quinta-feira, 22 de novembro de 2018

Brasil tem de zerar desmatamento da Amazônia

O mundo precisa da Amazônia. Não vai conter o aquecimento global sem a grande floresta tropical brasileira, que está perto de chegar ao limite além do qual será praticamente impossível a regeneração. Está na hora de zerar o desmatamento, alertaram ontem os participantes do painel Mudança do Clima e Meio Ambiente nos Diálogos do Amanhã, uma conferência realizada pelo Cebri (Centro Brasileiro de Relações Internacionais), o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) e Fundação Konrad Adenauer.

"A Amazônia está no limite", advertiu a ex-ministra do Meio Ambiente Izabella Teixeira, moderadora do painel sobre o clima. "Temos de evitar o segundo arco do desmatamento."

Nos anos 1950s, só 2% do cerrado eram desmatados; hoje, são 50%. O desmatamento da Amazônia está em 27%. Se chegar a 40%, será irreversível, previu Thelma Krug, vice-presidente do Painel Internacional sobre Mudanças Climáticas (IPCC).

"A Amazônia é crucial", alertou Thelma Krug. O último relatório do IPCC recomenda que o aumento da temperatura média do planeta deve ser contido em 1,5ºC acima da era pré-industrial para evitar impactos desastrosos.

"Hoje, a temperatura está um grau centígrado acima da era pré-industrial", declarou a vice-presidente do IPCC. "Com 1ºC, estamos sentindo impactos atribuídos à mudança do clima como os incêndios na Califórnia. Limitar o aquecimento a 1,5ºC não é impossível, mas requer mudanças sem precedentes. Todo aumento de temperatura é importante. Tem impactos sobre a saúde, morbidade e mortalidade, mais diante muito quentes."

A expectativa do IPCC é que as emissões de gás carbônico sejam zeradas em 2050, com cortes nos clorofluorcarbonetos e no metano, outros gases que agravam o efeito estufa. "Até o final do século, a temperatura média passa de 1,5%. Depois, desce, com reflorestamento em larga escala e bioenergia", previu Krug.

Esta é a previsão otimista. No momento, as contribuições nacionalmente determinadas (NDCs), as metas voluntárias previstas pelo Acordo do Clima assinado em 12 de dezembro de 2015 em Paris, apontam um aumento de 3,2ºC.

"A cooperação internacional é um elemento crítico para os países em desenvolvimento, em capacitação e tecnologia. Até 2050, 75% a 80% da geração de eletricidade precisam vir de fontes renováveis", observou Thelma Krug.

Há um papel para os bancos de desenvolvimento, notou o superintendente de Gestão Pública e Socioambiental do BNDES, Gabriel Visconti: "Os técnicos do BNDES se apresentam para criar uma economia de baixo carbono."

O Brasil tem de parar de desmatar: "É preciso construir uma nova governança. Não dá mais para expandir a fronteira agrícola", afirmou André Guimarães, membro da Coalizão Clima, Florestas e Agricultura e pesquisador do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam).

A agricultura brasileira é muito importante. Somando a agroindústria e os serviços de distribuição, o agronegócio responde por 23,5% do produto interno bruto e 20% do emprego, de acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística.

"A maior parte da agricultura não é irrigada. Depende da chuva. O mundo tem liquidez. É comprador de serviços ambientais. Ou vemos como oportunidade ou vamos pagar um alto preço", acrescentou Guimarães.

"Cerca de 20% da água doce estão na Amazônia", disse o pesquisador. "Não tem como chegar a 1,5ºC ou 2ºC sem a floresta. Cada árvore bombeia mil litros de água por dia para a atmosfera. São 400 bilhões de árvores."

Essa evaporação cria uma corrente de vapor d'água que bate na Cordilheira dos Andes e desde para o Centro-Sul do Brasil, irrigando a agricultura do Centro-Oeste e do Sudeste. Se olharmos o mapa do mundo, regiões nesta latitude são desérticas, do Chile à Austrália, passando pela África. Sem a máquina de fabricar chuva da Amazônia, o agronegócio acaba.

"Somos uma ilha com a maior parte da população no litoral", comentou o o embaixador do Reino Unido, Vijay Rangajaran. Se as calotas polares derreterem e o nível dos oceanos se elevar, as populações litorâneas e ribeirinhas terão de recuar numa escala sem precedentes. "O Brasil, a China e a Índia são países-chaves."

"O mundo precisa da Amazônia", concluiu o embaixador britânico, mais do que a Amazônia precisa do mundo, não só para conter o aquecimento global, mas como banco genético e riqueza natural de onde podem sair substâncias capazes de virar medicamentos para doenças hoje incuráveis.

Falta convencer os ruralistas e o futuro ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, que vê o aquecimento global como uma conspiração marxista para favorecer a China.

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