Depois de mais de 33 anos de ruptura e de um ano e meio de negociações secretas, os Estados Unidos vão reatar relações diplomáticas com Cuba, anunciou hoje o presidente Barack Obama, dizendo que "começa um novo capítulo nas nações da América". A embaixada americana em Havana deve ser reaberta nos próximos meses.
Ao fazer o anúncio, Obama admitiu que o embargo econômico não foi capaz de acabar com o regime comunista e serviu de desculpa para as autoridades cubanas explicarem os problemas do país: "Vamos acabar com uma abordagem ultrapassada que por décadas fracassou em promover nossos interesses e começar a normalizar as relações entre os dois países. Não acredito que possamos continuar fazendo a mesma coisa por mais cinco décadas e esperar um resultado diferente."
Na mesma hora, em Havana, o presidente Raúl Castro dava a notícia aos cubanos. Ele agradeceu ao papa Francisco pela mediação do Vaticano na reaproximação entre os dois países. Raúl e Obama conversaram durante 45 minutos por telefone ontem à noite acertando os detalhes finais da reaproximação.
Em nota, a Santa Sé elogiou o reatamento: "O Santo Padre quer expressar suas calorosas congratulações pela decisão histórica tomada pelos governos dos EUA e de Cuba de restabelecer relações diplomáticas com o objetivo de superar, no interesse dos cidadãos dos dois países, as dificuldades que marcaram sua história recente."
O acordo diminui as restrições de viagem a Cuba, mas mantém a proibição ao turismo. As relações bancárias vão aumentar, permitindo o uso de cartões de débito na ilha. Os cubanos residentes nos EUA poderão enviar até US$ 2 mil a cada três meses para Cuba, em vez dos atuais US$ 500.
Quando forem a Cuba, os americanos poderia importar até US$ 400 em produtos cubanos, inclusive US$ 100 em produtos de álcool ou tabaco.
Em Miami, na Flórida, o senador republicano de origem cubana Marco Rubio, do grupo de ultradireita Festa do Chá, repudiou a iniciativa. Ele denunciou "outra concessão à tirania" e acusou Obama de ser "intencionalmente ignorar a maneira como o mundo realmente funciona".
Na sua opinião, Obama se baseou na "ilusão de que mais comércio e acesso a dinheiro e bens vai se traduzir em liberdade política para o povo cubano", atacou Rubio. "Tudo o que isto faz é dar ao regime dos irmãos Castro, que controla todos os aspectos da vida cubana, de manipular as mudanças para ficar no poder."
Isso indica que Obama pode ter dificuldades para revogar o embargo econômico, desde 1991 regido por uma lei aprovada pelo Congresso dos EUA, que assim só pode ser alterada pela Câmara e o Senado, onde o Partido Republicano terá maioria a partir de 2015.
Até mesmo no Partido Democrata, houve vozes dissidentes. Para o senador Robert Menendez, do estado de Nova Jérsei, o segundo com maior população de origem cubana, depois da Flórida, "este não foi um gesto humanitário do regime castrista. Foi uma troca de espiões condenados por um americano inocente" (veja abaixo).
Os dois países romperam relações diplomáticas depois da fracassada tentativa de invasão da Baía dos Porcos por contrarrevolucionários cubanos apoiados pela Agência Central de Inteligência (CIA), o serviço secreto da Presidência dos EUA.
Para se proteger, o ditador cubano, Fidel Castro, negociou com a União Soviética a instalação de mísseis nucleares em Cuba, provocando a maior crise da Guerra Fria. Nunca o mundo esteve tão perto de uma guerra nuclear. A Crise dos Mísseis em Cuba durou de 14 a 27 de outubro de 1962.
O então presidente John Kennedy decretou o bloqueio naval da ilha e os EUA estavam prestes a invadir Cuba quando o primeiro-ministro soviético, Nikita Kruschev, concordou em retirar os mísseis nucleares da ilha em troca de um compromisso tácito dos EUA de não atacar Cuba.
Com o fim da URSS, em 1991, o regime comunista cubano enfrentou uma crise econômica seríssima que só seria amenizada pela aproximação com a Venezuela de Hugo Chávez. O reatamento coloca o regime chavista à esquerda de Cuba como maior adversário dos EUA na América Latina.
Este é o blog do jornalista Nelson Franco Jobim, Mestre em Relações Internacionais pela London School of Economics, ex-correspondente do Jornal do Brasil em Londres, ex-editor internacional do Jornal da Globo e da TV Brasil, ex-professor de jornalismo e de relações internacionais na UniverCidade, no Rio de Janeiro. Todos os comentários, críticas e sugestões são bem-vindos, mas não serão publicadas mensagens discriminatórias, racistas, sexistas ou com ofensas pessoais.
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