Mais de 100 mil pessoas marcharam no Centro de Londres ontem, dois anos depois do plebiscito que aprovou a retirada do Reino Unido da União Europeia, para exigir a realização de uma segunda consulta popular quando estiver definido o acordo de separação do bloco europeu. A saída britânica (Brexit) terá de acontecer até 31 de março de 2019.
Com a economia em marcha lenta, a libra em queda e grandes empresas anunciando a intenção de deixar o país, vários deputados do Partido Trabalhista, um ex-assessor da primeira-ministra conservadora Margaret Thatcher e ativistas favoráveis à integração europeia se juntaram à multidão.
Militantes dos três maiores partidos britânicos, conservadores, trabalhistas e sociais-democratas, caminharam juntos pela avenida Whitehall. Houve gritos de "onde está Jeremy Corbyn?"
O líder trabalhista nunca foi um grande fã da UE. Acusado de omissão na campanha do plebiscito de 2016, Corbyn está no Oriente Médio visitando campos de refugiados palestinos, enquanto os judeus do Reino Unido denunciam o antissemitismo do partido.
A insatisfação popular com o andamento das negociações do divórcio da UE se soma à crescente pressão do empresariado para que o Reino Unido continue tendo acesso ao mercado comum europeu. Na semana passada, duas grandes empresas, a Airbus e a BMW, advertiram que vão reconsiderar seus investimentos no país dependendo do acesso que terão à Europa.
"Grandes companhias europeias que colocaram o Reino Unido em suas cadeias produtivas foram claras", observou o lorde conservador Michael Glendon. "Num mundo competitivo, qualquer movimento de bens que vá sofrer qualquer tipo de tarifação terá o custo cuidadosamente reavaliado."
Ao mesmo tempo, a ala antieuropeia mais linha-dura do Partido Conservador pressiona a primeira-ministra Theresa May a fazer planos de contingência para o caso de não haver acordo com a UE.
Seis ex-ministros, inclusive o ex-ministro das Finanças Nigel Lawson, deputados, economistas e líderes empresariais enviaram carta a May sob o argumento de que , "para ter uma alavancagem real nas negociações da Brexit", o Reino Unido deveria se reservar o direito de abandonar o diálogo sem um acerto e "pagar os 39 bilhões de libras que se ofereceu para pagar como parte do acordo de divórcio".
Neste sentido, o governo britânico deveria preparar sua máquina administrativa para operar o comércio exterior com base nas regras da Organização Mundial do Comércio (OMC), dando um sinal claro de estar pronto para manter suas relações comerciais mesmo fora do bloco europeu, segundo maior mercado do mundo, depois dos Estados Unidos.
A carta insiste que a economia britânica pode "florescer" mesmo sem um acordo de livre comércio por causa dos "benefícios" de sair da UE: "Isto vai dar ao ministro das Finanças ampla margem para aumentar o gasto público em serviços públicos prioritários como o NHS (Serviço Nacional de Saúde) enquanto reduz a elevada carga fiscal do Reino Unido."
O governo May afirma estar "confiante de conseguir um bom acordo que nos permita reassumir o controle sobre nosso dinheiro, nossas regras e nossas fronteiras".
Talvez esta seja a questão central. Para ficar no mercado comum europeu, o Reino Unido tem de aceitar a livre circulação de capitais, mercadorias e pessoas. Uma das principais causas da vitória da Brexit foi o repúdio à imigração de europeus de outros países do bloco, especialmente da Europa Oriental, a partir da adesão dos antigos países comunistas do Bloco Soviético, em 2004. Foi explorado numa campanha ultranacionalista com uma forte carga racista.
As regiões mais cosmopolitas, como Londres, Cambridge e Oxford, onde vivem mais estrangeiros proporcionalmente, votaram há dois anos a favor de ficar na UE. Os setores mais atrasados e retrógrados ganharam explorando o medo e fazendo falsas promessas, como aumentar substancialmente o orçamento para a saúde pública.
Agora, os defensores da participação do Reino Unido na UE exigem um segundo plebiscito ou um referendo sobre o acordo final do divórcio. Alegam que a campanha a favor da Brexit foi mentirosa, cheia de notícias falsas e que o verdadeiro impacto sobre o futuro do país só poderá ser avaliado quando os termos do acordo negociado com a Europa unida foram revelados.
Este é o blog do jornalista Nelson Franco Jobim, Mestre em Relações Internacionais pela London School of Economics, ex-correspondente do Jornal do Brasil em Londres, ex-editor internacional do Jornal da Globo e da TV Brasil, ex-professor de jornalismo e de relações internacionais na UniverCidade, no Rio de Janeiro. Todos os comentários, críticas e sugestões são bem-vindos, mas não serão publicadas mensagens discriminatórias, racistas, sexistas ou com ofensas pessoais.
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