O maior desafio do Brasil é lutar contra o protecionismo agrícola, sobretudo dos países ricos mas também dos em desenvolvimento, para onde o crescimento das exportações brasileiras é maior. Este protecionismo impediu acordos com os EUA na ALCA e Mercosul-União Européia. Por isto, o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, apostou todas as suas fichas nas negociações da Organização Mundial do Comércio. A cartada agrícola é algo que os EUA e a UE usarão como instrumento de barganha numa negociação entre eles. Não fariam grandes concessões ao Brasil em acordos bilaterais.
“Quase todos os produtos brasileiros sofrem algum tipo de proteção como tarifas e cotas”, observou Marcos Jank, presidente do Instituto de Estudos de Comércio Internacional (Icone), ao participar da mesa redonda A Rodada Doha depois de Hong Kong, realizada ontem no Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri), no Rio de Janeiro. Como hoje a maior parte do aumento das exportações vai para paises em desenvolvimento, acrescentou que talvez seja mais importante negociar uma abertura de seus mercados: “China, Índia, Sudeste Asiático, Rússia e Europa Oriental crescem muito e têm problemas de recursos naturais.”
Ele identifica quatro tipos de barreiras:
1. Fito-sanitárias: um caso de vaca louca derrubou 80% das exportações americanas de carne. O Brasil tem o risco da aftosa. Trabalha para introduzir o conceito de regionalismo. Afinal, um surto no Paraguai tem impacto muito maior sobre a pecuária brasileira do que um no Amazonas.
2. Ecológicas: há pressões cada vez maiores pelo impacto ambiental da soja sobre a Floresta Amazônica.
3. Sociais: há pressões contra o uso de mão-de-obra infantil e condições de trabalho.
4. Técnicas: envolvem sobretudo os organismos geneticamente modificados, os transgênicos e sua identificação. A Europa quer introduzir o conceito de bem-estar animal
Em agricultura, os ricos estão claramente numa posição defensiva. Os EUA aprovaram sua Lei Agrícola em 2002 aumentando em 80% os subsídios agrícolas. Em uma década, darão US$ 82 bilhões a seus agricultores, sobretudo em medidas de apoio interno. Não é para a exportação mas reduz o espaço para importação no maior mercado do mundo. “A Europa reformou a política agrícola comum mas continua protecionista, com tarifas pontuais e elevadíssimas”, constata Jank.
“No centro da negociação, a UE tem de se mexer em acesso a mercados, os EUA tem de mexer no apoio interno e o Grupo dos 20 [liderado pelo Brasil] em produtos não agrícolas”, disse o presidente do Icone. O problema é que todas as partes têm de se mover em conjunto.
Jank prevê que a liberalização favoreceria mais as exportações brasileiras de carnes do que de grãos porque elas são mais protegidas. O Brasil exporta mais soja porque outros paises protegem suas indústrias processadoras e usam farelo e torta de soja para alimentar animais.
Outra constatação: quando os preços caem, aumentam os subsídios.
“Como a maioria das exportações agrícolas brasileiras cai na faixa tarifária mais alta, acima de 75%, as tarifas cairão mais”, destacou Jank. Mas ele aponta para cinco muros protecionistas:
1. Magnitude do corte.
2. Definição de produtos sensíveis
3. Cotas.
4. Salvaguardas.
5. Produtos especiais.
Os produtos brasileiros, como carnes, grãos e açúcar, são considerados sensíveis. Então é importante saber de quanto será a queda nas tarifas, que compensações o Brasil terá de oferecer. Até agora, a UE ofereceu uma expansão de cota equivalente a 1% do consumo; o G-20 quer 7%.
Ao mesmo tempo, para liderar o G-20, o Brasil vai dar aos países em desenvolvimento o que tirou da UE, salvaguardas especiais, pergunta o presidente do Icone. A Europa vai aceitar isso? “É impossível imaginar que Brasil, Índia, Argentina e China terá posições comuns em agricultura”.
As duas superpotências emergentes da Ásia têm centenas de milhões de agricultores pobres que precisam de apoio governamental, inclusive para evitar migrações em massa para as cidades.
Este é o blog do jornalista Nelson Franco Jobim, Mestre em Relações Internacionais pela London School of Economics, ex-correspondente do Jornal do Brasil em Londres, ex-editor internacional do Jornal da Globo e da TV Brasil, ex-professor de jornalismo e de relações internacionais na UniverCidade, no Rio de Janeiro. Todos os comentários, críticas e sugestões são bem-vindos, mas não serão publicadas mensagens discriminatórias, racistas, sexistas ou com ofensas pessoais.
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