Em uma decisão que contraria sentença anterior do próprio tribunal, os desembargadores da 1ª Câmara do Tribunal de Justiça da Província de Buenos Aires consideraram inconstitucional deter e acusar uma pessoa pela posse de drogas para uso pessoal. Eles absolveram um jovem preso com menos de meio grama de maconha, afirmando que cada pessoa é "o único juiz de suas questões pessoais".
A posse de droga para uso pessoal, argumenta o desembargador-relator, Benjamín Ramón Sal Llargués, "longe de ser uma conduta proibida, é uma conduta que consagra o exercício da liberdade".
É o contrário do que decidiu a 2ª Câmara do mesmo tribunal de apelações de La Plata. Em 27 de dezembro de 2007, considerou a posse de drogas para consumo pessoal um delito.
"Criminalizar o mal que alguém produz a si mesmo, como no caso do consumo de drogas, significa a assunção pelo Estado de um critério paternalista autoritário alheio ao princípio de autonomia da pessoa que nos remete às piores épocas de nossa história recente", sentenciou o juiz.
Na prática, o parecer de Sal Llargués, acompanhado por seu colega Carlos Natiello, considera inconstitucional o parágrafo II do Art. 14 da Lei de Estupefacientes (23.737), que fixa as penas de reclusão para quem é preso com drogas ilegais em seu poder: "A pena será de um mês a dois anos de prisão quando, pela escassa quantidade e demais circunstâncias, ficar inequivocamente evidenciado que a posse era para uso pessoal".
Para os juízes liberais, essa norma jurídica contradiz o Art. 19 da Constituição da Argentina, que diz: "as ações privadas que de nenhum modo ofendam a ordem e a moral pública, nem prejudiquem a um terceiro, estão reservardas a Deus e isentas da autoridade dos magistrados".
Como parte da criminalização da posse de drogas para consumo pessoal, "há um núcleo subjacente de idéias que leva a práticas de prevenção de caráter despótico, contrárias à liberdade pessoal e à dignidade humana", argumenta Sal Llargués.
"Ao penalizar o simples portador para consumo personal, o Estado adiciona o crime ao problema da droga, e o joga no sistema penal, criando um antecedente que muito provavelmente o marcará e o prejudicará no futuro, provocando eventualmente sua estigmatização".
O presidente do tribunal, Federico Domínguez, vai levar a questão a uma sessão plenária para que todos os desembargadores da província de Buenos Aires decidam se a posse de drogas é ou não um delito criminal.
Este é o blog do jornalista Nelson Franco Jobim, Mestre em Relações Internacionais pela London School of Economics, ex-correspondente do Jornal do Brasil em Londres, ex-editor internacional do Jornal da Globo e da TV Brasil, ex-professor de jornalismo e de relações internacionais na UniverCidade, no Rio de Janeiro. Todos os comentários, críticas e sugestões são bem-vindos, mas não serão publicadas mensagens discriminatórias, racistas, sexistas ou com ofensas pessoais.
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