O México escolhe hoje um novo presidente em eleições disputadíssimas.
As pesquisas de opinião indicam um equilíbrio entre o ex-prefeito da Cidade do México Andrés Manuel López Obrador, do Partido da Revolução Democrática (PRD), de esquerda, e o ex-ministro Felipe Calderón, do Partido de Ação Nacional (PAN), do presidente Vicente Fox.
Ambos estão com cerca de 36% das preferências, bem à frente de Roberto Madrazo, candidato do Partido Revolucionário Institucional (PRI), que teve o monopólio de poder no México de 1929 a 2000.
Como a eleição presidencial mexicana é realizada num só turno, ganha o mais votado, mesmo que não obtenha mais da metade dos votos válidos.
Para o jornal The Wall St. Journal, porta-voz do centro financeiro de Nova Iorque, será um referendo entre os defensores de reformas econômicas liberalizantes, representados por Calderón, e a nova tendência esquerdista na América Latina, que reivindica um papel mais ativo para o Estado no desenvolvimento econômico e social, encarnada por López Obrador.
Como a maior parte da América Latina, o México está radicalmente dividido em torno dos resultados de duas décadas de liberalização econômica, privatização e investimento estrangeiro.
O país vive seu mais longo período de estabilidade econômica desde os anos 60 e a expansão do comércio exterior depois que aderiu ao Tratado de Livre Comércio da América do Norte (Nafta, da sigla em inglês), em 1994, o transformou numa das 10 maiores economias do mundo. Mas este desenvolvimento recente agravou as tensões sociais criando uma nova casta de milionários enquanto a maioria dos mexicanos não se beneficiou deste progresso.
No domingo passado, num comício em Cuernavaca, o candidato esquerdista López Obrador prometeu governar para os deserdados pela globalização: “Tudo que a globalização tem feito é nos tornar mais pobres”. Ele disse que pretende lançar um programa de renda mínima para idosos a partir de 70 anos.
A mensagem de Calderón no Estádio Azteca, na Cidade do México, era oposta. O candidato da direita pedia a 100 mil pessoas que lembrassem o “filme de horror” do passado, quando o excesso de gastos públicos levou ao endividamento, inflação e colapso financeiro. Seu argumento é simples: o México precisa de empregos e isto exige investimentos nacionais e estrangeiros.
Assim a eleição mexicana se transforma em mais uma batalha em torno do papel do Estado na promoção do desenvolvimento e da redução da pobreza na América Latina. O Peru acaba de eleger o moderado Alan García, rejeitando o candidato ultranacionalista Ollanta Humala, apoiado pelo caudilho que preside a Venezuela, Hugo Chávez.
Enquanto Brasil, Chile e Colômbia têm governos moderados que procuram se beneficiar das oportunidades oferecidas pelo processo de globalização econômica, raciocina o Journal, Venezuela, Bolívia e Argentina adotaram políticas populistas e de controles de preços.
A eleição é de especial interesse nos EUA não só porque os dois países são aliados no Nafta. Cerca de 400 mil mexicanos entram ilegalmente nos EUA todos os anos em busca de uma vida melhor.
DA REVOLUÇÃO À LIBERALIZAÇÃO
O México moderno é produto da Revolução de 1910-17, liderada por heróis nacionais como Emiliano Zapata e Pancho Villa, que redistribuiu a terra, protegeu a indústria nacional e criou uma mentalidade paternalista em que o governo é visto como principal fonte de favores e riqueza.
Em 1929, o presidente Lázaro Cárdenas institucionalizou a revolução criando o PRI, que teria o monopólio do poder até 2000. O mesmo Cárdenas nacionalizou o petróleo em 1938.
No pós-guerra, o México cresceu rapidamente até a metade dos anos 70. Foi o primeiro país a quebrar na crise das dívidas externas da América Latina dos anos 80. A partir de 1986, iniciou um processo de liberalização de sua economia. Quando o Muro de Berlim caiu, o México era uma das economias emergentes que mais recebiam investimentos externos diretos.
A adesão ao Nafta em 1994 consolidava a abertura econômica e a reinserção internacional do país. Mas a concorrência dos países asiáticos, sobretudo da China, a burocracia, a corrupção e o baixo nível educacional pesaram. Desde 2000, no governo Fox, a economia cresceu em média apenas 1,8% ao ano, caindo do oitavo para o 14º lugares entre os países mais ricos do mundo.
Quando o banco de investimentos fala nas potências econômicas emergentes que estarão ao lado dos EUA, da Europa e do Japão lá pelo ano 2050, usa a expressão BRICs (Brasil, Rússia, Índia e China). O México está fora.
Uma das grandes arenas do debate ideológico no México é o petróleo. Embora seja o quinto maior produtor mundial, atrás da Arábia Saudita, da Rússia, dos EUA e do Irã, o México não produz gasolina ou gás natural em quantidades suficientes para atender ao consumo interno. Sem investimentos privados, teme-se que a produção decline na próxima década.
Calderón, que foi ministro da Energia, defende maior presença do setor privado, enquanto López Obrador resiste a qualquer tentativa de privatização. Promete administrar melhor a estatal Petróleos Mexicanos (Pemex) para economizar US$ 1 bilhão. Isto ajudaria a financiar os subsídios de US$ 2,4 bilhões por ano para gasolina, eletricidade e gás natural. Mas rejeita o capital estrangeiro: “Não vamos trair a nação”.
López Obrador, de 52 anos, conquistou popularidade organizando protestos de massa nos anos 80 e como prefeito da capital (1996-2005). Calderón, de 43 anos, filho de uma família católica conservadora, estudou na Universidade de Harvard, a mais prestigiada dos EUA.
Quem quer que seja eleito enfrentará a mesma dificuldade do atual presidente Vicente Fox. Não terá maioria no Congresso, que continuará sob o domínio do PRI, embora seu candidato a presidente não tenha a menor chance. Fox não conseguiu aprovar seus projetos e as reformas se estagnaram.
Calderón promete passar por cima das diferenças partidárias. López Obrador confia na mobilização popular para pressionar deputados e senadores.
Este é o blog do jornalista Nelson Franco Jobim, Mestre em Relações Internacionais pela London School of Economics, ex-correspondente do Jornal do Brasil em Londres, ex-editor internacional do Jornal da Globo e da TV Brasil, ex-professor de jornalismo e de relações internacionais na UniverCidade, no Rio de Janeiro. Todos os comentários, críticas e sugestões são bem-vindos, mas não serão publicadas mensagens discriminatórias, racistas, sexistas ou com ofensas pessoais.
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