Depois de adiar as eleições para 2018 sob o argumento de falta de dinheiro e de registro eleitoral, o presidente da República Democrática do Congo, Joseph Kabila, anunciou às 23 horas de 19 de dezembro, data do fim do mandato, a formação de um novo governo, deflagrando uma onda de protestos. As forças de segurança atacaram as multidões matando pelo menos 26 pessoas, noticiou o jornal inglês The Guardian.
Dez mortes aconteceram em Lubumbashi, no Sudeste do antigo Congo Belga, onde outras 31 pessoas saíram feridas. Em Goma, no Leste do país, pelo menos 20 ativistas foram presos. No país inteiro, pelo menos 275 pessoas foram presas e 116 continuam detidas. A oposição denuncia 600 prisões.
Joseph Kabila chegou ao poder em 2001, substituindo o pai, Laurent Kabila, que foi assassinado. Foi eleito em 2006 e reeleito em 2011. Na segunda-feira, terminou seu segundo mandato e a Constituição o impede de concorrer a nova reeleição, mas o presidente não parece disposto a entregar o poder.
O ditador ignorou uma tentativa de mediação conduzida pela Igreja Católica e se antecipou ao nomear ontem um novo primeiro-ministro, Samy Badibanga, um ex-opsocionista, e um governo com 67 ministros em vez dos 47 do governo anterior para tentar atrair adversários políticos para seu lado.
Riquíssimo em recursos naturais, o Congo tem uma história trágica. Foi colonizado numa ação genocida conduzida pelo rei Leopoldo II, da Bélgica, o que levou o escritor polaco-britânico Joseph Conrad a escrever o livro No Coração das Trevas.
Quando o país se tornou independente, a esquerda liderada pelo primeiro-ministro Patrice Lumumba venceu as eleições provocando uma guerra civil fomentada pelas potências ocidentais. Lumumba foi derrubado em três meses e assassinado em janeiro de 1961, num golpe liderado por Joseph-Desiré Mobutu, um ex-sargento do Exército colonial belga que se aliou ao Ocidente na Guerra Fria.
Em 1965, depois de um segundo golpe de Estado, Mobutu foi oficialmente nomeado presidente e mudou o nome do país para Zaire, que governou com mão de ferro durante 32 anos, acumulando uma fortuna pessoal estimada entre US$ 4 bilhões e US$ 6 bilhões.
Com o genocídio de 800 mil pessoas na vizinha Ruanda em 1994, centenas de milhares de pessoas da etnia tútsi se refugiaram no Leste do Zaire, desestabilizando o país.
Uma nova guerra civil congolesa começou em 1996, quando Laurent Kabila deixou as Montanhas da Lua, onde estava refugiado desde o fracasso da revolução dos anos 1960s, em que o guerrilheiro argentino Ernesto Che Guevara lutou ao lado dele, descrevendo-o como "bêbado, mulherengo e incapaz de liderar uma revolução".
Mobutu Sese Seko Kuku Ngbendu Wa Za Banga, traduzido como o guerreiro que não conhece derrota por causa de sua resistência e sua vontade inflexível e é todo poderoso, deixando uma trilha de fogo por onde passa de conquista, caiu em 16 de maio de 1997, mas a guerra civil estava apenas começando.
A Primeira Guerra Mundial Africana envolveu nove exércitos nacionais e centenas de grupos irregulares, muitos ainda em atividade. De 1997 a 2002, estima-se que 5,4 milhões pessoas tenham sido mortas em combate, de fome ou doenças. O estupro como arma de guerra tornou-se endêmico.
Este é o blog do jornalista Nelson Franco Jobim, Mestre em Relações Internacionais pela London School of Economics, ex-correspondente do Jornal do Brasil em Londres, ex-editor internacional do Jornal da Globo e da TV Brasil, ex-professor de jornalismo e de relações internacionais na UniverCidade, no Rio de Janeiro. Todos os comentários, críticas e sugestões são bem-vindos, mas não serão publicadas mensagens discriminatórias, racistas, sexistas ou com ofensas pessoais.
quarta-feira, 21 de dezembro de 2016
Kabila consuma golpe e manda atirar na multidão no Congo
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