Ao fazer um balanço da situação atual dos Estados Unidos e apresentar propostas para seu segundo governo, o presidente Barack Obama começou citando John Kennedy para dizer que a Constituição é o instrumento que os partidos têm para chegar a acordos que façam o país progredir. Afirmou que o país, os pacientes e os consumidores estão hoje mais protegidos do que quatro anos atrás, quando chegou à Casa Branca.
"Nos últimos dois anos", afirmou, "os dois partidos trabalharam juntos para cortar o déficit orçamentário em US$ 2,1 trilhões", mas isso é apenas a metade do necessário para equilibrar as contas públicas. O presidente é contra os cortes automáticos previstos em lei se democratas e republicanos não chegarem a um acordo para evitar o chamado "sequestro".
O maior desafio, observou, é retomar a máquina de crescimento da economia americana, a classe média. Ele defendeu aumentos de impostos para os ricos para que o custo do ajuste fiscal não recaia apenas sobre a classe média. "Precisamos de cortes de gastos e aumento da renda".
Em seguida, Obama admitiu que a maior causa do crescimento do déficit público federal dos EUA é o gasto com saúde pública. Ele não vê sentido em manter furos e isenções na lei que permitem que ricos e grandes empresas deixem de pagar impostos enquanto aumentam a pressão da direita conservadora por cortes em saúde pública, educação e benefícios sociais.
Ao falar de uma reforma nos impostos, o presidente propôs que empresas que abrem filiais no exterior paguem mais do que as que operam nos EUA com trabalhadores americanos.
"A maior nação do mundo não pode ficar administrando sua economia de uma crise industrial a outra", argumentou. "Os americanos trabalharam demais para se livrar dos efeitos de uma crise para ver os políticos criarem outra".
Na sua opinião, "a simples redução do déficit não constitui uma política econômica". É preciso criar bons empregos e empresas inovadoras. "Há um ano e meio, propus uma lei de geração de empregos que foi rejeitada. Espero que este Congresso aprove uma".
Para rejeitar a acusação de que está aumentando o tamanho do governo, Obama garantiu que nenhuma das propostas que está fazendo nesta noite vai aumentar o déficit público em um centavo sequer.
Um de seus objetivos é "fazer a próxima revolução industrial aqui" nos EUA. "Para ter os melhores negócios, temos de investir em tecnologia. Não é hora de reduzir os investimentos em ciência e inovação."
Hoje, "nenhuma área promete mais para os EUA do que o setor de energia". O país pode alcançar a autossufiência. Ao mesmo tempo, "precisamos fazer mais para combater a mudança do clima. Os 12 anos mais quentes estiveram entre os últimos 14. Temos mais tempestades, secas, enchentes, furacões e nevadas. Precisamos acreditar na ciência e agir antes que seja tarde demais. Podemos fazer grandes progressos sem comprometer o crescimento econômico".
Se o Congresso não agir, advertiu, "eu o farei", acelerando a transição para uma economia com menos carbono. "No ano passado, a energia eólica representou a metade da nova energia oferecida nos EUA. Enquanto países como a China investirem em energia limpa, devemos fazer o mesmo".
O presidente quer criar um Energy Security Trust para aumentar a eficiência energética, construir edifícios mais econômicos em gasto de energia, além de renovar a infraestrutura, reconstruindo ferrovias e rodovias para gerar empregos.
Como há 70 mil pontes em risco no país, é possível criar um programa de emergência capaz de gerar empresas com o apoio do capital privado. "Temos de provar que não há melhor lugar para fazer negócios do que aqui nos EUA".
Obama anunciou a recuperação do mercado imobiliário, onde começou a crise financeira internacional de 2008. Quer dar a todos os compradores de casa própria o direito de renegociar suas hipotecas pelos juros atuais, que caíram muito com a crise.
"Energia, indústria, infraestrutura, construção civil - tudo isso vai gerar novos empregos, mas precisamos educar e treinar nossa juventude. Hoje desafio os estados a oferecerem uma pré-escola de qualidade a todas as crianças dos EUA", provocou.
"Vamos dar a nossas crianças a chance de começar a vida sem estar atrás. Vamos ter certeza de que nossos alunos saiam do segundo grau qualificados para o trabalho. Na Alemanha, todo estudante do ensino médio recebe uma formação técnica", exortou o presidente.
Mesmo que o segundo grau qualifique, muitos alunos vai chegar à universidade, que está cada vez mais cara. "Quanto mais se estuda, maior é a possibilidade de subir na vida". Obama defende novas regras para que as universidades recebam recursos públicos federais.
Outro ponto importante do projeto de Obama para o segundo mandato é a reforma do sistema de imigração: "Chegou a hora. Uma verdadeira reforma deve fortalecer o controle das fronteiras. Uma verdadeira reforma tem de criar um caminho para os ilegais regularizarem sua situação no país. Uma verdadeira reforma significa mudar as regras para a migração legal, valorizando os que vierem somar para o crescimento de nossa economia. Sabemos o que tem de ser feito. Os dois partidos estão trabalhando nisso. Vamos fazê-lo".
Ontem o Senado aprovou uma lei para proteger as mulheres da violência doméstica. O presidente pediu à Câmara que vote a favor e pagamento igual para homens e mulheres que exercerem as mesmas funções.
Obama também propôs um reajuste do salário mínimo para US$ 9 por hora, alegando que menos do que isso significa miséria para o trabalhador do país mais rico do mundo, e sua indexação: "Vamos ligar o salário mínimo ao aumento do custo de vida. Isso é algo que eu e o governador Mitt Romney combinamos fazer no ano passado", quando ambos faziam campanha para a Casa Branca.
O presidente prometeu ainda reduzir as dívidas federais de municípios em dificuldades financeiras para que eles possam voltar a investir em educação, saúde e segurança. "Famílias fortes, comunidades fortes, EUA mais fortes. Esta sempre foi a fonte de nosso progresso".
No plano internacional, Obama declarou que já retirou 33 mil soldados do Afeganistão, anunciou a saída de mais 34 mil nos próximos 12 meses e o fim da mais longa guerra da História dos EUA no fim de 2014. Ficará uma força mínima para perseguir terroristas.
A rede terrorista Al Caeda não é mais sombra do que era, alegou Obama. Deve ser combatida com ajuda a países onde ela atua e na ação de aliados como a França em sua intervenção militar no Máli, sendo desnecessário enviar dezenas de milhares de soldados americanos ao exterior.
"Nossos desafios não terminam com Al Caeda. Os EUA vão continuar tentando evitar a proliferação das armas mais perigosas", acrescentou advertindo os líderes da Coreia do Norte e do Irã. "Faremos o que for necessário para evitar que tenham armas nucleares".
Ao mesmo tempo, prometeu trabalhar com a Rússia para reduzir os arsenais atômicos das grandes potências.
Outra preocupação séria é a guerra cibernética, a tentativa de roubar segredos militares e econômicos, e até de paralisar o sistema de transmissão de energia dos EUA.
"Queremos criar uma Parceria Transpacífica e hoje estou lançando a proposta de criança de uma zona de livre comércio transatlântica porque é isso que gera prosperidade", anunciou, prometendo ainda fazer um grande esforço com os aliados para superar a miséria e liberar as novas gerações da aids.
Os EUA precisam continuar sendo o centro das transformações. Obama citou o exemplo americano em lugares como Mianmar e ofereceu ajuda à transição para a democracia no Oriente Médio. "O processo será confuso e não podemos ditar o ritmo da mudança em países como o Egito, mas vamos continuar pressionando um regime sírio que ataca seu próprio povo. Também vamos continuar pressionando Israel e os palestinos para que cheguem a uma paz duradoura".
É esta a mensagem que o presidente vai levar em sua primeira visita a Israel no mês que vem.
A fim de manter sua preeminência, os EUA "devem continuar a ter as melhores Forças Armadas do mundo", investindo em novas tecnologias e dando total apoio aos veteranos, o que raramente acontece na prática.
O direito de votar sem ter de esperar horas em filas é importante para a democracia americana, alertou Obama, citando as dificuldades para exercer esse direito em bairros pobres habitados por minorias.
Outro direito fundamental, o direito à vida, levou o presidente a pedir ao Congresso que coloque em votação os projetos para aumentar o controle de armas. Em tom emocional, ele citou várias vítimas de tiroteios para dizer que elas merecem que o assunto seja votado no Capitólio.
Em resposta, o jovem senador republicano Marco Rubio, da Flórida, acusou o presidente de aumentar o déficit, acreditar num governo grande e de prejudicar assim a iniciativa privada. Foi um discurso pobre, fraco, negativo e sem entusiasmo. Rubio sonha em chegar à Casa Branca. Precisa melhor muito.
Este é o blog do jornalista Nelson Franco Jobim, Mestre em Relações Internacionais pela London School of Economics, ex-correspondente do Jornal do Brasil em Londres, ex-editor internacional do Jornal da Globo e da TV Brasil, ex-professor de jornalismo e de relações internacionais na UniverCidade, no Rio de Janeiro. Todos os comentários, críticas e sugestões são bem-vindos, mas não serão publicadas mensagens discriminatórias, racistas, sexistas ou com ofensas pessoais.
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