matam outros muçulmanos parece que isto não conta nem para as autoridades corânicas e nem para a má consciência ocidental. A explicação é necessária, posto que quando o exército russo, cristão e ungido pelo Papa, arrasa a capital dos muçulmanos chechênios (Grozny, que possui 400.000 habitantes), em uma “operação anti-terrorista”, de acordo com o Primeiro Ministro (e depois Presidente) Vladimir Putin, e mata dezenas de milhares de crianças, nada conta. O Conselho de Segurança da ONU não realiza reuniões freqüentes para discutir a situação e a Organização dos Estados Islâmicos desvia seu olhar desta realidade. Parece, diz Glucksmann, que se é obrigado a concluir que só muçulmanos mortos por israelenses provocam indignação universal.
Deve-se crer, pergunta Glucksmann, que Ahmadineyad (Presidente do Iran) disse em voz alta o que a opinião pública mundial murmura para si mesma? Nota-se que um grande número de consciências ocidentais ultrajadas pelos bombardeios no Líbano se sente indignada quando se suspeita que seja anti-semita. Pode-se acreditar nelas, não estivesse o mundo a imaginar que todos vivem a paranóia anti-semita. Porém, o mistério aumenta ainda mais. Por que semelhante paralisia? Por que uma indignação mundial sobreexagerada quando se trata de bombas israelenses? Se as imagens das destruições no Líbano causam impacto incomparavelmente muito maior do que os famintos de Darfur e as ruínas da Chechênia, é porque levam implícitos os subtítulos de uma geopolítica surrealista. Quem contempla a atualidade de Cana ou de Gaza não conta somente os féretros dos piores dias: os desafortunados a quem enterram parece que levam a auréola de um presságio fatal, desconhecido em centenas de milhares de cadáveres africanos ou caucasianos, conclui Glucksmann.
Os criativos proponentes de um Estado Palestino laico construído sobre a destruição do Estado de Israel acreditam ter achado a solução para a definitiva paz. Com isso, seriam resolvidos todos os conflitos no Oriente Médio: o fanatismo religioso desapareceria sob o laicismo estatal; as divergências belicosas, tais como as que hoje ocorrem entre xiitas, druzos e sunitas, por exemplo, acabariam em um grande congraçamento; as revoluções sangrentas, as ditaduras sanguinárias, o terrorismo e a obsessão anti-ocidental apagar-se-iam com o sopro mágico deste outro Estado. Em resumo, o futuro de uma ilusão seria outra ilusão, baseada no fim das relações de poder. Diante deste sacrilégio teórico e prático, desfilam os faltos, com suas melopéias.
A existência do Estado de Israel nunca foi obstáculo ao anti-ocidentalismo assim como não é motivo ao anti-semitismo. É necessário muita ingenuidade ou má fé para não perceber que a destruição de Israel encerra, ao mesmo tempo, uma motivação relacionada à judeofobia e um pretexto para uma “guerra santa” em todas as frentes, que nada tem de conteúdo socialista ou antiimperialista, pois a pretensão é exatamente a imposição de um outro imperialismo, baseado no fanatismo religioso, o qual certamente não andará de mãos dadas com o fanatismo religioso dos neomarxistas. Uma vez destruído o Estado de Israel, somente os ignorantes ou os de má índole acreditarão que os fanáticos religiosos festejarão a vitória com o abandono das armas. É preciso dizer mais: somente o purismo relativo à parvoíce pode alimentar a crença de que a esta mesma esquerda será permitido organizar-se politicamente e atuar democrática e livremente, de maneira crítica, independente e autônoma, naqueles países. A geopolítica de má fé se converteu em ideologia religiosa. O neonazismo se reorganiza muito rapidamente no mundo, sob a complacência de uns e com a conivência e o apoio de outros, inclusive da falsa esquerda.
Como observa Roberto Romano (Correio de Campinas, 29/08/2006), “Jean-Pierre Faye fala na ‘ferradura ideológica’ pela qual circulam os discursos totalitários. Enunciações geradas no nazismo terminam em bocas da esquerda. É o que ocorre com o anti-semitismo que explode entre nós. Iniciada nas ‘fontes’ venenosas que saciaram o ódio de Hitler pelos judeus, a fala racista passa pela esquerda”. Ao “ato público” realizado em uma universidade pública, “só foram convidados os defensores de uma doutrina. E assim as mentiras fascistas se espalham: a propaganda nega o contraditório, porque lhe interessa impor sua vontade de potência. O asco é resposta aos que promovem o racismo sob a capa mentirosa das ‘lutas sociais’”. Para acompanhar este evento, diante das sempre raivosas demonstrações de irascibilidade destes auto denominados marxistas revolucionários, algumas autoridades universitárias e demais associações representativas adotam aquela clássica posição ambígua dos que se acomodam no berço da neutralidade dos coniventes.
A pretexto de propagar e defender o marxismo ou, segundo estes grupos se consideram, o único, o verdadeiro e o legítimo marxismo, os mesmos estão corroendo toda a base do marxismo, simplificando-o, reduzindo-o a mero discurso vazio e inconsistente, atacando-o com a pior das armas que é o seu uso irresponsável e oportunista, jogando pelo ralo como água suja um século e meio de construção. A judeofobia destes grupos auto intitulados de esquerda é grotesca: Marx, Trotski e Rosa Luxemburgo, por exemplo, são judeus. É vergonhoso, para um marxista ou para quem está simplesmente no campo da esquerda, ser confundido com estes grupos, como se toda a esquerda fosse uma só e, em sendo uma, fosse esta. Portanto, é imperioso indicar o que caracteriza esta auto-intitulada esquerda.
Não é uma tarefa simples ser marxista e ter, como referência epistemológica e teórica, o materialismo histórico e dialético. Principalmente nos dias atuais. Primeiro, porque a forma de se conduzir diante do real tendo por base o materialismo histórico e dialético requer muito investimento intelectual, muita dedicação e uma necessária quebra de preconceito contra outras formas de pensamento, pois não é preciso depreciar as outras teorias para valorizar a escolha, a não ser que não se acredite na força e pertinência da escolha feita. Em segundo lugar, porque o marxismo tem sido tratado com muito desdém pelos liberais e neoliberais, geralmente ignorantes do poder que o mesmo possui devido ao seu rigor teórico, metodológico e epistemológico. Há uma tentativa permanente de escarnecer o marxismo por seus supostos fracassos teóricos, pelo fato de que sua teoria não explica todos os fenômenos e pelo insucesso que representou o chamado socialismo real. Porém, nada disto tem relação com o marxismo de Marx. Marx não era profeta e não poderia explicar o que ainda não era real; Marx não era um hipercientísta, capaz de apresentar uma explicação definitiva sobre todos os ramos da ciência; Marx jamais advogou a tese de que seu socialismo científico tivesse a forma que teve o que se chamou de socialismo real. Marx era um sujeito. Brilhante, mas um sujeito. Seus textos são provas de uma das mais extraordinárias produções científicas e filosóficas da história da humanidade, mas, como todas as demais, possuem contradições, contêm equívocos, são limitadas pela realidade e pelo estágio científico e tecnológico em que foram criadas. Além disto, uma parte do que escreveu foi publicado sem sua revisão final, após sua morte, o que deixa dúvidas sobre a precisão de algumas passagens. Porém, de um autor só se pode esperar o que ele pretendeu fazer, caso contrário segue-se o caminho da mitificação.
Se, com todos estes fatores, já é uma tarefa difícil ser marxista, mais ainda se torna quando ao marxismo se agregam grupos de oportunistas, que o destroem feito vírus, com seus vícios, sua decadência, seu descompromisso. Estes formam o marxismo pérfido ou a esquerda pérfida. À diferença do marxismo e de uma esquerda genuína, grupos que formam o marxismo pérfido padecem de: (i) falta de autenticidade, pois desenterram suas “análises” de ultrapassadas realidades; (ii) atraso, pois desejam fazer regredir a história; (iii) preconceito, pois já têm o fato julgado antes de analisá-lo e mesmo diante da realidade mantém o pré-julgamento; (iv) incompetência científica, pois mesmo quando o real concreto aponta para complexas relações, satisfazem-se com análises simples e superficiais; (v) incapacidade de elaboração teórica original, pois ainda que tenham à sua disposição a mais sólida ferramenta teórico-epistemológica, insistem em fazer dela um dogma; (vi) ideologização da práxis política, pois procuram legitimar seus discursos e idéias com bordões e palavras de ordem retiradas do referencial marxista e deslocadas do lugar de sua produção original, encobrindo o real; (vii) criminalização de um Estado livre e democrático, pois ignoram convenientemente que em Israel existe oposição ao governo, liberdade de expressão e de organização; (viii) preferência pelos valores obtusos da Idade Média, pois se decidem pela defesa de um modo de vida feudal pelo simples fato do mesmo resistir ao capitalismo, como se esta resistência tivesse a mesma qualidade que uma luta contra o capitalismo no interior do mesmo; (ix) opção pela tirania, pois consideram a opressão e a crueldade como símbolos do heroísmo; (x) pacto com políticas nazistas, pois aplaudem o nacional socialismo latino americano e mundial e seus acordos com a pior tradição da direita, desprezando um fato histórico tão recente cujas conseqüências foram incomensuráveis; (xi) covardia, pois fogem dos verdadeiros debates no campo da esquerda já que seus argumentos são inconsistentes e se baseiam apenas em surrados discursos; (xii) autoritarismo, pois são incapazes de aceitar as diferenças e se comportam como raivosos componentes de uma ditadura típica do submundo do crime, a qual protege os aderentes e elimina os divergentes; (xiii) incoerência, pois afirmam que a religião é o ópio do povo, mas apóiam com raro entusiasmo o fanatismo religioso.
Por tudo isto, com a devida licença de Émile Zola que, com sua carta pública, de 13 de Janeiro de 1898, fez reabrir o caso do Capitão Alfred Dreyfus, judeu, sentenciado à Ilha do Diabo, da mesma forma Eu Acuso estes grupos da esquerda pérfida de anti-semitas. De igual modo, Eu os Acuso de anti-marxistas.
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