O Iraque decretou estado de emergência na capital hoje depois que centenas de partidários do aiatolá xiita rebelde Muktada al-Sader entraram na chamada Zona Verde do centro de Bagdá e invadiram a sede da Assembleia Nacional para exigir a aprovação de um novo ministério tecnocrático, informou a televisão pública britânica BBC.
Num ato sem precedentes, os militantes xiitas passaram pelas barricadas e postos de controle da ultrafortificada Zona Verde, onde ficam os principais prédios públicos e embaixadas estrangeiras de Bagdá. A polícia usou gás lacrimogênio para dispersar os manifestantes e reforçou os postos de controle, mas uma multidão se concentrou hoje numa praça dentro da Zona Verde para continuar o protesto.
O aiatolá rebelde denuncia a corrupção e a incompetência do governo central iraquiano. Muktada pressiona o primeiro-ministro Haider al-Abadi a formar um ministério de tecnocratas sem vínculo com partidos políticos. Em 30 de abril, seus partidários entraram na Zona Verde e saquearam prédios governamentais.
A mobilização começou em 18 de março com um protesto sentado contra a corrupção e a incompetência fora da Zona Verde. Há mais de um ano, está em discussão uma reforma ministerial anunciada pelo chefe de governo, adiada até agora.
Quando a Organização Bader, de Muktada, entrou na luta, começaram as manifestações de rua. Muktada também lidera sua própria milícia, o Exército Mehdi. Filho de um aiatolá morto pela ditadura de Saddam Hussein, Muktada foi um dos grandes beneficiários da invasão do Iraque pelos Estados Unidos em 2003.
Logo, passou a liderar uma rebelião xiita contra a ocupação estrangeira. Sua milícia atacou as tropas americanas e entrou no conflito sectário com a minoria sunita, que mandava no país durante a ditadura de Saddam Hussein (1979-2003) e desde muito antes, desde que o atual Iraque caiu sob o controle do Império Otomano, em 1638.
Muktada chegou a se refugiar no Irã para escapar da prisão durante a ocupação americana. De volta ao país, lidera um bloco parlamentar de mais de 30 deputados que usa para pressionar o governo de maioria xiita do primeiro-ministro Abadi.
Pelo arranjo de poder da frágil democracia iraquiana, o poder é dividido entre a maioria árabe xiita e as minorias árabe sunita e curda. Muktada quer acabar com o loteamento dos cargos públicos entre os partidos. Ao invadir pacificamente o Parlamento para pressionar os deputados, é a democracia funcionando.
Este é o blog do jornalista Nelson Franco Jobim, Mestre em Relações Internacionais pela London School of Economics, ex-correspondente do Jornal do Brasil em Londres, ex-editor internacional do Jornal da Globo e da TV Brasil, ex-professor de jornalismo e de relações internacionais na UniverCidade, no Rio de Janeiro. Todos os comentários, críticas e sugestões são bem-vindos, mas não serão publicadas mensagens discriminatórias, racistas, sexistas ou com ofensas pessoais.
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