Em sua viagem pelo Oriente Médio, depois de ir a Israel, o presidente Lula visita a Cisjordânia como o profeta do diálogo, como o descreveu o jornal liberal israelense Haaretz.
A Organização das Nações Unidas aprovou a partilha da Palestina em 1947. Mas o Estado árabe nunca foi criado. Os países árabes rejeitaram a criação de Israel e entraram em guerra assim que Israel nasceu, em 1948, criando um estado de guerra que persiste até hoje no Oriente Médio.
Na Palestina, onde estive em 1996, minha impressão foi de território ocupado, sem estradas, ruas, águas e esgotos, coisas fundamental da vida que a potência ocupante negligencia, mas não para si. As estradas onde circulam os tanques de Israel são de Primeiro Mundo. São Primeiro Mundo. A revolta é inevitável.
Com a morte do líder histórico da causa palestina, Yasser Arafat, em 2004, subiu Mahmoud Abbas, hoje presidente da Autoridade Nacional Palestina, considerado pelo governo Bush como “um parceiro confiável para negociar a paz”.
Arafat fundou seu partido e grupo armado Fatah (Luta) em 1959. O líder histórico do nacionalismo pan-árabe, o presidente egípcio Gamal Abdel Nasser, criou a Organização para a Libertação da Palestina (OLP) em 1964. Só depois da Guerra dos Seis Dias, em 1967, Arafat unificou o movimento palestino sob a OLP, em 1969.
Originalmente, seu objetivo era destruir Israel. Mas, em 1988, para ser reconhecido pelos EUA, Arafat concordou em banir da Carta da OLP a cláusula prevendo a destruição de Israel.
Um ano antes, surgira o Movimento de Resistência Islâmica (Hamas), filho da Irmandade Muçulmana do Egito, o mais antigo grupo fundamentalista muçulmano, fundado por Hassan al-Bana em 1928 para reislamizar a Umma, o conjunto de todos os muçulmanos. Israel apoiou o Hamas no seu começo para dividir o movimento nacional palestino.
As negociações de paz começaram na Conferência de Madri, em 30 e 31 de outubro de 1991, com a OLP enfraquecida porque Arafat apoiou Saddam Hussein na Guerra do Kuwait. No último minuto, para livrar a cara, Saddam admitiu sair do Kuwait se Israel devolvesse os territórios árabes. O blefe não colou.
Quando todos perceberam que os delegados palestinos saíam das reuniões para consultar Arafat e a OLP por telefone, a OLP entrou diretamente no jogo.
Como essas negociações públicas não avançavam, foram organizadas pela Noruega negociações secretas em Oslo. Israelenses e palestinos foram convidados para uma casa. Tomavam café da manhã juntos, almoçavam juntos, jantavam e tomavam drinques juntos.
Depois que se conhceram, começou a negociação. “Agora, vocês tem de se entender. Se der briga, a gente entra e aparta, mas não vamos nos meter no conteúdo da negociação, que é com vocês. Esqueçam as brigas do passado, se não nunca vão se entender. Pensem em construir o futuro.”
Em setembro de 1983, Arafat apertou a mão do relutante primeiro-ministro Yitzhak Rabin no jardim da Casa Branca. Saiu a Declaração de Princípios. No ano seguinte, foram assinados os acordos de Oslo: a opção Gaza e Jericó, primeiro.
Gaza é uma faixa de areia de 41 quilômetros de comprimento por 6 a 12 km de largura. Tem 1,1 milhão de habitantes, uma das maiores senão a maior densidade populacional do planeta. Não tem água no subsolo nem maior interesse para Israel, que ainda controla mar e ar, apesar do território estar sob administração.
Na Cisjordânia, o processo avançou além de Jericó, a cidade histórica, e inclui parte do território, Ramalá, onde está a sede da OLP, Belém. Há pelo menos três status legais diferentes para as cidades da Cisjordânia, a margem ocidental do Rio Jordão.
Há cidades sob total controle palestino; áreas em transição, ainda sob controle militar israelense; e áreas sob o controle de Israel.
A construção de uma barreira isolando partes da Cisjordânia dividiu famílias e palestinos. É uma das questões importantes no momento, comparado pelos palestinos ao Muro de Berlim.
O processo de paz criou esperança e até crescimento econômico em Israel no início dos anos 90, mas a vida dos palestinos certamente não melhorou. Em Gaza, o desemprego chega a 70%.
Em novembro de 1995, Rabin foi morto por um extremista israelense por devolver parte dos territórios ocupados aos palestinos. Em fevereiro do ano seguinte, Israel matou o engenheiro do Hamas, que deveria estar sendo procurado há muito tempo, com uma bomba no telefone celular.
Foi mais uma operação bem-sucedida do serviço secreto israelense Mossad, mas a reação foi violenta. Acabou levando à primeira eleição de Netanyahu, em 1996, apesar de Shimon Peres, hoje presidente, ter invadido o Líbano na Operação Vinhas da Ira e matado mais de cem palestinos num ataque com avião não tripulado a um campo de refugiados em Caná, onde, reza a Bíblia, Cristo transformou a água em vinho.
Com a morte de Rabin e a derrota dos trabalhista, o processo de paz entrou numa fase de relativa estagnação. Netanyahu reconheceu os acordos firmados pelo governo anterior e negociou pelo menos mais um. Mas a tentativa de chegar a um acordo definitivo só foi retomada com a volta dos trabalhistas ao poder, com Ehud Barak, em 1999.
Barak era contra o gradualismo do processo, que achava desgantante para Israel, além de acusar os palestinos de sempre quererem mais e mais. Tentou, no último suspiro do governo Clinton, chegar a um acordo definitivo nas negociações de 2000 em Camp David, nos EUA. Arafat preferiu esperar Bush, apostando, mais uma vez erradamente, que um governo republicano na Casa Branca seria melhor para o mundo árabe.
Na verdade, nenhum dos lados tinha força política para fazer as concessões necessárias para uma paz aceitável para o outro.
Uma visita de Sharon ao Muro das Lamentações, no Monte do Templo, em 28 de setembro de 2000, deflagrou a segunda intifada (revolta das pedras), acabando mais uma vez com o processo de paz.
Bush só percebeu a importância do problema palestino depois de 11 de setembro, como maneira de melhorar um pouco a imagem dos EUA no mundo árabe. Mais uma vez, Arafat fez a avaliação errada: com o crescimento da direita religiosa, que venera Israel como um local bíblico, a terra do povo judeu, o Partido Republicano criou uma aliança com a direita israelense.
Dentro da política de mudança de regime e democratização do Oriente Médio, parte da estratégia da guerra contra o terror, os palestinos foram pressionados a realizar eleições para dar legitimidade democrática ao processo.
Abbas foi eleito sucessor de Arafat em 2005. Mas, nas eleições parlamentares de 25 de janeiro de 2006, os palestinos deram maioria ao Hamas, um partido considerado um grupo terrorista pelos EUA e a Europa.
Nova crise: a ajuda internacional, de que muitas entidades e o próprio governo palestinos dependem foi cortada. Foi formado um governo do primeiro-ministro Ismail Haniya, isolado internacionalmente e de convivência difícil com a Fatah de Abbas.
Haniya foi demitido em junho de 2007, quando o Hamas tomou o poder na Faixa de Gaza, derrotando as forças da Autoridade Nacional Palestina, leais Abbas e à OLP, numa guerra civil palestina.
É assim que os palestinos se apresentam, divididos em pelo menos dois grupos principais, a Fatah, que governa parte da Cisjordânia, e o Hamas, que governa Gaza.
Como o Hamas não renuncia à luta armada nem reconhece Israel, não participa de negociações, a não ser indiretamente, sob a mediação do Egito. Mas que garantia tem Israel de assinar a paz com Abbas se o Hamas não concordar?
O Hamas exige a retirada incondicional de Israel dos territórios árabes ocupados em 1967, o que implica o reconhecimento do direito de existência de Israel. Está em trégua desde a ofensiva israelense do fim de 2008 e início de 2009, que matou 1,4 mil palestinos e 13 israelenses. A liderança do Hamas exilada em Damasco está sempre sob influência da Síria e especialmente do Irã, que é contra reconhecer Israel.
O processo de paz ainda tem de andar muito para chegar no Hamas. Se o Brasil conseguisse atrair o Hamas para as negociações através de seu bom relacionalmento com o Irã, prestaria um enorme serviço ao processo de paz.
Só os EUA têm poder para convencer Israel a fazer as concessões necessárias para chegar à paz porque os EUA são o único parceiro confiável para Israel. Só os EUA poderiam liderar uma força de paz para se interpor entre Israel e a Palestina independente. Mas os EUA não fazem isso porque, como disse Biden depois de ser esnobado, “os EUA não têm aliado melhor do que Israel”.
Lula tenta ganhar pontos para o novo status de potência ascendente do Brasil com sua proposta de diálogo. Mas, como os noruegueses avisaram, são israelenses e palestinos que precisam se entender.
A relação é muito desequilibrada, com o poder de Israel sendo infinitamente superior ao dos palestinos. Israel está preocupado com o Irã, não com a questão nacional palestina.
Lula tenta ganhar pontos para o novo status de potência ascendente do Brasil com sua proposta de diálogo. Mas, como os noruegueses avisaram, são israelenses e palestinos que precisam se entender.
A relação é muito desequilibrada, com o poder de Israel sendo infinitamente superior ao dos palestinos. Israel está preocupado com o Irã, não com a questão nacional palestina.
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