A Turquia e Israel vão trocar embaixadores nos próximos dias depois de um acordo de reconciliação sobre o ataque israelense a uma flotilha que tentava romper o bloqueio naval à Faixa de Gaza e levar ajuda aos palestinos em que dez turcos morreram, anunciou ontem a Agência France Presse (AFP) citando fontes de Ancara.
Como os dois países têm interesses comuns em meio ao caos no Oriente Médio, o acordo foi possível. Ambos tiveram de fazer concessões.
Depois que a França praticamente vetou a candidatura da Turquia à União Europeia, o presidente Recep Tayyip Erdogan decidiu reorientar o país para a Ásia, islamizando o regime. Apoiava o governo da Irmandade Muçulmana no Egito e o Movimento de Resistência Islâmica (Hamas) na Faixa de Gaza.
Nos últimos dez anos, as relações entre Israel e a Turquia esfriaram, mas agora há um degelo. Com o recuo estratégico dos Estados Unidos, as potências regionais entram no vácuo, observa a empresa de consultoria e análises estratégicas Stratfor.
Os EUA deixaram de ser a potência militar dominante no Oriente Médio. Entram com a Força Aérea e o apoio logístico, deixando o combate direto em terra a cargo de aliados locais. Ao mesmo tempo, tentam criar um equilíbrio de forças em que nenhum país se torne a potência regional hegemônica.
Além de Israel, uma potência nuclear, com o Iraque e a Síria em guerras civis arrasadoras, disputam o poder a Turquia, o Irã e a Arábia Saudita em aliança com as monarquias petroleiras do Golfo Pérsico.
O Irã constrói sua influência através da comunidade xiita no Iraque, no Líbano, na Síria, no Bahrein, no Iêmen, além de ter influência sobre os xiitas em todo o Oriente Médio, inclusive na rival Arábia Saudita.
A coalizão saudita foi abalada pela reaproximação entre EUA e Irã e o acordo nuclear com grandes potências das Nações Unidas com a república islâmica em torno da questão nuclear. Tratou de reforçar sua posição com acordos de cooperação econômica e segurança.
Desde 2011, a Arábia Saudita deu empréstimos e ajuda de US$ 3 bilhões ao Egito e US$ 1,8 bilhão à Jordânia. Em fevereiro de 2015, deu US$ 5 bilhões ao Exército do Sudão. Os Emirados Árabes Unidos, o Kuwait e Omã prometeram mais US$ 10 bilhões ao Egito.
Os interesses da Turquia e da Arábia Saudita, ambas aliadas dos EUA, convergem em certo sentido. Durante a Guerra Fria, ajudaram a conter a influência da União Soviética. Na guerra civil da Síria, os dois países apoiam rebeldes que lutam contra a ditadura de Bachar Assad.
As relações entre Israel e a Turquia vinham se deteriorando desde a guerra contra o Hamas na Faixa de Gaza em 2008-9. O ataque ao navio turco Mavi Marmara, da chamada Flotilha de Liberdade de Gaza, em 31 de maio de 2010, com a morte de dez pessoas, foi um golpe direto.
A Turquia rebaixou as relações diplomáticas e suspendeu a cooperação militar.
Israel concordou em pedir desculpas e indenizar as famílias dos mortos em US$ 20 milhões, mas o bloqueio a Gaza dificulta a plena normalização das relações bilaterais. Até a ajuda humanitária da Turquia a Gaza é considerada ameaça à segurança nacional israelense.
Para fortalecer sua posição regional, Israel usa suas reservas de gás natural para acordos com o Egito e a Jordânia, os dois únicos países árabes com que assinou a paz. O presidente Erdogan acaba de pedir desculpas à Rússia pelo abate de um avião de caça na guerra civil da Síria em 24 de novembro de 2015, mas as relações com a Rússia estão abaladas.
O gás é mais um interesse a aproximar a Turquia de Israel. O objetivo turco é diversificar as parcerias no setor de energia para ter alternativas de suprimento. Além de Israel, deve negociar gás natural com o Azerbaijão e o Curdistão iraquiano.
Este é o blog do jornalista Nelson Franco Jobim, Mestre em Relações Internacionais pela London School of Economics, ex-correspondente do Jornal do Brasil em Londres, ex-editor internacional do Jornal da Globo e da TV Brasil, ex-professor de jornalismo e de relações internacionais na UniverCidade, no Rio de Janeiro. Todos os comentários, críticas e sugestões são bem-vindos, mas não serão publicadas mensagens discriminatórias, racistas, sexistas ou com ofensas pessoais.
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