O deputado peronista Felipe Solá criticou hoje duramente o documento do Partido Justicialista para defender a presidente Cristina Kirchner da denúncia de acobertar os responsáveis pelo maior terrorista da história da Argentina. O texto acusa juízes, promotores e meios de comunicação de participar de uma conspiração para atingir o governo com a morte do promotor encarregado do caso, Alberto Nisman.
"Foi um documento para a presidente, não para o povo", desabafou Solá, citado pelo jornal argentino Clarín.
Em entrevista à Rádio Mitre na manhã de hoje, o deputado contou como o partido adotou sua posição oficial: "Não houve nenhuma discussão. Chegou Zannini com um papel e disse: é isto que vocês têm de dizer." Carlos Alberto Zannini é secretário jurídico e técnico da Presidência da Argentina.
O partido foi surpreendido, ontem de manhã, pela mudança total na posição de Cristina Kirchner, da versão inicial de suicídio para um assassinato feito sob encomenda para incriminá-la.
Solá também acusou o governo de criar um clima pesado antes da data marcada para Nisman apresentar suas provas à Câmara dos Deputados, a segunda-feira passada.
O promotor denunciou um conluio entre os governos da Argentina e do Irã para acobertar os responsáveis pelo atentado contra a Associação Mutual Israelita Argentina (AMIA), que matou 85 pessoas em 18 de julho de 1994, em troca da melhoria das relações econômicas entre os dois países. No domingo, Nisman foi encontrado morto em seu apartamento no bairro de Porto Madero, em Buenos Aires.
Outro problema levantado pelo deputado foi a presença do ministro da Segurança, Sergio Berni, o ministro da justiça argentino, no local do crime antes da perícia: "Não sabemos de nenhuma ação do Poder Executivo em relação a Berni. Há um crime grave na Argentina e o primeiro a chegar à cena do crime é uma figura política de um governo que seria acusado no dia seguinte."
Em ressonância com a Casa Rosada, ontem os presidenciáveis peronistas Daniel Scioli, Julián Domínguez e Sergio Uribarri acusaram os meios de comunicação "concentrados", referência aos jornais Clarín e La Nación, agentes secretos, juízes e promotores "golpistas" pela denúncia contra a presidente.
Hoje de manhã, o secretário-geral da Presidência, Anibal Fernández, insistiu na tese de que alguém escreveu a denúncia para Nisman: o promotor "não poderia ter escrito aquela burrice".
Mais gravações telefônicas autorizadas pela Justiça que faziam parte da denúncia foram reveladas hoje no programa de rádio do jornalista Jorge Lanata. Em novembro de 2012, o líder do movimento social dos piqueteiros, Luis D'Elia, aconselhou Alejandro Yussuf Khalil, identificado por Nisman como "agente iraniano", a não participar de uma marcha de apoio à independência da Palestina para não chamar a atenção.
Dois meses depois, em 27 de janeiro de 2013, Argentina e Irã assinaram um memorando de entendimento para uma comissão bilateral mista revisar o caso do atentado à AMIA e, na prática, inocentar os iranianos acusados suspendendo os mandados de prisão enviados à Interpol (Polícia Internacional). Por ironia ou não, é o dia da libertação do campo de concentração de Auschwitz, em 1945, no fim da Segunda Guerra Mundial.
Neste clima de alta comoção, as associações israelitas não vão participar da cerimônia do Dia do Holocausto marcada para a próxima terça-feira, 70º aniversário da libertação de Auschwitz, no Palácio San Martín, sede da chancelaria argentina.
Este é o blog do jornalista Nelson Franco Jobim, Mestre em Relações Internacionais pela London School of Economics, ex-correspondente do Jornal do Brasil em Londres, ex-editor internacional do Jornal da Globo e da TV Brasil, ex-professor de jornalismo e de relações internacionais na UniverCidade, no Rio de Janeiro. Todos os comentários, críticas e sugestões são bem-vindos, mas não serão publicadas mensagens discriminatórias, racistas, sexistas ou com ofensas pessoais.
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