O secretário da Defesa dos Estados Unidos, Donald Rumsfeld, o nome mais associado ao fracasso da invasão americana ao Iraque, caiu hoje, por causa da derrota em que o Partido Republicano perdeu a maioria na Câmara dos Representantes depois de 12 anos.
Além de reconquistar a maioria na Câmara, com a vitória em Montana anunciada esta manhã, os democratas ficaram a uma cadeira da maioria no Senado.
No estado da Virgínia, o desafiante James Webb venceu o senador republicano Charles Allen. Mas como a diferença foi inferior a 1% do total de votos, o perdedor tem direito a uma recontagem. Confirmado o resultado inicial, os democratas retomam o controle das duas casas do Congresso, enfraquecendo significativamente os últimos dois anos da presidência de George Walker Bush.
Dias depois de confirmar Rumsfeld no cargo, Bush declarou que "chegou a hora de uma nova liderança no Pentágono". O novo secretáio será Robert Gates, ex-diretor da CIA (Agência Central de Inteligência), o serviço de contra-espionagem dos EUA. Precisa da aprovação do Senado. É visto como um homem mais ligado ao setor mais pragmático e menos ideológico do Partido Republicano, o que talvez indique uma mudança de rumo mais na linha do que faria o pai de Bush, um moderado.
Com o agravamento da situação no Iraque, onde já morreram 2.839 soldados americanos, a guerra tornou-se o tema central das eleições intermediárias para renovar toda a Câmara e um terço do Senado dos EUA. A deputada federal californiana Nancy Pelosi, que deve ser eleita presidente da Câmara, elogiou a decisão do presidente.
O prestígio de Rumsfeld foi abalado nos primeiros dias da invasão, feita, por sua orientação, com a metade do contingente considerado ideal pelos generais americanos. Com sua estratégia de marchar rapidamente rumo a Bagdá, as forças de apoio que levavam os suprimentos para os soldados dos EUA ficaram desguarnecidas.
A rápida queda de Saddam resgatou o prestígio de Rumsfeld. Numa queda de braço com o secretário de Estado, Colin Powell, o Pentágono acabou sendo encarregado da pacificação do Iraque pós-Saddam. Todo o projeto da diplomacia americana, de 250 páginas, foi substituído pelo voluntarismo castrense de Rumsfeld.
Talvez o pior erro tenha sido desmantelar as forças de segurança do antigo regime. Isto jogou no desemprego centenas de milhares com treinamento para usar armas. Parte desse pessoal constitui o núcleo da insurgência sunita, depois reforçada pela chegada de terroristas internacionais da rede Al Caeda.
Quando estourou o escândalo de tortura de prisioneiros de guerra em Abu Ghraib, no Iraque, Bagram, no Afeganistão, e na base naval americana de Guantânamo, em Cuba, a revista inglesa The Economist pediu a cabeça de Rumsfeld. Mas a troca do secretário da Defesa no ano de sua reeleição equivaleria a confessor um erro na condução da guerra.
Agora, diante da derrota nas eleições de ontem, Bush e Rumsfeld se rendem.
Rumsfeld é conhecido como um operador político inescrupuloso. Durante o governo Ronald Reagan, quando o Iraque estava em guerra com o Irã e apertou a mão de Saddam Hussein. Os EUA contribuíram para o programa de armas químicas do Iraque, inclusive com exportações clandestinas de agrotóxicos.
Antes da guerra, quando a Alemanha e a França se negaram a apoiar a invasão do Iraque, Rumsfeld falou de uma "velha Europa" em contraposição à "nova Europa" formada pelos países da Europa Oriental que saíram da órbita soviética e assim tem interesse numa relação estratégica dos os EUA que os proteja da Rússia e da Alemanha. Aprofundou o fosso na aliança atlântica que foi a base da ordem internacional do pós-guerra.
Quando era secretário da Defesa do governo Gerald Ford (1974-77), Rummy bateu de frente com o então secretário de Estado, Henry Kissinger, que fez o seguinte comentário: "De todos os ditadores que conheci, o mais implacável é Donald Rumsfeld". A lista inclui diversos dirigentes soviéticos, o general Augusto Pinochet, do Chile, as juntas militares que mataram dezenas de milhares de argentinos e o marechal Mobutu, do Zaire.
Este é o blog do jornalista Nelson Franco Jobim, Mestre em Relações Internacionais pela London School of Economics, ex-correspondente do Jornal do Brasil em Londres, ex-editor internacional do Jornal da Globo e da TV Brasil, ex-professor de jornalismo e de relações internacionais na UniverCidade, no Rio de Janeiro. Todos os comentários, críticas e sugestões são bem-vindos, mas não serão publicadas mensagens discriminatórias, racistas, sexistas ou com ofensas pessoais.
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