Jobim - Agora, nesta questão do quadro da Márcia X há também intolerância religiosa. Depois o pessoal espalhou os cartazes pela cidade, o prefeito César Maia mandou recolher. Obviamente o prefeito mandou recolher num gesto demagógico para agradar às igrejas.
Tunga - Não vejo tanto a questão das igrejas. O que me interessa ali é o instrumento da pressão que foi exercida. Pelo que eu sei do jornal, daquilo que foi dito, é que correntistas de um banco público-privado iriam tirar as suas contas caso aquela obra estivesse ali. Então é preciso ficar atento à letra das coisas. É um volume de dinheiro depositado que iria sair se caso aquela imagem continuasse ali. Ponto. Essa é a pressão que foi exercida.
J - É uma pressão econômica, mas é uma forma de censura e, segundo consta, eram pessoas ligadas a uma seita dessas da Igreja Católica mais conservadora, a Opus Christi.
T - Poderia ser qualquer grupo. Qualquer grupo de depositantes poderia exercer isso. O que me interessa é a dinâmicadisso. Não é essa identidade de um ou outro ser muçulmano, cristão ou judeu. O que me interessa foi o exercício da pressão que foi feita a partir de um volume de dinheiro de correntistas.
Quer dizer, a rigor, o Centro Cultural Banco do Brasil pode muito bem ser dirigido pelos acionistas do Banco do Brasil. E eles vão dizer o perfil cultural que nós vamos passar a viver.
J - Falei em intolerância religiosa. Não citei muçulmanos, cristãos. Porque há uma radicalização, nem tanto aqui no Brasil.
T - O grave não é que esse ou aquele grupinho. No caso da retirada de uma obra do artista Nelson Leirner do Museu de Arte Moderna, foi um juiz, Siro Darlan. Resolveu que a presença do falus desenhado sobre a imagem de um bebê era atentatório aos menores. Aquilo poderia desviar a formação dos menores que tanto visitam o Museu de Arte Moderna. E a obra foi tirada, independente dos seus curadores ou diretores do museu. Por ordem judicial. Há uma lei que permite isso. Eu acho que há buracos que a gente pode observar e alguns desses buracos podem se tornar mais ou menos graves.
N - Uma última pergunta: a questão da crítica. Ferreira Gullar andou criticando seu trabalho. Você perguntou: Ferreira quem? Como é a relação do artista com o crítico? Não interessa a opinião deles para o seu trabalho criativo?
T- Veja bem, eu acho que há um equívoco aí. Eu não vi nenhuma crítica do Ferreira Gullar ao meu trabalho. Eu vi uma crítica do Ferreira Gullar ao meu nome. Só. Ele se referiu ao meu nome, não se referiu ao meu trabalho. Então não posso dizer nada sobre essa... “opinião crítica especializada”.
Este é o blog do jornalista Nelson Franco Jobim, Mestre em Relações Internacionais pela London School of Economics, ex-correspondente do Jornal do Brasil em Londres, ex-editor internacional do Jornal da Globo e da TV Brasil, ex-professor de jornalismo e de relações internacionais na UniverCidade, no Rio de Janeiro. Todos os comentários, críticas e sugestões são bem-vindos, mas não serão publicadas mensagens discriminatórias, racistas, sexistas ou com ofensas pessoais.
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2 comentários:
Super entrevista, vida global, de fato.
A critica do Tunga à politica cultural é continuidade de uma disputa clássica, que Hélio Oiticica reconheceu, e pela qual formulou seu ultimato: "Seja artista, seja marginal". Me parece que Tunga quer quebrar com essa tradicional marginalidade, mas a marginalidade rompida vira "mainstream", artificializada pelo mercado que Tunga lamenta. Até hoje, as politicas culturais encarceram. Isso não é novidade. Seria novidade dar o verdadeiro nome aos bois comandantes (fanatismo religioso dissimulado) coisa que Tunga não faz, não sei por q.
Quanto ao Gullar, deu pra perceber em "Vinícius", que ele é simplista com nomes, quando diz " Eu acho Brecht uma merda..."
errata: não é Brecht, é Beckett!
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