Com o apoio da coalizão aérea liderada pelos Estados Unidos, o Exército do Iraque e milícias aliadas reconquistaram hoje a cidade de Mahana, que estava em poder do Estado Islâmico do Iraque e do Levante, noticiou a televisão curda Rudaw.
A chamada Ofensiva Makhmur faz parte da grande operação para retomar Mossul, a segunda maior cidade iraquiana, em poder do Estado Islâmico desde junho de 2014.
O avanço é lento, apesar da cobertura aérea dos EUA. Vários grupos armados participam da operação terrestre. Ao lado do Exército do Iraque, estão hoje guerrilheiros curdos, milícias xiitas e milícias tribais sunitas.
Quando o Estado Islâmico for derrotado, esses grupos devem lutar entre si por território e influência no futuro do Iraque. A luta contra um inimigo comum encobre a profunda fragmentação do país.
Como os EUA dissolveram as forças de segurança de Saddam Hussein depois de derrubar o ditador em 9 de abril de 2003, um grande contingente de soldados e policiais com formação militar ficou sem emprego. Muitos aderiram ao Estado Islâmico.
Até agora, o novo Exército do Iraque se mostrou incapaz de defender o país. Seu maior fracasso foi a queda de Mossul, quando os soldados abandonaram suas armas de última geração fornecidas pelos EUA e até seus uniformes para não serem identificados e mortos pelo Estado Islâmico.
Assim, as milícias são essenciais à guerra contra os jihadistas, mas cobram seu preço. Os curdos controlam hoje as províncias de Diala e Saladino, que hoje não fazem parte do governo regional autônomo do Curdistão iraquiano. Talvez a maior disputa seja em torno de Kirkuk, que os curdos tomaram em 2014 e chamam de Jerusalém Curda.
A maior parte dos territórios conquistados pelos curdos tem populações multiétnicas, em parte como resultado de migrações forçadas promovidas pela ditadura de Saddam Hussein para aumentar o contingente de seus aliados árabes sunitas.
Mesmo assim, o governo regional curdo pretende incorporá-las ao Curdistão iraquiano. Pode também usá-las como moeda de troca em negociações com o governo central de Bagdá para aumentar sua participação no ministério e ter o direito de exportar petróleo independentemente.
Os choques eventuais entre guerrilheiros curdos e milícias xiitas levantam dúvidas sobre a capacidade de articular a força de 40 mil homens considerada necessária para reconquistar Mossul. Os curdos devem ser encarregados de atacar pela frente norte de modo a impedir a fuga dos jihadistas.
As terras ao redor de Mossul são aráveis, muito melhores para a agricultura do que o território montanhoso do Curdistão iraquiano. Os curdos cobiçam.
As milícias xiitas, treinadas, armadas e financiadas pelo Irã, foram fundamentais para a defesa de Bagdá e a reconquista de Ramadi, Tikrit e Faluja. A maioria está sob o controle da Força Quods, braço da Guarda Revolucionária Iraniana para operações no exterior.
O Ministério do Interior tenta absorver as milícias xiitas com suas Forças de Mobilização Popular, de 110 mil homens, destinando US$ 2 bilhões para isso no orçamento para 2016. Mas seu controle continua nas mãos dos chefes das milícias.
Embora sejam apenas 20% da população iraquiana, os xiitas estavam no poder há mais de 300 anos e dominavam o Estado na ditadura de Saddam Hussein. A revolta sunita foi o centro da resistência contra a invasão americana de 2003. Isso facilitou a infiltração no país da rede terrorista Al Caeda.
Al Caeda no Iraque virou Estado Islâmico do Iraque e, com a guerra civil na Síria, Estado Islâmico do Iraque e do Levante, o mais poderoso grupo terrorista muçulmano jamais visto, que conta com muitos antigos oficiais e soldados de Saddam.
A participação de milícias sunitas é fundamental para a retomada de regiões de maioria sunita. Caso contrário, o Exército do Iraque, os guerrilheiros curdos e milícias xiitas são considerados invasores. Ao mesmo tempo, os xiitas acusam os sunitas de conivência e colaboração com o Estado Islâmico.
Quando a milícia terrorista for derrotada, será necessária uma nova acomodação política para reintegrar os sunitas no governo central iraquiano e evitar uma divisão do país. O governo regional curdo vai continuar trabalhando pela independência do Curdistão.
Este é o blog do jornalista Nelson Franco Jobim, Mestre em Relações Internacionais pela London School of Economics, ex-correspondente do Jornal do Brasil em Londres, ex-editor internacional do Jornal da Globo e da TV Brasil, ex-professor de jornalismo e de relações internacionais na UniverCidade, no Rio de Janeiro. Todos os comentários, críticas e sugestões são bem-vindos, mas não serão publicadas mensagens discriminatórias, racistas, sexistas ou com ofensas pessoais.
quarta-feira, 27 de abril de 2016
Exército do Iraque retoma ofensiva rumo a Mossul
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