domingo, 1 de julho de 2018

Esquerdista López Obrador é eleito presidente do México

No fim de uma campanha dominada por temas como corrupção e violência, o ex-prefeito da capital Andrés Manuel López Obrador, do Movimento de Regeneração Nacional (Morena), venceu por ampla margem a eleição presidencial de hoje no México, na terceira tentativa, indicam as projeções dos primeiros resultados oficiais. 

Seus maiores adversários, Ricardo Anaya, do direitista Partido de Ação Nacional (PAN), e José Antônio Meade, do governista Partido Revolucionário Institucional (PRI), reconheceram a derrota.

AMLO, como é conhecido popularmente, será o primeiro esquerdista a governar o México, a segunda maior economia da América Latina, depois do Brasil, com produto interno bruto de US$ 1,149 trilhão, o 15º do mundo em 2017, pelos cálculos do Fundo Monetário Internacional (FMI).

Uma contagem rápida feita pelo Instituto Nacional Eleitoral deu 53% para AMLO, 22% para Anaya e 16% para Meade, informou o jornal esquerdista La Jornada. Esses números se confirmaram. Foi a maior vitória numa eleição presidencial mexicana em 40 anos.

López Obrador promete acabar com a corrupção crônica, reduzir a violência endêmica, agravada pela guerra às drogas das últimas décadas, e combater a pobreza absoluta. Sua grande popularidade se deve à esperança de que possa atacar estes problemas com algum sucesso.

Os economistas o acusam de populismo e perguntam como vai financiar generosos programas sociais, como aumento das aposentadorias e pensões, bolsas de estudos para jovens e apoio ao pequeno produtor rural. Ele pretende usar o dinheiro economizado com o combate à corrupção, um sonho que muitos temem que não se materialize.

Desde que o presidente Felipe Calderón declarou guerra às máfias do tráfico de drogras, em 2006, 200 mil pessoas foram mortas. No ano passado, o índice de homicídios foi o maior desde que o governo federal mexicano iniciou a pesquisa, em 1997. Pelo número de assassinatos deste ano, o total de 2017 será superado. AMLO não fez nenhuma proposta concreta para a questão da violência.

"As eleições recentes na América Latina mostram a mesma demanda por mudança", comentou a ex-presidente da Costa Rica Laura Chinchilla. "Os resultados não endossam ideologias, são demandas por mudanças, uma fadiga sentida pelo povo, que espera respostas que não vêm."

Para o historiador da esquerda mexicana Carlos Illades, professor da Universidade Nacional Autônoma do México (UNAM), o maior problema é o excesso de expectativa gerado por uma campanha populista e salvacionista: "O problema é o que ele não for capaz de fazer. Há pessoas com uma expectativa enorme."

Além dos problemas internos, AMLO terá de convencer os investidores estrangeiros de que seu nacionalismo econômico não vai fechar a economia e enfrentar a hostilidade do presidente Donald Trump, que lançou sua campanha à Casa Branca acusando os mexicanos de serem traficantes, estupradores e assassinos, e insiste na construção de um muro na fronteira entre os dois países.

Como prefeito da Cidade do México, ele mostrou ser um esquerdista capaz de trabalhar com o setor privado. Agora, enviou um representante para a renegociação do Acordo de Livre Comércio da América do Norte (Nafta).

"Hoje AMLO é muito mais moderado, é um político centrista que vai governar com a comunidade empresarial com a mão direita e com os programas sociais na mão esquerda", declarou Antonio Sola, marqueteiro que o apresentou como um perigo para o México na eleição de 2006, vencida por Felipe Calderón, do PAN. "A grande diferença é que agora a emoção dominante no eleitorado é a fúria. A raiva é muito mais forte do que o medo."

O presidente eleito prometeu revisar os contratos no setor de petróleo assinados pelo governo atual e reverter reformas educacionais para introduzir avaliações de mérito dos professores. Aliado dos poderosos sindicatos do setor público, AMLO quer voltar atrás. Deste jeito, cedendo aos interesses dos setores de educação e energia, não vai transformar o México.

"Minha maior preocupação sobre energia e educação é a ambiguidade do caminho alternativo a frente", observou o cientista político Jesus Silva Herzog, professor da Escola de Administração Pública do Instituto de Tecnologia e Ensino Superior de Monterrey, na terceira maior região metropolitana do México.

A vitória de López Obrador representa sobretudo a falência dos partidos políticos tradicionais mexicanos. O Partido Revolucionário Institucional (PRI), herdeiro da Revolução Mexicana de 1910, governou o país de sua fundação, em 1929, até o ano 2000. Voltou ao poder com o atual presidente, o desmoralizado Enrique Peña Nieto (2012-18). Sai destas eleições mais fraco do que nunca.

O Partido da Revolução Democrática (PRD), foi criado por Cuauhtémoc Cárdenas, filho do fundador do PRI, numa dissidência do partido oficial, em 1989. AMLO usou-o para lançar sua candidatura em 2006. Com o crescimento do Morena, o PRD corre o risco de desaparecer.

Desde logo, o PAN se apresenta como a oposição de direita. Algumas pesquisas indicaram que a aliança Juntos Faremos História, liderada por AMLO, poderá ter maioria absoluta na Câmara e no Senado. Isso lhe daria condições de aplicar seu programa radical. As atenções agora se voltam para estas apurações.

Seu partido Morena venceu em seis dos nove estados onde havia eleição para governador: Chiapas, México, Morelos, Puebla, Tabasco, onde nasceu AMLO, e Veracruz. Pela primeira uma mulher, a cientista Claudia Sheinbaum, de 56 anos, foi eleita prefeita da Cidade do México, uma megalópole de 20 milhões de habitantes.

Foram as maiores eleições da história do México, com mais de 3,4 mil cargos em disputa e também a mais violenta, com pelo menos 145 assassinatos políticos, sendo 48 de candidatos ou pré-candidatos.

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