quinta-feira, 25 de outubro de 2007

Recuperação econômica dá vitória a Cristina


A poucos dias da eleição presidencial do próximo domingo, 28 de outubro, na Argentina, as pesquisas indicam uma vitória da senadora e primeira-dama Cristina Fernández de Kirchner na corrida à Casa Rosada já no primeiro turno.

Seu marido, o presidente Néstor Kirchner, a indicou porque Cristina não se desgastou com os escândalos de seu governo. Mas é a recuperação econômica sob Kirchner que garante a vitória da candidata oficial, depois do colapso da dolarização iniciada sob Carlos Menem (1989-99), que arrasou a economia argentina e derrubou o governo Fernando de la Rúa (1999-2001).

O segundo colapso da economia argentina sob um presidente da União Cívical Radical (UCR) – o primeiro foi a hiperinflação de Raúl Alfonsín (1983-89) – destroçou o adversário tradicional do peronismo, que se apresenta hoje como a única força política capaz de governar a Argentina. Isto torna a eleição chata e desinteressante. Como não há uma oposição capaz de disputar o poder, o clima é de apatia.

Na Argentina, para ganhar no primeiro turno, é preciso receber 45% dos votos válidos ou 40% e uma vantagem de 10 pontos percentuais sobre o segundo colocado.



Em pesquisa divulgada pelo jornal La Nación, Cristina tem 40,9% e uma vantagem de 26,4 pontos sobre a segunda colocada, a esquerdista Elisa Carrió, da Coalizão Cívica, que tem 14,5%, enquanto que o ex-ministro da Economia que negociou o fim do calote, Roberto Lavagna, de Uma Nação Avançada, obteve 10,8%, e Alberto Rodríguez Saá subiu para 7,2%.

Mais uma vez, a economia decide. Como observa Oliver Galak, de La Nación, "o clima é de continuísmo mas não há triunfalismo oficialista nem adesão ideológica. A economia será determinante".

Desde que Kirchner chegou ao poder, há quatro anos e meio, a pobreza caiu de 54% para 23,4%, a miséria de 27,7% para 8,2% e o desemprego de 17,8% para 7,7%. A massa salarial cresceu 89,4% e o consumo nos supermercados já supera os 50%.

A economia argentina se expandiu a um ritmo anual de mais de 8%. Este ano as exportações devem passar de US$50 bilhões.

PROBLEMAS
A recuperação não foi tão espetacular quanto a queda, a pior de qualquer economia avançada. Cristina herderá do governo Néstor Kirchner uma série de problemas: inflação, descontrole dos gastos públicos, falta de confiança, falta de regras claras, excesso de subsídios e crise energética.

O crescimento de preços é estimado por economistas independentes em 20% ao ano, o dobro do índice oficial de inflação do Instituto de Estatísticas e Censos (Indec), acusado de manipulação eleitoreira. Mais grave ainda para os analistas: a inflação argentina foi de 11% no ano passado e está se acelerando.

“Há um núcleo da inflação que não vai cair automaticamente, ligado a uma crescente expansão da demanda num contexto de progressivo esgotamento da capacidade produtiva”, afirma Camilo Tiscornia, diretor da empresa Castiglioni, Tiscornia & Asociados. “A isto se suma que, em virtude do prolongado congelamento de tarifas e dos controles de preços, há uma inflação reprimida.”

A arrecadação estão nos seus níveis percentuais mais altos em relação ao produto interno bruto da Argentina. Mesmo assim, os gastos públicos crescem, em valores nominais, num ritmo superior a 50% ao ano, ameaçando a solvência do país. Cresce o número de funcionários públicos e de aposentados.

Com a retomado, o investimento está hoje em 21,5% a 22% do PIB argentino, estimado em US$ 250 bilhões. Mas para manter uma taxa de crescimento sustentado de 6% a 6,5%, seriam necessários investimentos de 24%-24,5% do PIB.

Para tornar a Argentina mais atraente, Cristina precisa reduzir a incerteza gerada pelo governo, atacando problemas como marco regulatório, segurança juridical e infra-estrutura.

Nos últimos anos, as economias da Argentina e do Brasil foram beneficiadas pelo aumento nos preços dos produtos primários, devido sobretudo ao rápido crescimento da China.

Depois de uma taxa média de crescimento superior a 8% ao ano, a expectativa agora é de uma redução em 2007 e 2008, com a desaceleração da economia mundial que deve crescer um pouco menos do que 5% em 2007 e 2008.

Os subsídios aos transportes públicos são usados em todo o mundo para garantir passagens baratas para os mais pobres. Mas, argumenta o defensor público Eduardo Mondino, não podem “gerar distorções que beneficiem mais as empresas do que os usuários. Os subsídios deveriam ser outorgados no marco de um programa de investimentos e capacitação profissional para melhorar a qualidade do serviço. Este é o principal erro deste governo. Neste ano, foram dados subsídios de mais de 2,2 bilhões de pesos que não se traduziram em mais eficiência nem em melhor qualidade”.

Mas o pior do sistema, na sua opinião, é sua falta de transparência e ausência de objetivos.

AUTORITARISMO
Outro problema sério é a instabilidade gerada pela falta de regras claras do jogo. “Na Argentina”, observa o economista Aldo Abram, “o Poder Executivo tem assumido um poder hegemônico e usado de forma arbitrária, com a cumplicidade do Congresso e a anuência da Justiça. Não creio que vamos mudar isso. Não vamos caminhar para uma maior institucionalidade.

Ao concentrar um poder hegemônico, arbitrário e não controlado, o Executivo muda as regras do jogo segundo sua vontade, raciocina Abram. “Isso é exatamente o contrário de ter regras claras, gerais e de longo prazo, como necessitam os investidores”.

Durante o governo Néstor Kirchner as reservas de gás e petróleo diminuíram e não foi instalada nenhuma nova geradora de energia elétrica. O congelamento de tarifas levou a uma queda de braço entre o governo e as empresas privatizadas por Menem.

Em 2002, o pior ano da crise econômica argentina, depois da queda, e no primeiro semestre de 2003, os custos subiram entre 45% e 110% e as tarifas ficaram congeladas. A partir daí, Kirchner subsidiou as empresas, adiando a solução real do problema.

“O financiamento interno”, adverte Miguel Angel Arrigoni, especialista em finanças corporativas da empresa de consultoria Deloitte & Touche em Buenos Aires, “segue dependendo do superávit fiscal: se este se esgotar, há grande probabilidade de que o governo volte a competir com o setor privado na captação de dinheiro.

“O financiamento de médio e longo prazo continua ausente por um ‘capricho’ de velhas leis: a proibição de atualizar os contratos por preços, sejam ‘indexados’ ou de produtos”, analise Arrigoni.

“Quanto ao financiamento externo, está mais condicionado do que antes à situação da dívida”, argumenta o economista. “Agora, volta a ser vital a questão do superávit, mais do que a dívida. O desafio do novo governo será, sem dúvida, melhorar a equação fiscal: buscar instrumentos arrecadadores para pegar os sonegadores e flexibilizar os tributos que claramente travam a economia”.

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