É muita cara-de-pau da ministra do Turismo, Marta Suplicy, dizer aos brasileiros que sofrem com o caos do transporte aéreo, que se arrasta há meses, sem que o governo consiga resolver o problema: "Relaxe e goze".
Ontem minha mãe, de 89 anos, ficou mais de quatro horas na sala de embarque do Aeroporto Tom Jobim esperando o vôo 1892 da Gol (Rio-PoA), sem que a companhia, que inicialmente mentiu dizendo que estava no horário, tenha se dignado a dar uma explicação convincente ou alguma atenção aos passageiros que se acumulavam em saguões e salas de embarque.
Se a neblina é inevitável no inverno, além da crise do controle aéreo, o mínimo que se exige é que as companhias dêem informações claras e prestem assistência aos passageiros que pagaram pelo serviço de transporte aéreo, que naturalmente inclui o embarque.
Sei que jornalistas não devem usar casos pessoais, mas como isto é um blog, um instrumento de um jornalismo pessoal, a situação foi abusiva e a vítima uma pessoa de idade avançada, resolvi ultrapassar essa norma.
Ao chegarmos no Galeão para o check-in a funcionária do balcão da companhia mentiu, dizendo que o vôo estava no horário. Quando minha mãe chegou à sala de embarque, outros passageiros já sabiam do atraso.
Em seguida, ela me ligou, quando eu chegava em casa, dizendo que o vôo iria para Brasília. Não era o vôo. Era o avião que iria cobrir uma rota Rio-Brasília-Rio. Liguei para o telefone 0800 280 0465. Depois de passar por várias gravações que me dirigiam para o site da empresa, onde não havia nenhuma informação atualizada, a atendente da Gol me disse que não sabia de nenhuma alteração: o vôo sairia normalmente, no horário previsto, ou com um atraso "normal" de meia a uma hora.
Liguei para minha irmã e avisei que o vôo deveria chegar no horário.
Às 16h45, minha mãe ligou de novo. O vôo sairia às 19h20, com quatro horas de atraso. Liguei para a companhia para confirmar. O Serviço de Atendimento ao Consumidor me informou que não tem contato telefônico com o pessoal da Gol no aeroporto. Mas que a informação que tinha "do setor operacional" era que o vôo sairia às 20h40. Chamam isso de "linhas aéreas inteligentes". Falta de comunicação, no mundo de hoje, é burrice.
Tratando-se de uma passageira de 89 anos, pedi encarecidamente que lhe dessem uma atenção especial, já que a culpa do desvio da aeronave era da Gol e não da neblina. Disseram-me para ligar para ela e dizer para procurar o balcão da companhia, em caso de necessidade, mas o celular estava na bolsa e ela não atendeu à ligação.
Quando percebeu que tinha uma chamada não-atendida, me ligou, dizendo: "comprei um livro e uns bombons, sentei num canto e fiquei quietinha lendo".
Lá pelas 19h30, chamaram o embarque. Às 22h30, finalmente, minha irmã avisou que estava levando a mãe para casa.
Em boa parte, o problema do caos aéreo é do duopólio Gol-TAM desde a falência da velha Varig. Como o mercado ainda não oferece muitas opções, ambas as empresas abusam do seu poder de mercado, tratando seus passageiros sem maior respeito.
Ao não salvar a Varig, o governo Lula é pelo menos parcialmente responsável por isso, sem falar na crise do sistema de controle aéreo.
A Varig tinha 91 aviões em operação, e as companhias que dominam o mercado hoje não têm condições de substituí-la. Lula alegou que não investiria dinheiro público numa empresa falida. Como não houve uma solução de mercado, a Varig quebrou, provocando desemprego, queda da presença internacional da avião brasileira e contribuindo para o caos aéreo.
Assim, ao usar a frase feita do seu tempo de sexóloga, a ministra Marta Suplicy parece mais estar promovendo o turismo sexual. Se a violação dos nossos direitos é inevitável, talvez seja melhor mesmo comprar um livro e se acomodar num canto. Mas as conseqüências do caos aéreo para o turismo brasileiras são devastadoras. E o desempenho do governo nesta crise é sofrível. Quem sofre somos nós, que sustentamos a farra de escândalos revelados a cada semana, a cada investigação da Polícia Federal.
A culpa da corrupção e de outros problemas nacionais não é exclusiva deste governo. Mas há um clima de cumplicidade em Brasília, como é evidente no caso Renan Calheiros, que enoja a opinião pública informada deste país.
Este é o blog do jornalista Nelson Franco Jobim, Mestre em Relações Internacionais pela London School of Economics, ex-correspondente do Jornal do Brasil em Londres, ex-editor internacional do Jornal da Globo e da TV Brasil, ex-professor de jornalismo e de relações internacionais na UniverCidade, no Rio de Janeiro. Todos os comentários, críticas e sugestões são bem-vindos, mas não serão publicadas mensagens discriminatórias, racistas, sexistas ou com ofensas pessoais.
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