Com 53,7% dos votos válidos, o ex-prefeito de San Salvador Nayib Bukele, de 37 anos, foi eleito ontem no primeiro turno presidente de El Salvador, um país pequeno da América Central.
Acaba assim o duopólio da conservadora Aliança Republicana Nacionalista (Arena) e da esquerdista Frente Farabundo Martí de Libertação Nacional (FMLN), que se alternavam no poder desde o fim da Guerra Civil Salvadorenha (1980-92).
Em segundo lugar, ficou Carlos Calleja (Arena), com 31,6%. O candidato do governo, Hugo Martínez (FMLN), foi o terceiro, com 13,7%. Seus partidos representam os dois lados da guerra civil, em que mais de 80 mil morreram e mais de 1 milhão fugiram de casa.
Bukele foi prefeito da capital (2015-18) eleito pela FMLN. Ganhou fama de bom gestor ao recuperar o sinistro e tenebroso centro de San Salvador, tomado por gangues e criminosos. Em 2017 foi expulso do antigo movimento guerrilheiro sob a acusação de dividir e difamar o partido.
Para viabilizar sua candidatura, entrou para a Grande Aliança pela Unidade Nacional (Gana), um partido marcado por denúncias de corrupção. Em seus duelos com os partidos tradicionais e a mídia salvadorenha, conseguiu manter sua imagem impoluta. Ele é fã do presidente esquerdista do México, Andrés Manuel López Obrador.
"Fizemos história e viramos a página do pós-guerra", declarou Bukele ao festejar a vitória com seus eleitores. "Ganhamos no primeiro turno e somamos mais votos do que Arena e FMLN juntos. Ganhamos nos 14 departamentos do país."
Sua campanha se concentrou nas redes sociais. Teve como alvo sobretudo o eleitorado jovem que como ele, nascido em 1981, se tornou adulto depois do fim da guerra civil. Prometeu combater a violência e a miséria, os maiores problemas salvadorenhos.
Depois de dez anos no governo, pesaram contra a FMLN a corrupção, o fracasso no combate à criminalidade e o abandono das bandeiras tradicionais da esquerda como a luta contra o desemprego e a desigualdade social.
Com os três últimos presidentes sendo processados por corrupção, Bukele encarnou a mudança e a esperança de um governo mais digno e mais ativo. A esperança da Arena era que sua inimiga histórica, a FMLN, não fosse tão mal e forçasse a realização de um segundo turno, em março.
A derrota de Salvador Sánchez Cerén e da FMLN, apoiada pelo PT, isola ainda mais o ditador Nicolás Maduro. Sánchez Cerén foi um dos quatro chefes de Estado a participar em 10 de janeiro da posse de Maduro, contestada pelos Estados Unidos, 10 países da Europa e a maioria da América do Sul. Os outros foram os ditadores de Cuba, Miguel Díaz Canel, e da Nicarágua, Daniel Ortega, e o presidente da Bolívia, Evo Morales.
Ao comentar a crise na vizinha Nicarágua, onde o governo enfrenta desde abril uma revolta popular com mais de 400 mortes, Bukele comparou Ortega ao ditador Anastasio Somoza, deposto em 1979 pela Revolução Sandinista. Ortega era um dos nove comandantes da Frente Sandinista de Libertação Nacional (FSLN), que tomou o poder naquela época.
Com apenas 11 deputados na Assembleia Nacional, de 82 cadeiras, o novo presidente terá de negociar com a Arena e a FMLN pelo menos até as eleições parlamentares de 2021. Na campanha, Bukele prometeu grandes obras de infraestrutura, uma ferrovia, um novo porto e um aeroporto, mas não disse como pretende financiá-los.
El Salvador tem um déficit orçamentário previsto pela agência de classificação de risco Stardard & Poor's para ficar em 2,7% do produto interno bruto neste ano, com a dívida pública em 66% do PIB, estimado pelo Fundo Monetário Internacional em US$ 25,8 bilhões no ano passado.
Este é o blog do jornalista Nelson Franco Jobim, Mestre em Relações Internacionais pela London School of Economics, ex-correspondente do Jornal do Brasil em Londres, ex-editor internacional do Jornal da Globo e da TV Brasil, ex-professor de jornalismo e de relações internacionais na UniverCidade, no Rio de Janeiro. Todos os comentários, críticas e sugestões são bem-vindos, mas não serão publicadas mensagens discriminatórias, racistas, sexistas ou com ofensas pessoais.
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