sábado, 18 de março de 2006

Teocracia Americana, a ameaça do fundamentalismo cristão nos EUA

O domínio conservador sobre a Casa Branca, o Congresso e a Suprema Corte, a infiltração cada vez maior do fundamentalismo cristão na ideologia do Partido Republicano, constitutem uma grande ameaça à democracia nos Estados Unidos. Quem adverte é Kevin Phillips.

Há 37 anos, ele escreveu A Emergente Maioria Republicana, livro onde afirmava que as mudanças demográficas e econômicas no pais, com migração de pessoas e recursos do Nordeste, a velha região industrial, para o Sul e o Oeste produziria uma maioria republicana mais conservadora que dominaria a política americana durante décadas. Phillips acredita que um Partido Republicano mais forte restabeleceria a ordem numa sociedade afetada por profundas mudanças, sendo algumas violentas.

Agora, no seu 13º livro, Teocracia Americana, resenhado pelo jornal The New York Times, adverte para os riscos criados pela coalizão conservadora que ajudou a articular. Descreve um cenário de extremismo ideológico, ganância sem limites, irresponsabilidade fiscal catastrófica e uma perigosa miopia política.

Phillips aponta três fatores que alimentam sua visão apocalíptica. Nenhum começou no governo George Walker Bush. Mas as políticas do atual presidente dos EUA os exacerbaram.

O primeiro é a influência do petróleo sobre as políticas interna e externa dos EUA. Em segundo, cita a presença cada vez maior de uma ideologia cristã fundamentalista na política e no governo do pais. Em terceiro, os megadéficits que a economia americana acumula há décadas.

Ele faz parte do grupo que está convencido que a verdadeira razão da invasão do Iraque foi o petróleo. “Pense no Iraque como uma base militar com uma vasta reserva de petróleo no subsolo”, disse um analista anos atrás. O terrorismo, as armas de destruição de massa, tirania e democracia seriam apenas desculpas.

É um raciocínio simplista mas nos últimos 30 anos o petróleo foi um elemento central na definição das políticas americanas. O próprio Bush reconheceu que o pais é “viciado em petróleo”.

Este “petroimperialismo”, denuncia Phillips, “transforma as Forças Armadas dos EUA numa força global de proteção do petróleo”.

Mas é o avanço do fundamentalismo cristão que está na idéia básica do titulo: a ameaça de um governo de inspiração teocrática na primeira democracia do mundo, construída sobre o princípio da tolerância religiosa. Ele compara os cristãos radicais aos talebã do Afeganistão por quererem reverter as conquistas do movimento feminista, acabar com a separação entre a Igreja e o Estado e criar um governo baseado na doutrina cristã.

Um grande grupo de protestantes, talvez cerca de um terço da população americana, pondera Phillips, acredita na suposta profecia bíblica da volta de Jesus Cristo à Terra para levar os fiéis para o paraíso. Estes fundamentalistas vêem sinais precursores do apocalipse nas guerras do Oriente Médio, na ocupação israelense de toda a Palestina e até no terrorismo, sinal da degradação da humanidade.

O autor entende que o governo Bush decidiu se aproximar destes fundamentalistas, encorajando-os a ver as políticas do presidente como respostas aos desafios desta era. Questiona se o presidente e seus assessores realmente acreditam na ideologia cristã fundamentalista ou se apenas manipulam a religião por oportunismo político.

Por fim, há a ameaça das dívidas. A dívida pública interna passa de US$ 8 trilhões. Mas a maior preocupação de Phillips é com os US$ 30 trilhões a US$ 40 trilhões que estima serão necessários para cobrir os gastos da Previdência Social e da saúde, por causa do envelhecimento da população. Fala ainda da dívida das empresas, da emissão de bônus por governos estaduais e muncipais, do déficit comercial que exigiria que as exportações fossem 70% do PIB e da dívida doméstica dos lares americanos, onde o consumo supera a poupança.

Phillips denuncia a “financeirização” dos EUA, que teriam passado de uma sociedade industrial para uma economia baseada na movimentação e administração de dinheiro. Ele acusa o ex-presidente do Federal Reserve Board (Fed), o banco central americano, Alan Greenspan de ignorar os riscos causados pela dívida para não furar a bolha especulativa que ajudou a criar.

A rigor, não há novidade em Teocracia na América. Mas Phillips junta elementos que foram um quadro aterrador. O fundamentalismo religioso nasceu nos EUA, na década dos 70 do século 19, como reação à Teoria da Evolução das Espécies de Charles Darwin. Ao refazer a viagem de Aléxis de Tocqueville, autor de Democracia na América em 1835, o filósofo francês Bernard-Henri Lêvy ficou impressionado com a quantidade de intelectuais que defende a teoria do “design inteligente”, pela qual a vida é algo tão maravilhoso que não poderia ter surgido espontaneamente, sem a interferência de um ser superior.

O fundamentalismo cristão é o novo pesadelo americano e as mesmas igrejas evangélicas pentecostalistas que surgiram no Texas, o estado de Bush, em 1901, expandem-se rapidamente pelo mundo, inclusive no Brasil.

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