domingo, 12 de maio de 2019

Complexo industrial militar da China resiste a pressões dos EUA

O presidente Donald Trump e o ditador Xi Jinping devem se encontrar durante a reunião de cúpula do Grupo dos 20 em Osaka, no Japão, em 28 e 29 de junho, para tentar acabar com a guerra comercial entre os Estados Unidos e a China, noticiou o jornal inglês Financial Times. A deterioração das negociações fortalece os falcões dos dois lados.

Além de aumento das importações chinesas para reduzir um déficit comercial de US$ 419 bilhões em 2018, os EUA exigem o fim da pirataria industrial, com respeito à propriedade intelectual e o fim da transferência forçada de tecnologia, fim da discriminação a empresas americanas no mercado chinês, cortes de subsídios estatais e fim da manipulação do câmbio. É uma mudança no modelo econômico, do capitalismo de Estado que tornou o país numa superpotência.

Um acordo parecia iminente quando Trump ameaçou, no domingo passado, aumentar de 10% para 25% as tarifas sobre produtos importados da China no valor de US$ 200 bilhões por ano e, se os chineses não cederem, aplicar a mesma alíquota para outras importações, no valor de US$ 325 bilhões. Na sexta-feira, cumpriu a primeira parte da ameaça.

Quando o regime comunista chinês exige "respeito mútuo" diante do tarifaço de Trump, fala a voz da linha dura e do complexo industrial militar. Do outro lado, o ex-estrategista da Casa Branca Steve Bannon escreveu no jornal The Washington Post que "os EUA estão em guerra econômica com a China. É fútil fazer acordo."

"Espero que as negociações fracassem", torce o coronel reformado da Força Aérea da China Dai Xu, professor da Universidade Nacional de Defesa da China, citado pelo jornal inglês Financial Times. "Quando as negociações forem abandonadas, os EUA estarão acabados... Expulsamos todas as empresas americanas e trazemos as nossas de volta... De jeito nenhum, Trump será reeleito."

O professor Dai falava num fórum cívico-militar sobre tecnologias de uso duplo organizado por empresas do setor de defesa, na maioria estatais, para incentivar parcerias no desenvolvimento tecnológico.

As empresas chinesas aproveitam a oportunidade para apresentar numa feira seus últimos lançamentos de alta tecnologia militar, como protótipos de drones, mísseis subaquáticos e robôs tipo tanques em miniatura para escanear a estrutura subterrânea das estradas.

Enquanto é flexível nas negociações comerciais com os EUA para preservar o acesso a um mercado que importou US$ 539 bilhões da China no ano passado, o regime chinês tenta passar para seus cidadãos uma imagem de firmeza.

"Xi está muito preocupado com sua autoridade", observou o comentarista Wu Qiang, ex-professor de ciência política da Universidade Tsinghua, "não quer ser visto como Yuan Shikai", que foi primeiro-ministro no Império e presidente da República, acusado de ter feito concessões demais às potências ocidentais.

O objetivo da linha-dura chinesa é ter um sistema de defesa "autônomo e controlável". Isso significa desenvolver sua própria tecnologia militar e suas cadeias produtivas.

Nos EUA, o representante comercial Robert Lighthizer e o assessor para indústria da Casa Branca, Peter Navarro, vem a China como uma força predadora no comércio internacional que só vai ceder sob pressão máxima. São considerados negociadores linha-dura, em contraste com o secretário do Tesouro, Steven Mnuchin, e o assessor econômica da Casa Branca, Larry Kudlow, mais flexíveis.

"Endurecer com a China para trazer empregos industriais de volta para os EUA estava no centro da marcha eleitoral do presidente Trump pelo Cinturão da Ferrugem em sua vitória em 2016. Hoje, a meta do grupo de radicais que governa a China - o Partido Comunista Chinês - é ser a potência hegemônica global", afirmou Bannon.

"Mas", ressalvou, "enquanto Washington e Beijim concluem um acordo neste mês depois de meses de negociações, o que quer que emerja não será um acordo comercial. Será uma trégua numa guerra econômica e estratégica de muitos anos com a China."

Com este discurso, a linha dura chinesa não tem dúvida: "Os EUA nos veem abertamente como seu maior inimigo", declarou o coronel-aviador Tan Yungang, "Os EUA vão bloquear o desenvolvimento da China mais do que fizeram com a União Soviética." Ele acredita que Washington está impondo uma série de "bloqueios tecnológicos" para manter seu domínio.

O tarifaço seria uma manobra "intencional" forçar as cadeias produtivas a voltarem para os EUA, a Europa e o Japão. Esta impressão foi reforçada por um tuíte de Trump dizendo que quem não quiser pagar impostos de importação deve produzir nos EUA. É o clássico discurso antiglobalização, como se os EUA não se beneficiassem com o comércio internacional.

A prisão no Canadá, com pedido de extradição para os EUA, da diretora financeira e filha do fundador da Huawei, Meng Wanzhou, "foi completamente fabricada para conter" o crescimento da maior companhia fabricante de equipamentos de telecomunicações do mundo, na visão do coronel Tan.

"Os EUA estão descendo ladeira abaixo e berram alto num sinal de declínio", criticou o secretário-geral do Centro de Ciências da China na Academia Internacional de Ciências da Eurásia, Liu Honghai.

Liu a defende a criação de um bloco de nações liderado pela China a partir da Iniciativa Um Cinturão Uma Estrada, um gigantesco programa de obras de infraestrutura ao longo do antigo Caminho da Seda. É um marco do imperialismo econômico chinês.

A China é acusada de fazer uma "diplomacia de talão de cheques" para dominar países em desenvolvimento através do endividamento. No mês passado, Xi assinou contratos com outros países no valor de US$ 64 bilhões.

"Por muito tempo, a China comunista vem trapaceando no comércio com os EUA", argumenta o jornalista Lou Dobbs, da televisão Fox Business, um aliado do tarifaço. "O presidente Trump deixou claro: o fracasso de presidentes anteriores de representar os interesses dos EUA acabou."

Ao atacar a globalização, o sistema multilateral e até mesmo os aliados dos EUA, que seriam úteis no conflito econômico com a China, Trump indica acreditar num mundo dividido em esferas de influência de grandes potências militares: EUA, China e Rússia.

"O mundo em que estamos entrando não será uma era de paz e desenvolvimento, será uma era de separação estratégica", prevê Yu Shiguang, da Associação de Investimentos na China, um órgão governamental. "O trumpismo não é apenas o imperialismo americano, é 'EUA primeiro', mais selvagem, mais sangrento e mais guerreiro."

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