Peter Edward Ginger Baker, considerado o maior baterista de rock, que tocou com Eric Clapton no Cream e no Blind Faith, com o nigeriano Fela Kuti e com Johnny Rotten no Public Image Ltd (PIL), morreu ontem aos 80 anos na cidade da Cantuária, na Inglaterra, informou a família no Twitter. "Tive sorte de tocar com ele", declarou Steve Winwood.
Filho de um pedreiro, Ginger Baker nasceu no bairro operário de Lewisham, no Sudeste de Londres, em 19 de agosto de 1939. Tinha quatro anos quando o pai morreu. Seu sonho era ser ciclista e competir na Volta da França. Aos 16 anos, num dia de chuva, um táxi londrino destruiu a bicicleta, conta um excelente perfil publicado na revista americana Rolling Stone.
Pouco tempo depois, ele sentou pela primeira vez no lugar que guiaria sua vida: uma bateria. Naturalmente, conseguiu tocar todos os tambores e pratos à sua frente. Ele também sabia que poderia tocar durante mais tempo do que os outros músicos: "O ciclismo de longa distância me condicionou para tocar bateria."
Aos 17 anos, ganhava 16 libras por semana para tocar numa banda de jazz tradicional estilo Nova Orleans. Detalhista, passava horas estudando as diferentes batidas e os elementos para montar sua bateria. E aprendeu a compor.
Ainda adolescente, era uma estrela do Soho, centro da noite e da cultura beatnik em Londres. O mesmo cara que lhe apresentou os ritmos da África, o baixista de jazz inglês Phil Seaman, introduziu a heroína na vida rebelde e selvagem de Ginger Baker.
"Ginger era um cara solitário", observou Pete Brown, letrista do Cream. "Ajudava a escapar. Deu a ele a percepção do artista torturado. Ele estava seguindo os passos de Charlie Parker."
Em 1962, o rhythm & blues tomava o lugar do jazz na noite londrina. Ginger substituiu o jovem Charlie Watts na banda Alexis Korner's Blues Incorporated, com o baixista Jack Bruce, com quem teria brigas épicas que continuariam no Cream.
"Você pode convidar cem baterias para tocar a mesma música e Ginger sempre vai dar um toque diferente", comentou anos atrás o baixista de jazz Bill Frisell, que gravou com Baker nos anos 1990s.
Um dia um jovem chamado Mick Jagger foi cantar com o grupo. "Aquele garotinho afeminado apareceu e eu o odiei. Era um idiota para música. Alexis me pediu para dar uma chance a ele de cantar no intervalo. Mas no intervalo eu tomava minhas drogas", revelou Baker. Ele e Bruce tocaram um jazz sofisticado para confundir Jagger.
Para ganhar dinheiro, Ginger, Bruce e Bond formaram a Graham Bond Organisation, uma das grandes bandas londrinas, favorita dos músicos. A heroína começava a pesar, em 1966, quando ele e Clapton resolveram formar uma banda que revolucionaria a história do rock.
Clapton tinha visto os dois tocando juntos. Insistiu para Bruce ser o baixista. Ginger aceitou. The Cream foi o primeiro supergrupo de rock de apenas três músicos, guitarra, baixo e bateria. Os instrumentos estavam acima da voz.
Em dois anos, o Cream vendeu 15 milhões de LPs. Clapton se tornou uma das maiores estrelas do rock. Bruce e Baker ganharam fortunas, mas brigaram pelos direitos autorais. Em 1968, o Cream fez dois concertos antológicos de despedida no Royal Albert Hall.
Muitos críticos e estudiosos dizem que o Cream foi um precursor do heavy metal. A extravagância musical da banda teria aberto o caminho para Led Zeppelin e Van Halen.
Ginger despreza este legado: "As pessoas tentam dizer que do Cream nasceu o heavy metal. Se for o caso, deveríamos ter feito um aborto."
No ano seguinte, Clapton e Baker se uniram a Steve Winwood para formar outro supergrupo, Blind Faith, que só gravou um disco e durou apenas um ano, em parte por causa do vício de Baker. Ao sair fora, Clapton falou que parecia estar voltando ao pesadelo do Cream.
Baker contava outra história. Dizia que ficou limpo até o final da turnê pelos Estados Unidos. Mas admitia: "Eu era uma pessoal horrível naquela época. Eric queria ficar longe de mim."
A morte de Jimi Hendrix, em 18 de setembro de 1970, alertou Ginger para o risco de suicídio que o abuso de drogas acarretava. Depois de se injetar com heroína no aeroporto, ele foi para a noite com Mitch Mitchell, baterista de Jimi, atrás do maior guitarrista da história, com quem planejava gravar um disco.
Cansado da heroína, Baker decidiu tomar cocaína na veia. Teve uma de muitas overdoses quase fatais. Ginger sobreviveu àquela noite. Jimi tomou 16 mandrax em casa com a namorada e morreu aos 27 anos sufocado por seu próprio vômito. Uma tragédia privou o mundo de um superdisco.
Chocado, Ginger resolveu cair fora de Londres. Foi para a Nigéria, onde montou o primeiro estúdio para gravação em 16 faixas da África Ocidental e gravou com o revolucionário Fela Kuti, enquanto jogava no Clube de Polo de Lagos com os chefes da ditadura militar nigeriana.
Quando seus sócios chamaram a polícia depois de desentendimentos e usaram as conexões com o poder para ameaçá-lo com armas na mão, era hora de ir embora outra vez. Vendeu o estúdio por valor muito abaixo do investimento e voltou a Londres, onde passou a vender cocaína para sobreviver. Chegou a vender num estúdio onde Clapton gravava.
Divorciado da primeira mulkher e com dívidas com o imposto de renda, em 1982, Ginger partiu com uma namorada de 22 anos para a Toscana, na Itália, onde tentou viver como agricultor plantando oliveiras. "A fazenda era um desastre", descreveu o produtor musical Bill Laswell, que o resgatou. "Não havia eletricidade. Ele tinha uma pequena cama onde dormia com seus cachorros. Era um milagre que ainda estivesse vivo."
Laswell o chamou para gravar dois discos. De volta à Toscana, foi acusado de tráfico de drogas e teve problemas com a máfia. Em 1988, Ginger Baker se mudou para Los Angeles, onde casou pela terceira, com Karen Loucks.
Da Califórnia, foi em 1993 para uma fazenda criar pôneis para jogar polo em Parker, no Colorado, enterrando mais uma fortuna. A mulher comentou que "ele sempre lidou com dinheiro como uma criança porque não tinha dinheiro quando pequeno".
Separado outra vez, com problemas com o imposto de renda e a imigração, seu próximo destino foi a província de KwaZulu/Natal, na África do Sul, onde teve problemas como de costume.
Ginger pagava os empregados acima do salário médio na região. Deixava sem-teto acamparem nas suas terras, o que atraiu marginais. Quando uma milícia branca ofereceu protestou, rejeitou. Também brigou no clube de polo local convidando um time negro da Nigéria que venceu os racistas sul-africanos.
Expulso de Natal, Ginger pegou seus cavalos e foi para uma fazenda em Tulbagh, cidade com o nome de um governador holandês da Colônia do Cabo, na província do Cabo Ocidental, com sua última companheira, a zimbabuana Kudzai Machacoto, com quem estava desde 2010.
A revista Rolling Stone selecionou 10 faixas para dar uma amostra da genialidade desta lenda do rock.
Este é o blog do jornalista Nelson Franco Jobim, Mestre em Relações Internacionais pela London School of Economics, ex-correspondente do Jornal do Brasil em Londres, ex-editor internacional do Jornal da Globo e da TV Brasil, ex-professor de jornalismo e de relações internacionais na UniverCidade, no Rio de Janeiro. Todos os comentários, críticas e sugestões são bem-vindos, mas não serão publicadas mensagens discriminatórias, racistas, sexistas ou com ofensas pessoais.
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