O primeiro-ministro da Turquia, Recep Tayyip Erdogan, vai a Damasco nesta semana com um recado: Israel está pronta para negociar com a Síria. Em troca da paz, devolve as Colinas do Golã, ocupadas na Guerra dos Seis Dias, em 1967, e anexadas em 1981.
No fim de semana passado, o ex-presidente Jimmy Carter esteve na capital síria com o presidente Bachar Assad e com o líder máximo do Movimento de Resistência Islâmica (Hamas), Khaled Mechal.
São ações diplomáticas para atrair a Síria para o processo de paz no Oriente Médio. Com a Síria, seria possível evitar um boicote de grupos radicais às negociações entre israelenses e palestinos, pacificar o Líbano, cortar o apoio sírio a extremistas sunitas no Iraque e afastá-la de sua aliança com o Irã.
“Erdogan telefonou para o presidente Bachar al-Assad na manhã de terça-feira para lhe dizer que o primeiro-ministro de Israel, Ehud Olmert, está pronto para uma retirada total das Colinas do Golã em troca da paz”, reportou o jornal oficial sírio Al-Watan. A televisão estatal deu a mesma notícia.
O primeiro-ministro é uma das pessoas mais qualificadas para levar o recado. A Turquia é a maior aliada de Israel no mundo muçulmano e Erdogan um islamita moderado.
A Síria insiste na devolução completa das Colinas do Golã como precondição para negociar a paz. Quando o primeiro-ministro israelense Yitzhak Rabin fez o acordo com a Organização para a Libertação da Palestina, de Yasser Arafat, em 1994, acenou com a possibilidade de uma negociação com a Síria para evitar um boicote sírio à paz.
Os sírios sempre tiveram dúvida se a proposta era para valer, Israel queria manter o controle das águas do Mar da Galiléia. Rabin foi assassinado em novembro de 1995. Uma série de atentados terroristas do Hamas e uma invasão do Líbano minaram o sucessor de Rabin, Shimon Peres, e a direita ganhou a eleição de 1996 com Benjamin Netanyahu.
Outra tentativa foi feita em 2000 pelo então primeiro-ministro Ehud Barak, hoje ministro da Defesa. Ele queria superar o gradualismo dos acordos de Oslo, mas acabou não conseguindo nada além de retirar Israel do Sul do Líbano.
Em junho do ano passado, dois ministros israelenses confirmaram que uma proposta de paz havia sido feita à Síria através de terceiros, no caso, a Turquia.
Aí houve um grave incidente. Em 6 de setembro, a Força Aérea de Israel destruiu uma construção na Síria, supostamente de uma central nuclear que estava recebendo um reator da Coréia do Norte. Esta relação está sendo usada pela linha dura nos Estados Unidos contra Damasco e Pionguiangue.
Na semana passada, o primeiro-ministro Olmert declarou à TV israelense: “É claro que queremos a paz com a Síria e estamos tomando todas as medidas para este fim. O presidente Assad sabe precisamente quais são as nossas expectativas e nós as dele. Não posso falar mais do que isso.”
No domingo, Assad comunicou oficialmente a seu Partido Baath, líder da Frente Progressista Nacional que governa a Síria, que “amigos estão fazendo esforços para organizar contatos entre a Síria e Israel”.
Ao mesmo tempo, o ex-presidente Jimmy Carter resolveu tentar romper o isolamento da Síria e do Hamas, estigmatizados pelo governo George Walker Bush. Com o apoio do presidente do Egito, Hosni Mubarak, foi a Damasco se encontrar com Assad e Mechal.
Carter chegou a anunciar que o Hamas aceitaria uma negociação de paz com Israel com base na fórmula de dois Estados, um palestino e um israelense, convivendo lado a lado no território histórico da Palestina.
Mechal aceitou a fórmula mas rejeitou o reconhecimento de Israel. Exigiu o recuo de Israel para as fronteiras anteriores à guerra de 1967, a criação de um país palestino na Cisjordânia e na Faixa de Gaza, com capital no setor árabe de Jerusalém, e o direito de retorno de todos os refugiados.
Israel rejeita o total direito de retorno, mas uma compensação financeira aos palestinos refugiados desde a criação de Israel, em 1948, pode fazer parte de um grande acordo de paz.
Em entrevista anterior a um jornal palestino, o dirigente do Hamas admitiu negociar com base no Documento dos Prisioneiros, elaborado nas prisões de Israel por representantes das principais facções armadas palestinas. Ao se basear na idéia de dois Estados Nacionais, reconhece implicitamente o direito de existência de Israel.
No site do Centro Carter, o ex-presidente deixou notas sobre os encontros com os líderes do Hamas: “Eles ainda não concordaram em aceitar a coexistência pacífica com Israel; não renunciaram à violência e não aceitam os antigos acordos de paz.”
Na sua opinião, “o Hamas deveria concordar nestas três questões, mas não acreditamos que a paz seja provável e estamos certos de que a paz é insustentável se não for encontrada uma forma para garantir que o Hamas não vai sabotar as negociações de paz.”
“A atual estratégia de isolar e sufocar o Hamas e perseguir a população de Gaza não está funcionando. Só exacerba o ciclo da violência, e as últimas pesquisas mostram que aumentou a popularidade relativa do Hamas em toda a Palestina. Alguns dizem que meu encontro com o Hamas o legitima, mas sua legitimidade vem do voto da maioria do povo palestino nas eleições de 2006, que observei.”
Há um velho ditado no Oriente Médio que diz: “Não há guerra sem o Egito nem paz sem a Síria”. Continua valendo.
Este é o blog do jornalista Nelson Franco Jobim, Mestre em Relações Internacionais pela London School of Economics, ex-correspondente do Jornal do Brasil em Londres, ex-editor internacional do Jornal da Globo e da TV Brasil, ex-professor de jornalismo e de relações internacionais na UniverCidade, no Rio de Janeiro. Todos os comentários, críticas e sugestões são bem-vindos, mas não serão publicadas mensagens discriminatórias, racistas, sexistas ou com ofensas pessoais.
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