Cerca de 300 sobreviventes do Holocausto participam neste momento da cerimônia para lembrar os 70 anos da libertação pelo Exército Vermelho do campo de concentração e extermínio de Auschwitz-Birkenau, na Polônia, no fim da Segunda Guerra Mundial, em 1945. Mas o presidente da Rússia, Vladimir Putin, não participa por causa do conflito com a Ucrânia, sinal de nova divisão na Europa, e há um aumento do antissemitismo em várias regiões do planeta.
A maior preocupação dos sobreviventes é que sua história jamais seja esquecida. Ontem, a Fundação pela Memória da Shoah apresentou o resultado de três projetos: uma pesquisa internacional sobre o que os jovens de hoje pensam sobre o século 20, um documentário sobre a tentativa de exterminar os judeus da Europa e a reedição do Álbum de Auschwitz, um livro e DVD com cerca de 200 fotografias que mostram como funcionava o mais sinistro dos campos de concentração nazistas.
O livro reúne fotos de uma sobrevivente, Lili Jacob, que documentou a tragédia dos judeus deportados desde que chegavam ao campo até a morte nas câmaras de gás e a destruição dos corpos em fornos crematórios, e do oficial das SS Karl Höcker, assessor do comandante de Auschwitz.
Em 1940, um quartel do Exército da Polônia, invadida pela Alemanha em 1º de setembro de 1939, no início da Segunda Guerra Mundial, foi transformado em prisão para inimigos da ocupação nazista: dissidentes e nacionalistas poloneses, comunistas e esquerdistas em geral, ciganos e judeus.
Nos dois anos seguintes, Auschwitz foi transformado num campo de concentração, especialmente depois que uma conferência realizada pelos nazistas às margens do Lago Wannsee decidiu, em 20 de janeiro de 1942, adotar a "solução final" de exterminar todo o povo judeu.
Como ficava junto ao principal entroncamento ferroviário da Europa Oriental, Auschwitz recebeu grande quantidade de judeus da Hungria e da Ucrânia. Os adultos sadios faziam trabalhos forçados. Velhos, crianças e doentes eram sumariamente eliminados.
Logo, os nazistas resolveram aperfeiçoar os métodos de matar. Criaram as câmaras de gás, onde suas vítimas eram induzidas a entrar como se fossem tomar banho para serem sufocadas com inseticidas e em seguida queimadas em fornos crematórios.
A quantidade de pessoas enviadas era tanta que foi necessário construir um novo campo, Birkenau, onde os presos do nazismo eram concentrados e torturados até serem exterminados em Auschwitz. Sobrevivem em Birkenau os grandes pavilhões de madeira onde judeus e outras vítimas eram amontoadas em condições precárias, sem roupa e alimentos necessários para enfrentar o frio de até 25 graus negativos do inverno polonês.
Hoje estima-se que 11 milhões de pessoas foram mortas no Holocausto, sendo 6 milhões de judeus e 1 milhão de ciganos. Pelo menos 1,1 milhão, talvez 1,5 milhão, morreram em Auschwitz nas câmaras de gás, de fuzilamento, fome e frio.
O campo foi usado para testar a resistência humana até o limite final e para as experiências de manipulação genética do médico Josef Mendele. Quando o Exército Vermelho libertou Auschwitz-Birkenau, restavam 7 mil sobreviventes.
Todo o ser humano deveria ir a Auschwitz pelo menos uma vez na vida para se dar conta do que sua espécie é capaz. O simples ruído das crianças brincando num lugar tão sinistro já causa problemas de consciência. Mas, afinal, os culpados foram os nazistas. As crianças são inocentes, mas todos nos sentimos culpados ao revisitar o palco da maior tragédia da história.
Se você ficar atrás da guia turística enquanto ela descreve em pormenores das atrocidades cometidas em Auschwitz - celas sem ar para respirar ou com barras de ferro, salas de tortura, laboratório de manipulação genética -, verá os rostos dos visitantes se transfigurando diante do horror.
Em Auschwitz, tudo é superlativo. São milhares de malas, de sapatos, de sapatinhos de crianças, montes de cabelo, de bens roubados das vítimas... É tudo tão horrível que o visitante começa a se sentir mal. Aí, mais uma vez, sente-se culpado pelos males do mundo e pela tragédia de Auschwitz. Somos todos culpados.
Esse sentimento se reforça com as novas ameaças que pairam sobre os judeus especialmente na Europa, sem esquecer que aqui, na Argentina, acaba de morrer o promotor especial encarregado de investigar o pior atentado terrorista da história da América Latina, realizado contra a Associação Mutual Israelita Argentina (AMIA).
No 70º aniversário da libertação de Auschwitz, celebrado como Dia da Memória do Holocausto, o presidente do Congresso Judaico Europeu, Moshe Cantor, adverte que está próximo um novo êxodo dos judeus da Europa e que "o jihadismo se parece com o nazismo".
Antes de participar da cerimônia na Polônia, o diretor de cinema Steven Spielberg, judeu americano que ganhou um Oscar por A Lista de Schindler, em que contava como um benfeitor salvou judeus do Holocausto, condenou "o esforço crescente para expulsar os judeus da Europa". Ele gravou depoimentos de 58 mil sobreviventes do Holocausto.
Em 2014, portanto antes dos atentados do início deste mês, mais do que dobrou o número de judeus franceses que emigraram para Israel, superando até os judeus dos Estados Unidos, cuja população é oito vezes maior.
Durante cerimônia para marcar a data em Berlim, a chanceler (primeira-ministra) Angela Merkel considerou uma "desgraça" que os judeus ainda enfrentem insultos, ameaças e agressões na Alemanha. O crescimento da islamofobia com movimentos como os Patriotas Europeus unidos contra a Islamização do Ocidente ajuda a alimentar o neonazismo.
Este é o blog do jornalista Nelson Franco Jobim, Mestre em Relações Internacionais pela London School of Economics, ex-correspondente do Jornal do Brasil em Londres, ex-editor internacional do Jornal da Globo e da TV Brasil, ex-professor de jornalismo e de relações internacionais na UniverCidade, no Rio de Janeiro. Todos os comentários, críticas e sugestões são bem-vindos, mas não serão publicadas mensagens discriminatórias, racistas, sexistas ou com ofensas pessoais.
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