En resposta a um ataque com 30 mísseis contra um quartel do Iraque perto da cidade de Kirkuk onde havia soldados americanos, a Força Aérea dos Estados Unidos bombardeou hoje bases da milícia iraquiana Kataib Hesbolá (Brigadas do Hesbolá), apoiada pelo Irã.
No primeiro ataque, um funcionário de uma empreiteira americana a serviço do Departamento da Defesa morreu e quatro soldados dos EUA saíram feridos. Foi o 11º em dois meses contra bases onde havia pessoal americano no Iraque.
Eram cerca de sete da noite pela hora local (13h em Brasília) quando caças-bombardeiros F-15E cumpriram a missão aprovada sábado à noite pelo presidente Donald Trump. O Pentágono não revelou de onde partiram os aviões.
Foi a primeira vez que os EUA atacaram uma milícia xiita desde que voltaram ao Iraque em 2014 para combater a organização terrorista Estado Islâmico, que é sunita.
Pela avaliação inicial do comando militar americano, todos os cinco alvos escolhidos, três no Iraque e dois na Síria, foram atingidos. Eram arsenais e centros de comando e controle da milícia xiita.
"O Irã e milícias aliadas devem parar de atacar os EUA e as forças da coalizão, e respeitar a soberania do Iraque para evitar ações defensivas adicionais das forças dos EUA", declarou em Washington o porta-voz do Pentágono, Jonathan Hoffman.
Há duas semanas, o secretário de Estado, Mike Pompeo, advertiu que os EUA responsabilizam o Irã por qualquer ataque contra alvos americanos por armar, financiar e treinar as milícias, e dariam "uma resposta firme".
Meia hora antes do bombardeio, o secretário da Defesa, Mark Esper, telefonou para o primeiro-ministro do Iraque, Adel Abdul Mahdi, para avisar sobre o ataque.
O primeiro-ministro xiita tentou dissuadir o chefe do Pentágono alegando que seria "uma violação da soberania do Iraque capaz de levar a uma escalada perigosa que ameaçaria o Iraque e toda a região", de acordo com o porta-voz do governo iraquiano, general Abdul Karim Khalaf.
Abdul Mahdi chegou a alegar que o Iraque não tinha certeza sobre a autoria do ataque, sugerindo que poderia ser do grupo terrorista Estado Islâmico. Tanto o Estado Islâmico quando as milícias xiitas chamadas de Unidades de Mobilização Popular (UMPs) atuam na região de Kirkuk. A escala do ataque levou os EUA a concluir que seriam as milícias xiitas.
Depois da invasão do Iraque para derrubar o ditador Saddam Hussein, em 2003, as forças de ocupação dos EUA foram atacadas por milícias sunitas e xiitas. Nos últimos cinco anos de guerra contra o Estado Islâmico, as milícias xiitas e os EUA tinham um inimigo comum feroz. Esta trégua informal acabou.
A tensão entre EUA e Irã aumenta desde que o presidente Donald Trump abandonou, em 8 de maio de 2018, o acordo nuclear negociado pelo governo Barack Obama, as outras grandes potências do Conselho de Segurança das Nações Unidas e a Alemanha para evitar que a República Islâmica fabrique armas atômicas.
Para pressionar o Irã a negociar um acordo mais amplo, que também inclua mísseis de médio e longo alcances, o governo Trump faz uma verdadeira guerra econômica contra o país. Com sanções diretas e cruzadas, os EUA tentam zerar as exportações de petróleo iranianas, que caíram de 3 milhões para 600 mil barris por dia.
Sob pressão, com inflação acima de 50% ao ano, recessão e desemprego em alta no Irã, em maio e junho, a Guarda Revolucionária Iraniana fez vários ataques a navios petroleiros no Golfo Pérsico e no Estreito de Ormuz e abateu um drone americano.
Em 14 de setembro, duas instalações petrolíferas importantes da Arábia Saudita foram bombardeadas. A milícia xiita huti, que luta na guerra civil do Iêmen com o apoio do Irã, reivindicou a responsabilidade pelo ataque. Ficou evidente a fragilidade da defesa do setor de petróleo saudita. Um ataque arrasador teria sérias consequências para a economia mundial.
Os EUA não responderam a esses ataques porque nenhum americano foi ferido.
Como há 5 mil soldados americanos e numerosas milícias xiitas ligadas ao Irã no Iraque, há um grande risco de incidentes capazes de provocar uma conflagração maior e até mesmo uma guerra. O regime dos aiatolás e da Guarda Revolucionária não vai atacar diretamente os EUA, mas pode investir contra aliados americanos como a Arábia Saudita e Israel.
Nem Trump, que só pensa na reeleição, nem a ditadura teocrática iraniana quer a guerra. Mas sempre há o risco de que as provocações e retaliações saiam de controle.
Este é o blog do jornalista Nelson Franco Jobim, Mestre em Relações Internacionais pela London School of Economics, ex-correspondente do Jornal do Brasil em Londres, ex-editor internacional do Jornal da Globo e da TV Brasil, ex-professor de jornalismo e de relações internacionais na UniverCidade, no Rio de Janeiro. Todos os comentários, críticas e sugestões são bem-vindos, mas não serão publicadas mensagens discriminatórias, racistas, sexistas ou com ofensas pessoais.
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