sexta-feira, 3 de agosto de 2007

"Civis ainda têm preconceito com militares"

Os civis ainda não sabem o que querem e têm preconceito em relação aos militares, afirmou o professor Antônio Jorge Ramalho, da Universidade de Brasília, assessor do Ministério da Defesa ao participar da mesa redonda Lições da Segurança Internacional para a Segurança Pública: Missões de Paz, Garantia da Lei e da Ordem e o Emprego das Forças Armadas, realizada na segunda-feira, 30 de julho, no Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri), no Rio.

Na sua opinião, a experiência da missão de paz das Nações Unidas no Haiti, onde o Brasil tem o comando e o maior contingente, está sendo extremamente instrutiva. Mas “na questão conceitual, ainda há uma zona cinzenta entre a segurança nacional e a segurança pública”.

Essa definição não se faz no vácuo, destacou Antônio Jorge. A confusão vem dos Estados Unidos, onde o Departamento de Segurança Interna está enviando agentes para o exterior para, por exemplo, inspecionar as cargas despachadas para o território americano. Caso contrário, o navio tem o direito de atracar em portos dos EUA.

Diante da nova realidade criada pela guerra dos EUA contra o terrorismo, admite o professor, “há uma necessidade de revisar conceitos como instituições, fronteiras, segurança juridical, direitos humanos. As violações dos direitos humanos em Darfur, no Sudão, são consideradas uma ameaça à paz e à segurança internacionais. O narcotráfico e o tráfico de seres humanos exigem coordenação internacional”.

Antônio Jorge entende que as Forças Armadas devem ser empregadas somente em situações extremas, o que em alguns casos pode incluir a segurança interna. Mas “falta regulamentação: quem assume o comando? Falta um arcabouço legal, uma cadeia de comando e controle”, argumenta o professor.

Em princípio, ele reluta em ver as Forças Armadas fazendo papel de polícia: “As Forças Armadas foram feitas para dissuadir e fazer a guerra, para atirar primeiro e perguntar depois. Sabem que o tempo não se recupera; o espaço se recupera. Visam a destruir mais do que a normalizar”.

Na guerra, uma situação extrema em que as normas da convivência civilizada são suspensas, há uma desumanização do inimigo, um fortalecimento do espírito de corpo e uma série de comportamentos inaceitáveis na sociedade civilizada.

“Para as Forças Armadas e os guerrilheiros, havia uma guerra no Brasil. A sociedade ainda não virou a página 1964-85. É um problema sobretudo para os civis.”

“Hoje, entre as hipóteses de guerra, o Exército treina guerra de guerrilhas estudando casos como o Vietnã. Não temos armas e homens para defender o território nacional. Ninguém pensa que irá acontecer mas é uma hipótese. A guerrilha exige apoio local. O Exército acha importante ocupar a Amazônia.”

Como o afastamento dos militares da política no fim da ditadura, “o Exército se afastou dos grandes debates nacionais”.

No Haiti, Antônio Jorge acredita que os resultados da missão de paz da ONU liderada pelo Brasil são positivos. A única baixa foi o suicídio do general-de-divisão Urano Teixeira da Matta Bacellar, em 7 de janeiro de 2006, por problemas pessoais.

“Há uma doutrina de troca e relacionamento, uma ação cívico-social do Exército. A população percebe o soldado brasileiro como um primo. Em poucos dias, o soldado brasileiro se entende com os haitianos, em parte por causa da diversidade e da tolerância em relação ao próximo da cultura brasileira.”

“Não é um emprego da tropa para fazer papel de polícia. O Exército está lá num exercício de projeção de poder”, concluiu o professor Antônio Jorge em sua apresentação inicial.

O professor Antônio Jorge negou que haja uma ociosidade das Forças Armadas: “No terceiro dia no Haiti, em pleno Natal, os militares brasileiros estavam atirando”.

A sociedade precisa saber o que quer das Forças Armadas, insistiu o assessor do Ministério da Defesa. “O Exército não é necessário para fazer estradas e realizar campanhas de vacinação. A Força Nacional de Segurança é uma força intermediária. Precisa de doutrina e formação. A força armada foi feita para a guerra. É um elemento de dissuasão. Deve ser preservada da atuação cotidiana.”

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