Por 51,9% a 48,1%, com uma vantagem de mais de um milhão de votos, os eleitores britânicos aprovaram em plebiscito a saída do Reino Unido da União Europeia, anunciaram há pouco as televisões BBC, ITV e Sky. Foi uma decisão chocante para o bloco europeu, os mercados internacionais e a própria moeda britânica. A libra esterlina caiu 12,64% para a menor cotação em 31 anos, US$ 1,36.
Mais de 33 milhões de pessoas votaram, com 17,4 milhões optando pela saída da UE contra 16,1 milhões favoráveis à permanência. Desde o início da apuração, os partidários da saída da UE mostraram desempenho superior ao previsto nas pesquisas.
No Nordeste da Inglaterra, onde a apuração começou, em Newcastle, era esperada uma boa vitória dos europeístas. A vantagem foi estreita. Em Sunderland, a saída ganhou com quase dois terços dos votos.
Na Grande Londres, onde a permanência na UE venceu, uma chuva de verão reduziu o comparecimento às urnas, que no geral chegou a 72,2%, acima das eleições parlamentares do ano passado. No resto da Inglaterra, a saída ganhou decisivamente. Também venceu no País de Gales.
Em Birmingham, a segunda maior cidade do Reino Unido, com 63% de participação, a saída ganhou por pequena margem. Em Manchester, a terceira maior cidade e segundo maior centro cultural do país, tradicional reduto da esquerda, a vitória da permanência na UE foi pequena e a abstenção grande.
Isso revela o fracasso do Partido Trabalhista, sob a liderança de Jeremy Corbyn, da velha esquerda que vê a integração europeia como um projeto liberal capitalista, em mobilizar seu eleitorado para defender a Europa. Corbyn, que votou contra a adesão à Comunidade Europeia no plebiscito de 1975, se negou a fazer campanha ao lado do primeiro-ministro conservador David Cameron.
Os maiores sindicatos, com 6 milhões de associados, pediram o voto para ficar, mas a mobilização do eleitorado de direita e extrema direita foi muito maior. A esquerda fracassou em defender as conquistas e os direitos sociais garantidos pela UE. Se a Escócia declarar a independência, o que restar do Reino Unido será governado por ingleses conservadores.
A Escócia votou amplamente a favor da UE. A saída não ganhou em nenhum distrito eleitoral. A primeira-ministra da Escócia e líder do Partido Nacional Escocês, Nicola Sturgeon, declarou que uma mudança constitucional desta natureza justificaria a convocação de um novo plebiscito para aprovar a independência e ficar na Europa.
Na Irlanda do Norte, onde o fico ganhou, o Sinn Féin, partido do movimento católico, republicano e nacionalista ligado ao extinto Exército Republicano Irlandês (IRA), defende a realização de um plebiscito sobre a unificação da Irlanda.
É uma vitória do nacionalismo retrógrado da ala mais direitista do Partido Conservador e de neofascistas como Nigel Farage, líder do Partido da Independência do Reino Unido (UKIP). Ele posa como o grande vencedor, lembrando que sonha com este "dia da independência" há décadas e exige a formação de um governo do grupo Brexit (Britain exit, saída da Grã-Bretanha).
Farage fez três discursos desde a divulgação do resultado, enquanto o primeiro-ministro, o líder da oposição e mesmo os líderes da campanha conservadora pela saída continuam calado.
É uma vitória da extrema direita europeia, para a Frente Nacional de Marine Le Pen, que sonha em convocar um plebiscito semelhante na França, e da ultradireita que avança na Áustria, na Holanda, na Dinamarca e na Suécia, do presidente da Rússia, Vladimir Putin, que considera a UE inimiga, e de um populista inconsequente como o americano Donald Trump.
O primeiro-ministro David Cameron, que convocou o plebiscito na tentativa de acabar com a guerra civil interna do Partido Conservador e defendeu a permanência na UE, está desmoralizado. Entra para a história como um fracassado que destruiu o país.
Líder da campanha pela saída, o patético ex-prefeito de Londres Boris Johnson, um oportunista e um bufão, está pronto a desafiar Cameron e assumir o controle do partido e do governo.
O euro também cai. O projeto europeu está abalado. A vitória dos ultranacionalistas britânicos vai encorajar a extrema direita a reivindicar plebiscitos em outros países da UE, um projeto social-democrata que foi a maior garantia da paz e da prosperidade na Europa em mais de meio século.
O Reino Unido não fez parte do núcleo fundador da Comunidade Econômica Europeia em 1957 (Alemanha, Bélgica, França, Holanda, Itália e Luxemburgo). Nos anos 1960s, por duas vezes, o presidente francês, Charles de Gaulle, vetou a associação britânica, que via como um cavalo de Troia dos Estados Unidos.
Há 43 anos, em 1973, o Reino Unido, a Irlanda e a Dinamarca entraram para a CEE, que passou a ter nove países-membros. Hoje, são 28 membros. A Albânia, Montenegro e a Sérvia negociam a adesão.
Agora, resta ao Reino Unido negociar um divórcio amigável com a UE. Por um lado, há o interesse de manter a segunda maior economia europeia no mercado comum. Por outro lado, a UE não deve fazer nada que estimule outros países a deixar o bloco, não vai querer dar a impressão de que há benefícios em deixar o maior mercado do mundo.
Este é o blog do jornalista Nelson Franco Jobim, Mestre em Relações Internacionais pela London School of Economics, ex-correspondente do Jornal do Brasil em Londres, ex-editor internacional do Jornal da Globo e da TV Brasil, ex-professor de jornalismo e de relações internacionais na UniverCidade, no Rio de Janeiro. Todos os comentários, críticas e sugestões são bem-vindos, mas não serão publicadas mensagens discriminatórias, racistas, sexistas ou com ofensas pessoais.
sexta-feira, 24 de junho de 2016
Reino Unido vota a favor de sair da União Europeia
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