domingo, 12 de agosto de 2007

Uberti controlava 907 milhões de pesos

O alto funcionário argentino demitido no escândalo da maleta com US$ 790 mil não-declarados vindos da Venezuela controlava fundos com 907 milhões de pesos, revela hoje o jornal argentino La Nación. Acima de tudo, Claudio Uberti era o principal operador da relação especial com a Venezuela do presidente Hugo Chávez.

Uberti dirigia o Órgão de Controle de Concessões Viárias (Occovi). Em 2004, o partido esquerdista ARI o acusou de ser o apanhador de dinheiro sujo da campanha do presidente Néstor Kirchner em 2003, junto com o ex-motorista de Kirchner, Rudy Ulloa Igor, hoje dona de uma empresa multimídia.

Ele era próximo do ministro do Planejamento, Julio De Vido, um dos homens-fortes do kirchnerismo. O ministro encarregou Uberti da maior jóia da política externa de Kirchner: a relação especial com a Venezuela, mesmo que Uberti não tivesse autoridade legal para tanto. Além dos negócios de energia, a Venezuela comprou mais de US$ 5 bilhões em bônus da dívida pública argentina.

Claudio Uberti estava no vôo em que o empresário venezuelano Guido Alejandro Antonini Wilson e sua maleta, onde funcionários da aduana encontraram US$ 790 mil não-declarados, chegaram ao Aeroparque Jorge Newberry, no sábado, 4 de agosto. O escândalo estourou na terça-feira.

Desde que Uberti assumiu a direção do Occovi, em 28 de maio de 2003, mais de 1,5 bilhão de pesos passaram pela agência. Se não tivesse caído, teria 406 milhões para obras viárias, previstos no orçamento para 2007. Mais dinheiro vem da arrecadação de pedágio e vai para um fundo que movimentou 684 milhões de pesos sob a gestão de Uberti. Outro fundo recebe uma porcentagem da venda de combustíveis.

Esses fundos são as caixas-pretas do governo Kirchner. E a relação com a Venezuela é mais misteriosa ainda porque não existe uma contabilidade transparente.

"Ele não nos atende ao telefone há algum tempo", reclamou um concessionário de rodovia. "Está sempre em reunião ou tratando de assuntos relativos à Venezuela."

Outro empresário observou que Uberti "estava convencido de que seria embaixador na Venezuela". Não conseguiu, mas viajava todo mês a Caracas.

O escândalo desnuda a relação entre duas manifestações do populismo latino-americano: Kirchner é o herdeiro do general Juan Domingo Perón; Chávez é, na definição do pensador mexicano Jorge Castañeda, um "Perón com petróleo".

Chávez e Kirchner não têm idéias iguais, observa o jornalista Joaquín Morales Solá, colunista do jornal La Nación, "embora façam às vezes os discursos semelhantes para confusão deles mesmos e dos outros. Mas existe uma mesma maneira de governar: o personalismo absoluto, o controle dos recursos públicos como se fossem propriedade privada e o temor reverencial de amigos e colaboradores".

Este estilo autoritário e populista de governar com um grupo de tomada de decisões pequeno e fechado faz com que bilhões de dólares sejam administrados por pouquíssimas pessoas. Quase tudo passa pelas mãos do presidente, comenta Solá, que propõe uma série de perguntas:
• Como o avião pôde sair da Venezuela com US$ 790 mil?
• Que tipo de controle existe nos aeroportos da Venezuela?
• Por acaso os amigos de Chávez gozam dos privilégios de toda elite governante num regime autoritário?
• Por que seria esta a primeira vez que o empresário venezuelano Antonini Wilson teria tentado entrar na Argentina com uma fortuna na maleta? Só este ano entrou e saiu 12 vezes da Argentina.
• Que destino teria esse montão de dinheiro em moeda do "império", como costuma dizer Chávez?
• Quantas vezes Claudio Uberti viajou a Caracas nos últimos meses?
• O que foi fazer em cada viagem?
• Por que o Estado argentino deixou viajar de graça uma pessoa que declara não conhecer?
• Ou foi Antonini Wilson que pagou o aluguel do avião?

Um advogado já acionou judicialmente a estatal de petróleo argentina Enarsa, que oficialmente fretou o avião, para que esclareça a última pergunta.

O governo argentino alega que o dinheiro seria distribuído entre grupos chavistas. Neste caso, seria uma ingerência externa na política argentina. É melhor para Kirchner do que as hipóteses de pagamento de propina ou ajuda para a candidatura da primeira-dama, senadora Cristina Fernández de Kirchner.

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