Os piratas que atacam perto da costa Nordeste e agora também no Leste da África são produto da total anarquia na Somália, um país que não tem governo desde a queda do ditador Mohammed Siad Barre, em 1991.
A situação era tão grave, com milhões de pessoas ameaçadas de morrer de fome, que, depois de perder a reeleição para Bill Clinton, em dezembro de 1992, o presidente George Bush sr. mandou soldados americanos para a Somália em missão humanitária para proteger a distribuição de alimentos pelas Nações Unidas a populações famintas.
No governo Clinton, o objetivo foi mudado para pacificar o país. Os americanos acabaram entrando na guerra civil somaliana contra o senhor da guerra que dominava a região da capital, Mogadíscio, Mohammed Farah Aidid.
Como ele era líder de um clã, os americanos passaram a ser vistos como inimigos por uma parte da população. Acabaram sendo vítimas de uma embosca na Batalha de Mogadíscio, em 3 e 4 de outubro de 1993. Pelo menos 18 fuzileiros navais dos EUA foram mortos e alguns corpos arrastadas pelas ruas da capital somaliana.
Aquela derrota humilhante de uma força que não tinha os meios necessários para fazer a guerra levou Clinton a retirar os soldados americanos da Somália e a rejeitar o princípio de intervenção militar por razões humanitárias na África.
Quando caiu o governo de Ruanda, em abril de 1994, os EUA vetaram qualquer intervenção do Conselho de Segurança da ONU.
A missão de paz liderada por belgas caiu fora diante de falta de meios para resistir à guerra civil. Ficou só a Operação Turquesa, da França, acusada até hoje pelo novo governo de Ruanda de acobertar a fuga do Exército hutu derrotado e das milícias hutus responsáveis pelo genocídio de 800 mil pessoas.
Os hutus em fuga entraram em conflito com os baniamulengues do Congo, que são da etnia tútsi, provocando o início da guerra civil congolesa. Em 1997, caiu o ditador Joseph Mobutu e o Congo, riquíssimo em minerais, virou palco da Primeira Guerra Mundial Africana, envolvendo exércitos de nove países e centenas de grupos irregulares.
Entre 1998 e 2003, estima-se que 5,4 milhões de pessoas morreram no Congo. Em agosto, um general rebelde tútsi que rompeu com o governo central de Kinshasa, começou a atacar o Exército, acusando-o de cumplicidade com a Frente Democrática para a Libertação de Ruanda, que reúne os hutus no exílio no Congo.
A omissão da sociedade internacional depois da humilhação dos americanos na Batalha de Mogadíscio e diante do genocídio em Ruanda abriu espaço para duas situações explosivas que atormentam a África e o resto do mundo hoje.
Na Somália, foi negociado um acordo de paz, mas o governo provisório nunca assumiu o controle do território. Desde 2006, o grupo extremista muçulmano União dos Tribunais Islâmicos controla a maior parcela do território somaliano.
Isso provocou uma intervenção militar da Etiópia, apoiada pelos EUA, para que o país não caia nas mãos de uma milícia alinhada ideologicamente com Al Caeda. Os muçulmanos ameaçam atacar os piratas para libertar o superpetroleiro saudita Sirius Star, um “navio islâmico”, carregado com 2 milhões de barris de petróleo, um quarto da produção diária da Arábia Saudita.
Mas os piratas têm o apoio de senhores da guerra que fornecem armas e os deixam atracar os navios e acomodar os reféns. Nos últimos 12 meses, ganharam US$ 150 milhões.
Lição da História: a África precisa de ajuda da sociedade internacional para resolver seus problemas, muitos herdados do passado colonial, e a omissão só agrava os problemas e aumenta o preço em vidas e dinheiro.
Quando a África do Sul acabou com ditadura da minoria branca, em 1994, o presidente Nelson Mandela prometeu que os direitos humanos seriam uma pedra fundamental na política externa do governo democrático.
Mas o governo sul-africano tem sido tolerante e omisso com o genocídio em Darfur, cometido pelo regime islamita do Sudão, e com as fraudes eleitorais e abusos e poder do ditador do Zimbábue, Robert Mugabe, para só citar dois casos.
Os militantes indignados dizem que, se a maioria negra da África do Sul ainda estivesse lutando contra o regime segregacionista do apartheid, não teria o apoio do atual governo sul-africano.
Este é o blog do jornalista Nelson Franco Jobim, Mestre em Relações Internacionais pela London School of Economics, ex-correspondente do Jornal do Brasil em Londres, ex-editor internacional do Jornal da Globo e da TV Brasil, ex-professor de jornalismo e de relações internacionais na UniverCidade, no Rio de Janeiro. Todos os comentários, críticas e sugestões são bem-vindos, mas não serão publicadas mensagens discriminatórias, racistas, sexistas ou com ofensas pessoais.
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Um comentário:
Nelson,boa tarde.Meu nome é Célio.
Gostaria de saber como estão as investigações do veleiro encontrado no litoral brasileiro, ao que parece, vítima de piratas, e pior, deveria haver crianças à bordo.Prque foi encontrado mamadeiras.Será que assasinaram todos e jogaram ao mar? Quanta selvageria.
Obrigado
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