Desde 1989, ano da Queda do Muro de Berlim, marco do final da Guerra Fria, as guerras entre países se tornaram obsoletas, afirma o professor Edward Kaufman, diretor adjunto do Centro de Desenvolvimento Internacional e Gerenciamento de Conflitos da Universidade de Maryland, nos Estados Unidos. Houve uma queda de 60% nos conflitos.
A imensa maioria das guerras é interna, provocada por questões étnicas ou religiosas. O problema, ressalva o pesquisador, que participou no início do mês do 3º Encontro do Grupo de Análise e Prevenção de Conflitos da Universidade Cândido Mendes, é que “os conflitos domésticos geralmente são mais longos e mais difíceis de resolver”.
Kaufman, judeu argentino naturalizado americano, não aceita a tese do choque de civilizações: "É uma maneira de estereotipar sociedades. Em todo país, há uma sociedade civil que pensa que nem nós".
De 161 países pesquisados, mais da metade são democracias e 55 foram atingidos pela violência desde 1990: dois terços enfrentaram conflitos armados e 31 estão sob risco.
As guerras de libertação nacional atingiram o pico no início dos anos 90, observa o professor Kaufman. “O terrorismo mudou o panorama internacional. As novas políticas de segurança afetam os direitos humanos: prisão de Guantânamo, tortura, repressão, discriminação a muçulmanos, prisões ilegais”.
O discurso antiterrorista desqualifica o inimigo, tornando difícil negociar.
Desde 1945, com as promessas de “genocídio nunca mais” depois da queda do nazismo e da libertação dos campos de concentração, a questão dos direitos humanos entrou na agenda internacional. Durante a Guerra Fria, lembra Kaufman, usava-se a expressão “Holocausto nuclear”. Nos 1970s, com a détente entre as superpotências e os acordos de Helsinque, o tema tornou-se ainda mais importante.
Hoje a intervenção por razões humanitárias é, além da legítima defesa, a única guerra legitimada pela Carta da ONU. “Não há soberania para tiranos”.
Já o professor Jacques d'Akesky, coordenador do Programa de Direitos Humanos do Centro de Estudos das Américas da UCaM, ao discutir Direitos Humanos e Ingerência Humanitária, ressalvou que "o direito de intervenção humanitária flexibiliza, se não solapa, o princípio de soberania nacional".
Outra característica da guerra pós-moderna é que é cada vez maior a porcentagem de civis mortos. Na Primeira Guerra Mundial, apenas 10% dos 20 milhões de mortos eram civis. Na Segunda Guerra Mundial, metade dos 55 milhões de mortos era civil. Na última década, 80%-90% dos mortos em guerra foram civis.
A guerra pós-moderna viola assim o princípio básico da guerra justa que é poupar civis inocentes, distinguindo combatentes e não-combatentes.
Kaufman diz que a solução de conflitos começou durante a Guerra Fria por iniciativa de cientistas dos EUA e da União Soviética que temiam a corrida armamentista nuclear. É uma diplomacia cidadã. Havia 500 ONGs dedicadas à paz na última Assembléia Geral da ONU, no ano passado.
Na prática, observa o professor argentino-americano, “um conflito entre as abordagens das ciências sociais e jurídicas, paz x justiça. Na abordagem dos direitos humanos, a justiça é inegociável, então os violadores dos direitos humanos devem ser excluídos. Mas a abordagem tradicional de solução de conflitos é conciliatória e inclusiva.
Entre suas conclusões, a professor da Universidade de Maryland citou:
- a mudança no conceito de soberania;
- há maior transparência e prestação de contas;
- estamos indo de um mundo centro em Estados para um mundo com muitos centros;
- se quase não há mais guerras internacionais, os conflitos domésticos são longos e difíceis de resolver;
- há o risco de uma corrida armamentista, com Estados e grupos não-estatais querendo ter acesso a armas de destruição em massa;
- há uma queda nos gastos militares;
- em 2000, o total de mortos e feridos em guerras foi de 300 mil, muito menos do que o 1,2 milhão de mortos no trânsito;
- a opinião pública democrática é cada vez menos tolerante com mortes em guerras;
- há um grande aumento nas missões de paz;
- meios pacíficos levam a fins pacíficos;
- os civis precisam controlar os militares;
- há um fracasso da Pax Americana?
Este é o blog do jornalista Nelson Franco Jobim, Mestre em Relações Internacionais pela London School of Economics, ex-correspondente do Jornal do Brasil em Londres, ex-editor internacional do Jornal da Globo e da TV Brasil, ex-professor de jornalismo e de relações internacionais na UniverCidade, no Rio de Janeiro. Todos os comentários, críticas e sugestões são bem-vindos, mas não serão publicadas mensagens discriminatórias, racistas, sexistas ou com ofensas pessoais.
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