Só dará para acreditar nas promessas dos candidatos de dar prioridade à educação quando os políticos eleitos passarem a preservar o patrimônio histórico e artístico nacional, nossa identidade e história. Lugares que deveriam estar cheios de crianças e jovens estudando nossas origens são mais um exemplo do complexo de vira-latas que assola o Brasil.
Enquanto foram construídos estádios faraônicos e aeroportos suntuosos para a Copa do Mundo, as igrejas e mosteiros barrocos de Salvador, Olinda e Recife estão em péssimo estado, e os fortes que um dia defenderam a integridade territorial da América Portuguesa estão em ruínas.
A Catedral e as igrejas de São Francisco e da Ordem Terceira de São Francisco, em Salvador, na Bahia; a Capelo Dourada da Ordem Terceira de São Francisco e os Conventos de Santo Antônio e do Carmo, no Recife; e as igrejas de São Francisco e São Bento, em Olinda, Pernambuco; para lembrar apenas algumas das maiores joias do patrimônio histórico, arquitetônico e artístico nacional, dão pena.
A imponente Igreja do Santíssimo Sacramento do Passo ou Igreja do Passo, cuja escadaria foi o principal cenário de O Pagador de Promessas, de Anselmo Duarte, único filme brasileiro a ganhar a Palma da Ouro em Cannes, está fechada desde 1998, quando o teto, corroído por cupins, desabou.
Dos cerca de 900 fortes construídos ao longo da costa para defender o Império Português na América, mais de ainda existem, a maioria em péssimas condições.
No Nordeste, os fortes de Santa Maria, no Porto da Barra, em Salvador, na Bahia; Orange, em Itamaracá, Pernambuco; de Santa Catarina, em Cabedelo, na Paraíba, de onde Maurício de Nassau embarcou de volta para a Europa depois de governar o Brasil Holandês no seu período de maior glórica (1637-44); e dos Reis Magos, marco da fundação de Natal, estão em ruínas.
Na entrada do Forte Orange, um funcionário do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) dá uma tirinha de papel com o endereço na Internet, deixando claro que não há informações disponíveis no local.
Em Cabedelo, o local é aberto. Um guia caça-turistas oferece algumas explicações, mas o ambiente é desolador. Restam alguns canhões jogados, mas a grama avança.
Na entrada do Forte dos Reis Magos, está o primeiro marco da coroa portuguesa reivindicando soberania sobre o Brasil. Uma guia conta a história do cerco da guarnição portuguesa durante a Segunda Invasão Holandesa (1630-54) para um grupo de crianças de escolas públicas de Natal mais interessadas em tirar fotos com celulares.
Alguns abnegados se esforçam para manter a história viva. Na entrada, há uma mesa e cadeiras de plásticos onde três mulheres se acomodam entre pedras e grama. Ao lado, há uma mesa com vários livros interessantes sobre o patrimônio arquitetônico de diferentes regiões do Brasil. Mas, lá dentro, o panorama é desolador.
Há uma moto estacionado dentro de uma das salas. Elas estão identificadas como prisões para oficiais ou soldados, salas de reuniões do estado-maior, do comando, mas uma prisão virou banheiro. O descaso é total.
Quem já cruzou a fronteira sul, com o Uruguai, e esteve nos fortes de São Miguel e Santa Teresa, a poucos quilômetros ddo Chuí, vai encontrar armas, bandeiras, escudos e insígnias. O cenário está pronto. Se entrar um grupo de atores, a história do país pode ser reencenada aos visitantes. Dá para usar como sala de aula, cenário de filmes.
Na Inglaterra, é comum a contratação de atores para dar vida a prédios, monumentos e cidades históricas. No Castelo de Leeds, em Maidstone, Kent, além do fosso e dos animais para alimentar os moradores, aias falam da rainha e seus caprichos como se Ana Bolena fosse aparecer na sala ao lado.
Um ator encarnando Robin Hood circula regularmente pelas ruas de Nottingham, recontando a história do herói que roubava dos ricos para dar aos pobres, uma lenda provavelmente inspirada num dos nobres que se revoltou contra João Sem Terra e entrou na clandestinidade.
No Brasil, onde as empresas da construção civil ganhou tanto dinheiro e fazem tantas contribuições lícitas e ilícitas para as campanhas eleitorais, poderiam cuidar do patrimônio histórico e artístico nacional para que os estudantes possam entender como e por que o Brasil deu no que deu.
Com a inflação da Copa do Mundo e a insegurança nas capitais brasileiras, talvez seja mais barato e prudente viajar a Portugal para conhecer o lado que não estudamos da História do Brasil. Ou então ir para Aruba, Curaçao e Nova York, para onde foram holandeses e judeus depois da vitória da Insurreição Pernambucana, em 1654, quando o Recife era mais rico e próspero do que Nova Amsterdã, a futura Nova York.
Este é o blog do jornalista Nelson Franco Jobim, Mestre em Relações Internacionais pela London School of Economics, ex-correspondente do Jornal do Brasil em Londres, ex-editor internacional do Jornal da Globo e da TV Brasil, ex-professor de jornalismo e de relações internacionais na UniverCidade, no Rio de Janeiro. Todos os comentários, críticas e sugestões são bem-vindos, mas não serão publicadas mensagens discriminatórias, racistas, sexistas ou com ofensas pessoais.
domingo, 24 de agosto de 2014
Brasil despreza patrimônio histórico e artístico
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