De 65 países examinados, em 33 houve um declínio da liberdade na Internet desde junho de 2018, constatou um estudo da organização americana Freedom House. Entre os países com maior recuo citados no relatório A Crise das Redes Sociais, estão o Brasil, Bangladesh, o Casaquistão e o Zimbábue.
Com o autoritarismo digital e a vigilância aos cidadãos, em 47 dos 65 países houve prisões por "conteúdo político, religioso ou social" na rede mundial de computadores.
Dos 7,742 bilhões de seres humanos, 3,8 bilhões têm acesso à Internet.
• 71% vivem em países onde pessoas foram presas por divulgarem conteúdo político, social ou religioso;
• 65% vivem em países onde pessoas foram atacadas e até mortas por suas atividades on-line;
• 59% vivem em países onde autoridades usaram comentaristas a favor do governo para manipular as discussões;
• 56% vivem em países onde conteúdo político, social ou religioso on-line é censurado;
• 46% vivem em países onde as autoridades desligaram a internet ou as telecomunicações por telefone por motivos políticos;
• 46% vivem em países onde o acesso às plataformas das redes sociais é temporária ou permanentemente restrito.
A desinformação está em alta: "Líderes políticos empregam indivíduos para formar subrepticiamente a opinião na rede em 38 dos 65 países estudados neste relatório. (...) Em muitos países, a ascensão do populismo e do extremismo de ultradireita coincidiu com o crescimento de matilhas virtuais hiperpartidárias que incluem tanto usuários autênticos quanto fradulentos e contas automáticas", de robôs.
É a crise das redes sociais, nome do estudo. As plataformas que prometiam abertura e liberdade de expressão estão sendo usadas para vigiar, reprimir e confundir.
"A liberdade na Internet é crescentemente ameaçada pelos instrumentos e táticas do autoritarismo digital, que se espalhou rapidamente pelo globo. Regimes repressivos, governantes eleitos com ambições autoritárias e operadores partidários inescrupulosos exploram espaços não regulamentados das plataformas das redes sociais, convertendo-as em instrumentos para a distorção da política e o controle da sociedade", advertem os autories, Adrian Shahbaz e Allie Funk.
"Embora as redes sociais tenham às vezes servido de campo nivelado para a discussão cívica, elas estão agora se inclinando perigosamente para o iliberalismo, expondo os cidadãos a uma repressão sem precedentes de suas liberdades fundamentais. Pior ainda, uma alarmante variedade de governos está instalando instrumentos avançados para identificar e monitorar usuários numa escala imensa. Como resultado desta tendência, a liberdade na Internet global caiu pelo nono ano consecutivo em 2019", afirma o relatório.
O estudo acrescenta que "as redes sociais permitem que pessoas comuns, grupos sociais e jornalistas tenham acesso a uma vasta audiência a baixo ou nenhum custo, mas também oferecem uma plataforma útil e barata para operações de influência maligna de agentes do país ou do exterior."
"Além de facilitar a disseminação de propaganda e desinformação durante campanhas eleitorais, as redes sociais permitem a coleta e a análise de vasta quantidade de dados sobre populações inteiras. A vigilância sofisticada em massa, antes possível apenas para as agências de inteligência das grandes potências, agora é acessível a ampla variedade de países", alerta a Freedom House.
"Agentes estatais e não estatais empregaram técnicas informacionais para distorcer o ambiente da mídia durante eleições em 24 países no ano passado, tornando-a de longe a tática mais popular. A Freedom House lista cinco grandes métodos de manipulação: notícias que são propagandas, notícias totalmente falsas, comentaristas pagos, robôs e o sequestro de contas reais nas redes sociais.
"Neste ano, populistas e líderes de extrema direita se tornaram não só adeptos de criar uma desinformação viral, mas também de cultivar redes que as disseminem. Algumas destas redes são explicitamente dirigidas pelo Estado ou por funcionários do partido, enquanto outras são semiautônomas, dão apoio a seus ídolos políticos e recebem em troca encorajamento e aprovação", comenta o estudo, ao tentar explicar a redução da liberdade em 2019.
"Estas redes trabalham em conjunto com personalidades da mídia e magnatas do mundo dos negócios aliados ao governo. Estas matilhas virtuais amplificam teorias conspiratórias, visões inflamatórias e memes enganosos de pequenas câmaras de eco digital para a realidade política", argumentam os autores.
"Grupos de extrema-direita podem ter mais sucesso porque - como mostram estudos - conteúdos falsos, chocantes, negativos, exagerados e emocionalmente carregados tendem a se propagar mais depressa e mais amplamente em plataformas de redes sociais do que outros tipos de conteúdo", nota o relatório, acrescentando que as autoridades eleitorais da maioria dos países não estão preparadas para controlar este tipo de campanha eleitoral.
A pesquisa indica que "governos repressivos estão adquirindo instrumentos de vigilância nas redes sociais que empregam inteligência artificial para identificar possíveis ameaças e silenciar manifestações indesejadas. Mesmo nas democracias esta vigilância em massa está se espalhando pelas agências governamentais e sendo usada para outros propósitos sem as salvaguardas adequadas.
Se a China isola sua Internet para evitar a entrada de ideias indesejáveis para o regime comunista e a Rússia marcha na mesma direção, as grandes plataformas das redes sociais estão nos Estados Unidos e "sua exploração por forças antidemocráticas é em parte produto da negligência americana", continua o relatório.
"A vitória de Jair Bolsonaro na eleição presidencial de outubro de 2018 no Brasil provou ser um divisor de águas para a interferência digital nas eleições do país. Atores não identificados montaram ataques contra jornalistas, entidades governamentais e usuários politicamente engajados, enquanto a manipulação das redes sociais atingia novos picos. Partidários de Bolsonaro e de sua coalizão de extrema direita Brasil acima de Todos, Deus acima de Tudo divulgaram rumores homofóbicos e imagens manipuladas no YouTube e no WhatsApp. No governo, Bolsonaro contratou consultores de comunicação a quem se credita uma campanha sofisticada de desinformação", diz o parágrafo sobre o Brasil.
"O futuro da liberdade na Internet depende de corrigir as redes sociais", propõem os autores. "Não há tempo a perder. Novas tecnologias como biométrica, inteligência artificial e redes de telecomunicações de quinta geração (5G) vão oferecer novas oportunidades para o desenvolvimento humano, mas também apresentam, sem dúvida, uma nova série de desafios aos direitos humanos.
"São necessárias proteções fortes às liberdades democráticas para garantir que a Internet não se transforme num Cavalo de Troia da tirania e da opressão. O futuro da privacidade, da liberdade de expressão e da governança democrática está nas decisões que tomamos hoje."
Este é o blog do jornalista Nelson Franco Jobim, Mestre em Relações Internacionais pela London School of Economics, ex-correspondente do Jornal do Brasil em Londres, ex-editor internacional do Jornal da Globo e da TV Brasil, ex-professor de jornalismo e de relações internacionais na UniverCidade, no Rio de Janeiro. Todos os comentários, críticas e sugestões são bem-vindos, mas não serão publicadas mensagens discriminatórias, racistas, sexistas ou com ofensas pessoais.
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