Como diz uma piada cheia de ironia muito citada hoje na África do Sul, "se a gente ainda estivesse lutando contra o apartheid, este governo não nos apoiaria". O Congresso Nacional Africano virou um partido do status quo, incapaz por exemplo de negociar uma solução para a crise do vizinho Zimbábue, que agoniza há uma década sob a ditadura de Robert Mugabe.
Agora, um dos heróis da luta contra o regime segregacionista da minoria branca, o arcebispo Desmond Tutu, declara que "este governo é pior do que o do apartheid porque pelo menos a gente sabia o que esperar dele".
Sob pressão da China, sua mais nova aliada estratégica, o governo do CNA acaba de negar um pedido de visto para que Tenzin Gyatso, o 14º Dalai Lama, líder espiritual do Tibete, participasse da festa de 80 anos de Tutu.
O Dalai Lama luta pacificamente pela autonomia do Tibete, que só existe no papel. Na prática, a ditadura militar chinesa impõe uma política de assimilação forçada que os tibetanos acusam de destruir sua cultura.
Por iniciativa da China, a África do Sul foi convidada a participar do grupo BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, o S, de South Africa, do inglês). A sigla reunia as quatro grandes economias emergentes que, na opinião de um economista do banco de investimentos Goldman Sachs, serão responsáveis pela maior parte do crescimento mundial nas próximas décadas.
A África do Sul entrou de carona no grupo. Seu desempenho econômico não justifica o convite. A Indonésia tem peso muito maior na economia mundial, mas o regime comunista de Beijim preferiu fazer média com o continente africano, que explora impiedosamente como qualquer potência imperial, humilhando inclusive um dos grandes heróis da história recente da África.
Ao vetar ontem, ao lado da Rússia, a resolução do Conselho de Segurança das Nações Unidas condenando a violência da ditadura da Síria e pressionar a África do Sul a não receber o Dalai Lama, que luta pacificamente pela democracia, a ditadura militar da China mostra a verdadeira natureza da superpotência ascendente do século 21. Quem quiser que ignore ou baixe a cabeça.
Este é o blog do jornalista Nelson Franco Jobim, Mestre em Relações Internacionais pela London School of Economics, ex-correspondente do Jornal do Brasil em Londres, ex-editor internacional do Jornal da Globo e da TV Brasil, ex-professor de jornalismo e de relações internacionais na UniverCidade, no Rio de Janeiro. Todos os comentários, críticas e sugestões são bem-vindos, mas não serão publicadas mensagens discriminatórias, racistas, sexistas ou com ofensas pessoais.
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