A proposta do novo ministro das
Relações Exteriores, senador José Serra, de dar mais destaque ao Itamaraty e
usar a política externa para ampliar as relações econômicas do país foi tema de
matéria do jornal O
Globo de 22 de maio de 2016
em que fui citado. Abaixo, outras considerações além do que foi publicado.
Em princípio, é uma boa ideia um
ministro do Exterior que não seja diplomata de carreira por causa do
corporativismo do Itamaraty, mas Serra não é lá muito diplomático.
Foi correta a resposta pronta aos
governos latino-americanos que denunciam golpe no Brasil, mas conceder
passaporte diplomático a um pastor evangélico num Estado laico é um erro. Sou a
favor de taxar as religiões e não de fazer concessões eleitoreiras.
É importante retomar as relações com
as grandes potências democráticas, falo de EUA, Europa, Canadá, Japão e
Austrália. Temos em comum a defesa da democracia liberal e dos direitos
humanos. Devemos rejeitar atitudes colonialistas, mas não hostilizar EUA e
Europa como potências imperiais como fazia o PT.
A Guerra Fria acabou. No mundo globalizado,
é preciso negociar soberanamente com o mundo todo.
O grupo BRICS me parece mais um
instrumento de política externa da China, com quem precisamos manter boas
relações por causa da importância econômica, mas China e Rússia são defensoras
de um autoritarismo que não interessa a países verdadeiramente democráticos. De
acordo com a Constituição, os direitos humanos são um pilar importante da
política externa brasileira.
A cooperação econômica é importante,
mas a aliança política com qualquer potência não pode ser automática. Não pode
haver alinhamento automático nem com China nem com EUA e o maior desafio será
sempre negociar com as superpotências.
Precisamos de uma política externa
independente, soberana e flexível. O Brasil é um ator global e precisa
continuar sendo.
Serra sempre foi contra o Mercosul,
o que me parece um equívoco. Sob a orientação do embaixador Rubens Ricupero,
reconhece a importância do bloco na arquitetura da política externa brasileira,
que desde a redemocratização reconhece a importância da região, especialmente
da América do Sul.
Seria importante resgatar a proposta original do bloco, o regionalismo aberto, onde um grupo de países que se une para ter voz mais forte e maior poder de barganha em negociações e foros internacionais. A Venezuela de Maduro atrapalha, mas de que servem Mercosul, Unasul (União das Nações Sul-Americanas) e Celac (Comunidade dos Estados Latino-Americanos e Caribenhos), se não forem capazes de negociar uma transição pacífica na Venezuela?
É o problema mais urgente no nosso
entorno. Do jeito que vai, o derramento de sangue parece inevitável. O governo
Dilma Rousseff estava muito mais qualificado para fazer isso por causa da
identidade ideológica. Perdeu a oportunidade pelo desinteresse de Dilma com a política
externa.
A política externa é uma política de
Estado, que requer continuidade. Dilma esvaziou o Itamaraty, que hoje tem
excesso de terceiros-secretários porque sob Lula o Rio Branco admitia cem
pessoas por ano e Dilma teria reduzido para 20. Dilma desmontou o árduo
trabalho de Celso Amorim para aumentar a internacionalização do Brasil.
Em seu estilo pouco diplomático,
Serra mandou fazer logo uma análise de custos com o objetivo evidente de fechar
embaixadas. Todo orçamento tem limite, mas fechar as portas é dar um tapa na
cara de países com que o Brasil tentou reforçar os laços.
Imagino que o continente mais
afetado seja a África, onde Lula estabeleceu “amizades” com ditadores
sanguinários como Teodoro Obiang, da Guiné Equatorial, e Denis Sassou-Nguesso,
do Congo (ex-Francês). Não dá para ignorar graves violações dos direitos
humanos enquanto se faz negócios, mas se pode usar a influência para tentar
melhorar a situação ao contrário do que faz a China, que ignora tudo em nome da
soberania nacional.
A África é o próximo continente que
pode sofrer um crescimento acelerado, até mesmo por partir de um nível muito
baixo. O Brasil, como segundo maior país africano do mundo em população, deve
participar deste processo.
Se olharmos um mapa da África à noite, veremos uma escuridão quase
total. O ex-ministro francês Jean-Louis Borloo lançou a proposta de um Plano
Marshall para a eletrificação do continente, Energias para a África. Com energia e mão de obra barata,
pode ser um salto no desenvolvimento africano. O Brasil deveria se associar a
este projeto.
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