O presidente Luiz Inácio Lula da Silva termina seu primeiro governo sem fechar nenhuma negociação importante de comércio exterior. A política de comércio exterior regrediu a um nacional-desenvolvimentista que vê com suspeita acordos com países ricos, preferindo optar pelas relações com países em desenvolvimento. Houve um grande crescimento das exportações mas sem correlação com as negociações de comércio internacional.
As conclusões são do seminário Políticas Comerciais Comparadas: Brasil, EUA e UE, que abriu ontem, no Rio de Janeiro, o 3º Curso sobre Comércio Exterior e Negociações Internacionais para Jornalistas promovido pelo Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri) e pelo Instituto de Comércio e Negociações Internacionais (Ícone).
Ao abrir o seminário, o presidente do Cebri, embaixador José Botafogo Gonçalvez, reconheceu que o momento é de crise, cobrou maior movimento do setor privado e disse que instituições de pesquisa como o Cebri e o Ícone devem produzir documentos que proponham soluções.
“Quando Lula assumiu, o Brasil estava envolvido em três negociações importantes”, recorda Marcos Jank, presidente do Ícone, “na Rodada Doha da Organização Mundial do Comércio, com o Mercosul e a União Européia, e para criar a Área de Livre Comércio das Américas (Alca). Hoje, não há a menor perspectiva de um resultado positivo em qualquer das três frentes.”
Jank relatou: “Fizemos seis estudos de caso: Brasil, Argentina, Chile, México, Estados Unidos e União Européia. Quais são os resultados? O Brasil e a Argentina estão mais atrasados. O México fez 12 acordos com 42 países, cobrindo 85% do seu comércio exterior.”
Estes seis países foram classificados pelos seus modelos de negociação de comércio exterior:
1. Grandes burocracias: EUA e UE. Mais institucionalização significa menos personalismo. Nos EUA, o Congresso e as grandes empresas jogam um papel decisivo. Na UE, os países-membros e a burocracia de Bruxelas.
Para Jank, uma questão central é a implementação: “definido o mandato negociador, como aplicar a política? O processo rotatório da diplomacia inibe a especialização”. Como os diplomatas costumam trocar de posto em prazos preestabelecidos, às vezes abandonam uma negociação pela metade. Dada a sofisticação dos processos de negociação, isto pode ser prejudicial ao país.
Com a democratização, abriu-se o diálogo com a sociedade civil: “Não dá para deixar tudo nas mãos de burocratas. Há necessidade de algo mais permanente e mais maduro.”
Na Organização Mundial do Comércio, “a falta de movimento dos principais atores indica que não haverá acordo a curto prazo. Os lobbies americanos condicionaram a redução dos subsídios a maior acesso a mercados, sobretudo na China e na Índia. A Índia vem travando a negociação agrícola.”
Como os EUA estão em campanha eleitoral e a França elege um novo presidente no próximo ano, não haverá condições políticas neste ano nem no início do próximo, prevê Marcos Jank.
Até a Rodada Uruguai do GATT (Acordo Geral de Tarifas e Comércio), lembra ele, “os ricos negociavam; hoje há mais atores importantes. Talvez sejam necessários oito anos.
2. Países que definiram claramente uma política comercial: Chile e México são mais parecidos com o Brasil do que os EUA e a UE. Ambos fizeram uma abertura unilateral e complementaram com uma abertura negociada. Tem uma vontade explícita de abrir suas economias e se integrar mais ao mundo.
O Brasil não tomou esta decisão. Fica no terceiro grupo.
3. Países sem visão estratégica: a Argentina está numa situação ainda pior. No Brasil, há uma instrumentalização da participação da sociedade civil. O modelo está muito sujeito aos lobbies. Há dois ministérios da agricultura com discursos totalmente distintos, como se viu na conferência interministerial da OMC em Hong Kong no ano passado.
Qual o modelo mais adequado? Não há modelo ideal. Mas o Brasil e a Argentina estão atrasados na sua abertura comercial, desperdiçando as oportunidades oferecidas pela globalização da economia.
Diante do colapso das negociações da OMC por causa da agricultura, Jank disse que o Brasil deve abrir novos contenciosos com os EUA dentro do mecanismo de solução de conflitos da OMC. O Brasil anunciou ontem a intenção de pedir autorização para retaliar os EUA no valor de US$ 4 bilhões, equivalente ao subsídio dado pelo governo americano aos produtores de algodão.
"O Brasil ainda não exerceu seu direito porque estava negociando a Rodada Doha", notou o presidente do Ícone. "Agora que a rodada entrou em crise, o Brasil deve pedir retaliação, se possível em áreas que afetem os americanos, como propriedade intelectual."
Outros casos passíveis de reclamação junto à OMC são soja, milho e arroz. Para ganhar a questão no painel de solução de conflitos da OMC, é preciso comprovar que houve prejuízo. "Como os preços das commodities estão em alta", constatou Jank, nestes últimos dois anos os subsídios americanos não apareceram."
Este é o blog do jornalista Nelson Franco Jobim, Mestre em Relações Internacionais pela London School of Economics, ex-correspondente do Jornal do Brasil em Londres, ex-editor internacional do Jornal da Globo e da TV Brasil, ex-professor de jornalismo e de relações internacionais na UniverCidade, no Rio de Janeiro. Todos os comentários, críticas e sugestões são bem-vindos, mas não serão publicadas mensagens discriminatórias, racistas, sexistas ou com ofensas pessoais.
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