Parte da América Latina celebrou ontem os 40 anos da morte do guerrilheiro heróico Ernesto Che Guevara, um homem que deu a vida por seus ideais. Mas como observa o cientísta político e ex-ministro do Exterior do México Jorge Castañeda, as idéias pelas quais o Che sacrificou sua vida fracassaram.
Em 26 de agosto passado, o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, criou o Comitê Presidencial para a Formação Ideológica e Política e a Transformação da Economia Capitalista em um modelo de Economia Socialista, encarregado da Missão Che Guevara para promover uma renovação ideológica e a criação de um "homem novo", como se tudo isso fosse novidade.
Castañeda constata, em artigo para o jornal espanhol El País, que há hoje mais médicos cubanos em Vallegrande, na Bolívia, do que havia guerrilheiros 40 anos atrás. A miséria continua igual, como em tantas outras regiões da América Latina, sinal da má distribuição da riqueza. Os Estados Unidos continuam intervindo nos assuntos internos dos outros países do continente.
Essas são algumas razões que levaram milhares de jovens latino-americanos a querer ser como Guevara. Milhares morreram como o Che, mas sem glória.
Ainda não se sabe, afirma o ex-chanceler mexicano, por que o Che saiu de Cuba no início de 1965 para ir para o Congo, na África, e em meados de 1966 para a Bolívia: rompeu com Fidel ou foi levar adiante a revolução? Havia algum plano para resgatá-lo nos Andes?
Só os arquivos cubanos e soviéticos podem esclarecer essas questões.
A questão mais importante é qual o balanço final da luta guerrilheira que Che Guevara defendeu na América Latina em seu sonho de criar vários vietnãs para minar o poder imperial dos EUA.
Apesar da morte de milhares de jovens que seguiram o exemplo do guerrilheiro heróico, "com duas exceções, Nicarágua e El Salvador, todas as tentativas de criar focos guerrilheiros nos anos 60, 70 e 80 foram aniquiladas. O saldo é vermelho", conclui Castañeda, "não pelo triunfo da revolução mas pelo sangue derramado de ambos os lados".
Além das mortes, a luta armada provocou a radicalização das ditaduras militares e da ideologia de segurança nacional. Onde os movimentos guerrilheiros não provocaram golpes de Estado os aceleraram e levaram a uma repressão mais dura, cruel e brutal.
Por fim, Castañeda entende que o romantismo guerrilheiro adiou o surgimento de uma esquerda moderna e democrática na América Latina, como existe no Brasil, no Chile e no Uruguai, coincidentemente, na opinião do intelectual mexicano, onde não houve festejos oficiais em homenagem a Guevara.
Nos outros países, como Argentina, Venezuela, Peru, Nicarágua, México e Equador, essa modernização da esquerda pós-Guerra Fria para enfrentar os desafios da globalização econômica ainda não começou. Talvez, raciocina Castañeda, por causa do "fascínio que a revolução, o socialismo, a luta armada e o antiimperialismo ainda exercem sobre amplos territórios da esquerda latino-americana. O símbolo de tudo isso é justamente Che Guevara".
A festa em homenagem ao Che é reveladora, nota o ex-chanceler: "Onde o celebram e relembram prevalece uma esquerda anacrônica, autoritária, nacionalista e estatista. E onde brilham por sua ausência os festejos e homenagens impera uma esquerda que se renovou, dentro e fora do governo. Lá, finalmente, descansa em paz o senhor das camisetas com um epitário que lhe corresponde: simbolizar uma época - 1968 - e um movimento - da juventude dos anos 60 - a que tanto devemos, e não a um ideário político obsoleto que tantos rechaçam".
Este é o blog do jornalista Nelson Franco Jobim, Mestre em Relações Internacionais pela London School of Economics, ex-correspondente do Jornal do Brasil em Londres, ex-editor internacional do Jornal da Globo e da TV Brasil, ex-professor de jornalismo e de relações internacionais na UniverCidade, no Rio de Janeiro. Todos os comentários, críticas e sugestões são bem-vindos, mas não serão publicadas mensagens discriminatórias, racistas, sexistas ou com ofensas pessoais.
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário