sexta-feira, 4 de julho de 2014

Alemanha: da história trágica a líder da Europa

A Alemanha, líder da União Europeia, é a maior economia da Europa e a quarta do mundo, segunda maior exportadora de produtos industriais, superada pela China por causa da crise internacional iniciada em 2008. A excelência de sua engenharia compensa os altos custos de produção.

Apesar de sua trágica história marcada por guerras e pelo Holocausto, é um país moderno, pacífico e desenvolvido, berço de grandes músicos, poetas e filósofos – e uma potência do esporte. O Brasil tem a maior população de origem alemã fora da Alemanha.

GEOGRAFIA
Com 80,5 milhões de habitantes (censo de 2011) e 357 mil quilômetros quadrados, é o maior país da Europa depois da Rússia em população. Situada na Europa Central, não tem fronteiras naturais, a não ser nos pequenos trechos de costa. É cercada pelos mares do Norte e Báltico, e pela Dinamarca, ao norte; pela Polônia e a República Tcheca, a leste; pela Suíça e Áustria, ao sul; e pela França, Bélgica, Holanda e Luxemburgo, a oeste.

POPULAÇÃO
A população alemã diminui desde 2003. Em 2012, morreram 196 mil pessoas a mais do que nasceram na Alemanha, menos do que os 273 mil migrantes. Mas a expectativa é de que o déficit de nascimentos supere a imigração. A projeção oficial é de uma população de 65 a 70 milhões em 2060.

Cerca de 81% têm origem étnica alemã e 7% de outros países europeus; 4% são turcos, o segundo maior grupo étnico. Mais de 19% têm algum antepassado imigrante.

ECONOMIA
Antes do final do século 19, a Alemanha era a segunda maior economia do mundo, atrás apenas dos EUA, maiores e mais ricos em recursos naturais.

Proibida de se rearmar depois da Segunda Guerra Mundial, sob a proteção do guarda-chuva nuclear dos EUA, a Alemanha Ocidental aproveitou a Guerra Fria para se desenvolver economicamente. Tornou-se a terceira maior economia do mundo nos anos 1960s. Ultrapassada pela China, é hoje a quarta maior do mundo e a maior da União Europeia.

Sua economia cresceu 0,7% em 2012 e 0,5% em 2013, com inflação de 2%, chegando a US$ 3,64 trilhões. A taxa de desemprego entre os jovens, de 7,8%, é a menor da UE. O índice geral de desemprego estava em 5,1% em maio de 2014. É o segundo menor da UE, abaixo apenas da Áustria (4,6%).

POLÍTICA
A República Federal da Alemanha, criada em 23 de maio de 1949, é uma democracia parlamentarista. Era conhecida como Alemanha Ocidental até se unir à Alemanha Oriental, em 3 de outubro de 1990, depois da abertura do Muro de Berlim, em 9 de novembro de 1989. É uma federação de 16 estados.

A chefe de governo é a chanceler (primeira-ministra) Angela Merkel, líder da União Democrata-Cristã (CDU), que tem a maior bancada na Câmara Federal (Bundestag) do Parlamento, é aliada da União Social-Cristão (CSU), da Baviera, e forma uma grande coalizão com o Partido Social-Democrata da Alemanha (SPD), o segundo maior do país, nascido do movimento operário.

Seu ex-líder Frank-Walter Steinmeier é ministro do Exterior da grande coalizão do governo Merkel. Ocupava o cargo até ser derrotado nas eleições de setembro de 2009 pela CDU de Merkel. Foi a pior derrota do SPD desde as eleições de 1932, em plena Grande Depressão, quando os nazistas chegaram ao poder.

Merkel venceu as eleições de 22 de setembro de 2013, mas os liberais do FDP, que formavam a uma coligação de governo com a aliança CDU-CSU não obtiveram a votação mínima de 5% para ter direito a representação parlamentar. Ela voltou a se aliar ao SPD.

Também merecem destaque Os Verdes, o mais antigo partido ecologista do mundo, que fez aliança com o SPD no governo Gerhard Schröder (1998-2005) e A Esquerda, que reúne dissidentes do SPD com remanescentes do partido comunista da Alemanha Oriental.

O presidente, que exerce as funções cerimoniais de chefe de Estado, é eleito indiretamente pelo Parlamento.

ORIGENS
As tribos germânicas desceram para o Sul da Europa no início da Era Cristã e ajudaram a derrubar o Império Romano do Ocidente, em 476.

Em 25 de dezembro de 800, Carlos Magno foi coroado imperador do Sacro Império Romano-Germânico. O título foi restaurado com a coroação de Oto I, em 2 de fevereiro de 962, e mantido até a dissolução do império por Francisco II em 1806, durante as guerras napoleônicas.

IMPRENSA E REFORMA
Em 1455, Johan Gutenberg inventou a imprensa, uma das revoluções tecnológicas que criaram o mundo moderno, a era das grandes navegações, do Renascimento artístico e cultural, do racionalismo, do humanismo e da Reforma da Igreja.

Sob influência da tecnologia da imprensa, tão revolucionária para a época quanto a Internet é hoje, em 31 de outubro de 1517, o monge alemão Martinho Lutero pregou na porta da Igreja de Wittenberg suas 95 Teses sobre o Poder e a Eficácia das Indulgências, o manifesto inicial da Reforma Protestante.

GUERRAS
A Alemanha reunificada (a Alemanha foi unificada por Bismarck em 1871, no fim da Guerra Franco-Prussiana) é a primeira filha do mundo pós-Guerra Fria, depois de sua ocupação e divisão no fim da Segunda Guerra Mundial.

Toda ascensão de grandes potências provoca tensões e guerras. A China promete não seguir o exemplo da Alemanha e da União Soviética.

A ascensão da Alemanha provocou duas guerras mundiais (1914-18 e 1939-45). Outros países europeus participaram da grande guerra civil europeia, mas a Alemanha esteve no centro de tudo desde a unificação promovida pelo marechal de ferro original, Otto von Bismarck, no fim da Guerra Franco-Prussiana (1870-71). O Brasil também teve seu marechal de ferro, Floriano Peixoto, o segundo presidente da República.

UNIFICAÇÃO
Bismarck observou que estar no centro do continente e não ter fronteiras naturais era a vantagem e a desvantagem da Alemanha, um país vulnerável (a Inglaterra é um navio que Deus na Mancha ancorou, como disse Castro Alves) e expansionista.

A Guerra Franco-Prussiana (1870-71) unificou uma série de reinos e principados como a Prússia, a Renânia e a Baviera, criando o Império Alemão, sob hegemonia da autoritária Prússia. Também tomou as regiões francesas da Alsácia e da Lorena, uma disputa que está na origem da Primeira Guerra Mundial (1914-18).

SOCIAL-DEMOCRACIA
Como se industrializou depois da Grã-Bretanha, berço do liberalismo econômico, a Alemanha adotou o nacionalismo econômico, pregado por pensadores como Johann Fichte. Bismarck introduziu a social-democracia, os direitos sociais e trabalhistas que estão até hoje no centro da economia social de mercado, o modelo econômico da União Europeia.

Como os alemães eram os grandes pensadores, os grandes filósofos (Immanuel Kant, Georg Hegel, Karl Marx, Friedrich Nietzche, entre outros), desprezavam os americanos. O século 20 seria o século da Alemanha. Seria, se a Alemanha não tivesse se autodestruído em duas guerras mundiais.

PRIMEIRA GUERRA MUNDIAL
A ascensão da Alemanha, inclusive como potência colonial, a partir da Conferência de Berlim (1884-85), quando os europeus fizeram a partilha da África, levou ao aumento da tensão e à formação da Tríplice Aliança (Alemanha, Império Austro-Húngaro e Itália), em 1882, e da Tríplice Entente (França, Grã-Bretanha e Rússia), em 1907.

Essas alianças travaram a Primeira Guerra Mundial de 28 de julho de 1914 a 11 de novembro de 1918. Essa guerra moldou o século 20. Foi responsável pela entrada dos EUA na cena internacional, a partir de 1917, e pela Revolução Russa, no mesmo ano, das duas superpotências que dominariam a segunda metade do século 21.

Até março de 1918, a Alemanha tinha chance de ganhar, mas a entrada dos EUA e de seus recursos numa Europa arrasada decidiu a guerra.

Derrotada, a Alemanha foi submetida a dívidas de guerra e condições extremamente desfavoráveis na Conferência de Paz de Versalhes.

PAZ DE VERSALHES
Para convencer o povo americano da necessidade de intervenção militar na Europa, o presidente americano Woodrow Wilson dizia que era “a guerra para acabar com todas as guerras”.

Versalhes foi a paz para acabar com todas as pazes. Como o Congresso dos EUA rejeitou a Convenção da Liga das Nações, uma proposta de Wilson, os EUA retomaram sua posição isolacionista.

Humilhada e arrasada, a Alemanha deixou de ser um império (Wilson achava que a culpa da guerra era dos impérios e da aristocracia, da falta de democracia) e fez uma breve experiência liberal.

A República de Weimar fracassou sob o peso de conflitos entre extremistas de direita e de esquerda depois de uma fracassada insurreição comunista, das dívidas da guerra, de uma hiperinflação histórica de 30 mil por cento em 1923 e finalmente da Grande Depressão (1929-39).

ASCENSÃO DO NAZISMO
Neste clima de anarquia e instalabilidade social, com o fantasma da revolução bolchevique, hiperinflação e depois a Grande Depressão, armou-se o cenário para a ascensão de um certo partido que se reunia numa cervejaria de Munique em 1919.

No auge da depressão, em 1932, o índice de desemprego chegou a 25% nos EUA e 30% na Alemanha, o país europeu mais atingido. Com 37% dos votos, o Partido Trabalhista Nacional-Socialista Alemão ganhou as eleições e se tornou o maior partido do país.

Em 27 de fevereiro de 1933, os nazistas incendiaram o Reichstag, o parlamento alemão (hoje aberto com uma cúpula projetada pelo arquiteto britânico Norman Foster para dar transparência), e botaram a culpa nos comunistas. Hitler, que havia sido nomeado chanceler (primeiro-ministro) em 30 de janeiro de 1933, pediu poderes especiais ao presidente, marechal Hindenburg, e iniciou uma caçada aos comunistas e depois aos outros partidos, aos judeus, aos homossexuais.

PODER ABSOLUTO
Nas eleições antecipadas de 5 de março de 1933, o Partido Trabalhista Nacional-Socialista Alemão conquistava 44% das cadeiras e, em aliança com outro partido nacionalista, maioria absoluta de 52%.

Em 19 de agosto de 1934, 17 dias depois da morte do presidente Hindenburg, um referendo fundiu os cargos de presidente e chanceler. Com mais de 38 milhões de votos, 88% do total, Hitler se tornava o Führer, um ditador com poderes absolutos.

Os nazistas rejeitaram as restrições impostas em Versalhes e remilitarizaram na Alemanha, transformando-a mais uma vez numa poderosíssima máquina de guerra que enfrentou a União Soviética na frente oriental e a aliança atlântica no Ocidente. Para um país do tamanho da Alemanha, um feito e um custo terríveis.

GUERRA
Primeiro, Hitler anexou a Áustria e a Tcheco-Eslováquia, e firmou com Stalin o Pacto Germano-Soviético, obrigando os comunistas no mundo inteiro a justificar uma aliança com os nazistas em nome da “capitulação de Munique”. Quando a França e a Grã-Bretanha aceitaram a anexação dos Sudetos, não restaria outra saída, alegavam os comunistas.

Quando a Alemanha invadiu a Polônia, em 1º de setembro de 1939, a guerra começou. A França se rendeu em junho de 1940, deixando a resistência na Europa Ocidental com a Grã-Bretanha, que se livrou da ocupação com a vitória na Batalha de Inglaterra, em outubro de 1940.

Em 22 de junho de 1941, Hitler rompeu o pacto de não agressão com Stalin e invadiu a União Soviética, atacando em três frentes, com um total de 117 divisões. A Operação Barbarroxa foi a maior ofensiva da guerra, com 4,5 milhões de soldados, 3.580 tanques, 7.184 canhões, 1.830 aviões e 750 mil cavalos.

A Alemanha avançou na Frente Leste até ser derrotada na Batalha de Stalingrado, talvez a mais importante da História. De 23 de agosto de 1942 a 2 de fevereiro de 1943, soviéticos e nazistas lutaram pelo controle da cidade à margem do Rio Volga. Lá começou o contra-ataque do Exército Vermelho até a tomada de Berlim, em 8 de maio de 1945, fim da guerra na Europa.

Com a invasão da Itália, em 3 de setembro de 1943, e da Normandia, na França, em 6 de junho de 1944, os aliados fecharam o cerco até a derrota total de Hitler, que teria se suicidado em 30 de abril de 1945.

HOLOCAUSTO
O antissemitismo já estava explícito em Minha Luta (Mein Kampf), o livro escrito por Hitler na prisão enunciando as bases ideológicas do nazismo.

A perseguição aos judeus começou assim que os nazistas chegaram ao poder, em 30 de janeiro de 1933. As Leis de Nurembergue, introduzidas durante o congresso anual do Partido Nazista, em 1935, tiram a cidadania alemã de judeus e não arianos, e proíbem as relações sexuais e os casamentos de alemães com as etnias banidas, que logo incluiriam negros e ciganos.

O boicote aos comerciantes pelos nazistas judeus vinha desde 1933. Um dos episódios marcantes foi a Noite dos Cristais. Em 9 de novembro de 1938, as lojas dos judeus foram depredadas e saqueadas na Alemanha.

Com a invasão da Polônia e o início da guerra, em 1º de setembro de 1939, começou o genocídio, acentuado a partir da invasão da URSS, em junho de 1941.

SOLUÇÃO FINAL
A “solução final”, a decisão de exterminar todo o povo judeu, foi tomada na Conferência de Wannsea, realizada à margem do Lago Wannsea, em Berlim, em 20 de janeiro de 1942.

Ao todo, estima-se que 11 milhões de pessoas morreram em campos de concentração e centros de extermínio nazistas como Auschwitz-Birkenau, Bergen Belsen, Buchenwald, Teresienstadt e Treblinka, sendo 6 milhões de judeus, 1 milhão de ciganos, além de homossexuais, deficientes, esquerdistas e outros adversários políticos dos nazistas.

Essa história foi contada por inúmeros relatos de sobreviventes, com destaque para os livros do escritor italiano Primo Levi, autor de É isto um homem?, que estava preso em Auschwitz quando o campo de concentração foi libertado pelo Exército Vermelho, em 27 de janeiro de 1945.

DUAS ALEMANHAS
No fim da Segunda Guerra Mundial, em maio de 1945, a Alemanha foi ocupada e dividida pelos Estados Unidos, a União Soviética, o Reino Unido e a França. Sua capital, Berlim, ficou no setor soviético e também foi dividida em quatro.

A Alemanha foi ocupada e dividida até a queda do Muro, em 1989. Só depois as potências vencedoras da Segunda Guerra Mundial abriram mão de todos os seus direitos sobre o território alemão, em 1990. Com a retirada das tropas soviéticas e a manutenção das forças dos aliados ocidentais da OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte), a Alemanha foi reunificada.

De 1949 a 1990, os setores americano, britânico e francês formaram a Alemanha Ocidental, e a parte soviética virou a Alemanha Oriental.

BLOQUEIO DE BERLIM
Em 1948, para pressionar os aliados ocidentais no início da Guerra Fria, o ditador soviético Josef Stalin decretou o Bloqueio de Berlim, a segunda crise do conflito entre as superpotências, depois de problemas entre o Irã e a URSS, em 1946. Foi uma reação à aprovação do Plano Marshall, a ajuda americana para reconstrução da Europa, no valor de US$ 17 bilhões, que Stalin chamou de “imperalismo do dólar”.

De 24 de junho de 1948 a 11 de maio de 1949, a passagem por terra da Alemanha Ocidental para Berlim Ocidental foi fechada por ordem do Kremlin. Neste período, mais de 200 mil voos levaram 13 mil toneladas de comida e outros suprimentos para a cidade sitiada.

Quando ficou evidente que o bloqueio não estava funcionando e que a ponte aérea era instrumento de propaganda do Ocidente, a URSS suspendeu o cerco. O aeroporto de Tempelhof, em Berlim Ocidental, foi transformado em museu da ponte aérea montada para furar o bloqueio.

ALEMANHA ORIENTAL
Em 7 de outubro de 1949, a República Democrática da Alemanha, a Alemanha Oriental, nascia oficialmente, reunindo cinco estados da parte central da antiga Alemanha: Meclemburgo-Pomerânia Ocidental, Brandemburgo, Saxônia, Alta Saxônia e Turíngia. Os territórios à margem oriental dos rios Oder e Neisse foram entregues à Polônia para compensá-la pelas terras tomadas pela URSS.

Pelo total de mortos na Segunda Guerra Mundial, 27 milhões de soviéticos e 11 milhões de alemães, foi, acima de tudo, uma guerra entre a Alemanha e a URSS. Stalin aproveitou a ocupação para exigir reparações de guerra.

LEVANTE DE 1953
Em 16 de junho de 1953, o regime comunista alemão-oriental decretou um aumento de 10% na cota de produção dos operários que construíam uma nova avenida em Berlim Oriental, a Stalinallee, hoje Karl Marx Allee. No dia seguinte, um movimento sindical de protesto se espalhou pelo país levando a uma grave de mais de um milhão de pessoas.

O governo alemão pediu a ajuda da URSS, que usou tanques contra a multidão. Pelo menos 50 pessoas morreram. Cerca de 10 mil foram presas e condenadas pelo Levante de 1953.

Com a ajuda do Plano Marshall, a República Federal da Alemanha, também fundada em 1949, cresceu e se recuperou, atraindo cada vez mais alemães do Leste. Descontentes com a falta de liberdade e de oportunidades no regime comunista, cada vez mais eles “votavam com os pés”. Cerca de 3,5 milhões fugiram para o Ocidente.

CONSTRUÇÃO DO MURO
Na noite de 12 para 13 de agosto de 1961, a fronteira com Berlim Ocidental foi fechada. Começava a construção do Muro de Berlim. A cidade se tornava um enclave capitalista na Alemanha Oriental.

Durante quase todo o tempo de sua existência, a ordem era atirar para matar em quem tentasse cruzar o Muro de Berlim. Cerca de 200 pessoas morreram tentando fugir (136, segundo um centro de pesquisa de Potsdam que está investigando detalhes dessas mortes). Cerca de 5 mil conseguiram escapar.

A história do Muro está contada no Museu do Check Point Charlie, um dos principais postos de fronteira onde se podia atravessar o Muro. Tem diversos instrumentos usados em tentativas de fuga, inclusive um motor aquático para fugir por baixo da água. Lá, estão as placas do tempo da Guerra Fria, do tipo "Você Está Deixando o Setor Americano".

TENSÃO NA GUERRA FRIA
A construção do Muro coincide com um período de elevada tensão na Guerra Fria. Em 15 de abril de 1961, houve a frustrada tentativa de exilados cubanos apoiados pela Agência Central de Inteligência (CIA), a agência de espionagem dos EUA, de invadir a Baía dos Porcos, em Cuba. Isso levaria à tentativa de instalação de mísseis soviéticos em Cuba.

A Crise dos Mísseis (14 a 27 de outubro de 1962) foi o momento de maior tensão da Era Atômica. O mundo nunca esteve tão perto de uma guerra nuclear. Na época, ficou decidido que uma linha telefônica direta ligaria permanentemente a Casa Branca ao Kremlin para desarmar crises mundiais através da comunicação direta. O telefone vermelho começou a funcionar em 30 de agosto de 1963.

“SOU BERLINENSE”
No mesmo ano, tanques soviéticos e americanos ficaram frente a frente em posição ameaçadora numa rua de Berlim. Em 26 de junho de 1963, Kennedy fez um famoso discurso Eu Sou um Berlinense diante do Muro: “Todos os homens livres, onde quer que vivam, são cidadãos de Berlim. Portanto, como um homem livre, tenho orgulho das palavras: Ich bin ein Berliner.”

OSTPOLITIK
Para aliviar as tensões e evitar que a Alemanha fosse palco da primeira batalha da Guerra Fria, em 1969, o primeiro-ministro social-democrata alemão-ocidental Willy Brandt lançou sua nova Ostpolitik, política para a Alemanha Oriental, numa tentativa de mudar o regime comunista através da reaproximação, do estabelecimento de laços diplomáticos, econômicos e culturais.

Em 1970, Brandt assinou o Tratado de Moscou, renunciando ao uso da força e reconhecendo as fronteiras da Europa, e o Tratado de Varsóvia, reconhecendo a fronteira polonesa nos rios Oder e Neisse. Em 1972, fechou o controvertido Tratado Básico com a Alemanha Oriental, estabelecendo relações diplomáticas entre os dois países.

ERA GORBACHEV
O Muro começou a ruir com a ascensão de Mikhail Gorbachev à liderança do Partido Comunista da União Soviética, em 11 de marco de 1985. Sua abertura democrática (glasnost) e sua reestruturação econômica (perestroika) foram mal recebidas pelos stalinistas da Alemanha Oriental, liderados por Erich Honecker, um entusiasta do Muro.

Dois meses antes do início da construção, em 1961, o então líder do partido comunista alemão-oriental, Walter Ulbricht, negou que seria construído. Aparentemente mudou de ideia ao receber um telefonema do primeiro-ministro soviético, Nikita Kruschev, em 1º de agosto de 1961.

SOLIDARIEDADE
Em discurso diante do muro em 12 de junho de 1987, outro presidente americano, Ronald Reagan, fez um apelo a Gorbachev para derrubar o Muro como o grande teste para sua abertura política.

Em 5 de abril de 1989, na Polônia, o sindicato livre Solidariedade fez um acordo com o regime comunista para participar de eleições, que venceu por maioria esmagadora em 4 e 18 de junho, perdendo apenas duas cadeiras das que pôde disputar.

CORTINA DE FERRO
Em 2 de maio de 1989, a Hungria rompeu a Cortina de Ferro. Começou a demanchar a cerca eletrificada na fronteira com a Áustria. Em 23 de agosto, em plenas férias de verão na Europa, todas as barreiras nas fronteiras da Hungria tinham caído.

Cidadãos dos países comunistas da Europa Oriental iam para a Hungria e cruzavam para o Ocidente. Cerca de 13 mil alemães-orientais fugiram via Áustria.

Quando começaram a ser mandados de volta da fronteira por pressão da Alemanha Oriental, invadiram embaixadas da Alemanha Oriental na Hungria e na Tcheco-Eslováquia. O ministro do Exterior alemão-ocidental, Hans-Dietrich Genscher, foi pessoalmente a Praga. Os fugitivos foram autorizados a emigrar para a Alemanha Ocidental.

QUEDA DO MURO
Em sua quarta geração, com blocos de concreto de 4 m de altura, o Muro de Berlim resistia à avalanche democrática. Mas, a partir de setembro de 1989, as manifestações de massa de tornaram frequentes também na Alemanha Oriental.

Em outubro de 1989, a Alemanha Oriental celebrou seus 40 anos com a presença de delegações de partidos da esquerda brasileira como o PT e o PCdoB. Mas o veterano líder linha-dura Honecker, que previra em janeiro que o Muro duraria mais cem anos, foi substituído por Egon Krenz, mais tolerante com a fuga dos alemães-orientais através dos países vizinhos.

Em 4 de novembro, um milhão de pessoas se reuniram na Alexanderplatz, no coração de Berlim Oriental, para pedir a abertura do regime.

ESQUERDA
Em 1998, na primeira eleição do Schröder, a praça estava tomada pelos ex-comunistas do antigo Partido Socialista Unificado, o partido comunista da Alemanha Oriental, que mudou de nome para Partido Democrático Socialista e se fundiu com dissidentes do Partido Social-Democrata para formar um novo partido, A Esquerda.

O pessoal que realmente iniciou o movimento da sociedade civil pelo fim do comunismo formou a Aliança 90, aliada dos Verdes no Leste. O partido verde alemão é o mais importante do mundo. Esteve no poder em aliança com o Partido Social-Democrata SPD na coligação verde-rosa, sob Schröder.

NOITE HISTÓRICA
Sob pressão da fuga em massa que importunava outros países e dos protestos de rua, em 9 de novembro de 1989, o Politburo do partido comunista decidiu permitir que os alemães-orientais saíssem do país para visitar a Alemanha Ocidental através das fronteiras do país.

Com pouco mais do que uma nota em mãos, o encarregado de dar a notícia, o secretário de Propaganda do partido, Günter Schabowski, foi para uma entrevista coletiva fazer o anúncio. Ele disse que, pelas novas regras, os alemães-orientais poderiam viajar ao exterior. Bastava apresentar o passaporte na fronteira.

Diante de uma pergunta inesperada de um jornalista italiano, acrescentou que a medida entraria em vigor imediatamente.

Dezenas de milhares de alemães-orientais foram para os postos de fronteira em Berlim para cruzar o Muro. Os guardas não sabiam o que fazer. Ligaram para seus superiores, que não tinham sido informados da decisão confusa do Politburo. Cederam para evitar um banho de sangue como o que acontecera na Praça da Paz Celestial, em Beijim, na China, na noite de 3 para 4 de junho de junho de 1989.

Os alemães cruzaram e pularam o Muro em diversos pontos. Quando voltaram, no meio da madrugada, jovens alemães-ocidentais se depararam soldados postados ao longo de todo o lado oriental, o que foi interpretado como sinal de que o regime ainda estava em dúvida quanto à abertura.

ABERTURA DO MURO
No dia seguinte, foi anunciada a abertura de mais 10 pontos de passagem. Antes do Natal, os cidadãos das duas Alemanhas podiam viajar livremente entre os dois países.

Em 22 de dezembro, foi aberta a Porta de Brandemburgo, um dos principais pontos de Berlim, local das grandes celebrações de Ano Novo. Do lado oriental, leva à Unter den Linden (Avenida das Tílias), um dos lugares bonitos da antiga Berlim Oriental, onde as paredes dos prédios históricos ainda estão cravejadas pelas balas da Segunda Guerra Mundial.

LOCAIS HISTÓRICOS
Ao lado do Reichtstag, sede do Parlamento Alemão, a Porta de Brandemburgo é o principal símbolo de Berlim. Há também a igreja da avenida Kurfurtensdam, que foi bombardeada e é mantida em ruínas como memória histórica, e a Coluna da Vitória.

O Mitte (Centro) da antiga Berlim Oriental se tornou um dos bairros mais agitados da festiva noite berlinense, para onde foram os artistas plásticos em busca de aluguéis mais baratos e espaço.

Um dos grandes marcos da reunificação da cidade é a Potzdamerplatz, onde em 1928, foi instalado o primeiro sinal de trânsito na Europa. Durante a Guerra Fria, a Potzdamer Platz sumiu. Ficava na terra de ninguém entre os dois lados do Muro. Ali, foi construído um grande centro comercial, com lojas, cinemas, teatros, restaurantes e galerias de arte para celebrar a Alemanha moderna.

REUNIFICAÇÃO
A queda do Muro foi uma bênção para o chanceler (primeiro-ministro) conservador Helmut Kohl, que governava a Alemanha Ocidental desde 1982, depois de romper uma longa hegemonia do SPD que vinha desde 1969.

Kohl estava mal nas pesquisas, mas o trem da História passou e ele pegou uma carona. Em 1990, as potências ocupantes renunciaram a todos os seus direitos sobre o território alemão. A URSS saiu fora, e os ocidentais ficaram por causa da OTAN.

Em 3 de outubro de 1990, a Alemanha estava reunificada sob a liderança de Kohl que venceu mais uma eleição. A atual chanceler, Angela Merkel, é do Leste e lidera o partido de Kohl, a União Democrata-Cristã (CDU), que venceu as eleições de 2005, 2009 e 2013.

PARIDADE CAMBIAL
Para conquistar o apoio politico dos alemães-orientais, Kohl cometeu o que é considerado o grande erro econômico da reunificação. No mercado, o marco oriental valia seis vezes menos do que o marco alemão-ocidental.

Numa decisão política, Kohl resolveu converter poupanças, salários e pensões na cotação de um por um. Isso aumentou artificialmente os custos e preços do lado oriental e acabou sendo um obstáculo à absorção do Leste pela Alemanha Ocidental.

A nova Alemanha investiu trilhões de euros na antiga Alemanha Oriental. A taxa de juros subiu para financiar tudo isso, pressionando moedas europeias mais fracas, como a lira e a libra, que sofreram fortes desvalorizações em 1992.

ÚLTIMAS ELEIÇÕES
Kohl ainda se reelegeu em 1994 e completou 16 anos no poder. A esquerda só voltou ao poder em 1998 com Gerhard Schröder, cujo slogan de campanha era Neue Mitte (Novo Centro). Ele se apresentava como uma espécie de Tony Blair alemão, um modernizador que traria a social-democracia mais para o centro para ganhar eleições.

Schröder era um politico pragmático que fechou diversos acordos de bastidores. Nunca teve uma visão programática e ideológica capaz de relançar o SPD a seus momentos de glória. Na verdade, os grandes partidos, o SPD e a CDU, perderam muito espaço para partidos menores nas últimas décadas.

REFORMAS
Com algumas reformas liberalizantes, Schröder conseguiu acelerar o crescimento da estagnada economia alemã e reduzir o desemprego, que atingia 4 milhões quando ele se elegeu, em setembro de 1998.

O crescimento e a oposição à invasão do Iraque pelos EUA lhe valeram a reeleição em 2002. Em 2005, ele perdeu por pequena margem para a atual chanceler, Angela Merkel, que passou a governar numa grande aliança com o SPD até vencer as eleições de setembro de 2009 e voltou a formar a grande coalizão em 2013.

Schröder governou em aliança com Os Verdes, com Joschka Fischer, um ex-líder estudantil e radical dos anos 60 que virou estadista, como ministro do Exterior. Fischer desafiou o então secretário da Defesa dos EUA, Donald Rumsfeld, quando a Alemanha, como membro temporário do Conselho de Segurança da ONU, foi contra a invasão do Iraque, provocando um grande racha na aliança transatlântica, a Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN).

Depois de deixar o poder, Schröder intermediou negócios da empresa estatal russa Gazprom, da qual se tornou diretor. Em plena crise da Ucrânia, foi ao Kremlin, o que foi interpretado como apoio ao presidente da Rússia, Vladimir Putin.

EM GUERRA
No Kossovo, em 1999, a Alemanha foi à guerra pela primeira vez desde o fim da Segunda Guerra Mundial. Em uma convenção dOs Verdes, militantes e Fischer, na mesa, se acusavam mutuamente de Hitler porque a Alemanha voltaria a entrar em combate, na Guerra do Kossovo.

A Alemanha quer mudar, mas é um pais maior e mais desigual, mais desequilibrado depois da reunificação, maior do que a aliada França. Isso abalou o eixo central da integração europeia, sob tremendas pressões da globalização,

MODELO EM CHEQUE
O modelo social-democrata, símbolo da estabilidade, da paz e da prosperidade do pós-guerra, está ameaçado, entre outras razões, pelo envelhecimento da população e pela globalização econômica.

Uma crise que a Alemanha não esperava e acredita que não criou abalou inclusive o sistema financeiro alemão, que tinha excesso de poupança para aplicar, então investiu nos papéis que micaram.

As exportações desabaram. No primeiro semestre de 2009, a China superou a Alemanha e se tornou a maior exportadora mundial de produtos industriais.

A Alemanha compete com sua engenharia de ponta, mas seus custos são muito superiores aos da China, Índia, Sudeste Asiático, América Latina e Europa Oriental. A maior cidade industrial da Alemanha hoje é São Paulo, onde as empresas alemães criam mais valor.

CRISE DO EURO
Com a crise das dívidas públicas de países da periferia da Zona do Euro, Grécia, Portugal, Irlanda e Espanha, a Alemanha impôs políticas de austeridade fiscal, com cortes em gastos públicos, empregos, aposentadorias e salários extremamente impopulares. Merkel foi caricaturada na Grécia com bigodinho de Hitler.

Só agora a Europa está saindo da crise. É a última região do planeta, e a rígida disciplina imposta pela Alemanha é uma das razões.

IDENTIDADE
A Alemanha é uma sociedade complexa, em larga medida introvertida e insegura quanto ao futuro, em crise de identidade, com dificuldades para manter a estabilidade, a harmonia e a paz social conquistadas com a economia social de mercado do modelo social-democrata. Sua saída é a Europa, mas a UE dos 28 se tornou grande demais e também vive sua crise de identidade.

De qualquer maneira, é um país rico, moderno e bem-sucedido, que está na vanguarda da ciência, da cultura e das artes, berço de poetas e filósofos - e vai continuar sendo um dos mais importantes do mundo.

ALEMANHA EUROPEIA
Desde que os Estados Unidos entraram na Segunda Guerra Mundial, depois do bombardeio japonês a Pearl Harbor, no Havaí, em 7 de dezembro de 1941, o presidente Franklin Delano Roosevelt preparava a ordem mundial do pós-guerra. Na Europa, mais uma vez, o desafio era impedir a remilitarização da Alemanha.

É melhor uma Alemanha europeia do que uma Europa alemã.

A maneira de evitar novas guerras na Europa era integrar os povos europeus numa comunidade de modo que eles pudessem resolver pacificamente seus conflitos. Em larga medida, a União das Comunidades Europeias conseguiu transcender à guerra.

Os europeus vão à guerra ocasionalmente, como no Golfo, no Kossovo, no Afeganistão e no Iraque, geralmente com os EUA. Mas não há apoio popular para isso, e os orçamentos militares são pequenos.

OTAN
Na OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte, criada em 1949 para defender a Europa Ocidental e a América do Norte de uma invasão soviética), as decisões são tomadas por consenso, mas 90% das armas de ponta são americanas.

A aliança ficou desequilibrada e pesada. É usada hoje pelos EUA muito mais como um instrumento político do que militar, ou como força subsidiária, de apoio.

PAZ ETERNA
O importante aqui é a paz eterna, sonhada pelo filósofo alemão Immanuel Kant em 1795 no ensaio Paz Perpétua e antes dele pelo Abade St.-Pierre, talvez o primeiro a propor a criação de uma organização internacional para proteger a paz mundial. Para brasileiros e latino-americanos, a guerra é uma realidade distante.

Em alguns lugares de Berlim, a destruição foi preservada, como na Anhalter Banhof, uma estação de trem onde só sobrou a fachada. As cicatrizes da guerra estão presentes na Alemanha.

COMUNIDADE EUROPEIA
A integração europeia nasce com o Plano Schuman, numa referência ao ministro das Relações Exteriores da França na época, Robert Schuman.

O Plano Schuman foi lançado em 9 de maio de 1950, Dia da Europa, cinco anos depois do fim da guerra, com o objetivo central de acabar com o conflito franco-alemão. O projeto era de seu assessor Jean Monnet.

Robert Schuman e Jean Monnet são considerados os pais da UE, que é o modelo de integração para o Mercosul (Mercado Comum do Sul) e a Unasul (União das Nações Sul-Americanas).

Foi o marco do início da cooperação entre a França e a Alemanha, inimigas históricas, para construir uma paz duradoura. O primeiro resultado prático foi a criação, em 18 de abril de 1951, da Comunidade Europeia do Carvão e do Aço. Controlando a produção de carvão e aço, seria possível evitar uma nova corrida armamentista no continente.

RENASCIMENTO
A Alemanha se reconstroi com a ajuda do Plano Marshall e volta a ser uma economia importante. Há um filme do Rainer Werner Fassbinder, O Casamento de Maria Braun, que apresenta a recuperação como uma prostituição do país ao capitalismo americano, uma alegoria da Alemanha dos anos 50.

A vitória na Copa de 1954 é apresentada ironicamente por Fassbinder como um marco do renascimento, do milagre econômico alemão, que segue pelos anos 60 e vai até a crise do petróleo de 1973.

Ao mesmo tempo, os EUA saíam da guerra como superpotência econômica do mundo capitalista, com quase a metade da produção industrial e da riqueza.

LIBERALISMO ECONÔMICO
A nova ordem econômica mundial proposta pelo governo Franklin Roosevelt na Conferência de Bretton Woods, em 1944, que criou o Fundo Monetário Internacional e o Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento (BIRD), depois Banco Mundial, visava a evitar a volta da Grande Depressão nos EUA.

Para isso, seria necessário um comércio internacional aberto. Os EUA boicotavam assim todas as tentativas de integração regional porque elas sempre implicariam o surgimento de barreiras aos produtos americanos - e hegemonia é isso, impor sua vontade.

AMEAÇA COMUNISTA
No caso da Europa, era diferente. O Exército Vermelho tinha se mostrado o melhor do mundo. Mais de 80% das tropas alemãs foram derrotadas na frente russa, e a União Soviética ocupou os países que libertou do nazismo na Europa Oriental. Na Guerra Fria, o Ocidente temia que o Exército Vermelho tomasse o resto da Europa.

As diferentes doutrinas de geopolítica sempre discutiram se o mais importante era ter o domínio dos mares ou de grandes massas continentais. Os EUA, com dois oceanos e sem inimigos na vizinhança, são uma potência aeronaval.

Uma tese é que quem domina a Ilha do Mundo (Eurásia e África) domina o mundo. A URSS só precisaria tomar a Europa Ocidental.

Os EUA precisavam de uma Europa capitalista unida e próspera para encarar o desafio comunista. A Europa – e sobretudo a Alemanha – era a primeira fronteira da Guerra Fria. Ali começaria a guerra para acabar com o mundo.

UNIÃO EUROPEIA
A Comunidade Econômica Europeia nasceu em 25 de março de 1957, quando seis países assinaram o Tratado de Roma, que entrou em vigor em 1º de janeiro de 1958: Alemanha, França, Itália, Bélgica, Holanda e Luxemburgo. Nos anos 70, entrariam Dinamarca, Irlanda e Reino Unido. Nos anos 80, Grécia, Espanha e Portugal. Nos anos 90, Áustria, Finlândia e Suécia.

Em 1991, o Tratado de Maastricht, que demorou algum tempo a ser ratificado porque chegou a ser rejeitado na Dinamarca por causa da moeda única, cria a União das Comunidades Europeias, a União Europeia, com a proposta de união econômica, monetária e política.

AMPLIAÇÃO
A queda do Muro de Berlim trouxe novos candidatos, ampliou a UE e retardou o aprofundamento da integração. Entraram muitos países pobres, com níveis de desenvolvimento muito abaixo da média comunitária.

Em 2004, entraram Hungria, Polônia, República Tcheca, Estônia, Letônia, Lituânia, Chipre, Malta, Eslováquia e Eslovênia. Acabava a divisão da Europa feita por Roosevelt, Stalin e Churchill na Conferência da Yalta.

Ainda entraram, em 2007, a Bulgária e a Romênia; em 2013, a Croácia. Estão na fila a Sérvia e a Turquia, que negocia há mais de 15 anos.

UNIÃO MONETÁRIA
O euro surge como moeda contábil em 1999 e passa a circular em 2002 como moeda ancorado na rígida disciplina do Bundesbank, o banco central alemão, ainda traumatizado pela hiperinflação de 1923.

Diante da crise financeira internacional de 2008, a chanceler (primeira-ministra, o cargo de chefe de governo na Alemanha chama-se Kanzler, Bundeskanzler, Chanceler Federal) Angela Merkel se apavorou com o envididamento público dos EUA e do Reino Unido para combater a crise. Considerava-os irresponsáveis, assim como a própria cultura dos centros financeiros de Nova York e Londres, onde começou a crise.

CRISE DO EURO
Sob pressão da Alemanha e de outros países do Norte que não queriam pagar a conta de gregos, irlandeses, portugueses, espanhóis e italianos, a UE adotou uma política de rígida disciplina fiscal para enfrentar a crise das dívidas públicas surgida com a Grande Recessão de 2008-9.

Com o aprofundamento da recessão e o aumento do desemprego, as opiniões públicas desses países se voltaram contra a Alemanha, acusada de ameaçar o projeto europeu.

ASSIMETRIA
A França e a Alemanha são o eixo central ao redor do qual foi construída a integração. Mas a queda do Muro de Berlim, ao criar uma Alemanha maior, mais populosa e mais poderosa, criou uma assimetria de poder e de interesses que abala esse eixo.

Reunificada, a Alemanha partiu para conquistar o Leste Europeu. Investiu pesadamente na Polônia, na República Tcheca, na Hungria e na Rússia. Os alemães são os maiores investidores estrangeiros na Rússia. Por isso, relutam em impor sanções econômicas. Sofreriam com isso.

Em todos os países do Leste, invadidos pelos nazistas e ocupados por Stalin, há ressentimento contra a Alemanha e contra a Rússia. Eles viveram espremidos por dois gigantes cruéis.

RELAÇÕES COM O BRASIL
Em 25 de julho de 1824, menos de dois anos depois da Independência do Brasil, o primeiro grupo de imigrantes alemães chegou ao vale do Rio dos Sinos, onde hoje fica a cidade de São Leopoldo, na Região Metropolitana de Porto Alegre.

Era o início de uma saga narrada em A Ferro e Fogo, do escritor gaúcho Josué Guimarães. A história se passa no Rio Grande do Sul depois das Guerras do Prata, num ambiente hostil, pobre a violento. Outro livro sobre a imigração é Um Rio Imita o Reno, de Clodomiro Viana Moog, descendente de alemães.

No mesmo ano, começou a imigração alemã para o Rio de Janeiro. Cinco anos depois para Santa Catarina, Paraná e São Paulo. Porto Alegre era uma cidade meio açoriana, meio alemã. Petrópolis e Teresópolis, na serra fluminense, foram fundadas por alemães.

BRASIL ALEMÃO
Hoje, estima-se que pelo menos 5 milhões de brasileiros tenham um ascendente alemão. No Sul do Brasil, são o segundo maior contingente de imigrantes, atrás dos italianos.

Em Santa Catarina, o estado mais branco e mais alemão do país, é possível encontrar pessoas conversando em alemão na fila de um supermercado em Florianópolis. Cidades como Gramado, Canela, Joinville, Blumenau e Pomerode são exemplos vivos desse Brasil alemão.

Blumenau faz a segunda maior Oktoberfest do mundo, atrás apenas de Munique. São Paulo é a maior cidade industrial da Alemanha. O empresário Jörg Gerdau Johannpeter, um dos homens mais ricos do Rio Grande do Sul, é membro do Conselho de Desenvolvimento Social do governo federal.

No porto de Hamburgo, um centro de informações ajuda os descendentes de alemães a descobrir quando e de onde saíram seus ancestrais.

Há um portal de Internet www.brasilalemanha.com.br  dedicado às comunidades alemãs no Brasil, o maior país alemão fora da Alemanha. Pessoas com o mesmo sobrenome, Becker, Fischer, Graeff, Krug, Müller, Schneider, Schultz, Weber e tantas outros, realizam reencontros de famílias para restabelecer seus laços.

PRIMEIRA GUERRA MUNDIAL
Quando começou a Primeira Guerra Mundial, o Brasil se declarou neutro, em 4 de agosto de 1914. Isso não impediu que o navio Rio Branco fosse afundado por um submarino alemão em 3 de maio de 1916. Como estava a serviço da Grã-Bretanha, com a maioria da tripulação norueguesa, foi considerado um ataque legal.

A economia brasileira, dependente na época da exportação de café, sofreu com o bloqueio naval determinado pela Alemanha, que em 1917 autorizou seus submarinos a atacar qualquer navio que entrasse em áreas proibidas.

Em 5 de abril de 1917, o navio Paraná foi torpedeado perto da França e três brasileiros morreram. Em 11 de abril, o Brasil rompeu relações diplomáticas com a Alemanha.

Começou uma onda de protestos, depredações e saques a propriedades de alemães, e de retaliações. Pelo menos mais quatro navios brasileiros foram atacados e 42 navios alemães confiscados para cobrir os prejuízos antes da declaração de guerra à Alemanha, em 26 de outubro de 1917.

O Brasil abriu seus portos aos países aliados e enviou a Divisão Naval de Operações de Guerra para se incorporar à esquadra britânica baseada em Gibraltar, mandou médicos militares, oficiais que atuaram com o Exército da França e aviadores que se juntaram à Força Aérea Real britânica. Foi o único país latino-americano a participar da guerra.

BARGANHA NACIONALISTA
Com a ascensão do nazismo, o Brasil, sob a ditadura de Getúlio Vargas, negociou acordos comerciais paralelamente com os EUA e a Alemanha nazista, na expectativa de extrair concessões das duas grandes potências da época.

Quando começou a guerra, sob a ditadura do Estado Novo, de inspiração fascista, o Brasil se declarou neutro.

SEGUNDA GUERRA MUNDIAL
O ataque inesperado do Japão à frota americana do Oceano Pacífico, baseada em Pearl Harbor, no Havaí, em 7 de dezembro de 1941, marca a entrada dos EUA na Segunda Guerra Mundial.

Em janeiro de 1942, uma conferência pan-americana realizada no Rio de Janeiro articulou o apoio latino-americano ao esforço de guerra dos EUA. O Brasil rompe com as potências do Eixo: Alemanha, Itália e Japão.

BATALHA DO ATLÂNTICO
A principal causa da entrada do Brasil na guerra foi a ação de submarinos alemães, que afundaram 21 navios brasileiros até a declaração de guerra ao Eixo, em 22 de agosto de 1942.

Durante a Batalha do Atlântico, pelo menos 33 navios brasileiros foram torpedeados e outros 35 atacados, diz João Barone, baterista dos Paralamas do Sucesso, no livro 1942: O Brasil e sua Guerra Quase Desconhecida. O total de mortos é de 1.055. Ele examinou caso a caso. Rejeita a teoria conspiratória de que os EUA teriam afundado os navios brasileiros para pressionar o país a entrar na guerra.

FORÇA EXPEDICIONÁRIA BRASILEIRA
Em janeiro de 1943, o presidente Franklin Delano Roosevelt se encontra com Vargas em Natal, onde havia uma base aérea dos EUA, para acertar a participação brasileira na guerra na Europa.

A FEB é criada em 15 de março de 1943, mas só chega a Nápoles em julho de 1944, quando os aliados já tinham invadido a Normandia, abrindo uma frente de combate mais importante na Europa Ocidental.

Com 25.334 homens ao todo, a FEB entrou em combate em setembro de 1944. Mais de 22 mil brasileiros estiveram em ação. O Brasil perdeu na campanha da Itália 450 soldados, 13 oficiais e oito pilotos da Força Aérea. Outros 12 mil soldados foram feridos.

Essa epopeia está contada em livros como Crônicas da Guerra na Itália, de Rubem Braga, que foi correspondente de guerra, e As Duas Faces da Glória: a FEB vista pelos seus aliados e inimigos, do jornalista William Waack.

No fim da guerra, a FEB tinha capturado mais de 20 mil soldados inimigos, 1,5 mil viaturas e 4 mil cavalos. O regresso da FEB depois da vitória contra o nazifascismo e a pressão dos EUA para formar um bloco democrático na ONU ajudaram a acabar com o Estado Novo e a democratizar o país.

CULTURA
A Alemanha tem uma das culturas mais complexas e refinadas do mundo. A Universidade de Heidelberg, fundada em 1386, é uma das mais antigas da Europa

O país foi berço de alguns dos maiores compositores de todos os tempos como Johann Sebastian Bach e Ludwig van Beethoven, de poetas como Wolfgang Goethe, considerado o maior escritor alemão, e filósofos como Immanuel Kant, Georg Friedrich Hegel, Karl Marx, Friedrich Nietzsche, Martin Heidegger, Walter Benjamin, Herbert Marcuse e Theodor Adorno.

O grande paradoxo da Alemanha é como uma cultura tão sofisticada um Estado terrorista.

CULINÁRIA
Um bom exemplo da culinária alemã está nos fartos cafés coloniais servidas nas cidades turísticas do Brasil alemão, com grande variedade de tortas e bolos de frutas e nozes, pães brancos e integrais, queijos, geleias.

Nas principais refeições, não faltam batata, chucrute, carnes de porco, aves e gado, salsichas, tortas salgadas, sopas e saladas. O livro de receitas do Portal Brasil-Alemanha lista 141 pratos. A culinária alemã vai do cachorro quente com megassalsicha a camarões a Newburg.

ESPORTE
O esporte é uma parte fundamental da cultura e da sociedade na Alemanha. Em 2006, cerca de 27,5 milhões de pessoas eram sócias dos mais de 991 mil clubes esportivos do país.

A educação física foi introduzida como disciplina obrigatória nas escolas já no século 19.

Na História das Olimpíadas, somadas todas as medalhas, incluindo as da Alemanha Ocidental e da Alemanha Oriental, a Alemanha ficaria em terceiro lugar.

O país organizou os Jogos de Verão duas vezes e os de Inverno uma vez. Em 1936, Hitler tentou afirmar a superioridade ariana em Berlim. Foi desmentido pelas quatro medalhas de ouro do negro americano Jesse Owens, que seria discriminado nos EUA. Em 1972, em Munique, 11 atletas de Israel foram mortos pelo grupo palestino Setembro Negro, no maior ataque terrorista contra uma Olimpíada.

A Alemanha também é uma potência em esportes de inverno. A alemã-oriental Katarina Witt foi bicampeã olímpica em patinação artística em 1984 e 1988. Mas várias atletas da Alemanha Oriental, especialmente de natação e atletismo, tiveram seus títulos cassados por doping.

No tênis, deu dois grandes campeões, Steffi Graf e Boris Becker.

O país que inventou o automóvel tem dois grandes campeões de Fórmula 1. Michael Schumacher ganhou 91 corridas e sete títulos mundiais. Aos 26 anos, Sebastian Vettel se tornou em 2013 o mais jovem tetracampeão da F1.


OLIMPÍADA NAZISTA
Os EUA quase não participaram da Olimpíada de 1936 por causa da propaganda nazista sobre a superioridade ariana e da perseguição aos judeus.

A Alemanha ganhou com 89 medalhas, sendo 33 de ouro, seguida pelos EUA com 56, 24 de ouro. Mas, ao vencer as provas de 100 e 200 metros, o revezamento 4x100 e o salto em distância, o lendário atleta americano Jesse Owens derrubou o mito da superioridade ariana.

Uma das lendas dos Jogos de Berlim é que Hitler se recusou a cumprimentar Owens. Na verdade, Hitler deixou o Estádio Nacional na véspera da consagração de Owens, depois de ser advertido pelos organizadores de que não poderia escolher os atletas que queria receber, no dia em que outro negro americano, Cornelius Johnson, ganhou ouro no salto em altura. E não voltou mais.

Como propaganda nazista, registra João Barone, os Jogos de 1936 tiveram seu auge com o filme Olympia, da cineasta Leni Riefestahl, a favorita do Führer, com técnicas de filmagem, enquadramento, movimentos de câmera e iluminação para destacar a suposta perfeição dos corpos alemães.

FUTEBOL
Com participação em 17 Copas do Mundo, três títulos mundiais (1954, 1974 e 1990) e três da Eurocopa (1072, 1980 e 1996), a Alemanha é uma das grandes potências do futebol mundial. O Bayern de Munique, atual campeão europeu, é um dos clubes mais importantes do mundo.

A Associação (Federação) de Futebol da Alemanha tem 26 mil clubes e 178 mil times filiados.

Entre os grandes ídolos do futebol alemão, estão Fritz Walter, Franz Beckenbauer, Gerd Müller, Wolfgang Overath, Karl-Heinz Rummenigge, Lothar Matthäus, Jürgen Klinsmann e Oliver Kahn.

A seleção feminina alemã ganhou as Copas do Mundo de 2003 e 2007, tornando a Alemanha o único país do mundo a ganhar as copas do Mundo e da Europa de futebol masculinas e femininas.

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