quinta-feira, 21 de junho de 2007

Negociações da OMC terminam em fracasso

As negociações entre Brasil, Estados Unidos, Índia e União Européia (UE) para salvar a Rodada Doha da Organização Mundial do Comércio entraram em colapso hoje. Representantes brasileiros e indianos abandonaram a reunião, realizada em Pótsdã, na Alemanha, acusando os países ricos de não fazerem as concessões mínimas para um acordo agrícola.

O ministro das Relações Exteriores do Brasil, embaixador Celso Amorim, explicou que os dois países consideram "inútil" prosseguir com o diálogo: "Era inútil prosseguir com as negociações levando em conta o que havia sobre a mesa", disse Amorim ao lado do ministro indiano do Comércio, Kamal Nath.

Nos EUA, o presidente George Walker Bush responsabilizou o Brasil e a Índia, e alegou que esses países estão prejudicando o desenvolvimento de países mais pobres, enquanto o comissário europeu de Comércio Exterior, o britânico Peter Mandelson adotava o mesmo discurso.

Os três países e o bloco europeu, descritos pelo jornal The Wall Street Journal como os "mais poderosos membros da OMC", acusaram-se mutuamente pela impossibilidade de chegar a um acordo para reduzir o protecionismo agrícola dos países ricos. Eles não têm mandato dos 150 membros da organização, que opera por consenso, mas o sistema multilateral de comércio sempre funcionou desta maneira.

Quando as negociações da Rodada Uruguai (1986-94) do Acordo Geral de Tarifas e Comércio (GATT, da sigla em inglês) estavam num impasse, no final de 1993, o grupo Quad (EUA, UE, Japão e Canadá) fez um acerto entre si e apresentou o pacote para os países em desenvolvimento na base de pegar ou largar. No início daquela rodada, Brasil e Índia tinham uma postura negativa, contra as negociações de liberalização comercial.

A abertura comercial do Brasil e da Índia, no início dos 90, e o extraordinário desenvolvimento da China, que agora faz parte da OMC, fortaleceram a posição dos países em desenvolvimento, levando à criação do Grupo dos Vinte (G-20), sob a liderança do chanceler Celso Amorim.

O G-20 foi criado em agosto de 2003, na preparação da Conferência Interministerial da OMC em Cancún, no México, em setembro do mesmo ano. Hoje, tem 21 membros:cinco da África (África do Sul, Egito, Nigéria, Tanzânia and Zimbábue), seis da Ásia (China, Filipinas, Índia, Indonésia, Paquistão Tailândia) and 10 América (Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Cuba, Guatemala, México, Paraguai, Uruguai and Venezuela).

A Rodada Doha começou em Doha, no Catar, em novembro de 2001. Sob o impacto dos atentados de 11 de setembro de 2001, os EUA estavam com a idéia de que o desenvolvimento econômico era importante para combater o terrorismo. O Brasil negociou concessões para quebrar patentes de medicamentos contra a aids (sídrome de deficiência imunológica adquirida) porque o governo George W. Bush temia atentados com armas químicas e biológicas que poderiam exigir a fabricação em massa de medicamentos em tempo recorde.

Por sua vez, a Europa exigia maior acesso a mercados para suas exportações industriais para implementar os cortes de subsídios agrícolas aprovados na Rodada Uruguai. Daí surgiu a idéia de uma Rodada do Milênio ou do Desenvolvimento, com o argumento de que a liberalização comercial beneficiaria os países mais pobres.

Mas a espetacular ascensão da China e o especto da Índia, outro país de mais de 1 bilhão de pessoas em crescimento acelerado, aumentaram as pressões protecionistas nos países ricos.

O mesmo Mandelson que defende restrições às exportações chinesas de produtos têxteis e calçados agora acusa os países em desenvolvimento de não querem reduzir suas tarifas industriais: "Emergiu na discussão que não seríamos capaz de ter nenhuma mudança significativa comercialmente nas tarifas das economias emergentes, como uma compensação razóavel pelo preço que estamos pagando", declarou o comissário europeu em nota oficial.

A reunião de Pótsdã tinha urgência porque no final do mês termina o prazo da Autorização de Promoção Comercial dada pelo Congresso dos EUA ao governo Bush. Com essa autorização, o Congresso não pode emendar acordos comerciais internacionais assinados pelo presidente americano, apenas aprová-los ou rejeitá-los.

Se os acordos fossem alterados pelo Congresso, seria preciso rediscuti-los com os outros países signatários, inviabilizando a negociação. Mas o Brasil e a Índia preferiram não aceitar uma proposta lesiva a seus interesses.

Como é altamente improvável que o novo Congresso, empossado no início deste ano, com maioria democrata, dê nova autorização a Bush, nem esteja disposto a fazer concessões no ano eleitoral de 2008, a Rodada Doha deve se arrastar por mais alguns anos.

A Rodada Uruguai durou oito anos. Doha talvez exija mais tempo.

Nenhum comentário: