O novo Congresso dos Estados Unidos deve ser mais protecionista, prevê Peter Hakim, diretor do centro de pesquisas InterAmerican Dialogue. Ele participou ontem no Rio de Janeiro do 3º Curso para Jornalistas sobre Comércio Exterior e Negociações Internacionais promovido pelo Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri) e pelo Instituto de Comércio e Negociações Internacionais (Ícone).
Com a queda da popularidade do presidente George W. Bush por causa da guerra no Iraque, o Partido Democrata deve aumentar suas bancadas nas eleições de 7 de novembro. Hakim acredita que os democratas tenham 50% de chance de recuperar a maioria na Câmara, que perderam em 1994. Vê menos possibilidades de assumirem o controle do Senado, que será renovado em apenas um terço.
Mesmo que os republicanos mantenham a maioria nas duas câmaras, o Congresso será mais protecionista. Isto vai dificultar a renovação da autorização de promoção comercial, o mandato negociador que o Legislativo precisa dar à Casa Branca para que os EUA participem de negociações de comércio internacional.
Ao fazer um balanço da política de comércio exterior do governo Bush, o diretor do InterAmerican Dialogue observou que “as negociações globais e regionais estão paralisadas”.
Na Rodada Doha da Organização Mundial do Comércio (OMC), Hakim entende que “a culpa é compartilhada. Os EUA exigiam amplas concessões de outros países. Os interesses agrícolas bloquearam qualquer acordo. Os agricultores americanos só aceitariam cortes nos subsídios internos em troca de amplo acesso a outros mercados.” Os agricultores queriam ganhar um dólar de mercado externo para cada dólar de subsídio interno cortado.
Na sua opinião, “a Alca (Área de Livre Comércio das Américas) foi praticamente enterrada na Cúpula das Américas em Mar del Plata, na Argentina, em novembro do ano passado. Havia 29 países a favor e cinco contra: os quatro do Mercosul e mais a Venezuela. Brasil e Argentina são importantes para os EUA, representam quase metade do produto regional bruto da América Latina.”
Falta para Hakim, determinação política do Brasil e dos EUA para chegar a um acordo: “As diferenças entre os EUA e o México antes da Alca eram maiores. Mas havia determinação política para chegar a um acordo. Hoje, Brasil e EUA não mostram o mesmo interesse. Mesmo antes do governo Lula, o Brasil tinha resistências a negociar diretamente com os EUA; apostava em Doha. O caminho para a Alca seria um acordo Brasil-EUA”.
Diante do fracasso da Alca, os EUA firmaram 10 acordos bilaterais com a América Latina. Só ficaram fora o Mercosul, a Bolívia, o Haiti e Cuba. Mas Peter Hakim acredita que falta mais flexibilidade aos EUA para fazer concessões: “Uma das razões é que o Escritório de Representação Comercial dos EUA responde diretamente ao Congresso. Não tem interesses geopolíticos como é o caso do Itamaraty, no Brasil.”
Nos EUA, “a política comercial está subordinada à possibilidade de aprovação no Congresso. Os lobbies ficam em cima do Congresso. Hoje os republicanos dominam as duas câmaras do Congresso. O presidente da Comissão de Finanças do Senado, Charles Grassley, de Iowa, estado produtor de milho, tem um tremendo poder”, constata o pesquisador.
Hakim busca as razões desta postura no sistema eleitoral americano: “Das 435 cadeiras da Câmara dos Representantes, 90% são preenchidas por deputados eleitos em distritos claramente democratas ou republicanos. Só 10% das cadeiras são realmente disputadas. Então os candidatos presidenciais buscam o centro. Mas os candidatos que disputam eleições praticamente ganhas não precisam fazer isto.”
Em 1993, o Acordo de Livre Comércio da América do Norte (Nafta) foi aprovado por 100 deputados democratas e 150 republicanos. Mas só 16 democratas aprovaram o Acordo de Livre Comércio da América Central (Cafta) em julho de 2005. Foram necessários mais de 200 votos republicanos e a aprovação só ocorreu por dois votos. No momento, os republicanos não podem fazer muitas concessões para não desagradar aos lobbies.
Como o avanço previsto para os democratas nas eleições de novembro próximo, a aprovação de acordos de comércio internacional tende a ficar ainda mais difícil.
“Há duas possibilidades para retomar as negociações”, comenta Hakim: um acordo global na OMC ou o Brasil e os EUA discutem produto por produto, tarifas, subsídios, medidas sanitárias. Não haveria um grande acordo mas uma negociação pontual. Os EUA teriam de enfrentar os grupos de interesse domésticos. No momento, nenhuma é muito provável.
Um conselho final: "A América Latina precisa crescer mais para se tornar mais atraente. Cresce apenas 3% ao ano, contra 10% da China."
Este é o blog do jornalista Nelson Franco Jobim, Mestre em Relações Internacionais pela London School of Economics, ex-correspondente do Jornal do Brasil em Londres, ex-editor internacional do Jornal da Globo e da TV Brasil, ex-professor de jornalismo e de relações internacionais na UniverCidade, no Rio de Janeiro. Todos os comentários, críticas e sugestões são bem-vindos, mas não serão publicadas mensagens discriminatórias, racistas, sexistas ou com ofensas pessoais.
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