quinta-feira, 21 de janeiro de 2016

Número oficial de russos com HIV passa de mil

A epidemia da síndrome de deficiência imunológica adquirida (aids) se alastra na Rússia. O número oficial de pacientes infectados pelo vírus da imunodeficiência humana (HIV) chegou a 1 milhão, revelou em Moscou o diretor do Centro Federal de Combate à Aids, Vadim Pokrovski, citado pela agência de notícias Interfax.

Só no ano passado, foram registrados 93 mil novos casos. Por causa da subnotificação, os especialistas em saúde pública estimam que o total esteja perto de 1,4 milhão, quase 1% da população da Rússia, estimada em 143 milhões de habitantes. Cerca de 70% dos casos ocorrem na faixa de 20 a 39 anos, idade mais produtiva para a maioria dos trabalhadores.

As tradições culturais, o machismo arraigado, a homofobia, o abuso de drogas e fraqueza da economia russa, agravada pela crise do petróleo e as sanções impostas pelo Ocidente contra a intervenção militar na Ucrânia, dificultam o combate à aids.

Há dez anos, havia 170 mil casos registrados. Até o ano 2000, 87% dos casos atingiam usuários de drogas injetáveis. Hoje, 53% das infecções pelo HIV são atribuídas a seringas e agulhas contaminadas e 42% a relações sexuais. O sexo antes do casamento se tornou mais aceitável e a inflação aumentou o preço das camisinhas.

Em sua campanha contra o Ocidente e o homossexualismo, o governo e a mídia oficial acusam os homossexuais e estilos de vida alternativos pela propagação do HIV, mas, de acordo com o centro de combate só 1,5% dos casos são atribuídos a relações homossexuais.

A incidência da doença em mulheres aumentou de 10% em 2005 para 37% em 2015, corroborando a hipótese de que a maior parte das infecções pelo sexo acontecem em relações heterossexuais.

Com o estigma associado à aids como uma doença de homossexuais, o preconceito é grande na Rússia. Cerca de 25% dos HIV positivos tiveram tratamento negado e 11% perderam o emprego. Por medo da discriminação, muita gente em situação de risco não faz o exame.

Os setores mais conservadores do governo e a Igreja Ortodoxa Russa pressionam o Kremlin a proibir a educação sexual e programas de prevenção da aids em escolas e universidades. O Ministério da Saúde chegou a alegar que a educação sexual causaria um aumento da atividade sexual e da transmissão da doença.

Pela cartilha da Igreja, "castidade, fé e patriotismo" são as soluções para combater a aids, em linha com a promoção dos valores tradicionais da família pelo Kremlin.

A onda de manifestações contra o governo, no fim de 2011, suscitou temores no Kremlin de que uma revolta inspirada pelo Ocidente no estilo da Primavera Árabe visava a derrubar o homem-forte do país, o atual presidente Vladimir Putin.

Em resposta, o Parlamento aprovou em 2012 a Lei contra Agentes Estrangeiros para dificultar a atuação de organizações não governamentais que recebem financiamento do exterior, acabando com vários programas de ajuda.

O Fundo Global de Combate à Aids distribuía medicamentos retrovirais para 66 mil pacientes em 2009; no ano passado, foram apenas 4,3 mil. Moscou também vetou o Programa de Agulhas Limpas da Organização Mundial da Saúde (OMS), que distribui seringas a usuários de drogas injetáveis.

A Rússia importa 90% dos medicamentos que consome e a produção doméstica depende de importações em 99% dos casos. Em 2014, diante das sanções da Europa e dos Estados Unidos contra a intervenção na Ucrânia, o Kremlin resolveu apostar no fortalecimento da indústria local do setor, que cresceu 27% naquele ano e 7,5% no ano passado. Mas as restrições a investimentos e a obrigação de companhias estrangeiras de fazer parcerias com universidades russas fez com que 77% das empresas farmacêuticas estrangeiras estejam com problemas financeiros.

Juntos, esses fatores limitam a 3% o total da população com HIV que toma medicamentos antirretrovirais.

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