Com quase 80 anos, o escritor e intelectual italiano Umberto Eco mantém a inquietação. A exemplo de outros pensadores, como o filósofo alemão Jürgen Habermas, quer salvar o projeto de integração da Europa, abalado pela pior crise econômica do pós-guerra. Está convencido de que a salvação está na cultura.
"Somos europeus por causa da cultura, depois de o havermos sido por causa de guerras fratricidas", declarou Eco ao suplemento Europa, publicado por seis jornais do continente, inclusive o francês Le Monde.
"Diante da crise da dívida europeia", acrescentou, "devemos lembrar que só a cultura, além da guerra, constitui nossa identidade. Durante séculos, franceses, italianos, alemães, espanhóis e ingleses se atacaram. Estamos em paz há menos de 60 anos e ninguém mais presta atenção a esta obra-prima: imaginar hoje a explosão de um conflito entre Espanha e França ou entre Itália e Alemanha não provoca mais do que risos. Os Estados Unidos precisaram de uma guerra civil para se unir verdadeiramente. Espero que a cultura e o mercado nos sejam suficiente".
Na visão do historiador britânico Geoffrey Barraclough, o continente viveu a "longa guerra civil europeia" que começou em 1914, com a Primeira Guerra Mundial, e termina em 1989, com a queda do Muro de Berlim.
Para "enraizar" a cultura europeia, Eco propõe estender o programa de intercâmbio universitário Erasmus a outros setores: "É uma revolução sexual: um jovem catalão encontra uma jovem flamenga, eles se apaixonam, se casam e se tornam europeus, como seus filhos".
É uma ideia sedutora, diz a reportagem, mas jornais populares e partidos de extrema direita na França, Suécia, Finlândia, Hungria e Itália aproveitam a crise para fomentar o nacionalismo extremado e a xenofobia que quase levaram a Europa ao suicídio coletivo duas vezes durante o século 20.
"É por isso que chamo nossa identidade de rasa", argumenta. "Os pais fundadores da Europa, Konrad Adenauer, Alcide de Gasperi, Jean Monnet, podem ter viajado menos - De Gasperi só falava alemão porque nascera no Império Austro-Húngaro -, eles não tinham a Internet para ler a imprensa estrangeira. A Europa que eles construíram era uma reação à guerra, eles dividiram os recursos para construir a paz. Hoje devemos trabalhar para construir uma identidade profunda".
Em meio à pior crise do mundo globalizado, Eco é otimista: "Apesar de todos os seus defeitos, o mercado globalizado tornou a guerra mais improvável. Não haverá jamais uns Estados Unidos da Europa no modelo americano, um só país com uma única língua. (...) Eu continuo a pensar que a distância entre Lisboa e Varsóvia não é maior do que de São Francisco a Nova York. Seremos uma federação, mas indissolúvel".
Este é o blog do jornalista Nelson Franco Jobim, Mestre em Relações Internacionais pela London School of Economics, ex-correspondente do Jornal do Brasil em Londres, ex-editor internacional do Jornal da Globo e da TV Brasil, ex-professor de jornalismo e de relações internacionais na UniverCidade, no Rio de Janeiro. Todos os comentários, críticas e sugestões são bem-vindos, mas não serão publicadas mensagens discriminatórias, racistas, sexistas ou com ofensas pessoais.
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