Em vídeo de 12 minutos gravado em seu apartamento no aristocrático bairro da Recoleta, em Buenos Aires, a ex-presidente Cristina Fernández de Kirchner anunciou a intenção de se candidatar a vice-presidente na eleição presidencial de 27 de outubro na Argentina.
O candidato a presidente seria seu ex-chefe de Gabinete, o equivalente a chefe da Casa Civil, Alberto Fernández, que não tem parentesco com sua líder.
O ex-assessor dava aula na Universidade de Buenos Aires na quarta-feira quando o telefone tocou. Cristina pedia para ele passar na casa dela mais tarde. Na noite daquela quarta-feira, o acordo foi selado, noticiou o jornal Clarín.
Num encontro a dois, Cristina fez a proposta: "Tenho um teto. Pode dar para ganhar, mas vai ser muito difícil para governar. Você terá de ser presidente. Eu vou te acompanhar."
Surpreso, Alberto Fernández alegou que tal decisão não poderia ser tomada "a quente". Pediu 24 horas "para meditar". A quinta-feira foi infernal para o kirchnerismo: a Justiça confirmou a audiência de um dos processos contra Cristina e houve panelaço antiperonismo.
Na sexta-feira, a decisão estava tomada. Era irreversível. Cristina estava relaxada "como se tivesse tirado de cima um peso enorme", comentou um alto funcionário do Partido Justicialista, peronista. A ex-presidente chamou Fernández, mostrou-lhe o vídeo e avisou que pretendia divulgá-lo hoje.
Falando como pré-candidato, Alberto Fernández tentou acalmar os mercados, temerosos da volta do kirchnerismo ao poder: "No me assusta o FMI (Fundo Monetário Internacional). Já negociamos com o Fundo. Temos de encontrar uma saída para os compromissos que a Argentina tem com o mundo. Temos de cumpri-los sem que isso represente mais penúria para os argentinos."
Com sua tacada de mestra, Cristina reforça o discurso de "humildade", "grandeza" e "renúncia", tentando sair do foco dos ataques durante a campanha.
A candidatura de Fernández atinge o movimento peronista não kirchnerista, que articulava uma chapa com o ex-ministro da Economia no governo Néstor Kirchner, Roberto Lavagna, e o deputado Sergio Massa, terceiro colocado na eleição presidencial de 2015, quando Mauricio Macri venceu o candidato de Cristina, o governador Daniel Scioli.
Também surpresa, a Casa Rosada reagiu rapidamente. Para o governo Macri, a polarização com o kirchnerismo continua e Fernández não pode ser apresentado como uma "renovação".
Nas últimas pesquisas, Cristina chegou a ter uma vantagem de até sete pontos percentuais para Macri, que perderia para Lavagna num segundo turno, a ser realizado em 24 de novembro. A pesquisa com Fernández ainda não saiu.
De certa forma, observa o chefe de redação do jornal Perfil, Javier Calvo, houve um resgate da fórmula "Cámpora no governo, Perón no poder", usada na eleição de Héctor Cámpora, em março da 1973, que preparou o retorno à Argentina do caudilho Juan Domingo Perón.
Este é o blog do jornalista Nelson Franco Jobim, Mestre em Relações Internacionais pela London School of Economics, ex-correspondente do Jornal do Brasil em Londres, ex-editor internacional do Jornal da Globo e da TV Brasil, ex-professor de jornalismo e de relações internacionais na UniverCidade, no Rio de Janeiro. Todos os comentários, críticas e sugestões são bem-vindos, mas não serão publicadas mensagens discriminatórias, racistas, sexistas ou com ofensas pessoais.
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